Transcrevo o perfil que sobre mim traçou a jornalista do "Público" Teresa Firmino, no suplemento dominical daquele jornal que foi especialmente dedicado à quadra natalícia:
Um pouco mais de saber - Carlos Fiolhais, físico, 54 anos
Gosta de comunicar a ciência a toda a gente, ou não tivesse já escrito vários livros de divulgação científica, o que costuma fazer com humor. Por isso, o desejo de Carlos Fiolhais, de 54 anos, é sobre a produção do próprio conhecimento e a sua divulgação. "O que qualquer cientista quer dar à humanidade é mais ciência, isto é, quer acrescentar mais um bocadinho de saber ao que já se sabe", diz o físico da Universidade de Coimbra.
"Sabemos pouca coisa sobre o próximo ano (o físico Niels Bohr observou com fina ironia: 'É muito difícil fazer previsões, principalmente sobre o futuro'). Mas uma coisa sabemos com certeza, pois todos os anos tem sido assim: no próximo Natal saberemos mais do que neste. Nos laboratórios e institutos de todo o mundo, incluindo o meu em Portugal, enquanto a Terra dá mais uma volta ao Sol, irá fazer-se mais ciência, ciência essa que será publicada em revistas ou arquivos electrónicos e ficará à disposição da humanidade."
É precisamente por isso, diz, que os cientistas são em geral pessoas optimistas: "Sabem que amanhã saberão ainda mais. E que, por isso, se viverá melhor."
Doutorado em física teórica na Alemanha, na Universidade Johann Wolfgang Goethe, em Frankfurt, Carlos Fiolhais publicou um artigo científico, em 1992, que já foi citado 7802 vezes nos trabalhos de outros investigadores, o que é uma forma de aferir a sua relevância na construção sempre inacabada do edifício da ciência. "É o artigo mais citado de sempre com um co-autor a trabalhar em Portugal." E o seu segundo artigo mais citado é... uma errata àquele artigo. "Até a pequena correcção já foi citada 528 vezes", e ri-se.
Porquê tantas citações? Porque o artigo apresenta uma nova fórmula matemática que descreve a ligação dos átomos entre si — a sua cola —, que torna possível a formação de moléculas, sólidos e superfícies. "Por que existe a água? Porque há dois átomos de hidrogénio que se juntam a um átomo de oxigénio. Há uma ligação, uma cola", exemplifica. Ainda hoje essa fórmula tem grande aplicação em trabalhos de química, nanotecnologia, biologia ou engenharia de materiais — "os exemplos são tantos, que se somam as citações".
Como divulgador científico, acaba de publicar, com o físico Décio Martins, uma Breve História da Ciência em Portugal. Neste pequeno livro é resumida a ciência feita por cá desde o tempo dos Descobrimentos até ao final do Estado Novo, passeando-se por nomes como Pedro Nunes, Garcia da Orta, Egas Moniz ou contribuições como o aperfeiçoamento da caravela, a criação do astrolábio náutico ou a descoberta da doença dos pezinhos.
O seu livro Física Divertida (Gradiva), de 1991, é um best-seller que já vendeu 20 mil exemplares em Portugal. As conferências que deu em muitas escolas ajudaram a inspirá-lo nas histórias de física que aí conta: "Ia a muitas escolas — era um caixeiro-viajante — e contava aquelas histórias aos miúdos. A reacção deles permitiu-me aperfeiçoá-las e contá-las de maneira humorística."
O seu desejo de que se produza mais conhecimento leva-o a parafrasear outro gigante da física, Isaac Newton, que um dia afirmou: "Sou apenas uma criança que brinca na praia, enquanto oceanos de verdade estão por descobrir diante de mim." Metaforicamente, Carlos Fiolhais resume assim o seu sonho como cientista: "Encontrar, na orla da ignorância, um seixo, uma concha, uma estrela-do-mar que ainda ninguém tenha visto antes e dá-la a ver..."
Teresa Firmino
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