sexta-feira, 25 de outubro de 2019

NOSSOS FILHOS AMAZÓNIAS NOSSAS

Na sequência do anúncio da palestra que Jorge Paiva fará no próximo dia 30 de Outubro no Rómulo - Centro Ciência Viva da Universidade de Coimbra, recupero um texto de Manuel Alte da Veiga. Sendo um professor de Ciências e outro de Humanidades, o sentido do precioso trabalho que ambos têm desenvolvido é convergente. Tinha razão Rómulo de Carvalho quando disse que "Ciências e Humanidades é tudo a mesma coisa". A mesma coisa no sentido do valor que ambas as áreas têm na compreensão e preservação do mundo.
"A floresta da Amazónia só agora começa a ser sentida por toda a gente como problema do maior interesse a nível mundial. 
Mas só porque começou a mexer no bolso de cada qual – com uma diferença arrepiante: o dinheiro desaparece nos bolsos de quem tem pouco e multiplica-se nos bolsos de quem provoca e alimenta as tragédias a que só eles podem fugir. Esquecem que ganham fortunas gerindo guerras entre outras gentes, julgando-se suficientemente afastados da tragédia. 
A história antiga como a dos nossos dias não os vê tão imunes… Da Amazónia depende a saúde do nosso planeta, além de constituir a maior reserva de biodiversidade. Mesmo entre aqueles que conhecem estes problemas e levantam a voz contra os assassinos dessa «mãe telúrica» do bem-estar da Humanidade, quantos se esforçam por um estilo de vida congruente com esses valores? 
Toda a gente «sabe» que não se deve matar… contanto que não nos matem a nós nem aos nossos interesses. E de repente gritamos que o mundo vai mal! Mas quem vai mal é cada um de nós – quando não nos esforçamos por viver de modo a que haja mais vida. 
Votemos a favor ou contra o aborto e eutanásia, estaremos mais informados do que sobre a questão da Amazónia? Onde está o impacto das universidades católicas sobre questões sociais e educacionais? Onde está o cultivo de relações humanas, que permitam compreensivo envolvimento em problemas graves como estes? Que formação existe (nomeadamente entre o clero e leigos religiosamente comprometidos) para dialogar aberta e humanamente sobre estes e outros temas como a homossexualidade e transsexualidade? 
É perigosa a pretensão de possuir a verdade e as respostas para as «situações extremas»: são casos dramáticos, intensamente humanos, do intrincado sentido da morte e da vida. 
O legalismo pretensamente abalizado pela «ciência» e que se autoproclama «rigorosamente ético» não consegue nem deve querer penetrar no âmago do espírito humano para julgar «certo» ou «errado». Apenas pode e deve fornecer a maior informação disponível sobre «estudos de casos», em que a lei se reduz, quando muito, à «norma» estatística. 
Mas também não podemos viver de argumentações, por mais sábias que pareçam. É de extrema importância cultivar atitudes fundamentais para defender a vida. Atitudes que começam por ser «pequenas» mas são eliminadoras dos «pequenos princípios» de guerras e de toda a gama de crueldade. Calar um elogio, ser bruto no exercício do poder … estão do lado da morte ou da vida? 
As ditas pequenas atitudes (mas que exigem esforço) valem mais e são mais eficazes que alguns «vistosos» apoios financeiros: (...) À semelhança de florestas ricas e agriculturas saudáveis, olhamos para todos como «imprescindíveis» para o equilíbrio do «ambiente» cultural e espiritual da Humanidade? 
Precisamos de crianças e velhos como das velhas e novas árvores da Amazónia. Eles é que estão no topo do mais alto nível da «biodiversidade». Matando florestas, matamos pessoas. Mas as crianças não se podem «plantar» – muito menos por razões ou interesses político-económicos. Será que a publicidade à necessidade de «mais filhos» esconde a «necessidade» de garantir «novos escravos» do sistema económico que os compra ou abandona? Ou para corrigir a «distorção» ameaçadora da «pirâmide demográfica»? Querer que haja mais filhos ou mais crianças pode ocultar a histórica perversidade humana de dispor de muitos «escravos» para se escolherem os mais rentáveis ao sistema económico-social (defendido em várias escolas «católicas»!). 
Doutro modo, como explicar tanto desemprego nas faixas etárias aptas para trabalhar? E com que coragem sugerimos ter filhos, se os progenitores nem para eles próprios conseguem o devido «oxigénio»? Se todos (sobretudo os países ricos que destruíram as suas florestas e crianças, e gerem mal o «território») devemos contribuir para o pequeno resto de pulmão que nos resta – porque não contribuímos todos (é a justiça dos impostos…) para um número «racional» de filhos? (...). 
Manuel Alte da Veiga, Professor universitário aposentado.

1 comentário:

Carlos Ricardo Soares disse...

Vejo um nó cego no problema do hóspede que mata o hospedeiro, sobretudo porque hóspede e hospedeiro são duas ramificações do mesmo tronco.
Talvez a Terra, de que somos uma extensão pensante, antes de sabermos que o éramos, seja autofágica.
O planeta não está isento de culpas. Todas as culpas humanas são culpas do planeta. O planeta Terra não é um alter, relativamente aos humanos.
Nós somos o cérebro, os olhos, o pensamento, etc..., do planeta.
Ou o planeta perdeu o controlo, a ligação mais do que umbilical, que sempre teve connosco? Seremos nós a loucura do planeta? Terá endoidecido?
Creio que o planeta faz e acabará por fazer o que tem de ser feito, louco ou não, independentemente do que, na nossa perspetiva, devia fazer (as leis dos homens podem ser violadas, mas será isso um problema para as leis invioláveis do planeta?). O planeta também somos nós.
Quando tivermos de sair daqui, talvez possamos colocar as questões de outro modo.

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