quarta-feira, 28 de outubro de 2009
O MARXISMO SEGUNDO ONÉSIMO
Excerto do último livro do filósofo e escritor Onésimo Teotónio Almeida, "De Marx a Darwin. A Desconfiança das Ideologias", publicado há pouco na Gradiva:
"O marxismo aparece deste modo - Karl Popper apontou-o muito bem - como sistema metafísico não-falsificável, com todos os atributos de uma religião que opera enraizada numa fé não assente em princípios empíricos nem jamais sujeita à obrigação de demonstrações racionais dos seus axiomas de base. Esse sistema metafísico aliás - e não me parece de modo nenhum absurdo aventá-lo - seria assim uma espécie de versão secular da história bíblica judaico-cristã. O paraíso terreal existiu de facto e o ser humano era bom, mas o capitalismo foi, infelizmente, o pecado original que lançou a humanidade na senda de uma história de lutas de classes. No entanto, Marx vai ser o profeta da recuperação do estado original de graça. Fundando a sua Igreja e rodeando-se dos seus apóstolos, vai fazê-los militar na luta pela segunda vinda dessa ordem natural onde de novo reinará o bom selvagem. A felicidade, porém, não acontecerá no outro mundo, mas sim neste, e inevitavelmente virá.
Acredito que haja nesta síntese algo de exageradamente redutor, todavia insisto na paridade lógica das duas metafísicas - a marxista e a cristã. O carácter dogmático da sua doutrina é apenas uma faceta adicional a intensificar a legitimidade desse paralelo."
Onésimo Teotónio de Almeida
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24 comentários:
Interessante, mas não uma novidade. "Black Mass", do filósofo britânico John Gray, já abordava e explorava essa ligação.
Que eu saiba, a primeira referência à concepção marxista da sociedade sem classes como visão secularizada da segunda vinda anunciada na Bíblia sugiu na década de vinte. Na minha tese de doutoramento (The Concept of Ideology- A critical analysis,1980) e em escritos posteriores sobre a ideologia em Marx tenho aflorado essa temática, que ensino num curso desde 1981. Não procurei ser original, apenas expressei algo que fui aprofundando ao longo dos anos e sobre que venho ensinando em aulas e escrevendo muito antes do aparecimento de Black Mass, de John Gray, que surgiu em 2007.
Onésimo
Ó Ónesimo,
Então a luta de classes começou com o capitalismo? Em que estória aos quadradinhos é que aprendestes essa?
E onde foi que eu disse isso?
onésimo
Ainda sobre o primeiro comentário, fui consultar o meu exemplar de "Black Mass", de John Gray, que tenho profusamente anotado (escrevi já sobre John Gray noutros lugares) e só encontrei a este respeito umas referências a Karl Popper, sem nada mais a ver com o que digo nesses dois parágrafos amavelmente transcritos neste blogue (ver págs. 72 a 75).
onésimo
É curiosa esta abordagem que Carlos Fiolhais nos dá hoje porque, depois dos pós levantados pelas batidas de Saramago na Bíblia, temos agora a referência de outra bíblia, "O Capital", considerada, na opinião de Engels, a "Bíblia do Movimento Operário Internacional".
A versão que aqui nos é dada por Karl Popper sobre Karl Marx coincide com o que o historiador britânico Arnold Toynbee já tinha observado na sua "A study of History" (London, 1960), quando refere que Marx teria transportado ou transferido para "O Capital" o problema judaico substituindo Deus pela "necessidade histórica", o Povo Eleito representaria o proletariado, e o reino de Deus seria a ditadura do proletariado.
Na chamada de atenção (avertissement) ao "Le Capital. Livre 1", Althusser considera que a obra de Marx representava o terceiro pilar a que designou de "Continente-História", depois dos: "Continente-Matemática" dos gregos (séc. V), e "Continente-Física" de Galileu.
Isto para explicar a substituição de Deus pela "necessidade histórica" (Continente-História).
Onésimo disse..
"E onde foi que eu disse isso?"
Aristes diz..
Sendo o isso "a luta de classes começou com o capitalismo", acho que foi no livro citado no post, aqui:
"o capitalismo foi, infelizmente, o pecado original que lançou a humanidade na senda de uma história de lutas de classes".
Ou será que também vou precisar dum teólogo, ou dum exegeta do Onésimo, para ler um post do DRN?
E desde quando é que aquilo que Marx diz é o que eu digo?
Onésimo
Apenas comentei com base na ideia geral que fiquei da leitura do "Black Mass". Não pretendia diminuir ou atacar o livro aqui referido, o que seria ridículo, porque não sou especialista na área e não o li. Se foi isso que resultou das minhas palavras, que reconheço poderem ser equívocas, lamento.
Não sendo eu filósofo nem conhecendo John Gray, esta caracterização do marxismo como uma versão secular do cristianismo é algo que penso há muito. E não só eu: Pacheco Pereira, que partilha comigo uma experiência de juventude marxismo-leninista particularmente dogmática (pré-25 de Abril), pensa o mesmo, por exemplo. Trata-se de uma convicção que vem da experiência vivida e da posterior reflexão sobre ela.
Aliás, esta ideia foi-me recentemente reavivada pelas posições de Saramago contra a Bíblia e por uma curiosa nota de Frei Tolentino: a de que se tratava da manifestação de um complexo de Édipo - o que penso acertar em cheio! Na medida em que o marxismo é filho do judaico-cristianismo e não tem do Homem, diga-se de passagem, uma visão melhor que a da Bíblia, ao considerar que tudo resulta de egoístas motivações económicas e que em nome delas o Homem tem praticado as maiores barbaridades contra o seu semelhante...
Mas, às observações feitas por Onésimo, um pensador cujas crónicas leio há décadas, faria algumas correcções técnicas de promenor:
1 - Não é o capitalismo que é o pecado original na visão marxista, mas sim a PROPRIEDADE PRIVADA (dos meios de produção). O capitalismo é só a forma final de organização social baseada na propriedade privada, tendo sido antecedida pelo esclavagismo e pelo feudalismo.
2 - (Ao João boaventura): o paraíso não será, na visão marxista, a ditadura do proletariado, mas sim a sociedade comunista. A ditadura do proletariado será apenas o caminho para lá chegar, um pouco como a viagem difícil e atribulada do povo eleito pelo deserto rumo à Terra Prometida. E, nesta comparação, Lenine será o Moisés do marxismo...
Só umas breves linhas a agradecer a intervenção de Pinto de Sá - que não conheço - pelo tom e classe dela. Evito diálogos nos blogues porque, sendo alguém que gosta a sério de humor, acho que os bons e estimulantes diálogos dependem muito do tom em que são conduzidos.
A Carlos Azevedo apenas acrescento que a minha intenção foi apenas dar sinal de que eu não estava a procurar ser original ao fazer esse breve retrato do marxismo que decidi incluir no meu livro (é de longe capítulo mais curto) apenas para os leitores mais jovens não familiarizados com Marx poderem entender melhor o que eu pretendia acentuar em termos de diferenças entre essa visão do mundo e a darwinista.
AO Pinto de Sá
Agradeço a correcção-interpretação que colhi de Toynbee mas que no fundo, como bem esclarece, uma é a via para chegar à outra.
Sobre a "caracterização do marxismo como uma caracterização secular do cristianismo" traz à minha memória as reuniões, em Lourenço Marques, nos anos 60-70, como participante da "Juventude Católica Universitária", com meia dúzia de elementos para fazer leituras e interpretações d'O Capital de Marx.
Eram reuniões, 1 por semana, com sede alternada e aleatória, na casa de um, cobertas pelo secretismo.
Do que a minha memória reteve era ponto assente que a versão marxiana representava a doutrina cristã.
Caros,
Concordo com a frase "Acredito que haja nesta síntese algo de exageradamente redutor".
Não ponho em causa a facto de o marxismo assentar em pressupostos que se inspiram, fundamentalmente, em crenças e valores caracteristicos do critianismo (igualitarismo, universalismo, concepção "historicista" da realidade, com o que isto implica de cedência ao messianismo, etc.).
Também não me parece discutivel que existe uma contradicção insanavel entre a pretensão "cientifica" do marxismo e a obvia impossibilidade de justificar "cientificamente" os pressupostos acima mencionados.
Por mais que o procure negar, o marxismo assenta numa moral e, talvez também, numa metafisica.
Mas não vejo nenhum mérito no paralelo, abusivo em meu entender, com uma pretensa "metafisica" cristã. Tenho alias as mais sérias duvidas acerca da existência de uma metafisica "cristã". Ha cristãos de todas as espécies e feitios. Ha cristãos materialistas. Existem, até, cristãos marxistas.
Acho abusivo (e redutor) estarmos a por as duas coisas no mesmo pé : um sistema filosofico, uma religião. São duas coisas distintas.
Embora não sejam, muito longe disso, duas coisas sem quaisquer relações entre si.
E embora possa haver, e em minha opinião haja, algo de comum entre o marxismo e o cristianismo, na forma como encaram (implicitamente) a relação entre religião e filosofia...
Em relação ao comentário de José Viegas, direi que a comparação pretende acentuar o elemento de fé que também existe no marxismo. Toda a comparação falha - avisavam os clássicos - e por isso há que ater-nos apenas ao elemento que se pretende fazer ressaltar ao estabelecer-se uma comparação. E é esse da fé também necessária ao marxismo, precisamente para acentuar que as supostas bases científicas em que ele assenta têm menos fundamentação empírica do que Marx supunha, pois exigem uma boa dose de crença, ou fé.
É esse o elemento principal da comparação.
Onésimo
Prezado Onésimo,
(O meu nome é João e não José)
Não estou a criticar o paralelo naquilo que ele tem de positivo : por em relevo a falacia existente na filosofia marxista quando pretende ser uma visão do mundo inteiramente derivada da "ciência". De resto, convenhamos que esta critica não é apenas aplicavel à filosofia marxista. Aplica-se também a muitas outras filosofias.
Mas de cada vez que leio esse tipo de comparações, fico a pensar que o pensamento subjacente não é levado às suas ultimas consequências.
Porque é que se entende, geralmente, que apontar que uma filosofia radica numa "crença", ou num conjunto de "crenças" (prefiro de longe o termo "crença" ao termo "fé", que me parece designar outra coisa), é uma forma de disqualificação ? Na maioria dos casos, e certamente no caso da filosofia marxista, porque existe uma contradição, ou seja porque a filosofia em causa afirma ela propria, de acordo com os seus principios internos, que não assenta em "crenças" mas em "conhecimentos objectivos" ou "racionais". Ou seja porque a filosofia assenta no pressuposto de que existe uma separação nitida entre "crenças" e "conhecimentos racionais".
Mas isto nunca é justificado. Nem sequer nas filosofias analiticas que tanto são prezadas neste blogue.
Ora, quanto a mim, não é nada obvio que a dita separação seja assim tão estanque. Julgo até que se pode defender o contrario : a razão não é separada da crença, é apenas uma forma particular de organizar crenças entre si e de nos situarmos em relação a elas. Alias, a propria convicção segundo a qual a razão permite uma melhor apreensão da realidade assenta, ela também, numa crença...
A razão não é mais do que a procura (salutar, obviamente, e desejavel) de atingir o patamar comum a partir do qual é possivel compreender, e se necessario modificar, as crenças dos outros.
Ora, vista sob esse prisma, a critica dirigida ao marxismo pode, de facto, dirigir-se a qualquer outra filosofia. Qualquer filosofia tem de assentar em "crenças", pelo menos enquanto procura alcançar uma vida boa, que é o que define a filosofia.
O que pode ser contraditorio no marxismo (e noutras filosofias) é não assumir claramente esse facto. Mas sera coerente uma critica que, partindo do pressuposto de que existe a tal separação estanque entre crenças e convicções racionais, acaba por incorrer no mesmo erro ?
Primeiro do que tudo queria pedir desculpa de ter trocado João por José. Não me leve a mal. Estou tão habituado a tanta variação do meu nome (ainda hoje recebi uma carta endereçada a "Onsidon Alamade") que se calhar por isso às vezes descuido-me em matéria de nomes.
Claro que o que eu disse não se aplica apenas ao marxismo. Mas naquele caso era o marxismo que estava em causa.
Acho que parte do problema nesta conversa reside no facto de o João Viegas ter lido apenas os dois parágrafos transcritos neste blogue. Espero bem que tanto o que escrevi no meu livrito como o que tenho escrito noutros lugares ajude a tornar-me mais claro.
Onésimo disse:
"E desde quando é que aquilo que Marx diz é o que eu digo?"
Aristes pergunta...
Então foi o Marx que disse?
"o capitalismo foi, infelizmente, o pecado original que lançou a humanidade na senda de uma história de lutas de classes".
Ou trata-se de uma análise original de Onésimo? Ou algo que Onésimo foi beber a outra fonte?
Repito a minha manifestação de consideração de décadas por Onésimo, que também não conheço pessoalmente, e acrescentar-lhe-ia, em resposta a João Viegas:
Como disse Onésimo, o que há de comum entre o cristianismo e o marxismo é a fé messiânica. O facto de o marxismo ter subjacente uma filosofia é outra coisa, mas a que se pode retorquir que também o cristianismo tem uma teologia. Pode-se conhecer perfeitamente a teologia cristã, ou a filosofia marxista, e não ter fé - isto é, não acreditar nelas como sentido de vida.
Existe no entanto uma diferença essencial entre a perspectiva marxista e a cristã: é que para o marxismo, o pecado (e a salvação) não são questões individuais mas sim do homem integrado na sua classe social, ou seja, do homem dissolvido no colectivo. E, por isso, aliás tal como no nazismo, o indivíduo é, no marxismo, perfeitamente sacrificável à causa (messiânica). E a prática histórica do marxismo foi sempre a comprovação desta perspectiva, a de que o indivíduo está para a causa (representada na Igreja-Partido) tal como zero está para o infinito (na linha do romance de Koestler).
Ao Boaventura:
A ditadura do proletariado será a via para chegar ao comunismo, tal como os 40 anos de êxodo pelo deserto foram o caminho para chegar à Terra Prometida, mas não são a mesma coisa!
E, enquanto o "povo eleito" efectivamente alcançou Israel, os comunistas nunca conseguiram sair do deserto, onde soçobraram... talvez à própria natureza humana que negavam que existisse.
Prezados Onésimo e Pinto de Sa,
Concordo no essencial com o que vocês dizem, mas a minha duvida não é exactamente essa.
Eu não diria que o cristanismo assenta numa teologia, nem que o marxismo assenta numa filosofia. Diria até o contrario : a(s) teologia(s) cristã(s) assenta(m) essencialmente numa crença, da mesma forma que a filosofia marxista assenta numa crença.
A critica articulada no excerto de Onésimo (de facto não li o livro, mas não deixarei de comprar e de ler da proxima vez que for a Portugal) tem o mérito de pôr em evidência que o marxismo, ao mesmo tempo que critica a religião por assentar em "crenças", contrapostas a "conhecimentos racionais", é perfeitamente incapaz de reconhecer que a sua propria filosofia assenta, também ela, em crenças. E o totalitarismo é, numa certa medida, uma consequência disso mesmo, ou seja da sua recusa de pôr em causa a sua apreensão da realidade pretensamente "cientifica" e objectiva, que ele se julga com legitimidade para impor como unica realidade aceitavel, ou como unica realização meritoria.
Porém, se concedermos que, no fundo, qualquer filosofia assenta, também ela, em crenças, em que medida a critica de Onésimo pode ser considerada uma critica procedente ?
O que eu quero dizer com isso é que existe um vicio de raciocinio ao utilizar, para criticar o marxismo, o postulado interno da teoria marxista que, no fundo, esta na origem dos seus principais erros e dos seus excessos. (Não nego que seja legitimo proceder desta forma na medida em que a incoerência do marxismo com os seus proprios postulados internos é uma contradição, e portanto que deita por terra a sua construção logica, mas isso não chega...).
E, neste particular, digo também que o paralelo com o cristianismo é demasiado vago, porque o "cristianismo" abarca realidades filosoficas (ou teologicas) muito diversas. E' certo que o marxismo incorre no erro de muitos avatares do cristiansimo (as diversas formas de "fanatismo" cristão), e também é certo que ele se pode filiar directamente nalgumas correntes cristãs radicais (existe uma polémica em torno da propriedade dentro do cristianismo, existem movimentos comunistas de obediência cristã, e surgiram alias muito antes de Marx). Mas não me parece rigoroso reduzir o cristiansmo a esses avatares, nem sequer alias a uma unica filosofia.
Declaração de interesses : não sou cristão (sou ateu) ; não sou marxista (mas li Marx, julgo que com proveito, como alias muitas partes da biblia e obras significativas de teologia cristã).
Caro João Viegas:
Esta conversa a três está a ser muito interessante, mas não sei se a deveríamos fazer aqui. Corro o perigo de me repetir e queria evitar ser fastidioso, mas esse meu livro pretende identificar valores de fundo (mundividências com a sua componente ética) em sistemas como o marxista e o neo-darwinista quando assumido como base de uma nova visão do mundo, e a partir daí levantar questões de fundo apontando para o seu carácter não-propriamente científico, o que não implica que não sendo "científicos" esses valores deixem de ser reais.
Daí que me sinta algo constrangido nesta conversa que está a despoletar uma imensidão de questões interessantíssimas mas a afastar-se do que pretendi com o livro. Se me enviar um endereço postal, terei gosto em oferecer-lhe o livro (o meu e-mail particular é público onesimo_almeida@brown.edu).
De qualquer modo registo o carácter cordato dela, algo não muito comum em blogues. Ao Pinto de Sá, o meu obrigado pelas palavras simpáticas sobre as crónicas. A oferta do livro serve também para si.
Já há uns dias que não vinha ver como estava a conversa, e compreendo o incómodo de Onésimo. Claro que terei muito prazer em me "fazer" ao seu livro... :-)
Mas não resisto a notar ao João Viegas que, se o cristianismo tem muitas teologias, o marxismo também as tem. Vão (iam) do estalinismo ao trotskismo, passando pelo guevarismo, o maoísmo, e todos os comunismos "de rosto humano" que apareceram a partir de Krutchef.
Aliás, sempre achei que existia um grande paralelismo entre o trotskismo e o protestantismo, na atitude de recusa do papado e na insistência na leitura própria da Bíblia, e que o maoísmo se assemelhava também a uma deriva fundamentalista, similar a certas correntes reformistas...
Sei que este post é do passado, mas deparando-me com ele não posso deixar de manifestar a minha sincera desilusão com o que aqui é dito. Antes de mais, citar Karl Popper como uma autoridade para comentar o pensamento de Marx é, se não inapropriado, no mínimo uma ofensa ao próprio Marx. Karl Popper é dos filósofos (se é que se lhe pode chamar isso) mais pobres que já tive oportunidade de conhecer. Escreve um livro chamado The Poverty of Historicism onde apresenta uma interpretação do historicismo que é, simplesmente, o oposto radical do que esta tendência filosófica possa significar. Althusser é outro comentador que, enquanto co-mentador e este em especial medida, sempre acrescenta uns pontos à mensagem de Marx. Em segundo lugar, quem encontra qualquer moralismo na filosofia de Marx apenas pode estar certo de uma coisa: não percebeu o que leu. Em terceiro lugar, Marx não demoniza o capitalismo, encontra apenas o seu lugar na história do desenvolvimento das forças económicas e, por outro lado, sublinha a necessidade de se superar esta fase económica na medida em que as contradições que encerra desenvolvimento real são mais destrutivas do que benéficas para a as sociedades humanas (e creio que nos últimos anos isso é mais evidente do que nunca, portanto quem acha que não há provas empíricas disso, deve ser porque tem uma boa vida, que milhões no mundo não têm). O "movimento comunista", que para Marx é muito mais do que uma tendência política na cabeça de este ou aquilo iluminado bem-feitor, é um movimento histórico real, nascido dentro do próprio capitalismo, e revolucionário porque visa a superação deste modo de produção - que não é exclusivamente "operário", nem o proletariado é um conceito que vise somente os "operários" mas sim todo o tipo de assalariados, visto ser o assalariamento uma condição sem a qual o capitalismo em si não existiria. Em quarto lugar, não percebo qual é a "metafísica" em Marx e, principalmente, quem afirma que não há provas empíricas para suportar a leitura do desenvolvimento económico marxiana ou é cego ou então não quer ler.
Fico especialmente desiludida quando tudo isto começa com um post de um doutorado em Filosofia.
Para tirarem dúvidas, aconselho-vos a leitura do primeiro volume de A Ideologia Alemã, de Marx e Engels, creio que muitas das suposições que aqui se fazem serão desfeitas aos olhos de quem realmente quer e sabe ler. Está disponível, assim como muitas obras de Marx, em www.marxists.org
Deixo aqui apenas uma citação da dita obra:
«O comunismo não é para nós um estado de coisas que deva ser estabelecido, um ideal pelo qual a realidade [terá] de se regular. Chamamos comunismo ao movimento real que supera o actual estado de coisas. As condições deste movimento resultam da premissa actualmente existente.»
E, finalmente, do Manifesto Comunista: «As proposições teóricas dos comunistas não repousam de modo nenhum em ideias, em princípios que foram inventados ou descobertos por este ou aquele melhorador do mundo.
São apenas expressões gerais de relações efectivas de uma luta de classes que existe, de um movimento histórico que se processa diante dos nossos olhos.»
Cumprimentos
Com toda a venia, gostaria de sugerir um escrito que me parece interessante a respeito de alguns pensadores, inclusive de Marx e sua ideologia: "Os Intelectuais" de Paul Johnson. Ed. Imago - Brasil, 1990 ou no original "Intellectuals" , Ed. George Weidenfeld and Nicolson Limited.,UK, 1988 No capítulo 3, fala de um Marx muito diferente desse "Marx acadêmico", mostrando em cima do que foi construído as suas "utopias".
Atenciosamente,
Cumprimentos.
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