Meu artigo de opinião publicado hoje no "Diário as Beiras":
“Outrora a velhice era uma dignidade;
hoje ela é um peso” (François Chateaubriand, 1768-1848).
Em referência ao peso que os idosos
representam para a sociedade actual pouco habituada a esta situação (já o
autor em epígrafe, se queixava deste mal) por as pessoas viverem cada vez mais
anos, reporto-me ao repúdio então generalizado nos meios de comunicação social à expressão “praga grisalha" utilizada por um jovem deputado do PSD, Carlos Peixoto, em
arroubo tribunício.
Por
vir ao caso, evoco um meu artigo de
opinião, saído no jornal “Público” (14/03/2013), sobre um filme de ficção
norte-americano, que correu no nosso país em 1973, titulado “Soylent green”, tendo
como personagem principal o prestigiado
actor Edward G. Robinson.
Neste filme, é-nos dado prever New York em 2022, com 40
milhões de habitantes, havendo, como tal, escassez
de alimentos suprida por bolachas verdes feitas inicialmente com algas verdes,
entretanto, em desaparecimento o que fez
com que o governo criasse fábricas produtoras de alimentos contendo proteínas
de cadáveres humanos para alimentar os pobres.
A
solução para os desprotegidos deste
mundo passava pela abertura de luxuosas clínicas de eutanásia para uma das quais segue voluntariamente o referido actor assistindo
aí a um filme, em écran panorâmico e
com suave música de fundo, em que lhe é dado ver prados verdejantes com gazelas
à solta e pomares cheios de apetitosa
fruta, enquanto aguarda a morte que o libertará de uma vida madrasta.
Mas, por vezes, nos
bastidores do nosso Portugal dito progressista em que Sophia de Mello Breyner,
alertou “não se dever criar em nome do antifascismo um novo fascismo”, a
realidade acompanha a própria ficção. Assim, os velhos e doentes, “num dos
melhores lares de Cascais” - ergo, sendo este dos melhores com serão os piores?
– sobrevivem em verdadeira miséria humana numa antecâmara da morte “com mulheres, homens,
misturados e amontoados num único quarto, muitos deles a dormirem no chão” ou
em toscos catres, segundo uma comovente e oportuna reportagem de Ana Leal (TVI 24, 05/10/2019).
Mas de bradar aos céus!, outro tanto, o facto da opinião publicada nos media, em blogues ou
simples conversas de café, não se ter pronunciado em força (como diz a sabedoria popular, a união faz a força!) contra
este “status quo”, quiçá, em desânimo com Jorge de Sena: “Que importa dizer-se
que Portugal é um país de sacanas: Todos os são, mesmo os melhores; às suas
horas. E todos estão contentes de se saberem sacanas”.
Assim, neste torrão
natal em que o coração deveria moldar o carácter dos seus governantes, mas o não faz, não será altura de ser criado
um exclusivo e eficaz (repito, eficaz!) organismo que
vigie, com olhos de ver e ouvidos que escutem, como tal capacitado para
prevenir ou resolver rapidamente situações como esta, que atentam contra os mais elementares
direitos dos cidadãos? Nunca, por nunca, para atribuição de mais umas tantas sinecuras
aos subservientes filiados partidários.
Indaga Eça de
Queiroz, o leitor: “Estarei a exagerar?
Exageração era eu, pintar a cobra e depois pôr-lhe quatro pernas”, perguntando
eu, por meu lado, para este ofídio não rastejar em solo de indignidade?
2 comentários:
lá teremos de agradecer à ciência mais um adiamento do cadáver e ter conseguido uma 4ª idade para os humanos, caríssima e perigosa , deixando-nos à mercê sabe-se lá de quem, ansiando pela misericórdia da morte. e tudo assobia para o lado, falam de bebés , criduchos, enquanto ignoram o problema demográfico sócio económico de milhares de velhos , remediados e pobres, que vêm aí em catadupa. vai ser lindo de se ver.
Publiquei, momentos atrás, um post -"A ADSE e o barbarismo da nossa época" (19/10/2019) - em resposta ao comentário aqui publicado por "marina", que muito agradeço num país de egoístas que parece olhar só para o seu próprio umbigo. Ou seja, com o mal dos outros posso eu bem!
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