segunda-feira, 19 de setembro de 2011

O GENOMA DO BACALHAU - e o seu singular sistema imunitário!




Nota publicada no Diário de Coimbra.

O genoma do bacalhau do mar do norte, respondendo na nossa mesa como sendo da Noruega, e entre os cientistas por Gadus morhua, foi publicado na revista Nature. A sequenciação do genoma, por um consórcio internacional de cientistas maioritariamente noruegueses, anotou cerca de 22 mil genes e apresenta resultados muito interessantes sobre a complexa adaptação termal deste grande peixe teleósteo às águas gélidas.

Pescado pelos marinheiros portugueses, pelo menos desde o século XIV, os seus genes codificam alterações estruturais nas proteínas do grupo das hemoglobinas encarregues de transportar oxigénio nas baixas temperaturas do mar do atlântico norte. Muito curiosa é também a inexistência, no seu genoma, dos genes associados a proteínas importantes para a imunidade, nomeadamente os do MHC II (Complexo Principal de Histocompatibilidade II) e CD4 (uma glicoproteína receptora existente na membrana dos linfócitos T, entre outras células do sistema imunitário), revelando assim uma arquitectura imunitária muito pouco comum entre os vertebrados já sequenciados.

Segundo os autores, os resultados obtidos e apresentados neste trabalho, recentemente publicado, permite evidenciar a nível molecular (!) o resultado da forte pressão induzida, sobre esta espécie de bacalhau, pela sua captura intensiva pelo homem. Esta acção ficou, de alguma forma, registada na evolução recente do seu genoma, o que sugere que a captura selectiva e intensiva de espécies pode alterar a trajectória evolutiva de características comuns às populações naturais, tonando-as divergentes. Nada que os evolucionista já não soubessem mas que agora a genômica corrobora.

António Piedade

3 comentários:

São Canhões? Sabem mesmo a manteiga... disse...

vá lá pensava que era o Carlos Reis

óia quessa asserção de captura e alteração....

nº de exemplares

amostragens significativas retiradas de paleo-capturas num há né?

São Canhões? Sabem mesmo a manteiga... disse...

We find a highly expanded number of MHC I genes and a unique composition of its Toll-like receptor (TLR) families. This indicates how the Atlantic cod immune system has evolved compensatory mechanisms in both adaptive and innate immunity in the absence of MHC II. These observations affect fundamental assumptions about the evolution of the adaptive immune system and its components in vertebrates....

não vi nada do restante tem uns Powerpoints nices

um livro sobre evolução disse...

São de facto resultados fascinantes. O que começou por ser mais uma sequenciação de uma espécie economicamente importante -e que se tem mostrado difícil de “domesticar”- acaba a questionar todo o conhecimento sobre a evolução do sistema imunitário. E vem mais uma vez demonstrar o papel da duplicação de genes na adaptação, uma vez que a mesma equipa identificou uma expansão no número de genes da classe MHC I.

Só não concordo tanto com o último parágrafo; não interpretei os resultados descritos assim. No artigo os autores referem que analisaram o transcriptoma de outras 3 espécies gadiformes e estes aparentemente também não têm (ou não expressam) os mesmos genes. E que numa espécie taxonomicamente distante tinha já sido observado uma expansão no número de genes MHC II semelhante à que se observa no bacalhau, embora provavelmente esta esteja associada à falta de polimorfismo nos genes MHC II e não à ausência de genes. Ainda que os dados sejam diferentes, esta análise comparativa deixa supor que a evolução deste sistema imunitário singular seja uma característica derivada nos gadiformes. O legado de um ancestral comum que se adaptou a águas geladas e com um comunidade de agentes patogénicos muito particular?

E embora não tão espectacular como a descoberta de um sistema imunitário tão único, esta primeira análise do genoma do bacalhau mostra a contribuição da hemoglobina na adaptação termal, através de um complexo mecanismo de compensação. No fundo, parece simples: se um alelo tem menor afinidade para o oxigénio, aumenta-se a sua síntese!

[e agora lembrei-me de que há um artigo muito interessante sobre o papel da hemoglobina na adaptação ao frio; vou procurá-lo e depois envio-to]

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