quinta-feira, 1 de novembro de 2007

Preservação de anfíbios: uma luz ao fundo do túnel?


Como referi há um mês
, 2008 será o Ano Internacional da Rã, uma medida que visa alertar para a necessidade de medidas que evitem a extinção dos anfíbios, dos quais cerca de um terço das espécies conhecidas estava ameaçado em 2006.

O fungo Batrachochytrium dendrobatidis, causador da quitridiomicose, tem sido associado à extinção e ao declínio de espécies de anfíbios em várias regiões do mundo. Um grupo de investigação da Nova Zelândia declarou ontem ter encontrado uma possível cura para a doença, o cloramfenicol, um antibiótico de largo espectro hoje em dia utilizado apenas para tratar conjuntivites bacterianas.

Os cientistas decidiram publicitar a sua descoberta mesmo antes da publicação da mesma numa revista científica, dada a gravidade da situação que levou o presidente da Associação Mundial de Zoos e Aquários (WAZA) a compará-la à «extinção que dizimou os dinossauros do planeta».

Os cientistas banharam exemplares de duas espécies, Litoria ewingii e L. raniformis, numa solução do antibiótico e verificaram que não só os conseguiam curar completamente da quitrídia como o tratamento os tornava resistentes a novas infecções.

«Normalmente não esperamos que os antibióticos façam alguma coisa aos fungos. Mas fazem. Não percebemos porque razão o fazem, mas o que é certo é que isso acontece», comentou Russell Poulter, um dos cientistas que colaborou no projecto. Acrescentando que «tem a vantagem de ser incrivelmente barato».

Embora seja de facto barato, parece pouco provável que o tratamento agora descoberto possa ser utilizado fora de instalações veterinárias ou de investigação. De facto, o cloroanfenicol é uma substância completamente banida em todas as circunstâncias que possam resultar na sua ingestão pelo homem já que causa anemia aplástica, uma doença caracterizada por pancitopenia (déficite de glóbulos vermelhos, glóbulos brancos e plaquetas).

Por outro lado, Ana Carolina Carnaval, do Museu de Zoologia de Vertebrados da UCBerkeley e co-autora de um artigo sobre a rã-de-corredeira, Hylodes magalhaesi -uma espécie cujo habitat é a mata atlântica brasileira -, acredita que o fungo não é por si só responsável pelas extinções e declínio de populações observadas. De acordo com a cientista (artigo em formato pdf na revista Amphibian and Reptile Conservation), foi detectada quitridiomicose em populações que não estão em declínio, pelo que pensa tratar-se de um caso de sinergia entre a micose e outros factores, nomeadamente aumento de poluição, alterações climáticas, perda de habitat e demais alterações ambientais, opinião partilhada por outros herpetólogos.

O desaparecimento de anfíbios foi discutido pela primeira vez há quase 20 anos,no I Congresso Mundial de Herpetologia, realizado em Inglaterra, em 1989. Foram estabelecidas várias iniciativas que visam perceber as causas e dimensão desta catástrofe, como, por exemplo, a Avaliação Global de Anfíbios (GAA) ou a Rede de Análise de Anfíbios Neotropicais Ameaçados (Rana). Desde então, dezenas de espécies desapareceram e muitas mais encontram-se à beira da extinção (relatório de 2005 em formato pdf). A destruição de habitats é certamente uma causa não despicienda. Por esse motivo, mais que antibióticos, para salvar os anfíbios urge conservar esses habitats, principalmente os locais de reprodução.

2 comentários:

Anónimo disse...

Cara Palmira,
Excelente e importantíssimo post, parabéns! Preservar os anfíbios é mais importante do que discutir o sexo dos anjos. Sem isso não há medicina ou reprodução que possa valer à espécie humana - nem mesmo, diria eu, um Deus misericordioso que a proteja, de facto.

São os anfíbios que comem os insectos responsáveis por muitas doenças. Servem portanto de indicador para o estado da saúde das populações humanas também.

A poluição, para mim, é o factor principal no declínio das populações de anfíbios, e esta minha crença ou hipótese (não sou das áreas que realmente estudam isso a fundo) assenta num factor que me parece incontestável: a rapidez com que alteramos o nosso ambiente de vida, através da betonização de tudo, e também através do nosso estilo de consumo, cada vez mais ornamentalista, de resto por por dá cá aquela palha, e até com as melhores das intenções...

Vejamos: Não há hoje festa de crianças que não envolva pintar a cara dos miúdos, por ex. Já se contabilizou o que se gasta hoje em materiais sintéticos usados em tudo o que é ritual, por exemplo? Há poluição desnecessária a ser gerada, e muita gente a ganhar imenso dinheiro com isso.

Cuidar dos anfíbios, e portanto das zonas húmidas onde eles se habitam, é um imperativo de saúde pública também. Um imperativo mais importante até do que andar a pespegar hospitais por tudo quanto é lado.

Aliás, o tratamento ambulatório tem pelo menos a vantagem de não contribuir tanto, assim o creio, para a proliferação das infecções hospitalares. Porque também elas estão a aumentar, pelo que é útil reflectir sobre a real utilidade, a prazo, de aplicar aos animais a receita que, com óbvio sucesso, mas também com insucessos, vimos aplicando a nós mesmos: os antibióticos para curar anfíbios doentes darão mesmo resultado? E a sua fabricação em massa não será poluente? Uma estrada a passar ao lado dum paúl, diminuindo, devido à poluição que gera, a resposta imunitária dos seres vivos aí residentes, «cura-se» (ou compensa-se...) encharcando de antibióticos os anfíbios?
Um abraço
Adelaide Chichorro Ferreira

Anónimo disse...

Cara Palmira,
Excelente e important�ssimo post, parab�ns! Preservar os anf�bios � mais importante do que discutir o sexo dos anjos. Sem isso n�o h� medicina ou reprodu�o que possa valer � esp�cie humana - nem mesmo, diria eu, um Deus misericordioso que a proteja, de facto.

S�o os anf�bios que comem os insectos respons�veis por muitas doen�as. Servem portanto de indicador para o estado da sa�de das popula�es humanas tamb�m.

A polui�o, para mim, � o factor principal no decl�nio das popula�es de anf�bios, e esta minha cren�a ou hip�tese (n�o sou das �reas que realmente estudam isso a fundo) assenta num factor que me parece incontest�vel: a rapidez com que alteramos o nosso ambiente de vida, atrav�s da betoniza�o de tudo, e tamb�m atrav�s do nosso estilo de consumo, cada vez mais ornamentalista, de resto por por d� c� aquela palha, e at� com as melhores das inten�es...

Vejamos: N�o h� hoje festa de crian�as que n�o envolva pintar a cara dos mi�dos, por ex. J� se contabilizou o que se gasta hoje em materiais sint�ticos usados em tudo o que � ritual, por exemplo? H� polui�o desnecess�ria a ser gerada, e muita gente a ganhar imenso dinheiro com isso.

Cuidar dos anf�bios, e portanto das zonas h�midas onde eles se habitam, � um imperativo de sa�de p�blica tamb�m. Um imperativo mais importante at� do que andar a pespegar hospitais por tudo quanto � lado.

Ali�s, o tratamento ambulat�rio tem pelo menos a vantagem de n�o contribuir tanto, assim o creio, para a prolifera�o das infec�es hospitalares. Porque tamb�m elas est�o a aumentar, pelo que � �til reflectir sobre a real utilidade, a prazo, de aplicar aos animais a receita que, com �bvio sucesso, mas tamb�m com insucessos, vimos aplicando a n�s mesmos: os antibi�ticos para curar anf�bios doentes dar�o mesmo resultado? E a sua fabrica�o em massa n�o ser� poluente? Uma estrada a passar ao lado dum pa�l, diminuindo, devido � polui�o que gera, a resposta imunit�ria dos seres vivos a� residentes, �cura-se� (ou compensa-se...) encharcando de antibi�ticos os anf�bios?
Um abra�o
Adelaide Chichorro Ferreira

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