quinta-feira, 25 de agosto de 2011

A Avaliação Docente para as Calendas Gregas?


Novamente se discute o problema da avaliação docente que tem o problema de sempre: não agradar a gregos e a troianos. Correndo, assim, o perigo de se transformar numa discussão sem fim à vista por sofrer do pecado capital de se dirigir a uma actividade profissional que nunca se constituiu num corpus profissional, a exemplo de outras actividades profissionais tidas de interesse público pela exigência de formação, atribuição de título profissional e, principalmente, responsabilidade perante a sociedade dos actos técnicos e éticos (repito, éticos) dos seus agentes.

Ou seja, uma actividade profissional representada perante os poderes públicos a uma só voz em questões que não se esgotam (ou deviam esgotar) em fronteiras meramente sindicais, como sejam, questões meramente laborais: horários de trabalho e grelhas salariais, por exemplo.

Um dos cavalos de batalha dos sindicatos para que o acesso ao topo da careira docente seja um canal aberto de acesso a todos os professores, por desempenharem as mesmas funções e por isso deverem ter tratamento igual (e que tanto aceitação teve da classe docente no antigo regime de avaliação docente), sofreu o revés de se desdizer a si própria quando a ex-ministra Maria de Lurdes Rodrigues estabeleceu quotas de acesso aos escalões superiores e os professores se rebelaram contra o facto de serem preteridos os melhores pelos piores. Ou seja, aqui deixaram os professores de ser todos iguais! Dito de outra maneira, os sindicatos mostram-se receptivos a um sistema de avaliação em moldes da avaliação que igualava desiguais, a maior injustiça social que um estado democrático deve consentir.

E neste diz-tu-direi-eu, entre o Ministério da Educação e mais de dezena e meia de sindicatos docentes, numa mesa de negociações qual Torre de Babel, o desenlace do desentendimento negocial corre o risco de nunca mais ser alcançado. Et pour cause, os interesses da Educação Nacional correm o risco de se esgotarem aqui deixando para trás os verdadeiros problemas que respeitam aos alunos, suas famílias (que se vêem gregas para esticar o orçamento familiar para a compra dos simples manuais escolares) e à própria sociedade portuguesa que não pode continuar refém destas tricas que se não compaginam com o interesse público que deveria estar estabelecido para o exercício da actividade.

Já é tempo de ser posto cobro a esta situação de verdadeiro banho-maria procurando soluções outras de, entre elas, a decisão final competir ao Ministério da Educação que não pode continuar refém de interesses meramente sindicais que pretendem alastrar as negociações para além de limites toleráveis. Como tudo na vida, a tolerância tem os seus limites.

27 comentários:

Anónimo disse...

Este post não é, em parte, verdadeiro. A FENPROF está aberta a negociar e analisar QUALQUER procedimento de avaliação proposto pelo ministério. O que não se aceita é uma avaliação com um resultado pré-definido por cotas. Isto é que não é aceitável por qualquer pessoa inteligente.

A avaliação resolvia-se de forma muito simples, como já se fez noutros países: faz-se um concurso, a nível de ministério, para preenchimento de umas centenas de vagas de um novo cargo - inspector-avaliador. Não é preciso papéis, nem coisa nenhuma. Estes inspectores-avaliadores têm livre trânsito para entrar em qualquer aula da sua área (inspectores de matemática para matemática, inspectores de música para música, etc), observarem sem incomodar o número de aulas que entenderem, para por fim atribuirem uma avaliação ao professor. É simples por uma só razão: há pessoas dotadas de autoridade conferida por concurso público para serem avaliadoras, em todas as áreas pedagógicas, em todos os distritos.

António

Cláudia S. Tomazi disse...

Quando se desconhece o impacto de qualquer ação de outrem e não sabemos o que temos de fazer por se querermos algo fazer, porém sabemos que se nada sabemos resta-nos aprender. A responsabilidade implica em “um ser pelo outro” ousar. Este corpus profissional existe claro que existe. Mas, de sua pessoal causa está a integridade do conjunto, e se me permite apenas um detalhe que vos não sejais pessimista em relação ao momento, porque está a desmerecer aquele que as vezes pouco expressivo apóia suas acções, embora seu nível de exigência de todo abrigue a perfeição, e diga-se não por vaidades, mas, bem próximo estás ao contínuo esforço, sendo sempre necessário este perseverar.
Mas, para aprender com esta liberdade é necessário algo anterior da humildade talvez, um respeito ao vislumbrar o próprio conhecimento à realidade de outros.

“Problema de sempre? Não agradar a gregos e troianos”
A humanidade deu certo! Prova disso é o ânimo de vossa pessoa pelo factor positivo que representa à ambos gregos e troianos. Ou, vai negar o apreço que todos tem por vos?

E peço desculpa pelo comentário se não atingiu vossa expectativas ou altura de causa mas na esperança de palavras que vos estimulem e de conforto ao apoio ao que vos sois para todo gosto ao certame, a quem das virtudes sustentam por expressar o devotado carisma em busca dos acertos e tão somente de pessoal certeza é que vos abriga as respostas para causa.

Por que vos ocupa a indignidade Sr. Rui Baptista?
Porque o saber é um estado de graça.

Anónimo disse...

Depois de aberto o melão
e provada uma talhada,
chegou-se à constatação
de não prestar para nada!

JCN

Rui Baptista disse...

Caro António:

Parafraseando-o, concordo consigo em parte.

Discordo do respectivo parágrafo inicial do seu comentário pelo simples facto de nas negociações anteriores, sobre o sistema de avaliação docente, a Fenprof (e os outros sindicatos da chamada plataforma sindical ) nunca terestado aberta a analisar qualquer proposta de avaliação. A única avaliação que não suscitou discordância foi aquela em que os professores ascendiam ao 10.º escalão por simples antiguidade como se os cabelos brancos, a maior parte das vezes, não fossem mais sinal de velhice e menos de sabedoria.

Concordo, plenamente, com a sua proposta da avaliação ser feita por um corpo inspectivo que se não faça anunciar para não se dar o caso da sua visita ser antecedida de um ensaio geral que não corresponda ao que se passa no dia-a-dia da docência do inspeccionado.

Já chega da de uma espécie de “Vira do Minho” entre pares: ora hoje avalias-me tu, ora amanhã avalio-te eu! Quisera eu ter a certeza de que um sistema de avaliação tendo como um dos parâmetros um corpo inspectivo devidamente formado e informado, e assim, capacitado para exercer uma acção estimulante e activa diagnosticando os males de uma deficiente acção docente e propondo uma terapia eficaz para a respectiva melhoria.

Mas acredita mesmo, que esta proposta tenha pernas para andar num sistema de avaliação igualitário (como até aqui) que pretende fazer crer que o mau exercício profissional só existe noutras profissões? Por mais boa vontade que eu possa ter, não acredito que os sindicatos acolham uma sugestão que persiga a finalidade de separar o trigo do joio para não ser criada a maior das injustiças de igualar desiguais como se estivéssemos numa sociedade clonada de uma célula de Rómulo de Carvalho.

Anónimo disse...

"um estado de graça"... que não se obtém de graça! JCN

joão boaventura disse...

Caro António

Quando refere que:

“É simples por uma só razão: há pessoas dotadas de autoridade conferida por concurso público para serem avaliadoras, em todas as áreas pedagógicas, em todos os distritos.”

Se nos ativermos ao que parece simples, dispensamo-nos de indagar o que se entende por “pessoas dotadas de autoridade”, e ainda como é que um “concurso público” pode conferir “autoridade”. É o mesmo quer indagar como é que é possível a autoridade, ou a legitimidade, por via de um concurso, ou dessa legalidade.

A simplicidade da razão deixa-nos perante um facto consumado, mesmo sabendo-se que a perfectibilidade não existe. Importa acima de tudo saber, para que a equidade e a justiça não sofra atropelos, em que é que consiste um concurso para avaliador, quais os temas que o suportam, quais as disciplinas impostas, e a que tipo de exame psicológico é sujeito um futuro avaliador para considerar que há professores, ainda que sabedores e senhores da matéria, disciplinados e empáticos com a turma, que se enervam, perdem o controle, e se sentem angustiados perante uma classe que vai tirar conclusões daquele cenário em que um estranho vai tomando notas da comunicabilidade do professor.

Na Idade Média não se faria melhor, mas o que sobressai deste tema martelado até à exaustão, é a necessidade que o governo tem de escalonar os professores, a fim de reduzir as promoções, o mais possível, e manter a maioria dos professores com o vencimento congelado, sob a capa de que os professores não são todos iguais e que há uns melhores que merecem subir de escalão. Como diz um rifão chinês “os homens são todos feitos da mesma massa, mas os modelos são diferentes”.

Como vivemos num mundo-cão, não nos repugna antever um futuro cenário de todos os inspectores numa sessão de esclarecimento com o governo em que este avive a memória daqueles sobre a necessidade de encontrar formas de não subirem muitos professores de escalão, porque os fundos do erário vão escasseando. Mas mantenha-se o aparato de seriedade.

Não se inventa, extrapola-se o que se passou no governo socrático para não “reprovar alunos”, subindo-lhes as notas, porque o Eurostat só deseja informações, mesmo as falsas, e com isto o governo enganou-se a si mesmo, enganou os professores e desprezou os alunos.

Depois não conhecemos a arquitectura da avaliação, se o avaliador comunica as suas conclusões ao avaliado, se se trocam impressões, ou se aquela é secreta, e o avaliador é que é o sábio inquestionável e inquestionado.

Porque não chega esquematizar os pontos nevrálgicos que configuram a avaliação, preocupação primeira que tem ocupado os cérebros sobre a avaliação, como se toda a eficiência escolar dependesse da avaliação dos professores.

Há obsessões e fixações piores, mas esta coloca a profissão do professor no patamar do lixo. Importa por isso saber quais as artimanhas que se vão desenvolver, porque, dos governos, José Luís Borges diz, também simplesmente:

“A civilização ideal é aquela que tem governos que não aparecem” (1985), cuja ideia corriqueira pode se compaginada com a de que “o melhor árbitro de futebol é o que nunca se dá por ele”.

Cordialmente

Rui Baptista disse...

Compreendo, aceito e até concordo com as objecções levantadas, ou que venham a ser levantadas, a uma avaliação feita (ainda que mesmo só parcialmente) por um corpo inspectivo.

Mas também sei, por outro lado, que o óptimo é inimigo do bom, mas que continuar num constante impasse nesta questão faz com que a avaliação docente se eternize tornando o importante em acessório. E o importante me parece ser não continuar numa discussão de que se não descortina um final fazendo com que se não continue a igualar desiguais, o que, vai ao encontro desta perspectiva pessoana: "É preciso violentar todo o sentimento de igualdade que sob o aspecto de justiça ideal tem paralisado tantas vontades e tantos génios e que, aparentando salvaguardar a liberdade, é a maior das injustiças e a pior das tiranias".

Ou seja, a tirania dos medíocres e a injustiça de quem a consente! A Educação não pode estar dependente de um Moisés que desça do Monte Sinai com as tábuas da lei sobre ascondições a que deve obedecer uma perfeita avaliação docente. A avaliação docente, seja ela qual for, padecerá sempre das imperfeições humanas porque feita por humanos.

Rui Baptista disse...

No final da 1.ª linha do 2.º §, do meu comentário anterior, substituir "mas que" por "e que".

Cláudia disse...

A não prestar para nada
é a soberba dos ateus
que o bom Deus
do melão faz marmelada

Anónimo disse...

Prometer não falta quem,
pois fácil é prometer;
o difícil é fazer
sem desiludir ninguém!

JCN

joão boaventura disse...

O problema que se coloca ao avaliador é equivalente ao do que se põe ao inspector. Não se vai aqui desenvolver diferenças nem semelhanças mas apenas a fusão de ambas porque um avaliador é uma pessoa que vai inspeccionar o trabalho de um professor, e um inspector vai avaliar o trabalho de um professor.

Bem se sabe que há diferenças. O inspector é o que observa o processo de trabalho do professor e depois troca impressões com o observado. O avaliador é mais sofisticado: avalia, escreve o que viu e o que não viu, exactamente como fazem os árbitros que às vezes vêem coisas que ninguém viu. Depois entregam o texto da avaliação ao governo. E ao professor, como é lixo, não se dá satisfação nem cópia do relatório, não vá o professor contestar, e lá se vai a seriedade avaliadora, e a escrutinar-se as trapalhadas governativas.

Posto o problema neste pé, resta saber – e considerando que o governo está apostado em avançar com a agressão ao professorado – quais os pressupostos, ou que modos de fazer uma avaliação, ou inspecção pedagógica, vão configurar a actuação, porque, convém não esquecer que tudo na vida é teatro, e a representação do actor tem que assumir a presença em palco – na turma – ou de prepotente, ou de colaborador, ou de catedrático, ou de observador, ou de orientador, ou de esclarecedor, ou de exemplificador, ou de estimulador, ou de ajustador, ou de qualificador.

Nada disto se aborda a nível oficial ou a nível sindical. Porquê ? Porque a questão está posta ao nível económico. Ninguém deseja saber como vai ser avaliação. É preciso é andar para a frente: avaliar é avaliar e está tudo dito.

Põe-se o problema nesta equação porque o governo vai assumir o papel de entidade séria que deseja levar a cabo a avaliação-inspecção, mas porque a avaliação é algo abstracto (abstracto no sentido de não se conhecer a sua realidade, contornos, consequências), pelo que o governo vai agarrar-se à redacção seca dos normativos jurídicos, pão-pão, queijo-queijo, meia dúzia de observações, e está montado o painel dos avaliadores-inspectores. Tudo simples. Governar é fácil e o tempo urge.

Por norma as leis servem para resolver problemas imediatos, independentemente dos efeitos perversos (para isso terão o instrumento da revogação), primeiro porque dá muito trabalho investigar as causas que provocaram os “problemas imediatos”, e segundo porque as investigações levam muito tempo a apresentar as conclusões da causa-efeito.

Perante isto elabora-se o fácil: legisla-se, e logo se vê. E é assim que o governo vive de revogação em revogação, daí não haver problemas em instituir o quadro de avaliadores-inspectores, e respectivas funções e vencimentos. Isto é, pretende-se tirar euros aos professores para pagar aos avaliadores.

No senso comum, todos nós somos avaliadores do mundo que nos rodeia mas, porque não temos responsabilidade nos juízos interiorizados que do mundo elaboramos, a nossa responsabilidade é nula, dado que não temos que os transmitir a uma entidade oficial.

Isto se diz porque, de todo o aparato textual que se lê nos jornais sobre esta matéria que agride o professorado, não se vê um pensamento sério, mas um blá-blá ensurdecer, sem ponta por onde se pegue. Está visto: o professor não é lixo mas é tratado como se o fosse. Mas há que salvar os euros para o governo gastar nos avaliadores.

A escola que espere. O mundo ainda não acabou.

joão boaventura disse...

Caro António

Que diz S. Paulo, numa das “Cartas a Timóteo” ?

«Escrevo-te estas coisas, na esperança de ir ter contigo em breve. E, se tardar, quero que saibas como deves portar-te na Casa de Deus, que é a Igreja de Deus vivo, coluna e sustentáculo da verdade.

Eis o que deves proclamar e ensinar. Ninguém escarneça da tua juventude; antes, sê modelo dos fiéis, na palavra, na conduta, no amor, na fé, na castidade. Enquanto aguardas a minha chegada, aplica-te à leitura, à exortação, ao ensino.

Não descures o carisma que está em ti, e que te foi dado através de uma profecia, com a imposição das mãos dos presbíteros. Toma a peito estas coisas e persevera nelas, a fim de que o teu progresso seja manifesto a todos. Cuida de ti mesmo e da doutrina, persevera nestas coisas, porque, agindo assim, salvar-te-ás a ti mesmo e aos que te ouvirem.»

O que ele escreve seria o que qualquer avaliador-inspector deveria fazer, isto é, transmitir os seus conhecimentos aos professores da respectiva cadeira, para comunicar quais os obstáculos da matéria, de como ele os transpôs e do gosto que teria em trocar impressões com o mesmo, não na sala de aula, mas num gabinete isolado, para que a empatia permita criar à vontade da parte do professor.

Nestas circunstâncias, o avaliador estaria igualmente a ser avaliado pelo professor – supondo-se que o professor é uma pessoa responsável e que merece essa atenção – para confirmação de que, de facto e de direito, o avaliador também é uma pessoa responsável e que vai merecer essa atenção. Não basta merecer a confiança do Governo, deve merecer também a confiança do professor que vai ser classificado, para que não lhe impinjam gato por lebre. O professor desempenharia o mesmo papel do Governo que congemina oferecer os lugares de chefia mediante concurso - e não como antigamente, de acordo com a cor do Governo - mas depois os classificados, para ocuparem os seus lugares nos Ministérios teriam de merecer ainda a aprovação do respectivo Ministro.

Não sei se estão a esquadrinhar o mesmo filme nos concursos para avaliadores.

Mas S. Paulo era um pedagogo nato, e o avaliador, aquela figura obscura, metida no canto da sala, observando com olhar agudo e de testa franzida, silencioso, assumindo o papel de sábio prospector dos défices do observado professor, e preocupado com o facto do Estado só poder promover um ou dois professores ao escalão superior, sob pena de passar o Governo a ser desclassificado pela Troika. O protótipo do inquisidor da Santa Inquisição, porque uma das armas do poder será sempre o medo. Neste caso, o medo ou o terror de um professor ser mal avaliado, ou porque estava despenteado, ou porque não tinha gravata, ou porque há sempre argumentos para avaliar mal.

Espero que o exemplo de S. Paulo possa abrir as consciências para acabar com as malfeitorias que, como a avaliação, já pecam por excesso de tempo ocupado e desperdiçado. Ele não diz em que dia vai mas avisando que irá na próxima oportunidade mas que vá pensando nas instruções que vai dando para mostrar que sabe do que fala e espera o seu cumprimento, e nesta ida sem data fixa, o Timóteo (o Professor) acaba por se aplicar mais ainda para melhor o ensinamento, estando assim sempre bem preparado para acolher S. Paulo (o avaliador), o que se afigura mais pedagógico do que dizer com antecipação a data certa em que irá.

Sabe-se que esta metodologia não interessa ao Governo porque, para alcançar os seus objectivos, os avaliadores terão de ser distantes, ausentes, entrar na sala mudos e sair calados, e, pelo silêncio da noite fazerem um relatório que agrade ao Ministro.

A Escola, os Alunos, os Professores, não merecem tanto desperdício em minudências ministeriais e sindicais, mas o cenário parece estar já montado.

Haja Deus.

Anónimo disse...

Marmelada de melão
foi coisa que nunca vi:
só se for nalgum sertão,
tudo menos por aqui!

JCN

Anónimo disse...

Seja qual for o ministro,
ao mesmo tudo vai dar:
elaborar um registro
da maneira de ensinar!

JCN

Rui Baptista disse...

Já que santos ao pé da porta não fazem milagres, quiçá o filósofo Agostinho da Siva (1906-1996)justifique a minha posição inabalável de estar contra um sistema de avaliação docente que não distinga o mérito e penalize o demérito.

Escreveu ele: "A única salvação do que é diferente é ser diferente até ao fim, com todo o vigor e toda a rija impassibilidade"!

joão boaventura disse...

Caro Rui Baptista

Não questiono que todos somos diferentes, nem questiono que o Estado queira promover o mérito, e despromover o demérito. Nem questiono sequer a figura do avaliador. O que ponho em relevo é o que subjaz de seriedade, equidade, legitimidade e legalidade, da parte do Governo, e da pressa em concretizar a figura pálida do avaliador.

Porque é necessário saber as razões que levam o Governo a fixar afincadamente, com alma, com ardor, com persistência, empenho, teimosia, na avaliação dos professores. Pensa-se, e por ventura mal, que esta visão é negativa, e não melhora o ensino, nem motiva os professores.

È necessário recuar no tempo e descortinar as causas que provocaram esta medida do Governo:

1 – 25 de Abril. Pretendeu acabar com as desigualdades, argumentadas com o facto de os liceus acolherem os alunos das classes altas e as escolas técnicas, os alunos das classes baixas. No Liceu Camões, onde fui professor tive alunos filhos de motoristas, de ferreiros, de carpinteiros, de mulheres a dias, de viúvas que trabalhavam arduamente para melhorar a vida dos seus filhos…

2 – Para combater essa fictícia desigualdade, acabaram com os liceus e as escolas técnicas, e fundiram-nas em escolas secundárias, com efeitos que o tempo revelou: violência nas escolas entre alunos, de alunos e respectivas famílias contra os professores, com prejuízo para o ensino e a disciplina, porque se inculcava a ideia de que a liberdade abrileira permitia o desatino e a falta de respeito, sem discernimento, chegando-se ao ponto de levar a Procuradoria Geral a tomar medidas;

3 – Acresce que nos primeiros anos o Ministério da Educação esteve ausente, apesar de feliz por ter acabado com a desigualdade, e com as consequências que despontaram com a mistura dos desiguais, para serem iguais à força… na violência;

4 - Com o tempo, verificou-se que as mãos-de-obra qualificadas, que eram formadas nas escolas técnicas, tinham acabado o seu ciclo e iniciado a sua falta;

5 – O governo socrático, perante as duas evidências (violência nas escolas, e falta de mão-de-obra), quis solucionar os problemas à pressa e mal, e encontrou:

5.1 - quanto à primeira evidência, o mal nos professores, com o que tapava os erros cometidos com a mistura dos desiguais, segundo a nomenclatura revolucionária;
5.2 – quanto à segunda evidência multiplicou Centros de Novas Oportunidades, para qualificar profissões sem formação, ou falsamente formados, em força, à pressa, gabando-se das milhares mãos-de-obra criadas… sem qualificação.

6 – Paralelamente, e porque o atraso do país era uma herança a combater, os governos transformaram as Escolas do Magistério Primário em Escolas Superiores de Educação, o que representaria uma roupagem de nível superior, multiplicaram escolas politécnicas, cursos superiores, universidades, cursos de tudo e de nada, cada um tendo os seus currículos, seu tempo de formação, suas cadeiras, suas disciplinas, seus mestrados, seus doutoramentos… uma babilónia de misteres, qual feira da ladra.

Não alongo o quadro mas esta multiplicidade de formações múltiplas, para todos os gostos, traz à memória, os nossos descobridores e colonizadores que, na sua genética secular, não eram mais do que comerciantes. Mas como os descobrimentos e as colonizações acabaram, e o concomitante comércio findou, o espírito comerciante permaneceu vivo e actuante nas forjas universitárias, politécnicas e escolas superiores.

Nesta floração florestal não será difícil deduzir que a maior vítima foi o professor, cada um formado de maneira diferente, ou nas universidades e politécnicas privadas, ou nas universidades e politécnicas oficiais, cada entidade com o seu programa, porque uns mais formados que outros, com a possível consequência de reprovações, abandono escolar, e solução providencial governativa de passagens administrativas para, uma vez mais, o Estado tapar as suas falhas.

(continua)

joão boaventura disse...

(continuação)

Chegados a este retrato grosso modo do panorama da deseducação nacional não é difícil encontrar igual configuração no sector estatal e bancário.

O primeiro, tirando conclusões sobre o excesso de gasto da população, acima das suas possibilidades, e o segundo, convidando agressivamente a população a ir de férias, comprar carros, adquirir imóveis e equipamentos domésticos, comprando primeiro e pagando depois. O estatal a dizer poupa, e o bancário a dizer gasta.

O estatal optou por, como S. Tomás, “faz como digo mas não faças como faço”, e esbanjou quanto pôde, endividou-se sem conta nem medida, de cabeça perdida. A população arrastada pela facilidade com que o Estado esbanjava, concluiu que podia seguir o exemplo, obtendo empréstimos, não medindo o logro em que caía; e o futuro inesperado resultou na perda da casa, do carro, dos equipamentos domésticos, aumentando a passagem da classe média para a classe dos pobres e dos sem abrigo.

A banca, na esperança de aumentar os seus lucros, viu-se defraudada nos seus intentos porque nem o Estado pagava o que devia, nem a sociedade civil tinha posses para liquidar as dívidas, porque o desemprego passou por Portugal como um furacão.

O estudo comparado com a educação permite concluir que este desastre teve de impor um Avaliador à banca, ao Estado e à sociedade civil, a célebre Troika (BE, EFFE, FMI), cuja actuação não deixou lugar a dúvidas: contracção de novas dívidas imposta pelas três entidades que já tinham demonstrado sérias dificuldades em satisfazê-las.

Isto para dizer que o avaliador possivelmente avaliou mal o que o Imperador César já tinha avaliado melhor, “os lusitanos nem se governam nem se deixam governar”.

A previsão de Eça de Queiroz de que o destino de Portugal será o de desaparecer do mapa, parece anunciar-se cronologicamente por etapas. Mas, não interessa. Enquanto vivermos vamos inspirando a Troika e permanecendo expectante pelo mítico salvador Avaliador do Professorado, neste ambiente deletério de desgoverno vitalício.

Este filme de terror apocalíptico vai correndo à frente dos nossos olhos, e para não esgotar todas as cenas, relembro apenas a mais recente do não menos recente governo, propalando a todos os ventos que tem vindo a racionalizar as instituições reduzindo o pessoal, para o que cita números, mas esquece que esta legitimidade e legalidade se traduz em substituir o pessoal do anterior governo pelo pessoal do novo governo, sem citar números. Mas os media referem que já vai em cinco centenas, que ainda não acabou, e aponta quem, do governo, mais contratações já fez.

Parece o jogo nacional do Rapa, Tira, Deixa e Põe, que ora se relembra e se oferece para atenuar este quadro negro do “sou sério, mas não tanto”. E é provável que este jogo se esteja a desenrolar entre o PSD e o CDS.

Posto este descaminho aparente que o estudo comparado impôs, a primeira conclusão a tirar é a de que quem não sabe resolver problemas recorre à avaliação, porque é dela que a seguir se vai tratar.

(continua)

Rui Baptista disse...

Meu Caro João Boaventura: Com pena minha, por o assunto poder morrer aqui, e, simultaneamente, agrado meu ( o que parecendo paradoxal o não é) verifico concordância entre a 1.ª parte do seu comentário e aquilo que tenho criticado em inúmeros posts publicados , aqui, no DRN e na imprensa diária.

Isto é, nada tenho a acrescentar que mereça a pena da minha parte a não ser um profundo desencanto por verificar que o sindicalismo docente, de A a Z, nada fez, ou faz, para que a temática da avaliação docente deixe de ser uma espécie de nó górdio que não torne rombo o fio da espada de quem se atrever a dar por terminada uma espécie de telenovela que se repete para encontrar o fio à meada que lhe ponha termo.

Balanço feito, dos inúmeros problema que afectam o sistema educativo nacional, se reparar, e reparou com certeza, existe uma espécie de terra queimada herdada de 25 de Abril, que não têm merecido a atenção dos sindicatos docentes que assestam as suas baterias, apenas, para um sistema de avaliação que sirva a sua clientela em interesses meramente pessoais “num país em que a mediocridade é a lei”, como escreveu João Lobo Antunes.

E assim o tempo vai passando, as reuniões entre o Ministério da Educação e os sindicatos vão-se sucedendo até que o professor Nuno Crato, em ledo e doce engano sindical, resolva, porventura, regressar ao tempo em que os professores chegavam todos ao topo da carreira docente numa espécie de igualdade vergonhosa que servia os desígnios dos professores medíocres sendo uma verdadeira afronta para os professores dedicados e esforçados. Aliás, não acredito, para além de outros motivos, quanto mais não seja, pela experiência pessoal que teve das formalidades a cumprir para atingir a cátedra.

joão boaventura disse...

(conclusão)

O que ressalta do estudo comparado entre o avaliador financeiro, Troika, e o futuro avaliador professoral, é o imediatismo da solução, o disparo ao alvo, sem tibiezas nem subtilezas, na esperança de que este será o caminho correcto.

Em ambos, ainda, tanto o avaliador financeiro como o avaliador professoral, tratam apenas de meios económicos, afectando a sociedade civil, o Estado e a banca, e ainda o professorado.

Se no primeiro se representa o imponderável por dele depender a existência do País, já no segundo se deixa ao arbítrio e ao abandono o futuro do professor, não daquele que cumpre porque teve uma boa formação, mas daquele que representa a instituição da qual saiu deficientemente formado, com a conivência do Estado que vai solucionar o problema criado como se o culpado fosse o professor.

Mas o caso que interessa salvar - o do professor mal formado por o Estado não ter avaliado as instituições formadoras - mesmo que classificado de suficiente, porque o Estado, ao não instituir tampouco cursos de actualização regular, com os quais patentearia interesse pela classe dos professores, e sanearia a sua inconsciência, acrescentando novas ferramentas, ou relembrando matéria e fórmulas a manter, ou a alterar, prefere colocar-se no lugar do guarda pretoriano de continuar a descuidar a forma do soldado.

Porque o maior inimigo do professor centra-se na rotina. É por isso que S. Paulo chama constantemente a atenção dos discípulos para o trabalho, indicando caminhos, soluções e alvitres sobre a forma de não descuidar o ensinamento constante e permanente, mesmo que o desânimo pareça quebrar o bom trabalho, e para que se mantenha perseverante vai dizendo que irá inspeccionar o seu labor na primeira oportunidade.

O Estado terá muito que aprender com S. Paulo, e não actuar como o Big Brother que segue o caminho do “vigiar e punir”, como a grande solução, porque o que há mais são professores. Não se diga que a substituição é o único caminho, porque se o substituto é igual ao substituído, voltamos ao ponto de partida. Ou talvez nem interesse ao Estado a substituição, porque o professor de suficiente interessa aos cálculos económico-financeiros, isto é, nunca subirá de escalão.

Os caminhos que aqui se apontam são difíceis porque o Estado, além de conservar muitas rotinas, sabe que o País poderá não sobreviver à hecatombe que o aguarda. A reconstrução do arsenal educativo, depois de tantos erros consumados e avolumados, desanima qualquer Governo. Portanto, o melhor é ir pondo remendos, aqui e ali, tapando as falhas como a política sabe e faz, como quem tapa um cadáver com um pano colorido que esconde a verdade.

E depois o avaliador é o salvatério do Governo. Fará o número de relatórios que vá corresponder aos desejos do Ministério das Finanças e da Economia, mesmo que à custa de injustiças, porque esse é também o traje de um Estado de Direito.

Sejamos desumanos porque a crise o justifica.

Anónimo disse...

Disse Bordalo Pinheiro
com sarcástica ironia
ante um caso verdadeiro
que sendo-se inteligente
também curiosamente
ser ministro se podia!

JCN

Anónimo disse...

Mas que falta de decência
o governo querer pôr,
no que toca ao professor,
um limite à competência!

JCN

Cláudia disse...

Onde vigora a insistência
esperança é céu raminho
óh ilustríssimo acredites
que tanto elevas vosso ninho!

joão boaventura disse...

Caro Rui Baptista

Concedo mas não é o Sindicalismo a face negra da avaliação. Ele é o jogral da ideologia que o orienta nos rumos da avaliação, sua forma e objectivos, e perde-se em descaminhos sigilosos congeminando as jogadas das regras partidárias instituídas.

Têm a sua ratio studiorum, à imitação dos jesuítas mas o nível perde-se em constante contradição, com a arma das greves, das arruadas, das manifestações, dos slogans, gritos e cartazes, do contra por sistema, com ou sem razão, para que a sua força tenha consistência.

A este nível, escudado naqueles parâmetros bélicos e ameaçadores, a inteligência estanca-se e perde-se na permanência do desacordo ao Estado.

Com isto não digo que o Estado é a vítima e o alvo, digo que também se perde no diálogo descompassado e desnivelado com o sindicalismo, apostado na contradição, porque se o sindicato não se opõe ao governo, não discorda, e não marca manifestações, tem a morte anunciada à nascença e a fuga dos filiados.

Vive neste intervalo de tempo, entre dois opositores, o Estado e os filiados. Portanto, para manter a fidelidade dos inscritos, terá de lutar sempre contra o Estado, e perde a razão, o raciocínio, a ponderação, para estudar os temas e as fórmulas que o Estado deseja promulgar.

Toda a sua concentração e preocupação apoia-se neste finca-pé de não perder aderentes, e isso, se lhe dá forças para se muscular ante o Governo, tira-lhe energias, e impede-o de fugir do stress.

Perante este quadro, o Estado, pelo seu lado também está metido numa camisa de onze varas, porque metido num dilema herdado, oscilando entre a necessidade económico-financeira de reduzir ao mínimo a lista de subidas de escalão dos professores, e a necessidade de encontrar o ideal-tipo weberiano de avaliador que se sujeite a relatórios redigidos de acordo com o padrão ideológico do Governo.

Postos os dois casos perante estes parâmetros que afectam o sindicalismo e a governação, não se vê fuga possível.

Portanto, q.e.d., os cenários de ambos vão manter-se e, claro, quem vai pagar todas estas idiossincrasias criadas pelo Estado é indubitavelmente o Professor, que não teve forças para escolher outro País, quando nasceu.

É um atavismo lusitano. E depois admiram-se de os portugueses persistente e secularmente estarem sempre a dizer mal de si mesmos.

Para o evitar só há um remédio, para o qual não se encontrou ainda qualquer droga adequada, que seria a boa governação, com equidade, ética, justa, transparente.

Mas os sábios dizem que o homem ainda vai levar alguns milénios, primeiro, a adquirir consciência, e só depois, essas qualidades.

Continuemos pois a combater os dilemas que dilaceram Sindicatos e Governos, como dizia um padre amigo: eu sei que não endireito o mundo, mas sempre que ele passar torto à minha frente, falarei sempre.

Com um abraço amigo

joão boaventura disse...

No meu comentário de 28 de Agosto de 2011 17:10

No penúltimo parágrafo

“Parece o jogo nacional do Rapa, Tira, Deixa e Põe, que ora se...”

Por deficiência minha o sítio do “Rapa, Tira, Deixa e Põe” ficou trancado sem possibilidades de abertura, pelo que reponho novamente o Rapa, Tira, Deixa e Põe, com as minhas desculpas.

Rui Baptista disse...

Caro João Boaventura: O parágrafo final do último comentário com a citação do padre teu amigo – reproduzo-a: “eu sei que não endireito o mundo, mas sempre que ele passar torto à minha frente, falarei sempre” – trouxe-me à lembrança um dizer semelhante de um escritor cujo nome me escapa à memória: “Não julgues que com o teu exemplo endireitas o mundo, mas serás um pulha a menos neste mundo!”

Retribuo, com igual amizade, o abraço enviado.

Cláudia disse...

O fio da meada é vossa questão
que de um melão para marmelada
pois se Deus pegar nesta talhada
existe o milagre aqui no sertão!

Anónimo disse...

Mesmo feito em marmelada,
melão é coisa que Deus
não comerá lá nos céus,
cara senhora inspirada!

JCN

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