terça-feira, 5 de outubro de 2010

Educação Patriótica, Educação Republicana

Pela mão de Alberto Filipe Araújo e Joaquim Machado de Araújo evoca-se João de Barros (1881-1960) um dos mais importantes nomes da educação republicana.

Estudante de Direito em Coimbra, onde conheceu e se tornou amigo do futuro pedagogo de João de Deus Ramos, exerceu primeiramente as funções de professor, mas, interessado que estava nos desígnios da educação nacional, passados dois anos, respondeu ao desafio lançado pela Presidência do Conselho de Ministros de viajar para o estrangeiro, a fim de conhecer experiências de ensino que pudessem servir da base à reforma na instrução pública.

O conhecimento de escolas de Espanha, França, Bélgica, Inglaterra, etc., (publicadas no livro A Escola e o Futuro), permitiu-lhe apresentar um projecto de reforma, que não teve, no seu entender, o acolhimento esperado, o que viria a criar alguma crispação política, mas não ao ponto de ser ter afastado do pensamento educativo e da própria política.

Aqui reproduzimos algumas páginas do livro de João de Barros Educação Republicana seleccionadas pelos autores acima referidos (páginas 68-70).

"Antes de mais nada, o meu desejo seria criar um entusiasmo por essa tarefa, ainda tão abandonada ou tão mal compreendida entre nós, que consiste em dar à criança todas as possibilidades, todas as capacidades, todas as energias necessárias para a tornar num ser consciente e forte, apto a contribuir para o progresso do seu país, e para a beleza, «harmonia e utilidade do momento em que vive e trabalha. Tarefa complexa e grave, e que a todos pertence: às famílias, aos professores, ao Estado. Tarefa sobretudo difícil – nesta hora em que assistimos à elaboração de uma nova fórmula de disciplina social: de que a República foi a encarnação política, mas que precisa ser aperfeiçoada, intensificada, completada nas suas outras modalidades e realizações, entre as quais, sem dúvida, avulta a efectivação dum plano educativo geral. Sem ela, com efeito, poderemos dar à República, no momento que passa, todo o esplendor, toda a sabedoria, toda a ordem e toda a paz: - não lhe daremos, porém os defensores futuros do ideal que representa, não a consolidaremos na consciência da mocidade, deixando, portanto, de criar essa coesão entre o Presente e o Porvir dum povo, que é a garantia mais sólida do prestígio e da força do regime que ele escolheu.

Todos sabemos, com efeito, que há em Portugal um analfabetismo assustador. Que há uma necessidade absoluta de escolas primárias e superiores. Que há urgência em criar óptimas escolas profissionais. Que não pode demorar muito mais tempo a instalação dum bom ensino técnico. Que é necessário instalar as escolas normais – primárias e secundárias – com laboratórios e gabinetes completos. Que não temos um bom ensino artístico. Que o estado só agora começa a ocupar-se a sério do ensino da Ginástica. E sabemos também que estas legítimas aspirações do público que por tais assuntos se interessa – têm de ser satisfeitas para se estabelecer um ensino verdadeiramente republicano. E porquê, afinal? Porque o analfabetismo não permite fazer cidadãos, porque a ausência do ensino profissional não nos deixa criar homens (úteis a si e à sociedade; porque) a classe burguesa estiola-se no bacharelismo agudo, em vez de ser um elemento produtivo de riqueza, como seus filhos seriam se estivessem praticamente preparados para a vida; porque sem haver professores não há obra nenhuma que vingue em matéria pedagógica; porque, sem ensino artístico, não há educação –, da sensibilidade e não há cultura geral que valha; e, ainda, porque – sem boa cultura física – não há raça que saiba vingar as suas aspirações mais íntimas e mais profundas de espírito e de coração (…).


No entanto, a República fez da educação e da instrução duas bandeiras de batalha, e com elas se tem preocupado e ocupado a cada instante. Instruir! Educar! A todo o momento os propagandistas laçam estas palavras mágicas para o meio do público. A todo o momento evocam, por meio delas, um esplendor de civismo e de progresso intelectual que não existe. A todo o momento, ligam a sorte das novas instituições à vitória das ideias que estas palavras significam. E porque o farão? Porque sentem que, sem educar e sem instruir as novas gerações, dentro de um critério republicano, que seja ao mesmo tempo um critério pedagógico ninguém poderá garantir o futuro da República e da Pária (…).


Com efeito, a educação é um produto directo das nossas convicções sociais. A cada novo ideal da humanidade corresponde um novo ponto de vista pedagógico. A Revolução Francesa, de cujo impulso formidável ainda hoje vivemos, trouxe consigo Rousseau; e, pedagogicamente, é de Rousseau que ainda hoje vive também o nosso pensamento, a nossa sensibilidade. Da renovação vital e da quimera humanista que foi a Renascença nasceu Montaigne: – a sua pedagogia é a pedagogia duma época forte, vibrante de alegria de viver, e absolutamente cônscia do poder do homem e do valor do seu esforço… Não vale a pena continuar a lista destes exemplos, claros e concludentes. Basta fixar apenas que a educação das crianças, sendo, como é, uma das faces da nossa actividade colectiva, deriva sempre da ambição ou do sonho que determinou essa actividade.”


Referência bibliográfica:
Barros, João de (1916). Educação Republicana. Paris-Lisboa: Livrarias Aillaud & Bertrand, páginas 11-13, 23-24, 62-63, 175-176. Citado por Araújo, A.F. & Araújo. J. M. (2004). João de Barros: vida obra e pensamento. Braga: António Marcelino Valente

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