sábado, 19 de dezembro de 2009

O "ANNUS MIRABILIS" DO JAZZ


Texto do físico José António Paixão, publicado na revista "Anti-Matéria" dos estudantes de Física da Universidade de Coimbra:

Celebra-se em 2009 a passagem de 50 anos sobre aquele que é, talvez, o ano mais produtivo da história do jazz - 1959 -, verdadeiro “annus mirabilis”, onde vieram a lume trabalhos que marcariam o rumo do jazz na segunda metade do século XX. Podemos até estabelecer um paralelo na história da Física com o ano de 1905, em que Albert Einstein publicou os seus trabalhos seminais, e cujo centenário foi amplamente celebrado por todo o mundo em 2005 como “Ano Mundial da Física”.

Exemplifiquemos com algumas das obras mais importantes desse ano.

Kind of Blue, do primeiro quinteto de Miles Davis é, consensualmente um dos melhores – senão o melhor – disco de jazz de todos os tempos. Num estilo modal, o disco que se inicia com o inolvidável “So what” foi inovador e inspirador para sucessivas gerações de músicos, não só da música improvisada mas também de outros estilos musicais. Este LP é hoje quádrupla platina e o disco de jazz mais vendido de todos os tempos.

The shape of Jazz to come, de Ornette Coleman, justificou plenamente o título, abrindo as portas a um novo estilo na música improvisada em que as harmonias clássicas são abandonadas em favor de uma forma mais livre, conhecida, precisamente, por free jazz. Sem o suporte de um instrumento harmónico como o piano, Ornette fazia-se acompanhar apenas pelo trompete de Don Cherry, o contrabaixo de Charlie Haden, e a bateria de Billy Higgins. Arbert Ayler, Archie Shepp ou o contemporâneo John Zorn, vierem beber deste novo estilo que surpreendeu, em 1959, o mundo do jazz.

Mingus Ah Um é um dos trabalhos fundamentais de Charles Mingus, onde o génio deste contrabaixista e compositor está bem patente em temas inolvidáveis como Better Git It In Your Soul, Fables of Faubus e Goodbye Pork Pie Hat, este último dedicado à memória do saxofonista Lester Young que faleceu nesse ano.

Giant steps,
de John Coltrane, é outro marco importante na história do Jazz e na forma de tocar saxofone. As estruturas harmónicas complexas de composições como “Giant steps” e “Countdown” e o ritmo frenético com que eram executadas pelo “mestre” apontavam já o novo rumo de Coltrane na direcção de uma estética free, característica dos seus últimos trabalhos.

Time out, do quarteto de Dave Brubeck, foi um estrondoso sucesso comercial vindo da West Coast – Brubeck foi capa da Time com este disco – devido em grande medida aos inusitados tempos das composições, como o compasso 5/4 do tema Take Five, e aos solos arrebatadores do saxofonista alto Paul Desmond.

Portrait in Jazz
, do trio do pianista Bill Evans, que contava com o malogrado contrabaixista Scott LaFaro (viria a falecer aos 25 anos de idade, em 1961, num acidente de automóvel) e o baterista Paul Motion, apontou para um renovado rumo do trio clássico de piano, contrabaixo e bateria. A empatia entre os membros do trio de Bill Evans é fantástica e a o seu legado influenciou decisivamente grupos como os trios de Keith Jarrett, Brad Meldhau e Esbjörn Svensson.

Boa escuta!

José António Paixão

1 comentário:

in Deo disse...

d+ muito bom meeeesmo !

A ARTE DE INSISTIR

Quando se pensa nisso o tempo todo, alguma descoberta se consegue. Que uma ideia venha ao engodo e o espírito desassossegue, nela se co...