Na passada semana, ao ligar a televisão, ouvi a responsável máxima pela Pasta da Educação Pré-Escolar e Ensinos Básico e Secundário dizer uma coisa extraordinária em relação à qualidade do desempenho profissional, em geral, e do desempenho docente, em particular. Tão extraordinária se me afigurou, que pensei ter compreendido mal e resolvi ver a repetição do programa. Confirmei o que antes tinha escutado.
O que a senhora Ministra Maria de Lurdes Rodrigues disse foi mais ou menos o seguinte: a avaliação do desempenho docente enquadra-se na política de avaliação da função pública, e no ensino, tal como nas restantes profissões da função pública, a excelência, como todos sabemos, é rara. Não temos 70 % de pessoas excelentes e 30 % de pessoas normais. O que temos, infelizmente, é o contrário.
Interpretei tal afirmação do seguinte modo: antes de se realizar a avaliação do ensino e de se apurarem os resultados da mesma, a senhora Ministra da Educação já sabe, e lamenta, que tenhamos uma minoria de professores excelentes. Em números redondos: trinta por cento.
Se desse azo ao meu raciocínio perguntaria a mim própria, porque foi legislado um novo Regime de Avaliação do Desempenho do Pessoal Docente (Decreto Regulamentar n.º 2/2008, de 10 de Janeiro)? Porque se reconheceu a necessidade de constituição de um Conselho Científico para a Avaliação dos Professores (Decreto Regulamentar n.º 4/2008, de 5 de Fevereiro)? Porque foram emanados vários instrumentos de avaliação por esse mesmo Conselho? Porque se pede às escolas para se organizarem no sentido de aplicarem o dito Regime e construírem os seus próprios instrumentos? Etc.
Como, possivelmente, não encontraria resposta para estas perguntas, tentei o caminho da compreensão. Assim, se contextualizada, a afirmação em causa nada tem de extraordinário. Explico:
- O processo de avaliação do ensino está a ser implementado antes de se ter actualizado o documento que lhe deve servir de referencial – “Perfis gerais de competência para a docência”, permitindo orientá-lo e operacionalizá-lo. Dispomos do Decreto-Lei n.º 240/2001 de 30 de Agosto, que sendo anterior à publicação do actual Estatuto da Carreira Docente (Decreto-Lei n.º 15/2007 de 19 de Janeiro), mantém com ele incongruências não desprezíveis;
- Ainda que sem dispor de um referencial seguro de desempenho docente, que permitisse estabelecer parâmetros inequívocos, rigorosos e objectivos de avaliação, ao arrepio das regras mais elementares da metodologia científica de construção de instrumentos de observação/avaliação pedagógica, o Ministério da Educação divulgou pelo menos duas versões de fichas/grelhas de auto e hetero observação/avaliação, previstos no artigo 44.º do Estatuto da Carreira Docente. Paralelamente solicitou às escolas que se baseiem nelas, que as completem, que as adaptem?;
- Tudo isto foi feito, mesmo antes de se constituir o tão referido e distintamente designado Conselho Científico para a Avaliação dos Professores, que parece continuar reduzido à sua presidente;
- E, já agora, tudo isto foi feito sem se recorrer a conhecimentos científicos de carácter pedagógico-didáctico sobre o ensino e a avaliação do desempenho docente. Mas, aqui passamos para outra história! Uma velha história, aliás, essa da tutela tomar medidas de relevo negligenciando o que se sabe objectivamente sobre a educação. Não, não é por se usar uma linguagem com chavões próprios desta área que o discurso se torna mais credível.
Ironia à parte, e rematando num registo sério, sublinho que a avaliação do desempenho de professores ou de outros profissionais, ainda que necessária, é uma tarefa difícil, muito sujeita à interferência de factores aleatórios.
Nessa medida, requer, antes de mais, e resumidamente, decisões muito claras e precisas quanto ao que avaliar, baseadas no conhecimento do que é desempenho correcto e na especificidade das funções que, em concreto, os profissionais desempenham.
Requer, de seguida, uma metodologia cuidada, que implica, entre outros aspectos, o estabelecimento de fases bem delimitadas onde se inclui: a construção e validação de instrumentos adequados e a recolha e tratamento de dados.
É esta, e não outra a lógica, que se deve guiar um processo de avaliação do desempenho profissional.
Imagem retirada daqui.
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5 comentários:
excelência | s. f. | loc. adv.
do Lat. excellentia
s. f.,
qualidade do que é excelente;
superioridade de qualidade;
especialidade;
primazia;
tratamento dado às pessoas de alta categoria social e em geral às senhoras.
loc. adv.,
por -: no mais alto grau.
Do Dicionário online da Texto Editores sito em:
http://www.priberam.pt/dlpo/dlpo.aspx
Embora desconhecendo o método usado para determinar a percentagem de excelentes professores acima enunciada, e correndo o risco de ser altamente injusto devido à escassez da amostra, a experiência que tenho dos meus anos de escola diz-me que a Sr.ª Ministra foi um pouco optimista.
Talvez a minha bitola seja diferente da maioria das pessoas, mas se pensarmos um pouco e fizermos um pequeno passeio até aos bancos das escolas que frequentámos, à procura desses Professores, vamos chegar à conclusão que eram, realmente, uma minoria.
E não se pense que não tive excelentes professores. Alguns seriam até do melhor que se pode encontrar, infelizmente foram muito menos de 30% do total...
E o contrário também é verdadeiro. Poucos serão os professores, excelentes ou não, que se podem orgulhar de ter ensinado a 30% de alunos excelentes.
Cara Helena Damião,
Parabéns pelo excelente texto!
Luís Azevedo Rodrigues
30% de Excelentes?
Não!!!
5% a 10% quanto muito será a quota imposta pelo ME.
De qualquer modo, sempre será mais do que a excelência existente na equipa do actual ME.
Se soubesse que empresas privadas consideradas "de ponta" aceitam, no máximo, entre 5% e 10% de desmpenhos excelentes, outro "galo" teria cantado.
Caros,
O problema é outro: nem sequer 30% de programas competentes temos. A experiência diz-me que 90% dos professores fazem o que lhes mandam. Se os mandam ensinar com rigor, vão estudar para casa e ensinam com rigor. Se os mandam ensinar banalidades é isso que fazem.
Portanto, para mexer na educação, há que tocar nos 90% de programas acéfalos.
Rolando A
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