quinta-feira, 1 de novembro de 2012

Não será por acaso

Em véspera de feriado, tentando pôr-me a par da realidade, passei por alguns canais de televisão. Comecei pelos especializados em informação, onde as mais variadas vozes, da esquerda à direita, alinhadas e dissidentes, convergiam em afirmar que o estado da economia deste e doutros países não tem solução, é um castelo de cartas que se abate a cada dia, hora, minuto que passa. A miséria misturada com a falta de esperança expandem-se como uma mancha de tinta que engrandece, as populações vão para as rua e gritam. Num debate, dois convidados notavam que nas discussões políticas as pessoas (as pessoas mesmo) não constam nem contam, desapareceram.

Esta nota pode alargar-se ao reality show, que estava no canal que visitei de seguida, pessoas numa montra, a que o mundo tem acesso, a comportarem-se como não-pessoas. E o mundo com o nariz em frente duma televisão ou dum computador a assistir, deliciado, às transgressões do estado humano. Avanço para um telejornal onde se continua a dar cobertura ao caso dum certo jovem que, por tanto querer entrar nesse programa que exige um segredo escabroso de cada concorrente, denunciou a uma jornalista o seu próprio pai por crimes horríveis, que terá ou não cometido. À saída do julgamento, o jovem disse que tudo não passou duma brincadeira combinada com o pai...

O nonsense fez-me avançar e cheguei à RTP Memória, percebi que estava no ar um longo programa de homenagem a Mário Viegas: entrevistas antigas e actuais a quem o conheceu, filmezinhos e filmes que fez e em que entrou, o teatro... o seu mais-que-amado teatro. E (não podia faltar) a poesia. Foi passado o último episódio de Palavras Ditas que revi com o sentimento de, tal como Mário Viegas, já não estar neste mundo.

Ainda carreguei noutro botão do comando e fui dar a uma entrevista sobro o futuro da RTP: irá no arrasto deste sistema, disse o convidado e explicou porquê. Não é de admirar num ambiente (político? económico? ideológico?) onde o sentido de Pessoa se desvanece e a memória de cada uma também. É bem provável que no próximo dia 1 de Novembro, dia de lembrar quem já partiu, não seja possível fazer nada parecido com esse programa da RTP Memória.

Não será por acaso que este dia de feriado passará a vulgar.

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CARTA A UM JOVEM DECENTE

Face ao que diz ser a «normalização da indecência», a jornalista Mafalda Anjos publicou um livro com o título: Carta a um jovem decente .  N...