terça-feira, 19 de abril de 2011
Pontos de vista sobre a política e os políticos
“A política é a ocupação dos ociosos, a ciência dos ignorantes e a riqueza dos pobres. Reside em S. Bento…” (Eça de Queiroz, 1845-1900).
Do comentário de Carlos Albuquerque ao meu último post, “Será que a política em Portugal não tem emenda?" (18/04/2011), retenho e transcrevo o final: "Escolhem-se políticos assim e depois diz-se que a culpa é da política? Não, não é a política que tem culpa”.
Desde já o confesso. Hesitei no título do meu post, entre o escolhido e este: "Será que os políticos em Portugal não têm emenda?" Mas pensei, como a política é feita pelos políticos, vem tudo a dar na mesma. E, nesta hesitação, ocorreu-me o nome de Rafael Bordalo Pinheiro, que criou a figura da política representada por uma porca e os bacorinhos a sugarem-lhe sofregamente as tetas . Ora como os políticos são adultos, já estou como Eça, porque não se experimentam por uma vez as crianças? Mas, como as crianças são o espelho do caldo social em que o genoma mergulha, tudo ficaria, provavelmente, na mesma. E mudar só por mudar...
Este insustentável estado de coisas, em que a política dos politiqueiros tem encontrado terreno fértil, e dado sustento, para utilizar um lugar-comum, não a quem quer servir a res publica mas a quem se quer servir da República, pode encontrar exemplo na tristíssima história do gravador citada no supra comentário. Ou seja, é difícil procurar resposta para uma política séria. Uma política tal como a que preocupou os filósofos da Antiguidade em discussões sobre o melhor sistema político, designadamente colocando em causa a própria democracia quando Sócrates disse não gostar da democracia "quando os que nos governam não são os mais competentes"! Aqui, sim, nesta perspectiva talvez tivesse sido mais acertado da minha parte substituir, no título do meu post, política por políticos.
E, neste pantanoso campo de discussões infindáveis, encontram os politólogos um campo de estudo controverso de crítica, simultânea, ao capitalismo e à própria democracia sem, por vezes, terem em linha de conta a queda do Muro de Berlim, a emergente China – um único país e dois sistemas políticos - , e uma Cuba em tímido período de auto-crítica dos governantes de um regime ditatorial que se dizia em luta contra a anterior imoralidade de costumes acabando com os lupanares do ditador Baptista mas que vai tolerando essa prática sob o “manto diáfano” da sua ocultação. Que nos resta, portanto, de hossanas ao comunismo quando Alexander Soljenitzin nos disse que “o relógio do comunismo já soou todas as badaladas”? Ou num tempo em que “os revolucionários em Portugal já não são o que eram; agora identificam-se pelos seus fatos listados e telemóveis topo de gama”? (Finantial Times, 10.Março.2004)? Apenas uma agressiva Coreia do Norte armada até aos dentes e em busca incessante por armamento atómico!
Mas voltemos à política nacional. Em minha opinião, o que se passa na política em Portugal resulta de uma situação que emperra os destinos de um povo que foi enganado PEC atrás de PEC (por políticos que “prometeram construir pontes onde não existem rios”, em citação de Nikita Kruschev) como se esses PECs fossem o abre-te sésamo de uma bonança que se seguiria à tempestade de uma bancarrota há muito prenunciada em plúmbeas nuvens. Em renegação a qualquer encontro com o FMI, surge-nos agora Francisco Louçã, em atitude "patriótica", a proferir, com autoridade académica, narrações apocalípticas para o futuro do país, por um lado, e a anunciar, por outro, com esperança sebastiânica, que tem a solução secreta para os problemas financeiros e económicos de Portugal. Quiçá, porque como dizem os franceses, “les beaux esprits se rencontrent”, a mesma atitude é seguida pelo PCP e pelos Verdes como se houvesse apenas uma questão partidária e não uma grave questão nacional.
Em resumo, meu caro Carlos Albuquerque, ser prior desta freguesia (cheia de priores indesejáveis e pouco recomendáveis que nunca são julgados pelos seus actos, nem mesmo nas urnas) é algo complicado. Agradeço-lhe, portanto, a sua útil chamada de atenção para a política portuguesa, que pode ser um interessante ponto de partida para um debate que seria conveniente não findar aqui para que, em época de eleições, não subsista o meu pessimismo a respeito da classe política (com raras excepções, acrescento numa réstia de esperança!) por duvidar que o povo saiba fazer as suas escolhas em vez de ir votar, numa espécie de romaria dominical, porque se não tem mais nada para fazer... E, depois deste arrazoado, feito a eito e, provavelmente, sem jeito, volto ao princípio, pois me sinto obrigado a reflectir maduramente sobre a escolha do sistema político para Portugal, e, principalmente, sobre o perfil de confiança, respeitabilidade e honestidade dos seus executores.
Como deve estar recordado, Mouzinho da Silveira, "legislador de gabinete e cidadão liberal na alma de um antigo 'juiz de fora', ferido de mil catilinárias", não deixou de mostrar todo o seu desencanto pela política (ou politiquice) do seu tempo aconselhando o próprio filho a fugir a sete pés de “seitas e partidos como uma lepra do tempo”. Em contrapartida, outros há hoje que correm para os seus generosos braços a sete pés sem pensarem em servir o povo… mas pensando seriamente em se servirem a si próprios. E, quando saem de motu proprio da política nacional, ou dela são obrigados a sair, têm sempre uma porta aberta em Portugal, na actividade privada, ou no estrangeiro, onde beneficiam de mais grossos e chorudos cabedais em cargos oficiais da União Europeia.
Mas regozijemo-nos, Portugueses! Nem tudo está perdido…Temos três equipas de futebol nacionais nas semi-finais da Liga Europa (a ocuparem as primeiras páginas dos jornais desportivos e não desportivos, e em jornais de referência ou não) com fortes possibilidades de virem a erguer a respectiva taça para glória maior dos nossos governantes. No tempo da outra senhora, dizia-se ser o futebol o ópio do povo. E hoje, não é?
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17 comentários:
O problema não está certamente só nos políticos e na política, mas espera-se deles o exemplo e são eles quem de facto tem mais poder para mudar as coisas.
Quando o estado ano após ano gasta mais do que ganha e evita as decisões decisões difíceis que custam votos, não é de espantar que tanta gente siga o exemplo e viva do crédito e em estado de negação quanto à sustentabilidade de tal modo de vida.
Agora tem de ser o FMI a tomar as decisões difíceis que os sucessivos governos não quiseram tomar e o povo assinou por baixo votando sempre nos que menos impostos prometem.
O problema não tem solução simples nem fácil e há que ultrapassar alguns mitos como o de que a democracia é só votar ou que é preciso seguir o exemplo da China (é um facto que trabalham muito mais mas os 10% de crescimento ao ano vêm também do facto de que estão menos desenvolvidos, há grande exploração dos trabalhadores, desrespeito pelo meio ambiente, baixa qualidade dos produtos e muita contrafacção, ou seja, aproveitam-se do trabalho de outros).
Talvez o ponto de partida para a mudança seja uma alteração à consituição para que não seja possível haver défice. Se tal acontecesse, o governo seria automaticamente destituido e o primeiro-ministro e todos os ministros e governantes de topo das áreas com défice seriam impedidos de serem novamente eleitos. Afinal não é o que acontece se falharmos no pagamento da prestação do crédito à habitação? Levam-nos a casa e ficamos com mau crédito.
Tem havido muitas mudanças positivas no estado nos últimos anos, particularmente no que diz respeito na eliminação da burocracia, mas infelizmente já vieram tarde e não se focaram o suficiente na questão do défice.
P.Santos
não no tempo da outra senhora o futebol era pra homes de barba rija
ahora até mulheres atiram pedradas à polícia
logo hoje o futebol é um acto democrático
Que maravilha, Professor Rui Baptista!
É um prazer ler os seus artigos!
EXCELENTES!
Maria Nazaré Oliveira
Nada existe de pior
do que a política activa,
onde o termo pundonor
é flor que não se cultiva!
JCN
"E, todavia, o país sempre vale um pouco mais que a inteligência daqueles que o governam" (Ramalho Ortigão, in Farpas, Abril,1876)
NF
Se me permite Sr. Rui Baptista.
Ninguém é curioso por saber de onde é a origem deste pensamento em construir pontes sem rios? Discussão além da política, ao sub-produto por reflexos na política.
O apetite da cultura portuguesa ao que verte e é treinada para a sabedoria, em todos os níveis dos trejeitos possíveis, fato eleva seu comportamento modelando como ideal de conduta e passividade, ao ponto de desentenderem-se e não conseguirem converter soluções. Para tanto é reflexo da igualdade dos seus, que isola e determina um padrão de opiniões em que a razão, perde-se, anula-se (desconfigura) por ela ser de todos.
Sobre o encantado que caminha...
O mundo oscila desde a evolução com variáveis, entre as condições do avanço humanístico que procedem na horizontal, sendo que para o econômico caracteriza-se na vertical. Na linha vertical a feição do tratamento competitivo inclui além de disposições, considerações, não de ancoragem, mas de lastro tendo por ambigüidade na confusão do peso em denotado concílio de ações da competição por vias de regra. Pois o avanço do conhecimento tem por contradição emperrar a percepção para acirramento econômico, ao que tange dias mais agressivos em exigir práticas e tácticas de sobrevivência. De tal modo assimilaram por gerações o distanciamento da natureza sem escrúpulos, inconseqüente e de inconsciência pela corrida econômica mundial. Diante do vosso conforto por satisfação do saber e acomodação da prudência, sendo que esta avançou o sinal dos tempos sem tirar proveitos. Pois ao que tange a falta da percepção portuguesa cujo grau ou nível de estudo, distancia-os da astúcia competitiva, é que tem por condenar o mau comportamento de práticas que impulsionam e posicionam como decisivas no mundo dos negócios. Aliás, são vítimas destas, por nem aperceberem-se, devido ao condicionamento de vossa cultura. Que tão somente entende por degeneração e humilhação à muitos tratamentos revertidos como ideal do mercado, e, quando ao desviar destes, são penalizados por imbuídas situações, cujos valores do aprimoramento intelectual e metafórico não assimilam como digno ou libertário. Sendo ainda que o metafórico, concorre acobertado na consistência da língua, 244 milhões de criaturas que amparam as apunhaladas ao sacrifício desta inércia educativa, que a competitividade tem sangrado e perdurado pela dificuldade do límpido e extraordinário entendimento humanitário. Tal é a magnitude da perspectiva que desenlaça o desafio pela inovação da postura e consciência de uma nova realidade.
Em consonância com Ramalho Ortigão:
Mais pequeno que a nação
que se chama Portugal
é quem tem tido a missão
de governá-la... tão mal!
JCN
Prezada Maria Nazaré: Que responder-lhe? Obrigado pelas suas gentilíssimas palavras. Permita-me que lhe envie um respeitoso abraço de muita gratidão. Rui
Cara Cláudia da Silva Tomazi: Não percebi a razão em me pedir permissão para dar a sua opinião no comentário que subscreve. Essa permissão insere-se num princípio que muito prezo: a liberdade de expressão. Em nome desse princípio, agradeço-lhe o seu comentário. Uma boa Páscoa.
Prezado P. Santos: Diz o povo que só nos lembramos de Santa Bárbara quando troveja. Infelizmente, caem raios e coriscos sobre a política portuguesa que chegou a extremos de ocultar dos portugueses que o défice tinha chegado a valores insustentáveis que se irão reflectir nas suas bolsas pondo em causa a desgovernada casa lusitana que passa a ser tutelada do estrangeiro e por estrangeiros.
Ora, o comentário de NF, em transcrição de Ramalho : “E, todavia, o país sempre vale um pouco mais que a inteligência daqueles que o governam”. Mas será, apenas uma questão de inteligência?... Em política. há coisas piores do que a estupidez!
Caro Doutor JCN: Obrigado pelos seus versos que sintetizam o que lhe vai na alma e espelham no coração de muitos portugueses o desânimo pela actual situação do país em que não podem ser deculpabilizados os políticos de uma política desastrosa.
Prezado "one hundred trillion dollars":
No far-west deste país, em nome de uma igualdade de sexos naquilo que de pior existe na condição humana (o desrespeito pelos outros)o futebol deixou de ser só para homens de barba rija... Enfim, sinal dos tempos!
Conforme se preconiza,
para a vergonha perder
uma só coisa é precisa:
a política exercer!
JCN
A política, enquanto governo dos interesses públicos, é muito mais vasta do que a actuação dos políticos e inclui também o modo como os avaliamos.
Em democracia os cidadãos têm uma palavra a dizer sobre os políticos. Em contrapartida é difícil reunir toda a informação necessária a uma boa avaliação dos políticos. Mas o que me parece pior é aceitarmos/cairmos no princípio de que são "todos iguais". Isso é o que os piores dos políticos querem que pensemos!
Como é que nos querem levar a pensar que são todos iguais? Exigindo que sejam todos santos. Como nenhum é santo, logo são iguais.
Se não esperarmos que sejam todos santos mas formos capazes de hierarquizar a gravidade dos comportamentos dos políticos, passaremos a ter um papel moralizador e passaremos a ter melhores políticos.
Quando vejo ataques genéricos aos políticos fico logo preocupado por se estar a seguir o que pretendem os piores políticos: que não avaliemos os seus actos objectivos mas que escolhamos por inércia, baseados em impressões superficiais, etc. É que as nossas impressões superficiais são facilmente alteradas desde que se tenha dinheiro para pagar agências de comunicação, comentadores nos blogues e jornais, etc.
Prezado Carlos Albuquerque:
Claro que não comungo do pessimismo maniqueísta de entender que os políticos são todos péssimos. Aliás, este parágrafo do meu post o atesta. Transcrevo-o:
“Em resumo, meu caro Carlos Albuquerque, ser prior desta freguesia (cheia de priores indesejáveis e pouco recomendáveis que nunca são julgados pelos seus actos, nem mesmo nas urnas) é algo complicado. Agradeço-lhe, portanto, a sua útil chamada de atenção para a política portuguesa, que pode ser um interessante ponto de partida para um debate que seria conveniente não findar aqui para que, em época de eleições, não subsista o meu pessimismo a respeito da classe política (com raras excepções, acrescento numa réstia de esperança!) por duvidar que o povo saiba fazer as suas escolhas em vez de ir votar, numa espécie de romaria dominical, porque se não tem mais nada para fazer... E, depois deste arrazoado, feito a eito e, provavelmente, sem jeito, volto ao princípio, pois me sinto obrigado a reflectir maduramente sobre a escolha do sistema político para Portugal, e, principalmente, sobre o perfil de confiança, respeitabilidade e honestidade dos seus executores”.
Ou seja, apenas receio que, por culpa de políticos incompetentes ( e de outros que nunca lá estiveram dizendo ter receitas milagrosas para a salvação da pátria que ficam no segredo dos deuses ou dos paus carunchosos dos seus santos milagreiros) que se perpetuam no poder numa espécie de dança das cadeiras, ou de feira das vaidades, estejamos desesperançados quanto ao futuro que nos espera depois de um passado recente de fundos comunitários europeus que jorraram caudalosos, anos a fio, afogando-nos, por má ou mesmo dolosa gestão, hoje, na “vil e apagada tristeza” a que chegou a economia dos países europeus periféricos como Portugal à cabeça onde a riqueza criada pelo país tem vindo a decrescer década após década: 7,5 %, 4,5%, 3,2%, 2,7%, 0,7%, respectivamente nas décadas de 60, 70, 80, 90 e primeira década de 2.000. Refira-se que a década de 70 se reporta ao tempo da Guerra do Ultramar em três frentes de combate: Angola, Moçambique e Guiné.
Isto é, não são os regimes políticos, por si só, que dão de comer ao povo. E muito menos os políticos que escondem desse povo realidades em que o pior cego é aquele que não quer ver. Ou por conveniência própria, ou por ignorância ou, ainda, por puro masoquismo.
Pessimismo doentio o meu? Comungo da opinião de um saudoso amigo que em vida me dizia: "Prefiro ser um pessimista que se engana a seu um optimista que se engana".
A exemplo, oxalá que o futuro próximo da política portuguesa me vanha dizer que me enganei no meu pessimismo.
No 3.º §, penúltima linha: corrijo "década de 70" para década de 6O.
É gralha sobre gralha: na penúltima linha do último § do meu comentário (22.Abril; 18:46):venha, não vanha...
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