quarta-feira, 7 de outubro de 2009
COIMBRA: A MUDANÇA NECESSÁRIA
Que Coimbra é uma bela cidade é a conclusão que um visitante não pode deixar de tirar depois de ter visto o espectacular Mosteiro de Santa-Clara-a-Velha, recentemente reaberto, a resplandecente Biblioteca Joanina (está uma exposição de fotografia sobre a Alta da cidade nas Prisões Académicas), a magnífica vista do meio da ponte Pedro e Inês, o surpreendente Museu de Ciência da Universidade, a agradável Mata do Choupal, o elegante Jardim Botânico, o renovado Museu Machado de Castro com o criptopórtico romano, o sofisticado Centro de Artes Visuais no Pátio da Inquisição, os antigos claustros da Igreja de Santa Cruz e da Sé Velha, a escondida Lapa dos Esteios, a esplêndida vista do cimo do Paço das Escolas (de preferência a vista do cimo da velha "Cabra"), o animado foyer do Teatro Gil Vicente e o tranquilo Bar-Galeria Santa Clara, o Parque Verde da Cidade com as suas esplanadas à beira-rio, e um longo etc. que aqui não cabe esmiuçar.
Mas que Coimbra é, ao mesmo tempo, uma feia cidade é a conclusão que o mesmo visitante não pode deixar de extrair depois de ver a horrorosa urbanização das Torres do Mondego, o monstruoso Estádio Municipal, os inóspitos Coimbra Shopping e o Forum, a Penitenciária que faz que sai mas nunca mais sai, os muitos prédios da Alta em ruínas, a Baixa acabrunhada, o abandonado Jardim de Santa Cruz, a inacessível Mata do Jardim Botânico, o estado descuidado das rotundas, o trânsito desregulado, o estacionamento selvagem (veja-se o parque do Hospital), as Escadas Monumentais onduladas, a frontaria azulejada do Carmelo de Santa Teresa, a desaparecida Praça dos Heróis do Ultramar, a inefável Rua Carlos Seixas, o prédio negro do Arnado, a Estação Velha que mais parece um apeadeiro, o Conservatório que não há, o Hospital Pediátrico que já devia haver, os subúrbios degradados, as ruínas do Convento de S. Francisco, o Mosteiro de Santa Clara a Nova a caminhar também para esse estado, e um doloroso etc.
Por mim falo: estou cansado de ver, nos últimos anos, este último etc. do feio a crescer mais do que o outro do belo. Nos últimos oito anos a cidade, na importante parte que cabe à Câmara Municipal, não tem, infelizmente, melhorado. Fui das pessoas que acreditaram que o actual presidente, Carlos Encarnação, seria capaz de concretizar algumas das mudanças que anunciou há oito anos. Apoiei-o na altura. Lembro-me de o ver à porta da Penitenciária, à porta do Mosteiro de Santa-Clara-a-Nova, à porta do Convento de São Francisco, e a outras portas, a dizer que ali se iam abrir portas, para nós não só entrarmos como gostarmos de entrar. Não se abriram e nós não pudemos entrar. Teve o seu tempo - oito anos - para mostrar o que era capaz e o resultado está à vista. Pode ter feito o melhor que conseguiu, merecendo por isso o nosso respeito, mas não conseguiu melhor do que aquilo vemos. Não se pode queixar do governo central, que foi generoso para com a cidade pois muitas das coisas belas que apareceram vieram dele (o Mosteiro de Santa-Clara-a-Velha, o Parque Verde, o Museu da Ciência, e o Museu Machado de Castro). Nem se pode queixar da sua equipa, progressivamente deserdada (um seu ex vice-presidente concorre até contra ele), pois foi ele que, com o seu critério, a escolheu. Nem se pode queixar de falta de ajuda da Universidade, que bem tentou, e por vários meios, aliar-se com a Câmara.
Não falo dos escândalos que têm Coimbra por epicentro: a promiscuidade entre a Câmara e o clube local de futebol, os andares a mais nas Torres do Mondego (não são os andares: está tudo a mais!), o negócio mais do que duvidoso do edifício dos Correios. Não falo porque disso devem os tribunais falar e só é pena que demorem tanto tempo a dizer alguma coisa.
Mas falo da ciência e da sua filha, a tecnologia. Aqui havia e há um potencial enorme. Coimbra deixou, porém, fugir para Cantanhede um parque biotecnológico de categoria internacional. Não conseguiu ainda montar um parque empresarial fundado na moderna ciência e tecnologia, em particular na área da saúde, apesar de haver um Instituto Pedro Nunes, que é dos melhores do mundo a incubar empresas. Não deu aos spin-offs da Universidades, como a Critical Software, as asas com o tamanho necessário para voarem ainda mais alto.
E falo também da cultura. Do ponto de vista da cultura a Câmara foi um desatino quase completo. Foi o desastre da Coimbra Capital da Cultura, que fez acabar com as capitais portuguesas da cultura. Foi o desastre da ausência de candidatura a capital europeia da cultura (nem sequer foi a jogo com Guimarães, perdendo por falta de comparência!). Foi o desastre da falta de visão que se traduziu na ausência de equipamentos decentes, de espectáculos dignos e de público minimamente interessado. Quem quis cultura teve de sair da cidade mais vezes do que gostaria. Enganam-se aqueles que pensam que a responsabilidade da incapacidade cultural de Coimbra, da sua falta de projecção nacional e internacional nesta área, é de um só vereador. A responsabilidade maior pela acção e, sobretudo, pela inacção neste campo assim como noutros é, sobretudo, do Presidente. Eu não acredito que Carlos Encarnação, no seu íntimo, se sinta satisfeito... Não pode estar.
Agora concorre de novo para um terceiro mandato. E concorre com um "slogan" primitivo e lamechas que fala de "amor", isto é, não concorre com qualquer ideia nova. Agradecendo-lhe tudo o que de positivo conseguiu fazer, penso que, agora, é a altura de mudar. É a altura de aparecerem novas ideias para Coimbra. É a altura de surgir uma nova ambição para concretizar essas ideias. É preciso aumentar o etc. do belo e estancar rapidamente o do feio. A democracia tem o grande, o extraordinário mérito de permitir a alternância. O candidato Álvaro Maia Seco solicitou-me que integrasse a sua Comissão de Honra e acedi com todo o gosto porque tenho a esperança de uma Coimbra melhor. Não me interessam aqui os partidos (no Porto eu votaria Rui Rio e em Lisboa votaria António Costa), mas as pessoas, as ideias que são capazes de formular e a esperança que são capazes de fomentar. Confio que Álvaro Maia Seco ponha Coimbra no lugar que a cidade, por muitos e bons motivos, merece. Uma cidade melhor será também um país melhor.
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2 comentários:
Relativamente aos parques empresariais de base tecnológica, uma nota:
O sentimento que o parque tecnológico de categoria internaiconal, o Biocant, "fugiu" de Coimbra, como referido no texto, parece traduzir algo muito típico em terras lusas que é o sentimento de que "Se o vizinho do lado tem algo, eu também tenho que ter!".
A falta de cultura de partilha também é particularmente evidente no meio científico e foi até recentemente acarinhada pelo programa de reequipamento científico nacional que tornou Portugal num dos países com maior número de microscópios confocais per capita, mas sem deles tirar um rendimento proprocional. No caso dos parques empresariais (incluindo aqueles dedicados a empresas de base tecnológica) passa-se o mesmo. Passe o exagero, cada concelho quer o seu, gerando uma dispersão de recursos criminosa.
O Biocant nasceu fruto da colaboração louvável entre as universidades de Coimbra e Aveiro. Contra ventos e marés e graças ao esforço continuado dos seus promotores tem crescido e é claramente um caso de sucesso nacional. No entanto, e apesar de ter todos os ingredientes indispensáveis, ainda nem está a meio do percurso de se tornar uma estrutura de referência internacional. Precisa para tal de continuar a ganhar massa crítica, atraindo os melhores projectos, não da região, mas do país, como parque especializado que é. Tal no entanto será muito difícil se for fomentada a proliferação de parques e a dispersão de recursos a nível regional e nacional, desinvestindo cedo demais em projectos que estão a começar a mostrar todo o seu potencial e alocando por vezes recursos a outros projectos cuja necessidade, escala e viabilidade está por provar.
Como foram os resultados em Coimbra? O que é que o povo decidiu?
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