domingo, 25 de outubro de 2009

Pastas e pacotes - 1

A ideia tradicional de manual escolar é a de um livro com conteúdos disciplinares, pensado e organizado de modo pedagógico-didáctico para que os alunos acompanhem as aulas e estudem autonomamente.

Porém, esta ideia aplica-se cada vez menos aos manuais escolares que se publicam entre nós, pois a cada “área curricular disciplinar” (expressão incontornável na nova terminologia do sistema educativo) não corresponde apenas um livro: são vários os documentos destinados aos alunos que as editoras acomodam numa pasta ou num pacote.

As pastas são coloridas, têm nomes apelativos e, em geral, não cabem nas mochilas de tamanho compatível com a robustez dos alunos mais pequenos; os pacotes são de plástico transparente, não tão atractivos à vista, mas ocupando menos espaço.

Vejamos o que contêm:

Detenho-me nas pastas de Língua Portuguesa e de Matemática para o 1.º ano do 1.º ciclo do Ensino Básico, publicado por uma certa editora. Cada pasta contém quatro documentos: o livro principal, o livro de fichas de trabalho, o livro de fichas de avaliação, um pequeno caderno de palavras/números (na capa esclarece-se que é “oferta aos alunos"). Para a Matemática há, ainda, folhas soltas com autocolantes, figuras geométricas para recortar e montar, etc. Falta, ainda, a pasta de Estudo do Meio… No total são entre dez a doze documentos nas mãos de uma criança que entra na escola.

Detenho-me, se seguida, no pacote de Língua Portuguesa para o 1.º ano do 2.º ciclo do Ensino Básico, publicado por outra editora: é composto pelo livro principal, um caderno de actividades, uma minigramática, um caderno de sinónimos e um CD. Não mudando de ano de escolaridade, passo para o pacote de Matemática de uma terceira editora: três volumes compõem o livro principal a que se acrescenta o caderno de actividades. Não encontro o CD, mas vejo referência a um sítio na Internet “que contém um conjunto de materiais auxiliares”. Faltam os pacotes para todas as outras “áreas curriculares disciplinares”, que, como o leitor sabe, são muitas. Como se percebe, neste ciclo o número de documentos vai muito além da dúzia.

Poderia passar para o terceiro ciclo, para um qualquer ano lectivo ou “área curricular disciplinar” não referidas neste texto, poderia contabilizar com mais pormenor os documentos produzidos por uma quarta, quinta, ou sexta editora, que o panorama não variava muito do acima descrito.

Assim, deve-se perguntar: esta proliferação de documentos em que se transformaram os manuais escolares é adequada à aprendizagem ou não? Permite aos alunos ter uma visão de conjunto dos conhecimentos que deverão aprender ou contribui para a sua dispersão no estudo ou não?

6 comentários:

Fartinho da Silva disse...

E já reparou na infantilização forçada que se faz aos estudantes? As editoras vendem aquilo que o público quer. Se quem manda lá em casa e na "escola" são os miúdos, as editoras adaptam os seus produtos a estes clientes... é como diz o outro: "temos pena"!

José Batista da Ascenção disse...

Pois. São os famosos "packs". Proponho que os folheiem e vejam a qualidade (gramagem) do papel, a profusão de esquemas (grelhas, mapas de conceitos, diagramas diversos - um filho meu, há anos, tinha mesmo um manual de geografia que propunha em duas páginas pejadas de setinhas a busca de um percurso para se encontrar um adequado modo de vida, o qual terminava com a sugestão de que, percorrida qualquer das vias possíveis sem sucesso, se voltasse ao início!), bem como múltiplas figuras sempre muito coloridas, algumas de página inteira. Sugiro também que olhem a qualidade da escrita e... o preço!

Armando Quintas disse...

quem lucra são as editoras, os professores já não mandam nada, velhos problemas de escolha de manuais se arrastam, como o facto patético que escolas diferentes na mesma direcção regional usarem manuais diferentes para a mesma disciplina.
E qual a ligação do ministério da educação com as editoras? andam a dormir ou andam a receber luvas?
há aqui gato escondido com rabo de fora!
quem são estes técnicos pós modernos que recomendam os livros?
julgo lembrar-me que o governo tinha uma comissão de qualidade para os manuais escolares quem são os seus técnicos? ou afinal a coisa não andou para a frente?

Isto está uma palhaçada, não ajuda em nada as crianças, só dispersa e cria inutilides.

Rosa disse...

E ainda falta contabilizar as "toneladas" de fichas policopiadas que lhes são descarregadas e que eles têm que manter organizadas porque apesar de tantos cadernos, os manuais ou não têm a matéria, ou a têm de forma incompleta ou desajustada do programa - basta ver um grande número de manuais adoptados (em Língua Portuguesa) na altura em que a TLEBS foi implementada e logo retirada. Os manuais continuaram em uso porque é preciso obedecer ao ano de adopção...

P. Orlando Henriques disse...

Talvez eu seja antiquado, mas não vejo nada mais PRÁTICO do que um livrinho único para cada matéria, acessível, bem organizado e com um formato bem “asadinho” (como se diz na minha terra) para ser fácil de transportar.

Não sei se os alunos aprendem mais ou melhor com tantos livros, livrinhos, cadernos de apoio, de fichas, e CD’s, sites na net, etc., porque nunca estudei assim. Eu estudei com um manual para cada disciplina e quando muito um ou outro livro de fichas, o que era raro. Por isso não sei se estes novos e tão diversificados materiais darão melhor resultado ou não.

Talvez daqui por dez ou vinte anos, quando os alunos de hoje chegarem ao secundário e à universidade seja possível descobrirmos. Ou talvez já seja tarde de mais para chorar bilhas de leite derramadas…

Mas, apesar desta minha ignorância, atrevo-me a dizer que me parece que a matéria distribuída por tantos volumes (o livro, as fichas, o CD, o livro de apoio…) só contribui para a dispersão e que é uma maneira de encarecer o material, aumentando os lucros das editoras. E a impressão com que ficamos (talvez seja uma “impressão” superficial; ou então não…) é que os alunos não sabem mais por causa de umas ultra “inovadoras” pastas e cadernos coloridos com CD’s e sites na net.

Enfim, prefiro aquilo a que se pode chamar verdadeiramente um compêndio: um AMIGO com o qual podemos contar, porque sabemos que ali está o essencial daquilo que necessitamos de saber, sem ter que andar com uma biblioteca às costas.

Unknown disse...

Multiplicando os dois ou três livrinhos que acompanham o livro principal pelas várias disciplinas... terá o bom-senso pedido licença sem vencimento "ad eternum"?

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