Texto de João Boavida antes publicado no diário As Beiras :
A ideia foi tirada de um texto de Carlos Fiolhais sobre o destino da Penitenciária de Coimbra quando um dia deixar de o ser. Esperemos que em breve. Disse ele no “blog” De Rerum Natura:
«Se há uma área em que Coimbra tem mais valias muito fortes, a nível nacional e internacional, é a área dos livros e dos documentos, das bibliotecas e dos arquivos. Basta pensar na Biblioteca Joanina, uma das mais belas do mundo, repleta com cerca de cem mil livros antigos. O total de volumes das cerca de 80 bibliotecas da Universidade de Coimbra é de mais de dois milhões, com cerca de metade localizados na Biblioteca Geral, um vasto e rico património que é uma verdadeira reserva cultural da nação».
Mas há mais: a Biblioteca Municipal, com os seus seiscentos mil volumes, a Casa da Cultura, os Arquivos Municipal e Distrital, sem esquecer as raridades bibliográficas, acumulam em Coimbra três milhões de livros. Em bibliotecas institucionais, porque se pensarmos nas muitas centenas de milhares que há nas bibliotecas particulares da cidade, é caso para falar de facto em cidade do conhecimento impresso.
Coimbra terá que acarinhar este património bibliográfico excepcional, conservá-lo, enriquecê-lo e promovê-lo. Devemos actuar em termos práticos, culturais e promocionais. Primeiro: é preciso encontrar sempre espaço condigno para estes livros, e para os que vêm, e onde eles estejam acessíveis e convidativos. Segundo: este património tem que ser cada vez mais posto ao serviço das pessoas, mediante dinamizações culturais contínuas, que precisam de espaço, condições, gente preparada e programas de acção. Finalmente, é um factor de valorização da Universidade e da cidade, a merecer toda a atenção, devendo funcionar como promoção nacional e internacional de Coimbra e do País.
Há pois acções arquitectónicas a empreender para se poder avançar com as da cultura. Diz Fiolhais:
«A Biblioteca Joanina da Universidade está construída sobre uma prisão de origem medieval. Os livros deixaram, porém, a certa altura, de caber na Biblioteca Joanina, e construiu-se o "novo" edifício da Biblioteca Geral, que já tem mais de 50 anos. Esta Biblioteca foi construída sobre a antiga Faculdade de Letras, que por sua vez se ergueu sobre o Teatro Académico e este sobre o Colégio de S. Paulo Apóstolo. O novo tem sempre de subir para os ombros do velho, como um filho que sobe aos ombros do pai para ver mais longe».
Embora isto sugira uma boa metáfora sobre cultura e conhecimento e seja uma bela imagem da história da cidade de Coimbra e suas idades, basta de bibliotecas umas sobre as outras, como prateleiras sobrecarregadas, de sobrepor construções destruindo sempre o antigo para caber o novo, numa forma de parricídio muito nosso. Que a psicanálise explicará mas que é preciso ultrapassar passando à horizontalidade, à ocupação do espaço pela cultura, sem medo, numa marcação do terreno que em Coimbra tem toda a justificação. Os livros valem e devem fazer-se valer.
E é aqui que surge a Penitenciária com a sua cúpula brilhando ao sol, no futuro transformada em grande biblioteca, formando com as outras uma unidade viva e em rede. Um conjunto incontornável na cidade, para leitores e investigadores, e inesquecível para todos os visitantes. Uma casa dos livros que possa beneficiar do espaço disponível, da proximidade à Universidade e à Casa da Cultura, da centralidade e da companhia da Sereia e do Botânico. De tal modo que, pensando em Coimbra, se pense também em Biblioteca, numa identificação inevitavelmente alexandrínica e borgeana. Em suma, vamos, neste assunto, pensar em grande e ao longe?
Imagem: Biblioteca da Faculdade de Filologia da Universidade Livre de Berlim, projecto do arquitecto Norman Foster
terça-feira, 13 de outubro de 2009
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