terça-feira, 16 de agosto de 2011
Leituras de férias para professores que gostam de posições confortáveis
Texto recebido do professor António Mouzinho:
Leituras de férias para professores que gostam de posições confortáveis, muito práticas em todas as situações de lazer ou docência, úteis na cidade, na praia ou no campo, com duas amostras perfeitamente gratuitas
Das várias sugestões que recebi ao longo da vida nem sempre as mais fecundas tiveram origens prováveis. Recentemente, na minha escola, boas vontades construtivistas insinuaram que eu bem poderia fazer boas leituras sobre práticas de ensino: «talvez» estivesse desactualizado.
Como a crítica do construtivismo já estava feita (na minha memória, pelos finais dos anos 1960 arrumara o assunto), saltei a década que me indicavam (anos 1990) e passei ao século XXI. Sou atento a estas coisas. Actualizei-me.
Comecei por um artigo completamente moderno: de Carlos Fiolhais, Os Erros do «Eduquês», apontado por uma filha estudante de Letras e publicado no Primeiro de Janeiro em 2002 (está na Internet). Encontrei, a partir daí (um fio de informação puxa-se; desenrola-se o novelo), um substancial molho de livros, artigos, iniciativas e sítios. Aqui vai, para os interessados, uma sucinta selecção de meia dúzia, que não quero deixar de elogiar... e divulgar:
1. CRATO, Nuno — O 'Eduquês' em Discurso Directo; Uma Crítica da Pedagogia Romântica e Construtivista. Lisboa: Gradiva, 2006
2. HIRSH, Jr., E. D. — The Schools We Need; And Why We Don't Have Them. New York: Anchor Books, 1996/99 [nova intr. pelo Autor]
3. LAFFORGUE, Laurent e LURÇAT, Liliane (présentent) — La débacle de l'école: une tragédie incomprise. Paris: F.-X. de Guibert, 2007
4. LE BRIS, Marc — Et vos enfants ne sauront pas lire... ni compter; la faillite obstinée de l'école française. Paris: Stock, 2009
5. OUZILOU, Colette — Dyslexie; une varie-fausse épidémie. Paris: Presses de la Renaissance, 2010
6. PINKER, Steven — How the Mind Works. New York/ London: W. W. Norton & Co., 1997
Tenho da senhora que me vende fruta e hortaliça, a D. Cristina, a noção de meia-dúzia bem aviada: ainda vou referir uma compilação de textos, coordenada por Nuno Crato, que é especializada, mas extremamente interessante, até pelo facto de reunir contribuições de variados autores: CRATO, Nuno (coord.) — Desastre no Ensino da Matemática: como Recuperar o Tempo Perdido. Lisboa: Gradiva, 2006
Quanto aos outros, direi pouca coisa:
1. Com Nuno Crato, a primeira sistematização extensiva, em Portugal, do estado das coisas da Educação ao fim de uns bons anos de «Eduquês». Imprescindível, para mais com o autor nas funções de ministro. Nunca, em anos recentes, foi possível entender tão intimamente como pensa um cidadão investido nestas funções.
2. Sistematização profunda, fria, desapaixonada, do resultado do romantismo e do construtivismo (e quejandos) nos E.U.A., nossos tristes companheiros nos resultados do PISA. Hirsh Jr., professor universitário, crítico literário e pedagogo, satisfaz-nos com um panorama completo da educação no seu país, abordando por todos os ângulos possíveis os prós e os contras das reformas, das modas, e da leviandade pedagógica que teve, em boa medida, origem americana.
3. Como na meia-dúzia bem aviada por Nuno Crato, temos aqui uma compilação de textos. A França parece-se muito connosco no desastre, já que copiámos os franceses, que copiaram os americanos. Ou coisa parecida. Laforgue e Liliane Lurçat juntam um grupo igualmente interessante de especialistas que falam de tudo como os nossos especialistas falam do ensino da Matemática. É uma síntese terrível, e esclarecedora.
4. O panorama da escola primária visto por um professor que, ao contrário de Hirsh, é tudo menos desapaixonado: Le Bris é apaixonado mas não é romântico: gosta do que faz, gosta dos alunos, e não gosta da destruição do saber e da civilização. Percebemos aqui, com perfeição, onde, imperativamente, deve começar a mudança: no 1.º ciclo do básico.
5. Nas palavras de Le Bris: «se houvesse um único livro a ler sobre questão da leitura, seria este.» Percebi, finalmente, de onde surgia o aumento dramático de dislexia na escola: das más práticas pedagógicas no ensino da leitura... A senhora Ouzilou é ortofonista, e em quarenta anos de actividade conheceu, de facto, uma vintena de verdadeiros disléxicos. Indispensável.
6. A visão científica, plácida, do funcionamento do cérebro: neurocientista, Pinker trata inato e adquirido sem paixões ideológicas, dando ao hardware o que é do hardware, dando ao software o que é do software, (que Deus me perdoe, e César, já agora...). Separa as águas e, como desfaz ideias feitas sobre hereditariedade e meio, é particularmente útil neste debate, esclarecendo posições românticas naturalistas, e teses construtivistas.
Ao ler coisas de Laurent Lafforgue e Marc Le Bris tropecei no sítio do Grupo «Trans-Maîtres»: http://www.trans-maitre.org/. Além do cativante jogo de palavras, que Rabelais não desdenharia, fiquei com a ideia de uma organização eficazmente empenhada no combate à barbárie, com uns bons quilómetros de avanço em relação a nós. O sítio recomenda-se, e aqui vai a primeira amostra de que faço reclamo no título: a Carta do Grupo «Trans-Maîtres»:
«PREÂMBULO
O Grupo «Trans-Maîtres» reúne professores do ensino básico, secundário, universitário, pesquisadores, professores das instituições de formação de professores, pais que desejam fornecer uma resposta concreta ao grave problema da imensa pobreza do ensino actual, com consequências que vão do analfabetismo no básico e do iletrismo no secundário, ao esboroamento dos conhecimentos e da pesquisa na universidade.
O Grupo «Trans-Maîtres» toma como responsável principal do insucesso escolar, entre outras causas diversas, a teoria construtivista imposta pela Educação nacional há 20 anos, teoria errada segundo a qual o aluno deveria construir ele próprio o saber, teoria responsável pela rotura da transmissão do saber que sustenta qualquer civilização.
Tendo a crítica desse não-ensino sem substância, sustentado por métodos globais, sido feita há muitos anos, o Grupo «Trans-Maîtres» deseja hoje ressuscitar a instrução que tem como vocação transmitir conhecimentos provindos da riqueza do património, súmula científica, literária e cultural sustentada pelas noções elementares, as aprendizagens recorrentes e a metodologia analítica da escola primária.
Para tal, pretende reunir no seu sítio exemplos práticos de aula, de trabalhos e planos pedagógicos, de manuais cuja vocação é instruir, e testemunhos destinados às novas gerações de professores do básico, de acordo com essa ética de ensino e desejando retomar o caminho da transmissão do saber interrompido há 20 anos.
CARTA DO GRUPO «Trans-Maîtres»
Aquilo que o Grupo «Trans-Maîtres» quer trazer aos professores e aos alunos
A importância dos conteúdos
A reabilitação da instrução é, acima da tudo, uma reabilitação dos conteúdos do ensino básico, provindos do património e adaptados à nossa época.
Estes conteúdos devem ser transmitidos aos professores para que eles se apresentem perante os alunos portadores desse saber.
O que é transmitido? Quem transmite e a quem?
Os conteúdos são feitos em primeiro lugar de aprendizagens fundamentais, como por exemplo: a técnica de aprendizagem da escrita, a referenciação e a escrita em linhas de caderno, o desenho e os trabalhos manuais, o traçado e as medidas com uma régua graduada que permitem uma reabilitação da mão e uma educação do olhar.
Estas práticas são de seguida escoradas por exercícios mais complexos, tal como as repetições de análise gramatical e conjugação.
Estes ensinamentos não são dados, actualmente, nos institutos universitários de formação de professores.
É por isso que queremos transmitir progressões, lições estruturadas, sintetizando de forma simples as aquisições do saber escolar, e práticas de aula concretas, por vezes técnicas, utilizando a imitação e a repetição.
Agora, mais do que nunca!
Esta transmissão de professores a professores, no interesse dos alunos, é urgente e indispensável porque, no terreno, os conhecimentos sólidos e as boas práticas desaparecem à medida que os seus detentores se reformam.
Os sucessores devem aproveitar rapidamente o saber e a experiência acumulados.
Desta forma, o Grupo «Trans-Maîtres» repõe no lugar de honra a cultura e a instrução, longe da doutrina construtivista que obriga os docentes — bem contra a sua vontade — a abandonar as crianças à própria ignorância.
As exigências do Grupo «Trans-Maîtres» em matéria de ensino
Uma exigência precoce
Quando as aprendizagens são precoces as crianças adquirem verdadeiramente as bases e os mecanismos que libertam o espírito.
Queremos mostrar que a fasquia da exigência pode estar muito alta e que há que estimular as incríveis capacidades das crianças muito pequenas.
Aprendizagens cuidadosamente escalonadas
Aprendizagens mais ambiciosas nos programas da pré-primária, 1.º e 2.º anos [Grande Section, Cp e CE1 no original], permitindo assim aos alunos a aquisição de uma bagagem substancial nos três anos seguintes [CE2 a CM2 no original: a mudança de ciclo é feita no 5.º, em França] prevendo a entrada no 3.º ciclo [collège, no original].
A preocupação com um estudo da progressão e o respeito pelos níveis impõem-se para obter aquisições reais, em harmonia com o crescimento psicológico da criança.
Os meios da liberdade constroem-se
Os meios que permitirão ao futuro adulto ser livre e autónomo constituem a finalidade do ensino básico. Estes meios são simples: são conteúdos sólidos de uso ordenado, progressivo e regular que permitem estruturar o pensamento metodicamente e exprimi-lo com correcção oral e escrita, a fim de aceder realmente aos ensinos mais complexos do secundário.
A liberdade pedagógica
Reduzir o professor ao papel de um executante encarregado de fazer respeitar as instruções, de proceder a avaliações e de preencher itens é privá-lo do essencial da sua função de professor e da sua qualidade de homem livre.
Mas a liberdade pedagógica não consiste igualmente em reinventar conteúdos de ensino que já foram apurados e ensinados com eficácia. A liberdade do professor não consiste em testar métodos empíricos com os alunos.
A liberdade do professor reside no modo pessoal com que instrui os seus alunos e lhes transmite o amor do saber e do estudo.
Porque o professor tem sobretudo o dever de transmitir e esta transmissão exige respeito pelas regras constituintes do património linguístico e matemático.
Sem esse determinismo de base, nenhum pensamento poderá exercer-se de forma fecunda, sólida e realmente livre, nem conduzir a uma qualquer descoberta.
Princípios pedagógicos que regem o Grupo «Trans-Maîtres»
A libertação de professores e alunos passa pelo domínio e utilização de conteúdos de ensino precisos.
O grupo «Trans-Maîtres» reune pessoas, tanto no interior como no exterior da Educação nacional, regidas pelos seguintes princípios pedagógicos:
— A utilização do método alfabético para a aprendizagem simultânea da escrita e da leitura.
— A prática regular da leitura em voz alta.
— A arte da redacção pela aplicação consciente das regras e mecanismos adquiridos progressivamente.
— O ensino da gramática analítica, e não da gramática global preconizada pelas instituições de formação de professores [IUFM, Instituts Universitaires de Formation des Maîtres, no original].
— O ensino da conjugação e das regras da ortografia.
— O recurso às regras e definições aprendidas de cor na Língua Materna [Francês, no original] e em Matemática — etapa essencial para a apropriação dessas regras e definições pala criança — bem como a repetição de exercícios.
— A estruturação do pensamento, através da prática do raciocínio matemático por meio de exercícios variados, e da apropriação do património literário e uso permanente duma linguagem correcta e rica por meio de ditados, recitação, explicações de textos.
— O ensino das técnicas operatórias: noções de adição (juntar), de subtracção (retirar, cortar, suprimir), de multiplicação (juntar repetidas vezes), e de divisão (partilhar), assim como a geometria, desde o 1.º ano [CP no original].
— A prática regular do cálculo mental.
— A aprendizagem da redução de um número nos seus factores, o conhecimento dos números primos, os cálculos com utilização de números decimais.
— Um maior rigor no estudo das diferentes figuras geométricas e respectivas áreas, do sistema métrico e das conversões, assim como um uso regular da régua, do esquadro, do transferidor e do compasso.
— A resolução de problemas, compreendendo a redacção cuidada das soluções.
— As lições de coisas concretas e estruturadas, buscando exemplos na envolvente próxima e fazendo uso de um vocabulário preciso, permitindo à criança o exame e a nomeação dos objectos que a envolvem, a fim de desenvolver a relação com o real.
— O ensino da História, sob a forma de narrativa e de cronologia, e da Geografia, com a aprendizagem do traçado de cartas.
— O desenvolvimento da atenção, da vontade, do sentido do esforço, do gosto pelo trabalho bem feito, assim como da memória, das qualidades de observação, e da aptidão a reproduzir pelo desenho.»
E aqui está como honro reclamos: outra tradução, desta vez do referido livro de Hirsh Jr., página 62:
[...] Vamos supor que, de entre as escolas que uns pais tivessem à escolha, estava uma que subscrevia a seguinte filosofia:
Todos os professores da nossa escola têm não só treino pedagógico como o conhecimento pormenorizado da matéria que ensinam. Transmitimos a todas as crianças uma ética de tolerância, de civilidade, de método, de responsabilidade e de gosto pelo trabalho. O nosso corpo docente estabeleceu um núcleo permanente de conhecimentos e competências que todas os alunos atingirão em cada ano. Verificamos se cada um aprende este núcleo e ganha os conhecimentos e as competências específicos necessários para progredir para o ano seguinte, permitindo que mais conhecimentos se juntem aos já adquiridos. Os nossos professores estão em contacto permanente com os colegas para estabelecer os meios efectivos de estimular os estudantes para a aprendizagem e para a integração desses conhecimentos e competências específicas. A especificidade dos nossos objectivos permite-nos acompanhar as crianças reforçando o apoio quando necessário. É com este objectivo que fornecemos aos pais um programa pormenorizado dos conhecimentos específicos e competências a atingir em cada ano, e estaremos em permanente contacto com eles no que respeita à progressão dos filhos. Por meio desta aproximação baseada nos conhecimentos certificamo-nos de que todas as crianças normais estarão à altura do nível frequentado, enquanto, para além disso, os mais talentosos serão desafiados a atingir a excelência. Atingir este conhecimento e competências específicos e bem integrados dá aos nossos estudantes prazer na aprendizagem, bem como respeito por si próprios, assegurando que encaram um ano seguinte preparados e ávidos de aprender mais.
Se pais Americanos tivessem este tipo de oferta, é evidente que não seria a distância à dita escola que constituiria problema.
[...]
Boas férias; boas leituras; escrevam «eduquês» na areia, na baixa-mar. Deixem a praia-mar fazer o resto.
António Mouzinho
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12 comentários:
Cuidado com o lobby das "ciências" da educação. Lafforgue já sentiu o sabor amargo do contra ataque dos que se sentem donos do ensino:
http://www.ihes.fr/~lafforgue/demission.html
Tem cada qual o seu jeito
de exercer a profissão
no sector da educação,
consoante o seu conceito!
JCN
Os franceses que façam o que quiserem. Não podemos é deixar esta rapaziada destruir ainda mais o nosso ensino. Sim, é possível afundar ainda mais.
Caro António Mouzinho:
De facto, o chamado «eduquês» tem sido muito pernicioso. Concordo absolutamente consigo.
Mas pior ainda tem sido a «vulgata» do chamado «eduquês», tal como perniciosa se arrisca a ser a «vulgata» do «anti-eduquês», promovida por tanta gente do calibre dos vulgares «eduquêses», e que tende a generalizar-se como cartilha adoptada.
Outra coisa é a compreensão da sociedade em que vivemos (em todas as suas componentes), a compreensão da realidade do Ensino e das Escolas e a análise funda e fundada dos problemas de que padecem; só assim se poderá fazer a sua inventariação objectiva e pormenorizada com vista à descoberta dos eventuais remédios.
Temo que nos limitemos a transitar de «vulgata» em «vulgata».
Apesar de provavelmente já conhecer tudo o que lhe deixo abaixo, mesmo assim arrisco, esperando que, pelo menos, sorria e reflicta.
Entre as dicotomias que nos limitam o pensamento, a compreensão e a acção, eu prefiro a aparentemente absurda 3.ª margem do rio (qual feliz formulação de Guimarães Rosa), por achá-la uma forma muito mais promissora de compreender, analisar e agir sobre a realidade.
Desculpe-me o aparente paternalismo que a explicação possa conter, não é essa a minha intenção para consigo, mesmo assim clarifico porque também ajuda a clarificar o meu entendimento. A 1.ª margem representará, p. ex., o chamado «eduquês», a 2.ª margem o chamado «anti-eduquês», a 3.ª margem a vida na sua globalidade, diversidade, riqueza e potencialidades.
Mas podemos adoptar esta «fórmula» e colocar lá dentro o que quisermos, é bastante operatória para toda a realidade.
Aqui fica então o que lhe referi antes:
GRÉCIA:
«A juventude ama o luxo, é mal-educada, zomba da autoridade e não tem nenhuma espécie de respeito pelos velhos. As crianças de hoje são tiranas. Não se levantam quando um velho entra numa sala, respondem a seus pais e são simplesmente más». (Sócrates, 470-399 a.C.)
«Não tenho nenhuma esperança no futuro do nosso país se a juventude de hoje toma o mando amanhã, porque esta juventude é insuportável, sem moderação, simplesmente terrível». (Hesíodo, 720 a.C.)
«O nosso mundo atingiu um estado crítico. Os filhos não escutam os seus pais. O fim do mundo não pode estar longe». (Sacerdote egípcio, 2000 a.C.)
«Esta juventude está podre desde o fundo do coração. Os jovens são maus e preguiçosos. Não serão nunca a juventude de outrora. Os de hoje não são capazes de manter a nossa cultura.» (Frase descoberta nas ruínas de uma olaria babilónica datada de 1000 a.C.)
ROMA:
Onde é que isto vai parar? «Outrora, um desonesto era algo incrível. E agora, um tipo verdadeiramente íntegro é visto como um prodígio. Quanto aos jovens, é melhor nem falar. Onde já vai o tempo em que era visto como um sacrilégio um jovem não se levantar perante um idoso? Em resumo, devoção, correcção, rectidão, palavra de honra, respeito, valor, civismo, património cultural, etc. Tudo isso desapareceu. (...) Já não há em Roma mais lugar para um bravo Romano.» (Juvenal, séc. II d.C.)
PORTUGAL:
«A maioria dos estudantes […] desfalece perante o mais rudimentar trabalho analítico; raciocina errado, se raciocina; não sabe classificar; deduz mal, induz pior» (Decreto de 1894).
«Em Portugal, o aluno sai da escola primária um verdadeiro ignorante» (Albano Ramalho, inspector primário, 1909).
«Verifica-se nas respostas de muitos examinandos uma ignorância absoluta de certas matérias e lêem-se em muitas delas os disparates mais fantásticos» (Alves de Moura, 1939).
«O nível mental da maioria dos alunos do ensino liceal é muito baixo» (Fernando Pinho de Almeida, 1955).
As crianças de hoje em dia
em nada são desiguais
daquelas que antes havia,
tirando o caso dos pais!
JCN
Os livros, cada pessoa
sabe aqueles de que gosta:
o que para uns é boroa
para outros é pão de tosta!
JCN
Correcção:
No meu comentário anterior deixei perder o título das 2 últimas citações antes de Roma, que era - PRÓXIMO ORIENTE -, surgindo assim as mesmas como pertencendo à Grécia.
Do lapso peço desculpa.
Caro Manuel,
Ainda não vi nenhum eduquês assumir-se como tal, aquilo que tenho visto são os eduqueses a tentar demonstrar que quem lhes desmonta os argumentos são anti-eduqueses... e que eles (eduqueses) são uma espécie de pessoas muito sérias, muito cultas e muito inteligentes e que as restantes são apenas... do contra...
E ainda falam de Salazar...
Caro Fartinho da Silva:
Vejo que para si as coisas são a preto ou branco.
Há os chamados «eduquêses» (os pretos), piores do que o Diabo, que a partir dos anos 60 vieram estragar a paz mansa do rebanho. Desde os primórdios da nacionalidade (quiçá desde Viriato) que tudo corria no melhor dos mundos, tendo surgido esta cáfila de educadores rasca que pôs o Ensino pior do que antes de Adão e Eva. Tudo o que de mau existe é resultado da sua acção. Só não percebo como (na sua opinião e na de muitos críticos acérrimos do chamado «eduquês») conseguiram dominar praticamente todo o ensino e ter tanto êxito, sendo tão maus. É para mim um verdadeiro mistério.
Do outro lado há alguns, poucos, não-praticantes do chamado «eduquês» e os «anti-eduquêses» acrisolados, todos competentíssimos, excelentes e dedicados, o pouco de bom que ainda restou desta catástrofe a eles se deve. Merecem o reino dos céus.
Para si, fora desta dicotomia redutora nada mais pode existir, qualquer um que se atreva a pensar fora deste quadro mental a duas cores fortes, qualquer um que se atreva a colocar algum grãozinho de areia na engrenagem da narrativa da «vulgata» «anti-eduquêsa» é logo apelidado de «eduquês» envergonhado, como acabou de me fazer a mim.
Se tivesse lido com atenção tudo o que eu disse, mas tudo mesmo, e tivesse analisado bem a metáfora que usei do Guimarães Rosa, talvez se pudesse libertar desta dicotomia redutora e estéril.
Se eventualmente ainda não leu o livro que Nuno Crato publicou (organizou) em homenagem a Rómulo de Carvalho (que julgo ninguém apelidará de incompetente, praticante do chamado «eduquês» ou acérrimo militante de qualquer causa política de cariz oposicionista, nem situacionista, pois era um céptico que nunca se dignou votar depois do 25 de Abril por funda e sincera convicção da inutilidade de tal acto como construtor de uma sociedade melhor), livro que se chama «Rómulo de Carvalho: Ser Professor», aconselho-o a ler dois artigos (o livro é uma colectânea de artigos de R. de Carvalho) intitulados: «Sobre o estado actual do ensino da Física» e «O Ensino Liceal da Física de 1964 a 1970». Estes artigos fazem parte da «terceira margem do rio» de que nos fala Guimarães Rosa, não da dicotomia dos pretos contra os brancos ou dos chamados «eduquêses» contra os anti-eduquêses.
E esteja certo de que não sou um dos chamados «eduquêses» envergonhados.
Nota: Tentei perceber o sentido da referência ao Salazar, mas desisti, vai muito para além das minhas capacidades cognitivas.
Caro Manuel,
O senhor conclui que eu:
1. Vejo as coisas a preto e branco (1);
2. Considera que não leio com atenção (2);
3. Considera o meu pensamento redutor e estéril (3).
E tudo isto apenas e só porque não concordo com o pensamento dos "cientistas" da educação...
E ainda não percebeu a minha referência a Salazar?
(1)"Vejo que para si as coisas são a preto ou branco.".
(2)"Se tivesse lido com atenção tudo o que eu disse".
(3)"redutora e estéril"
Caro Fartinho da Silva:
Eu também não concordo com o pensamento dos «cientistas» da educação com aspas, de nenhum deles.
Quanto ao pensamento dos cientistas da educação sem aspas, concordo com o pensamento de uns, discordo do de outros, concordo com algumas coisas do pensamento de uns e outras do de outros, como é normal em tudo na vida.
Só assim pode haver discussão, não com o acantonamento de cada um nas suas verdades intocáveis e indiscutíveis, pior se esse acantonamento se fizer a partir de dicotomias assentes nas «vulgatas» compradas no pronto-a-vestir da esquina.
O exemplo do comportamento cívico de Rómulo de Carvalho que lhe dei, de nunca ter exercido o direito de voto depois do 25 de Abril (nem antes, como é óbvio), deve-se a não se ter deixado inebriar com a democracite derramada em catadupas sobre um povo inculto e incívico. Ele pensava pela sua cabeça (pensava dentro da 3.ª margem do rio), não a partir da margem Direita, dos saudosistas do salazarismo ou afins, que auguravam a catástrofe, nem a partir da margem Esquerda, dos novos donos da verdade absoluta, tão democratas que silenciavam os outros à paulada, se necessário. Esta posição é discutível, mas legítima.
Com a guerra latente entre os chamados «eduquêses» e os anti-«eduquêses» passa-se coisa semelhante, cada qual na sua trincheira. Uns só vêm a árvore imponente por mais frondosa que seja a floresta; outros conhecem todas as espécies da floresta mas nem se apercebem de que aquela árvore imponente está a destruir o equilíbrio da floresta, que é um problema. Estão ambos a laborar no erro, mas felizes com a sua «verdade».
Resposta recebida pelo De Rerum Natura de António Mousinho:
Manuel (...?):
Tenho 61 anos e estou de férias.
Apesar disto, duas palavrinhas: não desculpo o paternalismo, claro que não – não conheço a citação do Guimarães Rosa, não conheço o contexto, não tenho de conhecer, e as metáforas são tramadas: por exemplo, se imaginarmos a secção de um rio como se de uma caleira de alumínio se tratasse, temos a margem direita à nossa direita, quando virados para o tubo de queda; a margem esquerda oposta; a terceira margem no fundo, onde se juntam a vasa e o verdete. É intragável. As metáforas podem ser escorregadias, arriscamos o traumatismo craniano a derrapar nas metáforas: os limos não perdoam. Quando chegamos à «vida na sua globalidade, diversidade, riqueza e potencialidades», atordoados com o trambolhão, já não pensamos coisa com coisa.
No entanto, não brindei ninguém com um amontoado de citações descontextualizadas. Não penso autofagicamente, e dei-me ao trabalho de propor duas traduções que falam da «vida na sua globalidade, diversidade, riqueza e potencialidades»: uma que refere b-a-ba, tabuada, operações aritméticas, etc.; a outra que avança com um sucinto, mas não menos real, projecto educativo, que poderia vantajosamente (quer dizer, para benefício de alunos concretos, pais concretos, uma educação concreta) substituir muita ganga que já vi, que há pelas escolas tout court e é empurrada para a frente pelas escolas de formação de formadores e um ministério intelectualmente agonizante.
Juntei um conjunto de obras que acho que merecem ser lidas inteiras, e sobre as quais o senhor não diz palavra. Falam da «vida na sua globalidade, diversidade, riqueza e potencialidades». Não são dicotómicas.
Sugeri trabalho «de exteriores», de leitura e reflexão, não me pus a pensar por fórmulas fazendo puzzles com o que já todos sabemos.
Não utilizei o termo «anti-eduquês», porque nem entendo o que é.
Poderia juntar mais umas frases do teor das suas; junto, em vez disso, mais um título, para esclarecer o que acho do pensamento lateral e das «terceiras» vias:
BONO, Edward de — Po: Beyond Yes And No. Harmondsworth: Penguin Books, 1973.
É um clássico do género.
E, por favor, não entenda isto tudo como um início de polémica: é o fim da resposta.
Como já dizia lá atrás: tenho 61 anos e estou de férias.
Respeitosamente,
António Mouzinho
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