
quinta-feira, 9 de agosto de 2007
Contra a polícia da palavra

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13 comentários:
Voltaire,obrigado a sair de Paris, após a publicação das "Cartas filosóficas", sobre o valor sagrado em não calar a opinião contrária à nossa, sentenciou: "Posso não concordar com o que dizes, mas defenderei até à morte o direito que tens em o dizer".
Caro Rui
Tanto quanto sei essa famosa atribuição a Voltaire não é inteiramente verídica, apesar de exprimir as suas ideas sobre a liberdade de expressão. Se tiver alguma fonte onde Voltaire o tenha escrito explicitamente, poderia dizer-me qual é? Já procurei isso sem sucesso.
Caro Professor: Na verdade, li este pensamento sem poder precisar onde. Decorei-o pela impressão que em mim causou por exprimir um conceito de liberdade de expressão de um vulto de uma Cultura intemporal e sem fronteiras que suspeito de ter escrito páginas difamatórias contra o Regente Filipe de Orleãs esteve preso vários meses na Bastilha. Face aos tempos actuais em que a liberdade de expressão (devidamente responsável, claro está!) está longe de ter alcançado carta de alforria é caso para dizer que, nem sempre, os costmes mudam com os tempos. Reconheceu-o António José Saraiva (1963):"Este mundo é duro: haverá sempre inquisidores e fogueiras".Se, porventura, encontrar a referida fonte, fica a promessa de entrar em contacto consigo.
Onde escrevi "costmes" queria escrever costumes. Aqui fica feita a devida correcção.
Acredito que em relação a um número pequeno de questões ligadas à vida podemos ter um fundamento de verdade, mais do género de “não ser” por aí do que “ser” por aqui. Sei melhor o que não devo fazer para me manter vivo do que o que devo fazer para garantir o mesmo. E sabemos que não devemos matar outro ser humano, pelo menos, e que é melhor não ser ignorante do que ser (também sabemos quem defenda o contrário). Mas já temos dúvidas se há algum fudamento de verdade em não dever matar uma mosca que chateia, ou um caracol para o comer. Fora destas questões básicas, estou convencido que posso ter uma opinião que é correcta hoje e venha a ser incorrecta amanhã. Até aqui nada de novo.
Se assim é, a liberdade de pensamento devia dar-me a possibilidade de dizer hoje, que acerca de algumas ideias que eu tinha no passado (sobretudo as mais preciosas que eu tinha como verdadeiras) afinal estão erradas e por isso devo mudar, embora as coisas se compliquem se quisermos explicar como chegamos a essas conclusões.
Mas as pessoas que corrigem ex-verdades, ou que sequer as reconheçam, sobretudo aquelas que costumam defender uma opinião com “unhas e dentes”, são raras. Sobretudo quando “unhas e dentes” quer dizer perseguições, censuras e outras malfeitorias contra aqueles que defendiam opiniões contrárias. Claro que alguns que se vão apercebendo disso, acabam por cair no extremo oposto (parece que o oito e o oitenta é intrínseco à espécie humana – “uma boutade”), e acantonam-se naquele nicho que hoje se classifica de “pós-moderno” (sinceramente não sei o que este conceito significa), e fazem jus àquela frase anedótica “eu sou da mesma opinião e da contrária se for preciso”.
A maior parte das pessoas possui o preconceito contra a traição. Tendem a resistir mudar de opinião porque isso é uma traição ao seu próprio pensamento num dado momento histórico da sua vida. Eu tenho um amigo com 55 que é marxista desde os 17 e diz que não deixa o PC porque estaria a trair os seus princípios. De resto reconhece que o marxismo está errado ou falhou, ou assim uma coisa… (ele diz isto depois de mais um copo de Alvarinho). Por outro lado temos o Durão Barroso que era maoista e agora é neo-liberal (se é que isto significa alguma coisa) e já ouvi a muito boa gente dizer “Olá! Aqui há pardal!”. Dizer que isto é uma característica intrínseca do ser humano até pode ser uma verdade mas interessa pouco para o ponto onde queremos chegar agora.
Aqueles que resistem estão a trair o princípio da verdade naquele novo momento histórico? Como é que se pode sair desta embrulhada? Seria um grande benefício para todos termos a coragem de nos confrontarmos com o erros que cometemos, quer no campo das decisões, quer no campo das ideias, opiniões ou pensamentos. O erro é um risco constantemente presente e inevitável a que toda a espécie humana está sujeita (racionalistas cartesianos, empiristas stuartmillianos, wittgensteinianos, confucionistas, taoistas, budistas), mas parece que pouca gente o quer assumir. Todos constatámos isso mais tarde ou mais cedo no decurso da nossa vida.
Portanto, toda a pessoa, mais tarde ou mais cedo, está sujeita a ter de mudar de opinião num dado momento histórico, a deitar fora umas verdades que afinal são erros, e a trocar por erros o que afinal são verdades. Consequentemente, se quiser levar até às últimas consequências a sua honestidade intelectual, está sujeita a ter de praticar traição. Parece que alguns têm conseguido, mas certamente não a maioria.
A minha entrada tardia no mundo da informática leva-me a não ser um assíduo consultador da Wikipédia. Fi-lo agora com a intenção de ver se a minha referência à sentença de Voltaire lhe pertencia e se os termos em que a referi correspondiam a uma citação digna de crédito, por a ter feito de memória. Assim, a frase correcta, segundo aquela fonte informática é: "Posso não concordar com nenhuma das palavras que você diz, mas defenderei até à morte o direito de você dizê-las". A referência à verdadeira fonte onde ela se insere na obra de Voltaire fica sem ser desvendada. Mas o que interessa verdadeiramente é o facto de Desidério, com a transcrição do texto que faz, ter contribuído para que na consciência dos homens esteja sempre presente o crime contra tudo que atente contra a liberdade de expressão.
http://en.wikipedia.org/wiki/Evelyn_Beatrice_Hall
Evelyn Beatrice Hall, (1868 - 1919), who wrote under the pseudonym S.G. Tallentyre, was a writer best known for her biography of Voltaire. She completed her biography of Voltaire The Friends of Voltaire in 1906. She wrote the phrase, which is often mis-attributed to Voltaire, "I disapprove of what you say, but I will defend to the death your right to say it," as an illustration of Voltaire's beliefs".
Caro Desidério:
Julgo que aqui
http://en.wikiquote.org/wiki/Evelyn_Beatrice_Hall
aqui
http://www.classroomtools.com/voltaire.htm
e aqui
http://www.hypernote.com/C745182673/E253798223/
se pode ver a origem da falsa atribuição a Voltaire da máxima citada pelo "rui baptista".
Um abraço desde Ponte de Lima.
Julgo que a atribuição da frase a Voltaire não é, de forma alguma, falsa a fazer fé na Wikipédia. O que constitui "pano para mangas" é saber localizá-la na fonte. Espero que "lino" tenha dado um contributo válido nesses sentido com as pistas que anuncia. Pela minha parte, como disse, em comentário anterior, limitei-me a citar de memória uma sentença que muito me impressionou pela defesa que faz à liberdade de expressão. Saberei penitenciar-me se a frase não for de Voltaire. Não culparei a Wikipédia porquanto a minha consulta é posterior à citação por mim feita. De tudo isto, resulta o interesse da investigação a fazer sobre o assunto. Aliás um simples comentário não justificava uma recolha bibliográfica sempre imperiosa em trabalhos de natureza académica. Que não foi o caso!
“Se há facto estranho e inexplicável é que uma criatura de inteligência e sensibilidade se mantenha sempre sentada sobre a mesma opinião, sempre coerente consigo própria. A contínua transformação de tudo dá-se também no nosso corpo, e dá-se no nosso cérebro consequentemente.
(…) Ser coerente é uma doença, um atavismo, talvez, data de antepassados animais em cujo estádio de evolução tal desgraça seria natural.
(…) É uma falta de cortesia com os outros ser sempre o mesmo à vista deles, é maçá-los, apoquentá-los com a nossa falta de variedade.
Uma criatura de nervos modernos, de inteligência sem cortinas, de sensibilidade acordada, tem a obrigação de mudar de opinião e de certeza várias vezes no mesmo dia. Deve ter não crenças religiosas, opiniões políticas, predilecções literárias, mas sensações religiosas, impressões políticas, impulsos de admiração literária.
(…) O homem disciplinado e culto faz da sua sensibilidade e da sua inteligência espelhos do ambiente transitório: é republicano de manhã, e monárquico ao crepúsculo, ateu sob um sol descoberto, e católico ultramontano a certas horas de sombra e de silêncio…
(…) Convicções profundas, só as têm as criaturas superficiais… A política e a religião gastam dessa lenha, e é por isso que ardem tão mal ante a Verdade e a Vida”. (in: Fernando Pessoa, Páginas de Pensamento Político 1, 1910-1919, Publicações Europa-América).
Se a mudança é um fluir contínuo como não admitir, liberalmente como Mill, que o homem tem direito inalienável a exprimir-se, opinando diversamente, agora num sentido, logo num outro, e amanhã num ainda mais único e incongruente. Porque a admissão da liberdade do outro resulta da própria natureza mutável de cada qual. E a defesa da nossa individualidade impõe necessariamente a defesa intransigente da liberdade alheia. Contrariar esta liberdade imanente do ser humano pressupõe sempre uma unicidade e totalidade, que se assumida categórica e agressivamente desemboca num qualquer espírito totalitário.
Na Turquia, que já é quase uma democracia, é proibido falar no genocídio Arménio. Quem disser que ele aconteceu vai para a prisão.
Em vários países da democrática Europa é proibido, e dá prisão, dizer que não houve genocídio judeu durante a ocupação nazi
Os manuais escolares britânicos podem ser ilustrados com o pai de avental na cozinha, mas não com a mãe na mesma situação.
Eu nunca me sentaria à mesa com um fulano que nega o genocídio judeu. Teria nojo. Mas seria sua testemunha de defesa em tribunal se ele fosse julgado pelas suas opiniões.
Fico grato aos comentadores que investigaram na internet a origem da frase que atribuí a Voltaitre e que a própria Wikipedia apadrinha. Fui ao Google e inseri o nome de Voltaire. Aí me apareceram vários pensamentos atribuídos a Voltaire. De entre eles, a frase que motivou toda esta investigação contraditória na própria Wikipedia. Seja como for, este pensamento encontra a sua expressão actual no direito ao contraditório. Felizmente, os comentários permitem o seu usufruto pleno. O que não sucede nos jornais em que o fim da discussão é determinado pelas respectivas direcções, deixando nos interlocutores o sabor amargo de não serem aclaradas devidamente as diversas opiniões contraditórias.
A pressa com que foi redigido este comentário levou à repetição da palavra contraditório. Julgo que a redacção poderá ser melhorada com o seguinte final: (...)as diversas opiniões em jogo. Espero que o interesse que pus no desfecho desta investigação ajude ao alijar de culpas.
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