Post convidado de Armando Vieira:
Os números do desemprego não param de aumentar. Nalguns países da Europa a taxa de desemprego aproxima-se dos 20% e em Portugal já ultrapassou a barreira psicológica dos 10%. Para muitos jovens encontrar emprego tornou-se uma missão impossível.
Até agora, os responsáveis políticos têm-se centrado na recuperação da economia, que tem estado em queda livre, impulsionando a procura. Mas há outra forma mais interessante de estimular o crescimento económico e o emprego: incentivar o empreendedorismo. Em vez de manter os empregos de ontem deve-se é criar empregos de amanhã. As palavras de ordem são empreendedorismo, inovação e capital de risco.
Start-ups inovadoras são motores eficientes de criação de emprego e de crescimento económico a longo prazo. Os governos têm desempenhado um papel importante no estímulo ao empreendedorismo criando infra-estruturas vitais para a inovação e investindo no ensino superior. Porém é ao empreendedor que cabe a tarefa de executar a transferência de tecnologia e de assumir riscos, por vezes elevadíssimos, por um projecto em que acredita. Infelizmente o apoio a este nível é escasso e mal gerido pelos poderes políticos.
Um estudo publicado recentemente pelo gabinete de estatística da União Europeia mostra que Portugal é dos países com menor taxa de empreendedorismo europeu. Da, já de si pouca, produção científica desenvolvida, é ainda mais escassa a que passa as fronteiras do mundo académico e é transferida para o sector produtivo através de projectos de start-ups.
Embora existam alguns programas de capital de risco, os valores envolvidos são insignificantes e o processo tão burocrático e moroso que raras vezes compensa o esforço. Raras são as universidades que dispõem de eficazes gabinetes de transferência de tecnologia. Business Angels, embora já existam em Portugal, são regulados por um quadro legislativo muito restritivo e os projectos apoiados são mínimos.
É altura de fazer muito mais pelo empreendedorismo em Portugal. Tome-se o caso de Israel. No ano passado, Israel, um país de pouco mais de 7 milhões de pessoas, tem mais empresas de capital de risco do que a França e a Alemanha juntas. Israel tem mais start-ups per capita do que qualquer outro país (um total de 3 850, ou um para cada 1 844 israelitas), e mais companhias listadas na bolsa NASDAQ do que a China e a Índia juntas!
Bastava canalizar uma fracção das verbas que são desbaratas em obras faraónicas, muitas de rentabilidade duvidosa, para fundos de capital de risco, ágeis e eficazes no apoio aos inúmeros empreendedores nacionais que são forçados a sair do país para fazer crescer os seus projectos, que dificilmente voltaríamos a ter problema com o desemprego.
Armando Vieira
Professor Coordenador no ISEP e CEO da Sairmais.com
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9 comentários:
Os gurus da "Nova Economia" analisados por Thomas Frank em One Market Under God não diriam melhor. O que espanta não é que estas superstições existam; é que continuem a existir depois do que se passou nos últimos dois anos.
Não podia concordar mais com estas recomendações. Da minha experiência pessoal, é possível criar muita riqueza e ser resilientes a crises se as pessoas assumirem o empreendedorismo e a inovação como os motores de desenvolvimento da sociedade - sobretudo quando orientados a bens transaccionáveis e a mercados internacionais -. O empreendedorismo e a inovação são aquilo que é preciso fazer por serem o que mais vale a pena fazer - as vias preferenciais para criação de riqueza, emprego qualificado e resiliência eq crises -. Porém, e para uma boa parte das start-ups poderem ter sucesso, tal exige um governo que governe para o país e não para as televisões, com coragem para apostar na criação de riqueza e não nas aparências de criação de riqueza, criando e disponibilizando fundos ágeis de "venture capital" com decisões competentes e rápidas, e eliminando as teias burocráticas inadmissíveis das AICEPS, IAPMEIS, QRENs e outras que tais, que tanta incompetência e ineficácia encerram.
Chega de apoiar a construção civil e o emprego sem qualificações. Invista-se no que realmente conta para criar riqueza e desenvolver o país, que é o que está dentro da cabeça das pessoas.
Obrigado pelo seu post, que é importante.
O post é piedoso e vê-se que o seu autor é oriundo das áreas económicas. Fica todo contentinho por escrever frases como: "É altura de fazer muito mais pelo empreendedorismo em Portugal. Tome-se o caso de Israel" e imagina, com isso, ter dado um grande contributo para a resolução dos males nacionais.
É o problema dos economistas e dos gestores quase todos, a começar pelo actual Presidente da República. Ignoram a realidade e ficam felizes e realizados por fazerem diagnósticos. Comportam-se como um médico que dissesse ao paciente: "meu caro, fiz um estudo do seu caso. Você tem um cancro. Agora só sobrevive se o curar". E, depois, sem fazer mais nada, dissesse isto muitas vezes, atá à consulta final: "eu bem o avisei, disse-lhe mil vezes que tinha um cancro e que precisava de o curar. Você não me ligou nada, não se curou, agora está em estado terminal."
São assim os economistas. Andam há duzentos anos a fazer diagnósticos sobre o estado de coma em que caiu o país, mas, como toda a gente, sem ideia nenhuma dos meios de tratamento da doença.
"É preciso mudar as mentalidades" - dizem. Mas isso já dizia Luís António Verney. E nós não mudámos nada, desde então. O último a ter ilusões nessa matéria foi Cavaco Silva que, no final dos anos 80 do século passado, imaginou ter criado o português novo, europeu e civilizado.
A verdade é que em Portugal não há empreendedorismo algum, por uma razão muito simples: porque somos pobres. E os pobres apreciam a segurança e odeiam o risco. Ser empreendedor implica estar disposto a correr riscos. Em Portugal essa gente não existe. O que toda a gente procura é que o Estado tome conta de si e lhe garanta o seu futuro e dos seus filhos. E, ou se tenta ser funcionário público, ou se tenta ser empresário, mas um empresário que não tenha que correr riscos, um empresário a quem o Estado garanta o lucro e assuma os prejuízos se a coisa correr mal. Investe em novas energias, mas só se o Estado lhe subsidiar o investimento e se vincular a comprar-lhe toda a energia produzida, a preços fixos, muito superiores aos do mercado. Investe na construção de auto-estradas, mas só se o Estado lhe prometer que elas não terão portagens que afugentem os viajantes, assumindo antes ele, o Estado, o pagamento das portagens. E, mesmo aí, só se vincular a assumir também esse pagamento com base numa perspectiva sempre crescente de automobilistas passantes que garanta que, em hipótese alguma, o seu investimento lhe trará menos lucro do que cem vezes aquele que teria se colocasse o dinheiro numa conta a prazo do Montepio ou da Caixa.
A verdade é que se Portugal tivesse algum economista com uma ideia para para o país, a primeira coisa que ele faria era rejeitar a moda do uso da palavra "empreendedorismo" que, evidentemente, não significa absolutamente nada.
@Funes,
Compreendo a sua opinião, mas não creio que sejamos tão pobres assim a não ser de espírito. Aí estamos de acordo.
Não sendo economista, permita-me referir que, para mim, empreender tem um significado bem definido: chamar a nós próprios a responsabilidade de construir o futuro em que acreditamos e que queremos ter. Isso faz-se assumindo riscos, claro, numa lógica de risco/oportunidade que, de preferência, se deseja internacional.
Gostaria de ver um Estado bem mais reduzido e eficaz do que o actual, cumprindo um papel (1) legislador, (2) catalizador de desenvolvimento e (3) fiscalizador, e não agente activo da economia ou até controlador. Um Estado sem "golden shares" que aos poucos fosse incentivando uma sociedade que valorizasse a competência e premiasse o mérito, começando pelas suas próprias instituições.
O Salcedo queria ver menos Estado...
Mas quando a sociedade capitalista começa a arder,leia-se crise financeira e económica, chamam logo o Bombeiro, que é o Estado para não ficarem a arder com o dinheiro que especularam nas aventuras do tio patinhas...
Estou completamente de acordo com o Funes, cuja análise acho extramamente lúcida...
Mário Vale
@Mário,
Sim, gostaria de ver menos Estado e pessoas mais habilitadas a estabelecer o seu próprio futuro através do seu trabalho e mérito. Mas não defendo o modelo de capitalismo que o sistema financeiro - sobretudo nos EUA - nos mostrou. Não deve existir o "too big too fail". Defendo um modelo de capitalismo melhor regulado em que exista separação entre banca comercial e banca de investimento, em que a banca comercial não jogue cegamente com os dinheiros dos seus depositantes em produtos financeiros que nem os próprios financeiros entendem e que são de alto risco - para ser simpático -, e que as instituições paguem um preço quando falham. Se o Estado entender apoiá-las, então no mínimo que cobre juros adequados que beneficiem os cidadãos. Isso não tem acontecido nos EUA nem em outros países, em que o lobbying e os interesses políticos têm comprometido a isenção e a eficácia da regulação.
Creio que uma sociedade assim é socialmente mais justa e eficaz a criar riqueza.
Os que defendem menos Estado, olhem para os países escandinavos, onde a taxa de empreendorismo é bem mais alta do que a nossa. O problema da falta de empreendorismo em Portugal tem essencialmente a ver com um atraso educacional de décadas(educação direccionada para o funcionalismo, com pouca vertente na criação de inovação), com um condicionalismo industrial que fez história desde do séc. XIX ( protecção às empresas de negócio seguro, com vista a manipular o povo,basta ver o que hoje se passa com s Galps, EDps, bancos,etc.) e com uma quase inexistente política de capital de risco.
Restringir esta discussão apenas ao perfil de desenvolvimento económico(modelo americano vs. modelo keynesiano), é esquecer-se que , independentemente do modelo, o empreendor ( dadas as condições miníma) potencialmente poderá conseguir sucesso.
António Silva
Funes, é verdade que se vê que o autor vem das áreas económicas, mas também se vê que para escrever este texto tirou o chapéu de economista e pôs o de guru. São estes, e não os economistas, quem utiliza chavões como "empreendorismo" (feia palavra!); e ao fazê-lo saem da área da economia para entrar na área da treta.
@António Silva,
Concordo inteiramente com a sua opinião e com a raíz cultural antiga para a falta de apetência dos portugueses para correr riscos, em geral, e o que escrevi acima não contraria isso. Aliás, David Landes refere que as raízes desta característica das pessoas em Portugal têm já centenas de anos. Daí a falta de inovação e de "empreendedorismo" - se conhecer uma palavra mais adequada diga-me -.
Defender menos Estado - que defendo, embora prefira a expressão melhor Estado - também em nada colide com isso. O Estado que temos tem vindo a transformar-se numa espécie de ser tentacular que em medida significativa vive para si próprio em vez de servir as pessoas, absorvendo no processo uma parte importante da riqueza criada no país e sem ter nem a competência nem a coragem política para estabelecer estratégias continuadas de desenvolvimento (cultural, social, económico e financeiro).
Conheço bem os países excandinavos e sei o prestígio que os professores de todos os níveis têm lá porque o seu papel é sentido como essencial para o desenvolvimento da sociedade. São dados meios mas são feitas exigências claras e apertadas. É precisamente esse o tipo de Estado que defendo: competente, orientado para servir as pessoas e com coragem política para definir e implementar políticas de longo prazo que propiciem a libertação das pessoas das teias públicas e lhes dêm oportunidades para realizar o seu potencial. Nesse contexto, esse tipo de Estado propicia melhores condições para as pessoas empreenderem e para que inovação possa enraizar nas atitudes e comportanmentos das pessoas e empresas, e frutificar.
@José Luis Sarmento,
Para mim as palavras têm significados e não são feias nem bonitas. Como referi acima, para mim empreender tem um significado preciso: chamar a nós próprios a responsabilidade de construir o futuro em que acreditamos e que queremos ter. Isso faz-se assumindo riscos numa lógica de risco/oportunidade que, de preferência, se deseja internacional. E assumir responsabilidades está na antítese de qualquer treta.
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