segunda-feira, 28 de outubro de 2019

Novo “Linguarejar” (“Pérolas” do Novo Acordo Ortográfico)

 Carta de um leitor no jornal As Beiras de hoje, contra o Acordo Ortográfico:

Para dar a vitalidade devida a esta resenha, quero partir do princípio de que a língua, na verdadeira acepção da palavra, é a identificação de um povo. É a sua alma que lhe dá essência e que promove a sua união, o elo do seu entendimento e o catalisador e transmissor dos seus usos, costumes e tradições, dentro de uma mesma pátria.

Não estou em desacordo com a evolução linguística, pois esta deve-se à inserção de novos termos, intitulados de neologismos, que são naturalmente captados por osmose, procedentes de outras culturas, de outras gentes. Já não poderei estar em inteira anuência quando são cavacadas ou enxertadas nas palavras alterações na sua estrutura gráfica susceptíveis de mudar parcial ou radicalmente o seu sentido em relação ao que era usual e que a muitos tanto custou a aprender – com recurso, por vezes abusivo, à prestimosa ajuda de uma abnegada e austera “professora“, apelidada de, palmatória.

A “alporquia” confeccionada na nossa língua e escriturada no Novo Acordo Ortográfico, a meu ver, é tida como uma metamorfose que resultou numa evolução no sentido inverso da palavra, “involução”, contribuindo deste modo para fraccionar determinada credibilidade no espírito linguístico, com recurso à coerção de uma injecção de hibridismo no ADN da tradição do nosso povo. A língua.

Posso não entender patavina da língua portuguesa, mas julgo saber o bastante, para proceder à tecelagem da presente crítica, onde a minha revolta, agreste e ironicamente se manifesta. Neste alvalade, que congrega o educacional, e consequentemente o cultural, procuro ser um intransigente puritano.

Afinal, não houve acréscimo de novos vocábulos, porém, uma alteração substancial na estructura dos já existentes, que, em vez promover uma suposta facilidade no leccionamento e no aprendizado, veio gerar uma barafunda tempestuosa, que por sua vez provocou um aluimento nas práticas doutrinais há muitos anos ministradas, para a formação das palavras, que ficaram a boiar em terreno lodacento, perdendo algum vínculo entre si.

Chamo à colação alguns exemplos, que só os “puristas”, obreiros das alterações alusivas ao referido acordo podem justificar, e não eu, um simples e artesanal arranhador do nosso idioma, a quem o moderno “polimento” abastardou o seu parco saber e abanou o seu orgulho, no que concerne à ortografia e fiel interpretação da Língua Portuguesa:

Acto = Ato - (Se te apanho outra vez no acto, ato-te todo!).
Facto = Fato - (Pelo facto de o fato ter sido executado por um bom alfaiate, até assenta bem!).
Pára = Para - (Pára aí! Para onde vais?!)
Pêlo = Pelo - (Olha que eu passo-te a mão pelo pêlo!).
Espectador = Espetador (Sou um espectador condoído, pelo triste e sádico espectáculo que está a ofertar o espetador, ao espetar o animal).
Pacto = Pato - (Arroz de pacto, nunca provei; mas de pato, até é muito bom.
Falámos = Falamos - (Já falámos uma vez, ou falamos novamente?).
Pôde= Pode - (Se não pôde, é porque não pôde; mas já que pode, vamos a isso).
Pôr = Por - (Será um verbo, ou uma preposição? São tão idênticos, que fico a oscilar entre a certeza e a dúvida de como pôr o por, no seu devido lugar).
Prática = Pratica - (Quem não tem prática, pratica; só tem prática quem pratica).

É engraçado, “atão num” é?! É “dificientemente difrente e tamém devertido”.

Antes de ultimar, e a título de caçoada, vou expor ainda os dois minúsculos parágrafos sequentes, que, apesar do seu reduzido espaço, poderão albergar um enorme significado nas entrelinhas:

Estava eu sentado sobre um calhau a matutar na porca da vida com a minha observação direcionada para as águas borbulhantes de um riacho, quando, um quase imperceptível ruído de qualquer coisa que se arrastava me chegou aos tímpanos, “clamando” pela minha atenção; procurei localizar a sua proveniência, e, para meu espanto, observei que era um cagado; olhei bem, e era um cagado de fato, acabado de sair da correnteza ribeirinha.

 Muito engraçado por sinal, lá ia ele vagarosamente vencendo a inércia da sua dura e luzidia carapaça, como se tivesse todo o tempo do mundo para chegar ao seu destino. Após minuciosa observação, concluí que era de facto um cágado, e por causa das dúvidas, pude certificar também, que o seu “fato” não ia nada borrado (cagado).

Para muitos que mal sabem escrever, como eu, surgiram agora no céu estrelado da linguística, uns “iluminados” que, com a imposição de novas regras, vieram “infernizar” o universo da existência literária com palavras, cuja estrutura foi alterada, ou por forma “distinta”, adulterada, na sua “fisionomia” gráfica e fonética, cunhando algumas, dos díspares significados.

Logo, como ainda estamos com as mãos na massa e o estrugido para arroz de pato, ou de pacto (ortográfico), ainda não está bem apurado, poder-se-ia – sugestão minha – proceder à substituição da palavra linguistas por linguiças; claro que não têm o mesmo significado nem a mesma ortografia, contudo, como na língua lusófona o seu timbre é aproximado, este, requintado por congeminada analogia adulterada, lá irá dar ao mesmo.

 Quero manifestar a minha discordância inerente ao Novo Acordo Ortográfico, sublinhando a revogação do mesmo.

António Figueiredo

3 comentários:

Rui Baptista disse...

"Ridendo castigat mores", parabéns!

Rui Baptista disse...

Acabo de subscrever a petição para a derrogação deste aborto:Novo Acordo Ortográfico.

João Cabral disse...

Pena ter introduzido várias inverdades que não estão contempladas no Acordo e alguns erros, como "estructura". Só prejudica a efectiva luta contra o dito.

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