quinta-feira, 17 de dezembro de 2009

Alpinismo e homossexualidade

(A propósito da proposta de lei hoje aprovada que permite o casamento entre pessoas do mesmo sexo, recupero um texto que publiquei noutro blogue já há algum tempo sobre o tema supracitado)

George Leigh Mallory foi um exímio e destemido alpinista. Herói da I Guerra Mundial, com uma enorme experiência de escalada nos Alpes e em Gales, fez parte da expedição britânica de reconhecimento do Everest em 1921 e destacou-se num dos primeiros ataques ao cume da montanha mais alta do mundo no ano seguinte. Quando morreu, em 1924 na face norte do Everest, era sem discussão o melhor alpinista britânico do seu tempo. Ninguém desceria para contar que subiu ao cume do Everest antes de 1953 (por altura em que se propunha a estrutura em dupla hélice do ADN).

A última fotografia de George Mallory e Sandy Irvine

Expedição de 1924

Em 1999 o corpo de George Mallory foi encontrado a cerca de 8300 metros de altitude. Os alpinistas que o descobriram ficaram pasmados. As roupas eram simplesmente um amontoado de camadas de roupa quotidiana (camisa!), o material de segurança praticamente inexistente, a corda não aguentaria uma verdadeira queda (na realidade não aguentou, foi encontrada partida) e as botas em absoluto ineficazes para progressão em glaciar. Em 1924 não se poderia recorrer a uma série de "ajudas" dos tempos de hoje, como cordas fixas e uma escada colocada no second step por uma expedição chinesa nos anos 60. As vias de ascensão não eram conhecidas e não se sabia se seria possível a um ser humano sobreviver, mesmo que por breves momentos, no cume do Everest. Os sistemas de oxigénio suplementar tinham tantas fugas e eram tão pesados que suscitava debate a sua real utilidade. Não tinham como se proteger do frio, o calçado era inadequado para progredir sobre o gelo ou neve dura, as cordas partiam e não sabiam por onde ir. Era necessária uma audácia e espírito de aventura inimagináveis.

Por qualquer medida que se tome, George Mallory era um expoente das características superlativas da masculinidade.

Mallory era considerado um homem muito bonito e tinha um genuíno interesse pelas artes. Estudou em Cambridge, envolveu-se no ambiente do teatro, música e pintura, várias vezes pousou nu para o pintor Ducan Grant (homossexual assumido). Grant chegou mesmo a gabar-se de que Mallory terá sido seu amante. Não quer isto dizer, de modo algum, que tal seja verdade. De qualquer forma, o clima de Cambridge (e de Oxford) na primeira década do século XX era um ambiente muito tolerante à homossexualidade, com manifestações de amor assumidas entre homens.

Não há qualquer prova de que Mallory, mais tarde casado e com filhas, tenha tido alguma experiência homossexual. No entanto assumiu (numa carta enviada à sua mulher!) quando estava na Guerra o fascínio por um soldado extremamente bonito que havia encontrado nas trincheiras no dia anterior.

George Mallory

Há mesmo um biografo de Mallory que sugere que a escolha do inexperiente jovem Sandy Irvine (22 anos sem nenhuma época nos Alpes!) como seu companheiro de cordada na fatal tentativa ao cume do Everest em 1924 terá tido motivos românticos. Esta tese é facilmente desmontada, há várias razões circunstanciais e práticas que justificam a escolha (era um dos alpinistas mais frescos, mais fortes e o que melhor sabia utilizar e reparar o equipamento de oxigénio). De qualquer forma a hipótese é legítima dado o ambiente que se vivia em 1924 entre a elite de aventureiros britânicos.

E em 2009 o parlamento português aprova o casamento gay!

10 comentários:

Fernando Martins disse...

E, dia do sismo mais forte dos úkltimos 40 anos (em Portugal continental) o que publica o melhor Blog científico português sobre o assunto? Nada...?!?

António Conceição disse...

Não percebi o que é que o texto (aliás muito interessante) do post tem a ver com a conclusão plasmada na última frase.

margarida disse...

...as coisas espantosas (e belas, belas, belas) que aprendo aqui...
impagável.

Xico disse...

"Por qualquer medida que se tome, George Mallory era um expoente das características superlativas da masculinidade."
Também o eram Alexandre e David. Só alguém sem qualquer cultura ou conhecimento pode associar homosexualidade exclusivamente a falta de masculinidade. Ser homosexual é uma coisa, ser maricas é outra. Conheço muitos maricas heterosexuais.
E nem o alpinismo, nem a homosexualidade têm a ver com casamentos. É a minha opinião.

Anónimo disse...

Aliás há tb indicações de que Asterix e Obelix eram homossexuais. Não se lhe conhecem mulheres, não se sabe em que casa vivem, e andam sempre juntos.

O Batman e o Robin também se diz nos mentideros que coisa e tal.

Isto já para não falar no Bucha e Estica, no Pateta e no Mickey, no Sherlock Holmes e no Mr Wattson e no próprio Cristo, sempre acompanhado de uma data de homens.

Mais a leste, Brejnev e o ditador da RDA beijavam-se em público, com grande paixão.
Enfim, a coisa está definitivamente na moda e qualquer dia andar a apalpar as nalgas do vizinho, é considerado de bom tom e até chiquérrimo.

O Governo está apenas a legislar no caminho do progresso e da modernidade e essas coisas.
Até porque o Sócrates, não sei, consta para aí que, e tal e coisa...

Anónimo disse...

Estou de acordo com Funes e Xico.
Não percebi. Poderia o autor do texto dar uma explicação aos leitores menos inteligentes como eu? Estou com curiosidade.

margarida disse...

Hello "anónimo": no primeiro exemplo esquece um detalhe, bem louro e curvilíneo: Falbala.
(I shall say this only once.)

Anónimo disse...

Também não percebi...

Anónimo disse...

O facto de apenas em 2009 se aprovar em Portugal o casamento gay mostra que, apesar de existirem provas concretas que refutam os estereótipos que se atribuem à homossexualidade desde há muito tempo, estas têm sido ignoradas e tem-se dado mais importância a preconceitos e a ideias menos felizes sobre o assunto.
É assim que eu interpreto, pelo menos.

POLITICA EM PIRACAIA disse...

Pois é, Portugal toma a dianteira da hustória, não perdeu o bonde. E dizer que é um País atrasado pela Igreja, outra mentira preconceituosa. O País foi capaz de fazer o que fez, na época da expansão do capitalismo colonial, teve e tem grande expressão na formatação do conhecimento. Esta aprovação dos casamentos é o resultado da experiência de um povo que foi e que quer ser feliz. Basta ver o resultado da mistura de raças que é o Brasil. Poderiam postar mais informações sobre a Lei?

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