quinta-feira, 19 de julho de 2007

Provas de Aferição de Língua Portuguesa


Mais um artigo de Rui Baptista publicado no "Primeiro de Janeiro":

A barbárie está nas ideologias.”
Edgar Morin

Como preâmbulo para a necessidade dos exemplos apresentados neste artigo, tomamos de empréstimo as palavras de Eça de Queiroz: “Achais estas páginas cruéis? Pensais que não nos dói tanto escrevê-las com a vós lê-las?

Em resquícios de tempos logo a seguir ao 25 de Abril, em que foi palavra de ordem ser bastante decifrar a palavra que o aluno pretendia escrever, a questão de fundo reside também, agora, no facto de numa das partes das Provas de Aferição de Língua Portuguesa, do 4.º e 6.º anos do ensino básico, serem permitidos erros ortográficos e noutra não, medida defendida por hodiernos ideólogos do ensino que parecem conviver bem com a teoria, como lemos algures, “que os erros de português são uma questão de respeito pelas ‘diferenssas’”. Este “statu quo” quase obrigará o professor corrector a ter a seu lado uma espécie de dicionário que o ajude a deslindar o possível significado de certas palavras deixadas no papel “de pena ao vento”!

Com esta novidade, os professores formados pelas antigas Escolas do Magistério Primário, esforçados cabouqueiros de um ensino sem erros de ortografia, podem estar a contribuir para que as crianças a seu cargo, no que respeita à interpretação dos textos literários, sejam postas em plano de igualdade relativamente aquelas que dão erros de palmatória num verdadeiro atentado à Gramática, através de uma refinada forma do “eduquês” que toca as raias do cúmulo!

Por essas e por outras é que há professores, mesmo do ensino secundário, que se dirigem, por escrito, ao conselho executivo das suas escolas: “Senhor presidente do ‘Concelho’ Executivo”. Que importa: percebe-se, não se percebe? Outro caso verídico a cargo dum desses professores que escreveu estava a “chuver”, em vez de estava a chover. Até tem uma certa lógica: chuva escreve-se com “u”, porque não escrever chover com “u”? Um outro professor escrevia, por costume, “há-des”! E o que pensar de um aluno da Faculdade de Letras de Lisboa que ao lhe ser perguntado (“Jornal da TVI”, 29.Jan.2003) a grafia da palavra “assessoria” respondeu ser com dois esses e um cê cedilhado? Existem, até, textos emanados do próprio ministério da Educação que estão longe de primar por uma ortografia que devia honrar a sua origem. A (des)propósito, um aluno que faça uma determinada interpretação de um texto literário com um chorrilho de erros ortográficos e um outro que faça uma interpretação de igual valor sem nenhum erro, deverão ter ambos a mesma classificação?

Em nome de uma juventude sem a muleta de correctores de texto em prosa manuscrita, dizemos em parceria com Ramalho Ortigão: “Isto assim pode ser que seja útil, fácil, vantajoso; pode ser que assim se conquiste a opinião das maiorias boçais!” Bem sabemos, por outro lado, que a época é outra, mas nada justifica que em nome de uma discutível metodologia se atire para o cesto dos papéis a escrita correcta das palavras. Assim, fazer vista grossa ao facto dos alunos, cuja idade ronda os dez anos, cometerem erros ortográficos em Provas de Aferição de Língua Portuguesa, sem qualquer penalização, é ser-se conivente de uma situação que lhes poderá continuar a fazer companhia no estado adulto.

E se, para Fernando Pessoa, “a minha Pátria é a Língua Portuguesa”, o nosso orgulho nacional, numa extensa comunidade que no futuro se poderá estender do Atlântico aos Urais, deve encontrar acolhimento num português bem escrito e bem falado!

9 comentários:

Anónimo disse...

Que significará a inexistência de comentários a este lúcido texto ?

Quererá dizer que cá vamos, cantando e rindo a caminho de falar um outro castrapo, a exemplo d que sucedeu com os irmãos galegos, que não tarda será a língua corrente, dominante, logo correcta, em todo o Portugal ?


Ai, Portugal, Portugal... Por esta via, ainda hás-de voltar a uma espécie de Condado, e sem dares por ela !

António Viriato( http://alma_lusiada.blogspot.pt)

António Viriato disse...

Complemento o que disse acima, agora num registo mais sério :

Uma das razões por que gosto da Matemática e da Ciência, em geral, é justamente pela exigência do respeito por regras, mesmo que se pretenda subvertê-las mais tarde. Rigor no estudo, no raciocínio, para se poder aprender alguma coisa de válido.

Na Língua, apesar de não haver igual exigência, pela diferente natureza desta disciplina do saber, há igualmente a necessidade de respeitar a sua índole, a sua gramática, o seu «código genético» e só quem isto dominar, com certa desenvoltura, pode, um dia, ousar subvertê-la.

Anónimo disse...

É claro que lamento a forma como hoje se escreve a língua portuguesa (felizmente, não aqui). Com erros gramaticais crassos. Frases sem ponta por onde se lhes pegue. Sintaxe abstrusa. Estilo inóspito. Mas também lamento as muitas aspas e eufemismos que por aí circulam, se desviam rodopiantemente do essencial, se pavoneiam. E sobretudo lamento os silêncios. O hábito, instituído pela internet e pela aceleração, de não responder, de olhar para o lado. A ortografia é só uma parte duma questão bem mais vasta! Importante, sem dúvida, mas também assunto mais político do que normalmente se julga. Que o digam os galegos. Por exemplo.
Adelaide Chichorro Ferreira

Anónimo disse...

Quantas vezes me apeteceu, ao receber na escola circulares e outros documentos do Ministério da Educação, devolvê-los à proveniência depois de assinalar a vermelho os erros de ortografia, sintaxe e estilo! Poder cortar a verborreia, a redundância, a imprecisão de linguagem, o jargão, os modismos!
O que é que acham que me acontecia?

Anónimo disse...

Sinceramente, acho que se devia organizar uma tertúlia ou oficina para isso. Num sítio agradável, de preferência. À beira-rio, para os resíduos textuais fluirem para o mar...
Mas não apenas com textos do Ministério da Educação. Estou em crer que, com alguma arte, uma tal actividade poderia até ser divertida, e bem mais útil que o sudoku.
Em jargão jornalístico chamam a isso «barbear um texto», e creio que os cientistas (os de Ciências, e não tanto os de Letras) têm alguns dotes a não escamotear por pessoas como eu, que sou de Letras.
Adelaide Chichorro Ferreira

Anónimo disse...

Claro!!!

Anónimo disse...

hello you are ok?

Anónimo disse...

eu queria ver as provas de aferição

Anónimo disse...

Hello

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