terça-feira, 11 de novembro de 2008

Telepatia

Por amabilidade do editor, pré-publicamos um trecho do capítulo sobre "Telepatia" do livro "A Física do Impossível" do físico norte-americano Michio Kaku, a sair muito em breve na Bizâncio:

O romance Slan, de A. E. van Vogt, capta o grande potencial e os nossos maiores receios associados ao poder da telepatia.

Jommy Cross, o protagonista do romance, é um «slan», uma raça de telepatas super inteligentes em vias de extinção.

Os pais foram brutalmente assassinados por grupos de humanos enraivecidos que temem e desprezam todos os telepatas, devido ao enorme poder daqueles que conseguem intrometer-se nos pensamentos mais privados e íntimos das pessoas. Os humanos perseguem os slans sem piedade, como se fossem animais. Com as gavinhas típicas que lhes saem da cabeça, os slans são fáceis de identificar. No decorrer da história, Jommy tenta contactar outros slans que possam ter fugido para o espaço na tentativa de escapar à caça às bruxas dos humanos, determinados a exterminá-los.

Do ponto de vista histórico, a leitura da mente é algo tão importante que tem sido muitas vezes associado aos deuses. Um dos poderes mais importantes de qualquer deus é a capacidade de ler a nossa mente e assim responder às nossas preces mais profundas. Um verdadeiro telepata que conseguisse ler qualquer mente tornar-se-ia com facilidade a pessoa mais rica e poderosa da Terra, pois poderia entrar na mente dos banqueiros de Wall Street ou chantagear e coagir os seus rivais. Seria considerado uma ameaça à segurança dos governos, na medida em que conseguiria, sem qualquer esforço, roubar os segredos mais bem escondidos de uma nação. Tal como os slans, o telepata seria temido e até possivelmente perseguido e eliminado.

O enorme poder de um verdadeiro telepata foi destacado na série de referência intitulada Fundação, de Isaac Asimov, muitas vezes considerada uma das epopeias de ficção científica mais importante de sempre. Um Império Galáctico que deteve o poder durante milhares de anos está prestes a perecer. A Segunda Fundação, uma sociedade secreta de cientistas, consegue prever, através de equações complexas, que o Império vai cair e mergulhar a civilização em trinta mil anos de trevas. Então, na tentativa de reduzir este colapso da civilização apenas a alguns milhares de anos, esboçam um plano elaborado, baseado nas suas equações. E, nessa altura, acontece uma desgraça: as equações não prevêem um evento, o nascimento de um mutante chamado Mule, que é capaz de controlar a mente à distância e assim conseguir o controlo do Império Galáctico. A galáxia está condenada a trinta mil anos de caos e anarquia, a menos que se consiga neutralizar este telepata.

Embora a ficção científica esteja cheia de histórias fantásticas sobre telepatas, a verdade é muito mais terra-a-terra. Uma vez que os pensamentos são privados e invisíveis, durante séculos os charlatães e os impostores abusaram dos mais ingénuos e crédulos. Um dos truques de muitos mágicos e mentalistas consiste em utilizar um cúmplice escondido no meio do público e cuja mente o mentalista consegue «ler». Na verdade, a carreira de muitos mágicos e mentalistas baseou-se no famoso «truque do chapéu», em que as pessoas escrevem mensagens privadas em pedaços de papel, que são depois colocados num chapéu. O mágico começa então a dizer ao público o que está escrito nos papéis, para espanto de todos os presentes. Há uma explicação ilusoriamente simples para este truque astucioso.

Um dos casos mais famosos de telepatia não envolveu um cúmplice mas sim um animal: Clever Hans, um cavalo prodígio que deixou o público europeu estupefacto na década de 1890. Para espanto do público, Clever Hans conseguia fazer cálculos matemáticos complexos; por exemplo, se se pedisse a Hans para dividir 48 por 6, o cavalo batia com o casco 8 vezes. Clever Hans sabia dividir, multiplicar, adicionar fracções, soletrar e até identificar tons musicais. Os fãs de Clever Hans afirmavam que o cavalo era mais inteligente do que muitos humanos ou então conseguia ler a mente das pessoas.

Mas Clever Hans não foi o produto de um truque inteligente; a sua capacidade incrível de fazer contas enganou até o seu treinador. Em 1904 o Professor C. Strumpf, um psicólogo distinto, foi chamado para analisar o cavalo e não conseguiu encontrar uma prova de aparente fraude ou algum sinal que o treinador pudesse transmitir ao animal, aumentando assim o fascínio do público. No entanto, três anos mais tarde, o psicólogo Oskar Pfungst, aluno de Strumpf, efectuou testes muito mais rigorosos e, finalmente, descobriu o segredo de Clever Hans: tudo o que se limitava a fazer era observar as expressões faciais subtis do seu treinador. O cavalo continuava a bater o casco até a expressão facial do treinador se alterar um pouco e, nessa altura, parava. Clever Hans não lia a mente das pessoas nem sabia matemática, era apenas um bom observador do rosto humano.

Outros animais «telepáticos» ficaram registados na história. Em 1591, um cavalo chamado Morocco ficou famoso em Inglaterra e enriqueceu o seu dono por reconhecer pessoas no público, apontar letras do alfabeto e somar o total de um par de dados. Morocco causou tamanha sensação em Inglaterra que Shakespeare o imortalizou na sua peça Tanto Amor Desperdiçado como o «cavalo dançarino».

Também os jogadores conseguem ler a mente, num sentido limitado. Quando uma pessoa vê algo agradável, as suas pupilas normalmente dilatam-se; quando vê algo indesejável (ou faz um cálculo matemático), as pupilas contraem-se. Os jogadores conseguem ler as emoções dos oponentes ao verificar se os olhos dilatam ou contraem. Esta é uma das razões por que os jogadores muitas vezes usam palas de cor sobre os olhos, para proteger as pupilas. Também é possível apontar um raio laser para a pupila de uma pessoa e analisar seu reflexo, conseguindo dessa forma determinar com precisão para onde essa pessoa está a olhar. Ao analisar o movimento do ponto reflectido da luz laser, é possível determinar como uma pessoa analisa uma imagem. Ao juntar estas duas tecnologias, é possível determinar a reacção emocional de uma pessoa, sem ter a sua autorização, quando esta analisa uma imagem.

Michio Kaku

2 comentários:

Carlos Medina Ribeiro disse...

Edison (que, pelos vistos, acreditava na existência da telepatia) também fez experiências sobre esse assunto - mas de forma não-convencional:

Colocou grandes bobinas em torno das cabeças dos "emissores" e dos "receptores", ligou-as entre si, mas não obteve resultados satisfatórios...

Anónimo disse...

"A Segunda Fundação, uma sociedade secreta de cientistas, consegue prever, através de equações complexas, que o Império vai cair e mergulhar a civilização em trinta mil anos de trevas".

Receio que o autor não tenha lido a epopeia até ao fim.

(no entanto é sempre agradável ler coisas sobre boa FC)

José Simões

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