Jean Daniel, fundador do Le Nouvel Observateur, privou com Albert Camus, foram amigos, distanciaram-se, apesar de terem continuado unidos na profissão e no pensamento. A morte prematura do jornalista-filósofo-escritor-editor não permitiria uma reaproximação em presença, o que, de resto, não seria necessário: Daniel ficaria, para sempre, com Camus.
O livro que publicou em 2006 na Gallimard revela o encontro entre duas pessoas que, nas grandes e pequenas batalhas que o jornalismo convoca (e além dele) se pautaram, sem cedências, pelo humanismo.
É precisamente este conceito que se revela como o centro do livro, numa reflexão pouco linear mas indubitavelmente real: por não estar terminado e, nessa medida, implicar procura não isenta de erros; por levar, em certas ocasiões, à mudança de rumo que se tinha por certo e procurar novo caminho; por envolver coragem para pensar e agir em consciência, ainda que isso aconteça ao contrário do que está estabelecido.
Diz Daniel:
"Maravilhei-me um dia perante Camus por ele ter podido encontrar, tão jovem e com tanta facilidade, a força para se opor, a todos os seus, quando resolveu indignar-se, e com que soberba, pelo facto de a explosão da primeira bomaba atómica sobre Hiroxima poder ter sido saudada com um entusiasmo sem reticências. Negligenciando o facto (enorma, gigantesco!) de a nova invenção anunciar o fim da guerra, Camus receava já encontrar o homem na posse dos meios de destruir não só o inimigo, como a sua espécie. É preciso compreender em que consistiu a solidão desse grito e a coragem insólita de, na época, publicar a sua expressão. Como nos podemos escutar a nós mesmo quando somos os únicos a pensar? Como teremos confiança em nós mesmos? Perguntas que sempre me haveriam de atormentar. Como poderemos ousar persuadir-nos de que estamos certos, quando aqueles que admiramos discordam de nós?" (página 33).
E, mais adiante:
"Camus tem as suas receitas pessoais (...) quando não hesita em declarar que se enganou e que, daí em diante, tudo fará para manter os valores morais, mesmo que essa expressão pareça ridícula aos pedantes do realismo histórico. E quando pede aos intelectuais - e aos jornalistas! - que observem quatro obrigações: «1. Reconhecer o totalitarismo e denunciá-lo. 2. Não mentirem e saberem reconhecer o que ignoram. 3. Recusar dominar. 4. Rejeitar em todas as ocasiões e seja qual for o pretexto todo o despostismo, mesmo provisório», temosa sensação de possuir por fim estas regras de vida que nos protegem dos mais sanguinolentos desvios. (...) Como pilar filosófico de todas estas regras, havia a prevalência do facto moral (...) o que conta para mim é o facto de, em Camus, a moral não ser moralismo. Se se pode dizer que, em ceryos aspectos ele era nietzschiano, é no sentido em que a denúncia da impostura decanta a ética" (página 127).
segunda-feira, 26 de setembro de 2011
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