sexta-feira, 1 de outubro de 2010

Portugal e os próximos 10 anos


Segundo dados do Eurostat (relativos a 2008) o PIB per capita (PIB PC) português é cerca de 72% do PIB PC médio europeu (EU 27, 100%). Há cerca de dez anos atrás era de cerca de 80% da média comunitária. Considerando as actuais taxas de crescimento, a projecção para 2028 mostra que o PIB PC português será 56% da média comunitária e Portugal será o último da tabela de todos os países europeus. Ou seja, seremos o país mais pobre da comunidade, e continuaremos a divergir da média comunitária. Para convergir e atingir a média comunitária em 2028, Portugal teria de inverter a situação e crescer em média 3,86% ao ano, ou seja, passar de taxas de crescimento médias inferiores a 1% para taxas superiores a 3%.

Como conseguir este objectivo?

A única forma parece ser resolver de forma decisiva e sustentável as desvantagens que nos são apontadas, e que se relacionam com a atitude dos portugueses (qualidade da formação secundária e superior, qualidade da formação científica), capacidade empreendedora das empresas e instituições (investimento privado em I&D, patentes), flexibilidade do mercado de trabalho e das leis de trabalho, tamanho do mercado interno (o espaço lusófono tem de ser aproveitado), justiça, aspectos organizativos, e disponibilidade de recursos humanos avançados (baixa disponibilidade cientistas e engenheiros no mercado, o que é ainda agravado pela tendência crescente de saída dos melhores quadros para o estrangeiro – brain drain).

O país tem de contar consigo próprio e fazer valer as suas capacidades. É necessário ser consequente e eficaz no esforço de transferência de saber e tecnologia das universidades e centros de I&D para a economia, avaliando os resultados tendo por base indicadores de performance: número de empresas criadas, taxa de sobrevivência, número de empregos qualificados criados, número de patentes que deram origem a novas empresas e/ou novos produtos, entre outros. Os apoios terão de ser sempre proporcionais aos resultados.

Mas é também necessário mudar o financiamento universitário, como o resultado de um novo contrato com a sociedade que veja reforçado o papel da universidade/ politécnico no desenvolvimento económico e social do país. Uma parte desse financiamento deve estar directamente ligado à capacidade de transferir conhecimento e tecnologia para as empresas, criando mais-valias económicas e emprego qualificado, devendo o Estado colocar parte do seu esforço na redução de impostos às empresas que apostem em contratos de I&D em consórcio. Isto não significa uma redução do financiamento das universidades e centros de I&D, mas tão somente uma alteração na forma como são obtidos os orçamentos, incentivando assim uma relação mais eficaz com a sociedade e com economia. Uma relação que terá também efeitos muito significativos na criação de emprego qualificado e na incorporação de inovação e empreendedorismo na matriz das empresas.

Devemos ser também consequentes no apoio à internacionalização, à diplomacia económica, ao reforço da imagem de Portugal como país produtor de tecnologia, mas também à criação de mecanismos de redução fiscal para empresas que apresentem taxas crescentes de exportação e uma estratégia de internacionalização com resultados práticos.

O Estado só deve incentivar o investimento directo estrangeiro que tenha uma forte componente de inovação e transferência de tecnologia. Os incentivos devem ser reais, tendo por base preços de instalação, acompanhamento personalizado, ligação a centros de I&D, programas de incentivo ao estabelecimento de projectos de I&D com parceiros nacionais, etc. É nessa perspectiva que devem ser equacionados os clusters em áreas estratégicas, constituídos por empresas, centros de I&D e centros de saber, e financiamento dependente dos resultados práticos: produtos e actividade económica gerados pela criação do cluster.

Finalmente, deve ser desenvolvido um plano consistente de ligação de Portugal a instituições europeias de reconhecido mérito na transferência de tecnologia e conhecimento para as empresas. Esse plano deve apoiar essas ligações, tendo por base os seguintes pressupostos:

1. Os consórcios devem incluir instituições europeias e portuguesas, com modelo de gestão acordado com o Estado;
2. Os planos devem incluir cooperação na formação avançada para empresas (cursos curtos, mestrados e doutoramentos), na transferência de tecnologia e saber, e no estabelecimento de projectos europeus totalmente financiados pelos programas quadro europeus;
3. Os planos estabelecidos devem ser sustentados em 10 anos, isto é, o investimento do Estado nestes consórcios deve ser recuperado com projectos europeus, projectos em consórcio com empresas, prestação de serviços de formação e consultoria, proventos de cursos de mestrado e doutoramento realizados em consórcio entre as várias instituições, etc.

A próxima década deve ser dedicada ao empreendedorismo. Deve ser criado um plano nacional que tenha como objectivo:

1. Promover o empreendedorismo e risco na sociedade portuguesa, alertando para a necessidade de esforço individual e original para obter resultados;
2. Promover quem empreendeu, realizou, teve sucesso, criou emprego e actividade económica. Deveria ser um objectivo nacional divulgar estas iniciativas;
3. Promover a realização de pequenos cursos dedicados a escolas primárias, preparatórias e secundárias, onde fossem transmitidos conceitos elementares de economia, sobre a vida das empresas, de como funciona o nosso sistema económico, sobre emprego, sobre iniciativa e risco, como muitos passaram da ideia para o negócio, etc. Mensagens simples, mas que ajudam a criar o mindset empreendedor na população mais jovem;
4. Apoiar os alunos com os melhores resultados em áreas consideradas estratégicas;
5. Permitir que alunos do ensino secundário e do ensino superior participem activamente em equipas de I&D universitárias e resultantes de I&D em consórcio com empresas6. Premiar os empreendedores que se destacaram nas várias áreas de actividade, permitindo o respectivo reconhecimento público. Estes prémios deveriam ser nacionais e devidamente promovidos, estando, por exemplo, associados a uma data nacional relevante (25 de Abril, Dia de Portugal, etc.).

Os países ou as regiões, antes de serem espaços geográficos, políticos ou económicos, são a sua população. São as pessoas que fazem a diferença. São elas que moldam decisivamente o futuro. Atrair e fixar pessoas tem de ser, por isso, o nosso primeiro objectivo. E devemos estar particularmente interessados naquelas pessoas que procuram oportunidades, que as sabem identificar e têm o arrojo para definir objectivos e persegui-los com determinação. Pessoas com atitude. São essas pessoas que fazem as coisas acontecer nas várias áreas de actividade humana. São essas as pessoas que quando falham não desistem. Quando falham começam de novo. Falham, mas aprendem, até terem sucesso, contaminando as outras.

J. Norberto Pires
(publicado na revista "As 500 Maiores Empresas da Região Centro" do Jornal "I" e do Diário AS BEIRAS)


5 comentários:

Eduardo Freitas disse...

Precisamos de um plano, sim. Um plano que passe pela redução da presença do estado na economia para algo no mínimo inferior a 40% do PIB.

Precisamos de uma Universidade que seja responsável pela selecção dos seus alunos. Precisamos de uma Universidade onde o peso do financiamento do orçamento do estado tem necessariamente de se reduzir o que, para além da imprescindível miscigenação com as actividades de empreendorismo, não poderá deixar de passar por elevar o nível actual das propinas (talvez para o dobro).

José Meireles Graça disse...

Mas que grande lista de coisas que o Estado "tem" que fazer. Coisas muitas é o que o Estado tem feito. Já eu ficava grato se o Estado fosse barato e não atrapalhasse. Os tais 40% de que fala o comentador anterior - só um objectivo - fariam mais pelo País do que este discutível catálogo de dirigismos vários, grávidos muitos deles de efeitos perversos e despesa pública.

Anónimo disse...

Sair da crise necessitamos
Sem gente a mandar bocas em verso
talvez o consigamos.

JCA

Anónimo disse...

O estado tem que fazer muita coisa sim, mas os privados também, o problema é que desde 1850 que os grandes capitalistas da nação vivem às custas do estado.
Até hoje o esquema tem sido simples: o estado investe com o dinheiro dos contribuintes e os empresários ficam com o lucro!
Veja-se o caso do tgv e do aeroporto, porque é que o estado não se limita a facilitar os planos de construção e urbanismo, a burocracia e as respectivas autorizações e os privados constroem tudo com o dinheiro deles?
Porque estão à espera que o estado gaste o nosso dinheiro lá, para depois fazerem parcerias publico privadas e receberem apenas os lucros, ficando os prejuízos para nós!

Enquanto isto não mudar, não vale a pena falar em empreendedorismo.
Acaso na revolução industrial inglesa andou o estado a construir coisas para os privados? Promoveu sim, facilitou, mas quem entrou com o capital era quem o tinha e não o estado!

Bartolomeu disse...

Não!
Aquilo que o mundo ocidental precisa é que um -mega-terramoto, seguido de um mega-tesunami, arrasem por completo a China.

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