terça-feira, 27 de novembro de 2007

A moda dos alimentos enriquecidos


Nas férias de Verão publicámos alguns textos da nutricionista Ana Carvalhas, a quem de novo pedimos um "post". Aqui está:

A rápida evolução das ciências da alimentação e nutrição nas últimas décadas veio modificar os nossos hábitos de comer, que passaram a estar intimamente ligados à prevenção e à cura de doenças. Os investigadores identificaram vários compostos bioactivos (nomeadamente, compostos de origem vegetal, designados por fitoquímicos) com efeitos positivos na saúde, os quais têm sido aproveitados por uma indústria alimentar sempre ávida de aumentar a venda dos seus produtos. Por outro lado, cada vez mais pessoas se preocupam com aquilo que ingerem de modo a prevenir enfartes, tromboses e cancros, entre outras terríveis patologias, e, portanto, acrescentando anos à sua vida.

Com apregoados objectivos de nutriprevenção e nutriterapêutica, encontramos hoje nas prateleiras dos supermercados leite enriquecido com ómega-3, cálcio, vitamina D e isoflavonas de soja, margarinas com fitosteróis, água com fibras, iogurtes que baixam o colesterol, ovos com ómega-3 que foi adicionado na ração dos aviários, etc. Enfim é tal a proliferação de produtos enriquecidos que temos de perder algum tempo à procura de um litro de leite de vaca que pastou na Natureza, de uma dúzia de ovos postos por galinhas normais ou de um pacote das velhinhas bolachas “Maria”. A questão é: haverá realmente vantagens em consumir alimentos enriquecidos?

De facto, nenhum destes produtos consegue substituir os alimentos próprios da época, frescos ou bem conservados, que devem ser variados todos os dias. De facto, os alimentos tal como nos chegam da Natureza podem fornecer todos os nutrientes que necessitamos. O leite, por exemplo, sempre conteve cálcio em quantidade suficiente para satisfazer as nossas necessidades diárias. E só em situações muito especiais poderá haver vantagem num complemento deste mineral. Uma coisa é certa: se o cálcio for a mais, o organismo terá de o excretar, pois, caso contrário, a sua lenta deposição por todo corpo transformar-nos-ia em estátuas. Felizmente que os rins trabalham para eliminar o cálcio excedentário, embora exista a possibilidade de formação de cálculos.

Por outro lado, a quantidade de ácidos gordos ómega-3 adicionada ao leite ou às bolachas para prevenção cardiovascular fica muito aquém do que seria necessário e falta provar se têm o mesmo efeito dos que são ingeridos quando se come peixe gordo (sardinha, salmão, atum, cavala, etc.), que é o “ambiente” natural dos ácidos gordos ómega-3.

A fim de baixar o colesterol, alguns alimentos são enriquecidos com fitosteróis, moléculas de origem vegetal que têm uma acção benéfica, embora muitíssimo pequena, na redução do colesterol. No entanto, não é ainda bem conhecida a sua acção quando são adicionados à margarina e aos iogurtes.

Os produtos enriquecidos podem ser uma alternativa pontual, desde que haja uma orientação da dieta alimentar, mas é melhor fixar as nossas escolhas nos alimentos frescos, simples e variados. A absorção dos nutrientes deve ser preferencialmente feita através dos alimentos onde eles existam naturalmente, sempre com conta, peso e medida.

A nutriprevenção e nutriterapêutica são mesmo úteis, mas de uma forma orientada e com base em alimentos da época. Os fabricantes bem podem louvar os seus produtos com publicidade científica ou pseudo-científica. Mas os consumidores que somos nós devemos evitar que a propaganda da indústria alimentar nos leve a escolher alimentos enriquecidos cujas vantagens são discutíveis mas cujo preço é indiscutivelmente mais elevado.

5 comentários:

Manuel Rocha disse...

Será que as pessoas ainda sabem quais são os alimentos "próprios da época"?
Tenho dúvidas, mas adiante...

Além de outros, este post tem ainda o mérito de remeter para quem de direito a obrigação de procurar informação e agir em conformidade: o próprio consumidor !

Perante o hábito generalizado e extremamente cómodo de remeter para a entidade "abstracta" a que se chama Estado a obrigação de tudo e do seu contrário, é encorajador saber que há pessoas de bom-senso !

avelaneiraflorida disse...

"BRIGADOS" por este post!

Um tema que nunca é por demais salientar...
parece que toda a gente sabe tudo...mas a prática é bem diferente!!!!

Anónimo disse...

nos países de primeiro mundo os alimentos enriquecidos já não são necessários. Mas no Brasil e na África, por exemplo, o enriquecimento é necessário: por exemplo o enriquecimento da farinha de trigo com ácido fólico terminou, praticamente, com crianças nascidas com espinha bífida; o enriquecimento das bolachas maria com ferro( apenas duas bolochinhas por dia ), terminam com a anemia infantil; e o sódio, acrescido ao sal evita o bócio endêmico muito comum no Brasil há algumas décadas atrás.
De tal modo o enriquecimento alimentar é necessário por aqui.
Anton Dytz, porto alegre, rs, brasil.

Anónimo disse...

anton retifica: o iodo acrescido ao sal,evita o bócio o invés de sócio ao sal.

Anónimo disse...

conheci o blog hoje. É uma maravilha. Vou indicar para meus amigos.
anton

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