sexta-feira, 18 de dezembro de 2009
Cientista com cruz gamada
Com a amável autorização do autor Hélder Costa, publicamos um pequeno excerto da peça As peúgas de Einstein que foi recentemente levada à cena no Brasil e que em Portugal está por estrear (na foto o físico alemão Philippe von Lenard, 1862-1947, prémio Nobel da Física de 1905 e defensor activo da ideologia nazi):
"(Cientista com cruz gamada no braço, brandindo papéis)
Lenard – (senta-se no banco)
Eu, Philippe von Lenard, declaro que Einstein é o rei dos judeus vigaristas, é o símbolo da mentira dessa raça sub-humana. A teoria da relatividade é mais uma falsificação judia! Temos de esmagar e destruir essa gente, esses traidores da filosofia e da ciência da grande Alemanha. Temos de os expulsar da nossa santa Pátria. Rua da Alemanha! Fora da Alemanha!
(Levanta-se, fica à frente do banco) Os estudantes judeus não podem entrar nas nossas universidades. Os professores judeus deixam de ter alunos. Rua da Alemanha! Se a estupidez e a teimosia judia não os fizerem desistir, trancaremos as suas salas de aula com cadeados. Morte a essa raça indigna! (sai) (Palmas amplificadas com som)
(Música expressionista)
(Einstein, Elsa e Max Planck)
Einstein (circula) – O saber e a Ciência na mão dos nazis! Como é possivel!?
Elsa – (entra e leva banco do centro de cena para a mesa) Albert, mein Liebe, não te preocupes com Lenard e com os seus amigos. (Tira pacotes de cartas de um saco). Olha o teu correio. Vem de toda a parte do mundo, felicitam-te, pedem-te conselhos e fotos autografadas.
Einstein - Katherine Hepburn, Picasso, Bette Davis... Charlie Chaplin...
Elsa - Nem uma estrela de cinema tem tanta adoração.
Einstein - Não me queiras comparar com a Marlene Dietrich.
Elsa – Acho que tu és mais bonito.
Einstein - Pois , pois, tudo é relativo… (beijam-se)
Sem ruído surge Max Planck)
Elsa - Max!
Einstein - Max Planck, meu grande amigo e mestre! Em minha casa! Cuidado, eu sou judeu.
M. Planck – Albert, eu acho que o problema que existe consigo se deve à sua constante intervenção politica. Faça o seu trabalho cientifico e deixe esses assuntos para outra gente.
Einstein - Eu não acho que o cientista deva ficar em silêncio perante a política, perante a vida, perante os problemas do dia a dia. Eu não me arrependo de uma única palavra e estou convicto de que as minhas acções servem a humanidade.
M. Planck – O nazismo está a avançar em força. Mataram o seu amigo íntimo, o Walter Rathenau.
Einstein - Sim, e também mataram o Walter, o ministro das Relações Exteriores da Alemanha. Estão a apontar muito alto. Matam e ficam impunes. Pobre Alemanha! Eu gosto do trabalho científico que estamos a realizar. Ficarei em Berlim até ao último instante."
Hélder Costa
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