É um facto bem conhecido que a chamada civilização ocidental herdou muitos dos seus valores da tradição greco-latina. Os grandes modelos clássicos podem encontrar-se nos mais variados sectores, desde a literatura, arquitectura e escultura, até ao domínio do pensamento filosófico e político, para citarmos apenas alguns. Nem sempre, porém, eles se revestem da seriedade das grandes revelações.

Esta figura ilustre viveu na antiga Grécia, mais precisamente na cidade de Atenas, entre os séculos VII-VI a.C. A posteridade conhece-o, sobretudo, como legislador. As leis que promulgou para os seus concidadãos lançaram as primeiras sementes do regime em que hoje vivemos, a democracia, termo cuja etimologia acusa a mesma origem grega.
Mas deixemos de lado a vertente política, para salientar uma outra faceta da personalidade de Sólon: o facto de ter sido também o primeiro poeta ateniense. A maioria dos seus versos exprime a síntese perfeita entre o homem de Estado e o poeta, mas outros apresentam reflexões interessantes sobre a existência humana. Não hesita, por exemplo, em salientar o progresso intelectual trazido pela idade, quando diz: «envelheço aprendendo sempre muitas coisas».
Numa sociedade que, tal como a nossa, tinha em grande conta a beleza física e o frescor da juventude, era preciso alguma coragem para remar contra a corrente e afirmar as vantagens que a velhice pode trazer consigo. Esta consciência da evolução do homem está presente, de forma mais clara, num poema onde Sólon reflecte sobre as várias fases da vida. Não é dos mais belos, mas é curioso na sua simplicidade. O autor divide a existência humana em períodos sucessivos de sete anos, valor que tem alguma importância ainda nos nossos dias, pois, à imagem de outros números (como o três e o dez), denota a conclusão de um ciclo.
É essa reflexão que lhes proponho. Gostaria de o poder fazer na língua original, mas como infelizmente poucos a entenderiam, apresento-a na tradução directa a partir do grego. Não lhes peço que concordem ou que discordem das palavras de Sólon: exorto-os somente a que escutem uma voz com mais de dois mil e seiscentos anos.
A criança, menino ainda de tenra idade, a barreira dos dentes
que lhe nascera muda pela primeira vez aos sete anos.
Quando a divindade leva ao seu termo um novo ciclo de sete,
Revelam-se os indícios da puberdade a despontar.
No terceiro período, quando os membros ainda crescem, o queixo
Cobre-se de penugem e muda-se a flor da pele.
No quarto ciclo de sete anos, todos alcançam o cume
da sua força, que os homens consideram termo de virtude.
No quinto, é tempo de o homem pensar no casamento
e de assegurar a geração futura dos filhos.
No sexto, para tudo está preparado o espírito do homem
e já não deseja, como antes, praticar acções reprováveis.
No sétimo ciclo de sete anos, o espírito e a palavra alcançam o cume,
e também no oitavo — somando ambos catorze anos.
No nono, ainda tem vigor, mas são mais apropriadas,
para uma grande virtude, a sua palavra e sabedoria.
Se alguém alcançar o décimo e dele preencher a medida,
não será fora de sazão, se o atingir o mandato da morte.
Delfim Leão
2 comentários:
Juízos criteriosos,
nem o tempo os envelhece:
pelo contrário, parece
que são mais judiciosos!
Só que trnascritos em verso,
ao meu jeito pessoal,
valeriam mais um terço
do que o próprio original!
JCN
Corrijo a gralha "trnascritos" por "transcritos". JCN
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