O astrofísico Carl Sagan gostava, para referir a idade de uma pessoa, de usar a expressão “voltas ao Sol” em vez de anos. Morreu após ter dado 62 voltas ao Sol, a 20 de Dezembro de 1996. Agora que o novo ano está iminente, é uma boa altura para lembrar que o ano não é mais do que a unidade de tempo que corresponde a uma volta completa do nosso planeta em volta da sua estrela.
Que o ano comece a 1 de Janeiro, entre o solstício de Inverno a 21 de Dezembro e a data do periélio terrestre a 3 de Janeiro (quando a Terra está à menor distância do Sol, por estranho que isso possa parecer), não passa de uma convenção. Podia começar noutro dia? Poder podia e era a mesma coisa... As revoluções do nosso astro em torno do astro-rei repetem-se com uma extraordinária regularidade. Como todas as convenções, também essa tem uma história. O início do ano em 1 de Janeiro começou com o estabelecimento do calendário juliano pelo líder romano Júlio César, no ano 46 a.C. Antes disso o ano começava em Março. Acrescentaram-se então dois meses ao ano (Novembro e Dezembro) e os últimos dois meses do ano antigo (Janeiro e Fevereiro) passaram a ser os primeiros do novo ano. O ano da mudança ficou justamente designado por “ano da confusão”.
Uma outra confusão houve, embora menor, em 1582. A fim de melhor obedecer à astronomia, uma bula do Papa Gregório XIII, de 24 de Fevereiro, revogou o calendário juliano, decretando que fossem retirados alguns dias a esse ano. O dia 15 de Outubro surgiu logo após o 4 de Outubro, criando assim um “buraco” no calendário. O dia 1 de Janeiro de 2009 no calendário gregoriano, que ainda vigora, é o dia 19 de Dezembro do calendário juliano. Países católicos como Portugal, Espanha, Itália e Polónia seguiram imediatamente o édito papal (que tinha sido preparado por uma douta comissão que incluía Christophorus Clavius, talvez o mais famoso estudante de Coimbra). Outros seguiram-no mais tarde, como a Inglaterra. Comentou o astrónomo Johannes Kepler: “Preferiam estar em desacordo com o Sol a estar de acordo com o Papa".
quinta-feira, 31 de dezembro de 2009
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8 comentários:
Olá! Sempre interessante.
No artigo, há algo que não compreendo: por que razão se acrescentaram os dois meses com a adopção do calendário juliano? O ano tinha antes apenas dez meses? Além disso, Novembro e Dezembro têm nomes que provêm de "nove" e "dez", o que tem lógica se pensarmos que foram criados quando o ano começava em Março. Parece-me estranho os meses terem sido "inventados" exactamente quando os seus nomes perdiam a lógica. Vale o que vale, mas aqui vai: http://en.wikipedia.org/wiki/Julian_calendar
Pelos vistos, em Portugal, até ao séc. XVI, o ano não começava em Janeiro.
Já agora, bom ano!
Antes de mais um bom ano de 2010 independentemente de ele ser mesmo 2010 d.C. ou não e começar verdadeiramente em 1 de Janeiro.
Mas uma pequena correcção histórica - Júlio César nunca foi ou se intitulou imperador de Roma. O primeiro a usar o título foi Octávio.
Prof. Fiolhais,
Carl Sagan faleceu em 1996.
Um abraço de um antigo aluno
Que a convenção seja a de intitular o primeiro dia do ano como primeiro de Janeiro (Janus)é completamente aceitável, porque as convenções são isso mesmo .... convenções.
Portanto, o facto de o dia UM do ano ser o dia Um de Janeiro está convencionado.
O que já não se entende é o seu posicionamento em relação a determinado momento de posicionamento do planeta Terra ao descrever a sua órbita no sistema solar.
Teria feito todo o sentido fazer coincidir o dia do iníco da contagem do calendário com o dia de um posicionamento específico da Terra na órbita.
E, pelo menos, existem quatro momentos que poderiam ser escolhidos, dois solstícios e dois equinócios.
Com as técnicas de medição da época, falamos de há 2050 anos, o solstício de Inverno era bem determinável.
O calendário Gregoriano introduziu a correção secular dos anos bissextos que determina que os anos terminados em 00 não são bissextos, com exceção dos anos divisíveis por 400. Desta forma os solstícios e equinócios passaram a ocorrer sempre nas mesmas datas, sem acumular erros.
O astrónomo Medler propôs, em 1864, corrigir o calendário juliano, excluindo um ano bissexto de 128 em 128 anos.
A comissão formada por Gregório XIII deve ter feito as seguintes contas: 31*400/128=96,875 (há, no calendário juliano, em cada 128 anos, 32 bissextos), donde 97 bissextos em cada 400 anos.
Referência: N. Beskin, Fracções contínuas, Ulmeiro, 2001.
Américo Tavares
Já emendei o ano da morte de Sagan, muito obrigado pela correcção da gralha (demorei a emendar por ter estado fora e sem rede na passagem do ano).
Carlos Fiolhais
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