Em entrevista à revista LER, de Inverno (n.º 165), a escritora Lídia Jorge, que foi professora e que, a partir dessa condição, tem manifestado um olhar muito lúcido sobre a educação, diz o que segue (cf. página 49):
"Este país, em parte, tem falhado na escola. [A escola] devia ser não apenas um espaço de instrução, mas, sim, uma escola cultural, que fosse o hábito das pessoas e promovesse uma cultura cívica, de respeito pelo outro, e assentasse também na experiência de contacto com a arte. Tenho medo de generalizar, porque existem em Portugal escolas que são modelares e professores que são exemplares.
Mas, alguma coisa se passa quando, hoje, há hordas e hordas de jovens que deixaram de ler ou leem mal, que falam com palavrões, que não têm o mínimo gesto de delicadeza... Há 30 anos, nós tínhamos um programa para sair da ruralidade da escola. Aconteceu que, entretanto, o mundo tecnológico veio contraria esse projeto. E está provado que os países que têm menos tradição letrada e cultural incorporam acriticamente a informação, tendo uma noção de vanguarda - porque é muito fácil uma pessoa quase analfabeta manejar com muita facilidade todos os gadgets - e transitaram de uma cultura iletrada para uma cultura tecnológica, sem passarem por um filtro civilizante.
Foi o caso da sociedade portuguesa, que não tinha suficientes hábitos de leitura, de crítica, de liberdade ou de ousadia de expressão do pensamento, para o evitar. Essa vassoura eletrónica, que permite incentivar extraordinariamente os que já têm capacidade de aceder a uma formação sólida, está no entanto deixando todos os outros à beira da iliteracia.
Ao mesmo tempo surgiram as teorias mais absurdas sobre o futuro da escola: por exemplo, que vai ser um sítio sem professores ou que cada aluno pode fazer o seu próprio programa. E os portugueses, como são complexados por não estarem na vanguarda, impregnam-se de teorias bizarras, que são, na verdade, a promessa da nova barbárie."
6 comentários:
Em poucas palavras, a escritora Lídia Jorge diz quase tudo.
O Professor Egas Moniz era português, frequentou o sistema de ensino da sua época e subiu a escadaria de honra que o conduziu ao Prémio Nobel da Medicina. Para sermos tão bons como os melhores, em educação, não precisamos de copiar (plagiar) teorias aberrantes sobre a escola do futuro, correndo o sério risco de transformarmos o nosso sistema de ensino numa aberração. Por exemplo, dizer que a melhor maneira que um professor do ensino secundário tem de avaliar os seus duzentos alunos é passar a maior parte do tempo da aula a preencher grelhas imensas, com imensos indicadores sobre as emoções, comportamentos e aprendizagens essenciais demonstrados por cada um dos alunos, é uma aberração.
Prezado Alberto, detendo-me na segunda parte da sua mensagem, insisto na condição do professor como profissional intelectual. Como profissionais, no sentido mais nobre desta palavra, não podemos replicar as medidas que a tutela, a academia nos apresentam se elas não concorrerem para o Bem dos alunos. Na verdade, é da formação dos alunos, que devemos, em primeira instância, cuidar. Bem sei que é difícil, bem sei que não conseguimos deter a corrente, mas ceder a este princípio ético é ceder à nossa própria função, que é de educar. Cumprimentos, MHD
https://www.youtube.com/watch?v=jZk33FWcfcQ
Para a grande maioria dos encarregados de educação o fim da escola é passar diplomas aos seus educandos. A escola transformada em repartição pública, cheia de burocracia estéril, inimiga do ensino, é o meio seguro que justifica o fim da passagem fácil, falsa e feia de todos os alunos.
É muito difícil remar contra a maré. Os professores têm pouca autonomia técnica e científica. É mais fácil obedecer sempre ao ministro.
CONCORDO.
Esta análise diz tudo, em poucas palavras. Só de alguém que está atento, é inteligente e sabe escrever.
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