terça-feira, 30 de setembro de 2008

A Origem das Espécies de Darwin - Uma Biografia


Informação recebida da Gradiva:

A Gradiva não podia deixar de se associar às comemorações dos 200 anos do nascimento de Charles Darwin e dos 150 anos de publicação do seu livro A Origem das Espécies, que decorrerão em 2009. E começa já este mês por fazê-lo com a publicação do livro que constituiu a mais perfeita introdução ao pensamento de Darwin - A Origem das Espécies de Darwin - Uma Biografia - da autoria da sua principal biógrafa – Janet Browne .

Charles Darwin foi, sem dúvida, um dos mais importantes pensadores de todos os tempos. E um dos livros que mais alterou o entendimento que as pessoas têm de si próprias foi precisamente o seu A Origem das Espécies. Publicado em 1859, causou sensação mal foi editado e nunca deixou de gerar controvérsia e perplexidade. A ideia de que os seres vivos evoluem gradualmente através de selecção natural chocou profundamente os leitores vitorianos, pondo em causa aquela que era, para muitos, no quadro da visão e da vivência religiosa da época, a inabalável crença na existência de um Criador.

Neste livro, Janet Browne, a principal biógrafa de Charles Darwin, mostra porque é que A Origem das Espécies pode ser considerado o maior livro de ciência alguma vez publicado. A autora descreve a génese das teorias de Darwin, explica a recepção inicial destas e analisa as razões por que permanecem actualmente tão controversas. O seu livro constitui um relato apaixonante e fundamentado da obra que alterou para sempre o nosso conhecimento do que é ser-se humano.

O QUE DIZEM OS CRÍTICOS

«Uma jóia […] Browne explica com uma clareza absoluta as fontes, a natureza, a recepção e o legado de A Origem das Espécies.» (A. C. Grayling, The Times)

«Browne conta a história das ideias de Darwin com uma frescura límpida, que transforma a leitura do livro num prazer contínuo.» (John Gray, New Statesman).

A AUTORA

JANET BROWNE é professora de História da Ciência na Universidade de Harvard. Escreveu a biografia de referência de Charles Darwin, em dois volumes: Voyaging (1995) e The Power of Place (2002), distinguida com vários prémios literários, e é considerada a maior especialista mundial em história da biologia do século XIX.

- Janet Browne, A Origem das Espécies de Darwin Uma Biografia, tradução de Ana Falcão Bastos e Cláudia Brito, «Ciência Aberta», nº 175, com o apoio da Fundação Calouste Gulbenkian, 192 pp., € 12,50

CULTURA CASMURRA


Que a cultura não tem sido particularmente bem tratada pela Câmara Municipal de Coimbra é ilustrado pela recente mudança de nome da Praça Machado de Assis, que homenageava o grande escritor brasileiro, um dos maiores da língua portuguesa, pelo nome de Praça Fausto Correia, que homenageia um político local, infelizmente já falecido, e desconhecido lá fora. Pois tal alteração "casmurra" foi feita no dia da cidade (4 de Julho) e no ano em que no Brasil e em Portugal se celebra o centenário da morte de Machado de Assis... Quem não acreditar veja notícia aqui.

Qualquer outra praça ou rua nova serviria para colocar o nome do político local. O pormenor mais extraordinário é a mudança ter sido justificada por Fausto Correia costumar frequentar um café naquela praça. Ah, é isso: Machado de Assis nunca lá tomou café!

Pois eu continuo a chamar Machado de Assis à praça que agora foi despromovida, tal como continuo a chamar Ponte Europa à ponte que despromoveram em Ponte Rainha Santa Isabel. Já houve um político português actual que agradeceu um livro de Machado de Assis que a editora lhe enviou - não sei se foi o "Dom Casmurro" - apresentando os seus melhores cumprimentos ao Senhor Machado de Assis. Não quero acreditar que os políticos à frente do município coimbrão não saibam quem foi o autor de "Dom Casmurro".

A Morte da Utopia

Informação recebida da Guerra e Paz Editores sobre um novo livro de um autor que já aqui foi comentado:

"A história do século passado não é um conto de progresso secular, como os bem-pensantes da direita e da esquerda gostam de pensar." (John Gray)

Sobre o livro:

O mundo contemporâneo encontra-se polvilhado por destroços de projectos utópicos, planos para aperfeiçoar a experiência humana que acabaram por matar milhões. Da Alemanha à Rússia, passando pela China ou pelo Afeganistão, sociedades inteiras foram destruídas. Perseguindo o sonho de um mundo sem mácula, foram declaradas guerras e espalhado o terror a uma escala sem precedentes.

As ideologias utópicas que moldaram grande parte da história mundial do século passado afirmavam basear-se na ciência, rejeitando as fés tradicionais. Apesar disso, este livro poderoso e assustador demonstra que tais ideologias eram devedoras do mito do Apocalipse – a crença de que um evento grandioso poria fim à história e aos seus conflitos. Mas a religião acabou por regressar sob a forma de mitos políticos.

A morte da utopia não significa necessariamente paz. Pelo contrário, prenuncia a ressurgência de antigos mitos, agora abertamente fundamentalistas. Camufladas no manto obscuro das lutas geopolíticas pelo controlo de recursos naturais, as religiões apocalípticas regressaram em força aos conflitos globais. À entrada no século XXI, o mundo continua a preparar-se para novas guerras santas.

Dois Comentários:

"Fiquei impressionado com A Morte da Utopia de John Gray, que com rigor disseca as perigosas ligações entre as crenças religiosas e as ideias sobre a história e a política." (A.S. Byatt)

"Qualquer leitor minimamente sensível sairá deste livro mais sóbrio e até, talvez, mais sábio" (John Banville)

Sobre o autor:

Escritor e proeminente filósofo britânico, John Gray nasceu a 17 de Abril de 1948. Escreve regularmente para o The Guardian, o New Statesman ou o The Times Literary Supplement. Lecciona Pensamento Europeu na London School of Economics. Entre os muitos livros influentes que escreveu sobre teoria política, destaca-se Sobre Humanos e Outros Animais (2003), um controverso ataque desferido ao humanismo. Considerado um dos mais importantes pensadores da actualidade, esteve associado à Nova Direita que em Inglaterra influenciou decisivamente a ascensão ao poder de Margaret Thatcher. Outros livros seus que merecem destaque são Falso Amanhecer (1998), Al-Qaeda e o Significado de Ser Moderno (2003) e ainda biografias de Isaiah Berlin e Voltaire.

- John Gray, A Morte da Utopia e o Regresso das Religiões Apocalípticas
Tradução: Freitas e Silva, 312 Páginas, Colecção A Ferro & Fogo, 18,85 €.
Nas livrarias a partir de 9 de Outubro.

Biblioteca Digital de Botânica

Informação recebida do Serviço Integrado de Bibliotecas, a funcionar na Biblioteca Geral da Universidade de Coimbra:

Integrada no grande projecto da Biblioteca Digital da Universidade de Coimbra, foi hoje inaugurada a Biblioteca Digital de Botânica, que permite aceder a mais de 2500 documentos digitais. Ver aqui.

Na imagem, o botânico da Universidade de Coimbra Júlio Henriques (1838-1928), que é autor de alguns dos documentos expostos, nomeadamente da "Flora Portuguesa", conjunto de desenhos manuscritos.

Resposta a "Quem te viu já não te vê"

Carta ao Director publicada no "Público" de hoje a respeito deste artigo:

"Há pessoas em relação às quais não vale a pena fazer desmentidos, dado ser manifesto que abusam de insinuações e calúnias na esperança de assim chamarem a atenção para a sua própria pequenez. Não é esse, porém, o caso do Prof. Carlos Fiolhais, ilustre colaborador do PÚBLICO. Pelo contrário, o que escreve na sua coluna merece a justo título a atenção e o crédito dos leitores. Por isso mesmo, solicito-lhe, sr. director, que me permita desfazer, deste modo, o equívoco em que me parece incorrer o artigo do prof. Carlos Fiolhais de 26 de Setembro.

Escreve a dado passo o articulista: "Dizem que foi o Governo que mandou comprar os direitos do futebol. Não me admirava nada, pois, para distrair a crise, o povo sempre pode ver uns jogos. Também pouca gente se admirará que haja cuidada e atempada intervenção governamental no concurso do quinto canal generalista (...)."

Ora, ambas as afirmações são falsas. Nem o Governo mandou a RTP comprar fosse o que fosse, nem o Governo tem qualquer intervenção no concurso do 5.º canal generalista que entravasse a decisão de o lançar e a aprovação do respectivo regulamento."

Augusto Santos Silva
Ministro dos Assuntos Parlamentares

Blog Out

Os nossos leitores terão certamente reparado que o De Rerum Natura esteve inacessível durante umas horas. O mal-entendido na base do problema foi rapidamente resolvido e todos nós agradecemos a resposta célere do Blogger.

Agradecemos igualmente aos muitos leitores que nos escreveram a consideração que manifestaram pelo nosso trabalho. Obrigado a todos! Depois desta breve interrupção, iremos continuar a «discutir o empreendimento humano da descoberta do mundo, que é a ciência, e as profundas implicações que essa descoberta tem para a nossa vida no mundo».

Biblioteca Joanina on-line


Informação recebida da Biblioteca Geral da Universidade de Coimbra:

No mesmo dia, hoje, em que é lançado o DVD-ROM "Biblioteca Joanina Virtual" é também aberta a página da Biblioteca Joanina na Internet, onde se pode aceder a uma parte dos conteúdos do DVD, nomeadamente uma visita virtual ao edifício. Ver aqui.

segunda-feira, 29 de setembro de 2008

SAGAN E O PÊNDULO DE FOUCAULT

Na sequência do meu texto, com João Fonseca, sobre o pêndulo de Foucault:

Carl Sagan, no seu romance de ficção científica "Contacto", faz uma referência curiosa ao pêndulo de Foucault. O contexto em que se situa a referida referência é o seguinte: a directora dum grande observatório astronómico, projectado para procurar inteligência extraterrestre, trava uma calorosa discussão com um clérigo fanático, após ter sido detectado um sinal vindo da estrela Vega. O tema da discussão é "Ciência e Religião". A directora do Observatório considera a religião algo de muito perigoso e o padre pensa o mesmo da ciência. A esta altura, a directora usa o pêndulo de Foucault para argumentar contra o padre. Este afirma:

"A minha fé é tão forte que não preciso de provas, mas, sempre que surge um facto novo, ele confirma simplesmente a minha fé."

Responde a directora:

"(...) Ofende-me a ideia de que estamos a travar uma espécie de campeonato de fé e o senhor é o vencedor fácil. Tanto quanto eu saiba, nunca pôs a sua fé à prova. Está disposto a pôr a sua vida em jogo pela sua fé? Eu estou disposto a fazê-lo pela minha. Olhe, espreite por aquela janela. está ali um grande pêndulo de Foucault. O pêndulo propriamente dito deve pesar mais de 220 kg. A minha fé diz que a amplitude de um pêndulo livre - até que distância se afastará da sua posição vertical - nunca pode aumentar. Só pode diminuir. Estou disposta a ir lá fora, colocar o pêndulo defronte do meu nariz, largá-lo, deixá-lo afastar-se e voltar de novo na minha direcção. Se as minhas convicções estão erradas, levarei com um pêndulo de mais de 220 kg em cheio na cara. Então, quer pôr a minha fé à prova?"

"É contruir a Torre de Babel para chegar ao céu"


Extracto da entrevista de António Mega Ferreira (AMF), escritor e presidente do Centro Cultural de Belém (Lisboa), no último "Jornal de Letras" (JL):

"JL: Mas tinha as gavetas cheias de cadernos de apontamentos, com poemas, passagens, ideias, projectos literários?

AMF: O escritor é um grande reciclador. (...) Integrei neste livro ["A Blusa Romena"], por exemplo, um texto sobre Espinoza que tinha publicado há uns anos. Ocorreu-me porque definia bem aquilo que era a perplexidade da personagem perante a ideia de Deus. E que tinha a ver com a ambição divina do criador, daquele que quer opôr uma ordem, dar forma a uma série de coisas e onde há o Caos criar o Cosmos.


JL: A Ciência vai experimentar esse gosto divino com o grande acelerador de partículas...


AMF: E os recursos que se mobilizaram para fazer aquela máquina extraordin
ária e perceber como foi no princípio. Leio as descrições maravilhado. Como é possível construir uma coisa com aquele diâmetro, debaixo de uma país?

JL: Interessa-se pela Ciência?


AMF: Sim, fascina-me. Não me intimida nada, nem aquelas questões da clonagem. Mas há uma parte de descobertas científicas que não compreendo. Leio, leio, mas não chego lá. No caso do acelerador de partículas, compreendo qual o processo e o interesse. É construir a Torre de Babel para chegar ao céu. Ao contrário de muita gente, não acho nada inútil. Tentar compreender o mais possível é aquilo que nos distingue das outras espécies à superfície da Terra. E queremos saber mais e mais.


JL: A Literatura é também para si uma forma de compreender o mundo?


AMF: Mais de o interrogar. Os grandes romances não trazem respostas, interrogam, põem em causa, desestabilizam, inquietam, insinuam. O romance é uma máquina de interrogação do mundo."

NAS ENTRELINHAS DE MACHADO DE ASSIS




Vale a pena ler a crónica de Nuno Crato do último "Expresso" sobre o escritor brasileiro Machado de Assis, no "Blogue Auxiliar" do Carlos Medina Ribeiro: aqui. Nuno Crato escreve agora sobre ciência (e não só) no caderno principal do "Expresso" com mais espaço do que tinha na revista "Única".

"Entre Camões e Vieira"


No dia 30 de Setembro, a Universidade de Coimbra volta a associa-se às comemorações do Ano Vieirino com a realização de um Colóquio intitulado Entre Camões e Vieira, organizado, em parceria, pelo Centro Interuniversitário de Estudos Camonianos, o Centro de Literatura Portuguesa e o Centro de Estudos Clássicos e Humanísticos. O local será a Sala de São Pedro da Biblioteca Geral.

Nele intervirão Aníbal Pinto de Castro, Carlos Ascenso André, Rui Figueiredo Marcos, Martim de Albuquerque; Telmo Verdelho e Belmiro Pereira.

De tarde terá lugar a Falação do 'Sermão da Sexagésima' e, no final do dia, haverá um concerto de música seiscentista, na Capela da mesma Universidade.

PROGRAMA
9h30 - Sessão de Abertura
10h00 - Aníbal Pinto de Castro (Univ. Coimbra): Vieira leitor de Camões e
Carlos Ascenso André (Univ. Coimbra): Camões e Vieira na senda de Ovídio
11h30 - Martim de Albuquerque (Univ. Lisboa): A Ideia Camoniana de Sociedade Internacional e Rui Figueiredo Marcos (Univ. Coimbra): Tonalidades do comércio em Camões e Vieira
15h00 - Falação do Sermão da Sexagésima, por António Fonseca

16h00 - Telmo Verdelho (Univ. Aveiro): A língua portuguesa - de Camões a Vieira e Belmiro Pereira (Univ. Porto): Da exercitatio à imitatio - Uma retórica de palavras e obras
17h30 - Concerto: Formas e géneros da música para órgão no Portugal seiscentista - por Gerhard Doderer (Apresentação de Maria do Amparo Carvas Monteiro)

domingo, 28 de setembro de 2008

O PÊNDULO DE FOUCAULT

Como a revista "Sábado" reeditou a esta semana, a um euro apenas, o livro "O Pêndulo de Foucault" do escritor italiano Umberto Eco (livro publicado pela primeira vez há 20 anos), transcrevo, embora encurtado, um texto meu de divulgação científica sobre o referido pêndulo, que saiu na extinta revista "Futuro". O texto foi escrito em colaboração com João Fonseca, na altura meu aluno e hoje professor do secundário, com a particularidade interessante de o meu co-autor ter construído ele próprio um grande pêndulo de Foucault no vão das escadarias do Departamento de Física da Universidade de Coimbra. O pêndulo rodou, mostrando que a Terra gira em torno do seu eixo!

Desde tempos imemoriais que o homem olha as estrelas com um entusiasmo indisfarçável. Actualmente sabe-se que a matéria de que somos feitos, isto é, os átomos que nos constituem, proveio, na sua maioria, do interior das estrelas. Já alguém disse que o nosso encanto pelas estrelas é um reconhecimento e homenagem às nossas origens. Ao observar o céu nas noites límpidas vêem-se configurações que se movem ordenadamente. Todas as estrelas se movem no sentido retrógrado, descrevendo uma órbita circular em cada dia. Foi este facto que despertou a atenção humana, mostrando que existem regularidades na Natureza e que podemos desenvolver teorias para as descrever.

Os gregos da Antiguidade criaram um modelo para descrever e explicar o movimento das estrelas e dos outros astros. Imaginaram que a Terra estava fixa no centro do Universo envolvida por uma esfera negra, a que chamaram "esfera celeste". As estrelas estavam incrustadas nesta esfera, todas equidistantes da superfície da Terra, e giravam continuamente em torno de um eixo que passa pelo centro da Terra, dando uma volta completa em cada dia, no sentido retrógrado. Daqui resulta que todas as estrelas têm de se mover com movimento circular e uniforme, no sentido dos ponteiros do relógio, exibindo sempre as mesmas configurações. Mas, para descrever o movimento do Sol, da Lua e dos outros planetas visíveis a olho nu, tiveram que imaginar muitas outras esferas a rodar, dezenas de esferas, resultando um modelo assaz complicado e que não se ajustava completa e satisfatoriamente à realidade. Esse modelo só conseguia reproduzir de um modo grosseiro o movimento dos astros. Para explicar o movimento nos céus admitiram que a matéria celeste, a que chamaram "quinta essência", era diferente da que existia na Terra e que apenas se podia mover eternamente em volta desta.

Embora este modelo tenha sido aceite durante muitos séculos, actualmente está abandonado, em virtude das contradições que encerrava. O homem aprendeu a medir a distância que nos separa das estrelas, por paralaxe trigonométrica e por método fotométricos. Quando verificou que a referida distância, para estrelas diferentes, pode diferir de milhares de anos-luz, deixou de aceitar a hipótese segundo a qual as estrelas estão todas equidistantes da Terra. Com o aperfeiçoamento dos telescópios, acabou por descobrir que as estrelas mais próximas de nós fazem parte de um sistema estelar gigantesco com uma forma espiral, a que foi dado o nome de Galáxia ou Via Láctea. As viagens tripuladas à Lua, as sondas enviadas aos outros planetas, assim como observações telescópicas possibilitaram a conclusão de que os materiais que constituem os planetas, os cometas, os asteróides, assim como a poeira e o gás interestelar, são feitos de substâncias que nos são familiares aqui na Terra. Abandonou-se, portanto, a dinâmica baseada na hipótese da "quinta essência". É assim que a ciência progride: as ideias são submetidas à prova e emenda-se tudo o que não esteja de acordo com as observações.

O cepticismo em relação ao modelo das esferas celestes não é, porém, recente. Já no século III a.C. Aristarco propôs um outro modelo, um modelo heliocêntrico, que, na sua opinião, era mais adequado para descrever o movimento dos astros. Aristarco observou o tamanho da sombra da Terra sobre a Lua, durante um eclipse lunar. Com base nas dimensões dessa sombra, realizou um cálculo que o levou a pensar que o Sol é muito maior do que a Terra e que está muito mais afastado desta do que a Lua. Considerou, também, que o Sol é uma estrela, que brilhava mais e parecia maior do que as outras apenas por se encontrar mais próxima de nós. Assim, achava absurdo que as estrelas, com dimensões tão grandes comparadas com as da Terra e tão afastadas desta, girassem em seu redor, dando uma volta completa em cada dia. Para ultrapassar estas dificuldades, Aristarco pensou que seria mais conveniente imaginar o Sol fixo no centro do Universo, com a Terra e os outros planetas a girar em seu redor. Para explicar o movimento diário dos céus propôs a hipótese segundo a qual a Terra possui um movimento de rotação, em torno de um eixo de simetria, no sentido directo. Segundo esta hipótese, o movimento dos céus no sentido retrógrado é aparente, sendo devido ao movimento de rotação da Terra em torno do seu próprio eixo, em sentido contrário. Os contemporâneos de Aristarco e os que viveram nos séculos seguintes não aceitaram essa hipótese. É mais fácil admitir que são as estrelas que se movem, porque as vemos mover, do que a Terra, de cujo movimento de rotação em torno do seu eixo não nos podemos aperceber directamente. Algum misticismo e más interpretações das observações também contribuíram para refutar o modelo de Aristarco, que, apesar de tudo, permitia explicar a variação anual da inclinação das trajectórias dos astros, o movimento retrógrado dos planetas e o aumento da intensidade do seu brilho durante o movimento retrógrado.

Em finais do século XV, um monge polaco, Nicolau Copérnico (1473-1543) propôs um novo modelo também heliocêntrico, de algum modo semelhante ao de Aristarco, mas contendo novas demonstrações e recorrendo a novas observações. Copérnico, no seu livro "As Revoluções dos Orbes Celestes", escreveu: "E porque não havemos de admitir que a rotação diária aparente no Céu mas real na Terra? E assim que as coisas se passam na realidade, como disse o Eneias de Virgílio: 'Nós saímos do porto e a Terra e as cidades recuam' [Eneida, III,72]". Mais tarde Galileu, Kepler e Newton adoptaram este ponto de vista, tendo este último conseguido uma explicação unificada do movimento, isto é, uma explicação do movimento nos céus e na Terra à luz do conceito de força gravitacional, uma força universal a que estão sujeitos todos os corpos com massa.

Poder-se-ia em princípio dizer que as afirmações "A Terra roda em torno do seu eixo uma vez por dia" e "Todos os astros rodam em torno da Terra uma vez por dia" são ambas verdadeiras. A escolha de um referencial para descrever um movimento é arbitrária: qualquer referencial pode ser escolhido porque não há movimento absoluto. Contudo, convém escolher aquele que torna a descrição o mais simples possível!

Assim, para estudar o movimento dos astros e também outros movimentos, temos toda a conveniência em optar por um referencial ligado ao Sol e às outras estrelas. Neste referencial, a Terra roda em torno do seu eixo uma vez por dia, enquanto o Sol e as estrelas permanecem fixos. Esta opção permite-nos explicar o movimento com base na interacção gravitacional, permite interpretar certos fenómenos como o achatamento da Terra nos pólos e a variação da aceleração da gravidade com a latitude, e evita situações conflituosas, como as que acontecem quando escolhemos a Terra como referencial. Vejamos dois exemplos concretos. Conhecemos a massa das estrelas e sabemos que é muito maior que a da Terra. Consequentemente, a Terra não tem "meios" para obrigar as estrelas a girar à sua volta. Num referencial ligado à Terra só podemos explicar o movimento das estrelas em termos do antigo conceito de "quinta essência". Por outro lado, sabemos que as estrelas mais próximas da Terra são as do sistema estelar triplo chamado Alpha Centauri, a cerca de 4,3 anos-luz de distância. Todas as outras estrelas estão mais afastadas da Terra do que estas, muitas a milhares de anos-luz. Num referencial ligado à Terra, todas as estrelas descrevem uma órbita circular em torno desta em cada dia, o que entra em contradição com o resultado fundamental da teoria da relatividade, que afirma que a velocidade da luz não pode ser ultrapassada. Aplicado a conhecida equação do movimento circular e uniforme (v=wr) ao movimento das estrelas, considerando a distância r que as separa da Terra e a sua velocidade angular w correspondente a um ângulo de uma volta inteira por dia, chegamos conclusão absurda de que a velocidade das estrelas é milhares, ou mesmo milhões, de vezes superior à velocidade da luz. Em suma: é mais vantajoso admitir que o Sol e as estrelas estão fixos e que a Terra roda do que o contrário.

Em meados do século XIX foi construído um aparelho, tão simples quanto notável, com a ajuda do qual pode ser realizada uma experiência cujos resultados só podem ser explicados com base no movimento de rotação da Terra em torno do seu eixo. Chama-se pêndulo de Foucault. Mesmo que a Terra estivesse sempre coberta de espessas nuvens, como acontece no vizinho planeta Vénus, impossibilitando aos terrestres a observação do movimento dos astros, este aparelho bastaria por si só para mostrar que é verdadeira a afirmação de que a Terra roda em torno do seu eixo.

Um pêndulo de Foucault é um sistema constituído por uma esfera com massa de vários quilogramas, suspensa por um fio metálico que pode ter várias dezenas de metros de comprimento, e que, como qualquer outro pêndulo, pode oscilar em torno duma posição de equilíbrio. Este pêndulo tem o nome do físico francês Jean Baptiste Leon Foucault (1819-1868), porque foi ele quem idealizou e montou um destes pêndulos pela primeira vez, em 1851. A experiência foi realizada na enorme abóbada do Panthéon, em Paris. O pêndulo original de Foucault era constituído por um fio de 67 m de comprimento no qual estava suspensa uma esfera oca de cobre, cheia de chumbo, cuja massa era de 28 kg. Quando realizou a experiência, Foucault distribuiu um texto anunciando os resultados. Em 1855, a Royal Society de Londres homenageou Foucault com a Medalha Copley reconhecendo o alto mérito do seu trabalho.

Se uma pessoa caminhar em cima do carrocel, ao longo do raio deste, da borda para o eixo, sente que uma força misteriosa a empurra para o lado, perpendicularmente à trajectória. Se a pessoa se deslocar ainda ao longo de um raio, mas em sentido contrário, isto é, do centro para a borda, sente a actuação duma força igual em intensidade mas com sentido oposto: a pessoa é empurrada para o lado indicado pela seta, no interior do círculo. Podemos concluir que, quanto maior for a velocidade com que o sujeito se desloca dentro do carrocel e quanto maior for a velocidade com que o carrocel roda, maior será a intensidade da força que actua no sujeito. Também se observa experimentalmente que, se o carrocel rodar em sentido contrário, a força sobre o sujeito terá sentido inverso. Do mesmo modo, se pusermos um berlinde a oscilar, dentro de uma superfície esférica (por exemplo, uma bola de plástico cortada ao meio), a projecção da sua trajectória num plano horizontal é um segmento de recta. Todavia, se o sistema for colocado num prato dum gira-discos a rodar, a projecção da trajectória do berlinde já não será um segmento de recta tendo uma forma complicada. Tal como o sujeito no carrocel, o berlinde será empurrado para um lado, quando se deslocar num determinado sentido, e empurrado para o lado contrário, quando se deslocar em sentido inverso.

O movimento do pêndulo de Foucault tem a seguinte característica especial: O seu plano de oscilação roda directamente no sentido horário (no hemisfério norte). Se for posto inicialmente a oscilar na direcção norte-sul, por exemplo, o seu plano de oscilação vai rodar no sentido dos ponteiros do relógio.

A rotação do plano de oscilação do pêndulo pode ser atribuída a uma força que, actuando no pêndulo perpendicularmente à sua trajectória, o empurra para a direita quando este se desloca de sul para norte, e o empurra para a esquerda quando este se desloca de norte para sul. Se analisarmos, com atenção, esta força, que modifica a trajectória do pêndulo, verificamos que ela é semelhante à dos exemplos anteriores: é perpendicular à trajectória e inverte o seu sentido quando o corpo onde actua se passa a mover em sentido oposto. Se admitirmos que o pêndulo oscila em cima dum sistema em rotação, isto é, se admitirmos que a Terra roda em torno do seu eixo, encontramos uma explicação para o movimento do pêndulo de Foucault por analogia com os exemplos que foram apresentados: o plano de oscilação do pêndulo de Foucault roda num determinado sentido porque está a oscilar em cima de um sistema que roda em sentido contrário, a Terra; nestas condições, sofre a acção duma força peculiar, perpendicular à trajectória, que inverte o seu sentido quando o sentido do deslocamento é invertido, e que provoca a rotação do plano de oscilação.

Esta explicação intuitiva para o movimento do pêndulo de Foucault levanta uma questão importante: De que tipo a força que falamos para explicar o movimento do pêndulo?

Para explicar o movimento usamos o conceito de interacção ou força, tendo sido necessário introduzir quatro tipos diferentes de força para descrever o comportamento da natureza. Esses quatro tipos de força receberam os seguintes nomes: força nuclear forte, força nuclear fraca, força electromagnética e força gravitacional. A força que encurva a trajectória do pêndulo de Foucault não se enquadra em nenhum destes tipos de força. Será que devemos propor um novo tipo de força para explicar o movimento do pêndulo de Foucault? Não, porque este fenómeno não pode ser compreendido com base no conceito de interacção. Uma interacção é uma acção recíproca entre dois ou mais corpos e não conseguimos atribuir o encurvamento da trajectória do pêndulo à acção de um ou vários corpos sobre este. Dizemos, portanto, que a "força" de que falamos para explicar o movimento do pêndulo é uma "força fictícia", ou "força de inércia". Trata-se de uma simples artimanha cujo uso se deve à impossibilidade de explicar de outra forma o movimento dos corpos em certos referenciais. Estes referenciais, nos quais temos que usar o "truque" das "forças fictícias" para explicar o movimento dos corpos, chamam-se referenciais não inerciais. Um referencial em rotação é não inercial. Pelo contrário, os referenciais onde isto não é necessário, isto é, onde possível explicar o movimento dos corpos com base no conceito de interacção, denominam-se referenciais inerciais. O pêndulo de Foucault mostra que a Terra é um referencial não inercial. Pelo contrário, usando o Sol e as outras estrelas como referencial, não necessitamos de recorrer a quaisquer forças fictícias. Para um hipotético observador no Sol é a Terra que roda, em vez do plano de oscilação do pêndulo. De facto, o Sol constitui um referencial inercial para o estudo de um número maior de fenómenos do que a Terra. A rotação lenta do pêndulo de Foucault constitui uma prova inequívoca que a Terra gira em torno do seu eixo.

DO OUTRO LADO DA SIDA


Agora que Thabo Mbeki, líder da África do Sul e campeão da ignorância científica, devido às suas posições sobre a SIDA (AIDS no Brasil) saiu de cena, é altura de recordar o que sobre a SIDA e sobre ele escrevi no meu livro "A Coisa Mais Preciosa que Temos" (Gradiva). Porém, o futuro líder pode não ser melhor, como relata este post.


Convidaram-me na Semana Mundial de Combate à SIDA realizada em Novembro de 2000 para participar numa mesa-redonda intitulada “Do outro lado da SIDA”. Tratava-se de reunir pessoas que, em princípio, não são especialistas na doença, nem no seu estudo nem na sua prevenção e tratamento, não estavam portanto “do lado da SIDA”, mas sim do “outro lado”, o lado dos leigos. Juntaram-se assim, além de um físico, uma socióloga, um psicólogo e um filósofo. O desafio, pela novidade, era aliciante. Assim como era aliciante poder contribuir de alguma maneira para o melhor esclarecimento público sobre a terrível doença.

Que tem um físico a dizer sobre a SIDA? Sobre o assunto ele não sabe mais do que aquilo que é divulgado publicamente, em folhetos e nos “mass media”, que a SIDA, síndroma de imunodeficiência adquirida, é uma doença transmitida por vírus, o HIV ou outros do género, que necessitam de um contacto íntimo para se transmitir. Uma vez instalado, fica-se seropositivo: o vírus pode demorar algum tempo a executar a sua missão mortífera, mas acaba em geral por destruir as defesas do organismo, falecendo o seu portador por uma debilitação progressiva. Tal é conhecido de toda a gente, assim como os meios de evitar contactos transmissores de doença. Se acaso houver alguém que ainda não saiba, fica a informação que o vírus não atravessa um preservativo! Também é conhecido que, apesar de não haver actualmente nem vacina nem cura para a SIDA, existem meios de tratamento com relativa eficácia: algumas drogas químicas como o AZT, combinadas e em doses que não deixam de provocar efeitos secundários, podem em muitos casos adiar, mesmo indefinidamente, as manifestações da doença. Em todo o mundo, enquanto a SIDA cresce (nomeadamente em África) são procurados em institutos e laboratórios meios eficazes de prevenir e tratar a doença. E há a esperança que os cientistas consigam um dia vencer o vírus, antes que o vírus nos vença a nós.

Um físico, porque conhece por dentro os mecanismos de funcionamento da ciência (e da sua filha, a tecnologia, apesar desta ser uma filha pródiga que saiu de casa e leva uma vida por vezes pouco recomendável), acredita no vírus sem nunca o ter visto, nem mais novo nem mais velho. Sabe que ele foi identificado nos anos oitenta por colegas seus cientistas. Lembra-se bem de ter lido em revistas de divulgação e também nos media o debate sobre a prioridade da descoberta, entre o francês Luc Montagnier e o norte-americano Max Gallo. Sabe que essa identificação passou por um crivo muito apertado que é o reconhecimento dos pares e que só depois disso ela foi publicada em revistas científicas especializadas. Sabe que depois da descoberta esta foi escrutinada e confirmada em numerosos laboratórios e que os novos meios de tratamento se baseiam obviamente na natureza e acção dos microorganismos portadores da doença. Apesar de ser uma doença letal, que chega a todos (e não apenas a homosexuais e drogados, como muita gente julgava), a que alguém já chamou uma “praga do fim do século”, trata-se apenas de um efeito desregulador causado por vírus, que está ser, cada dia que passa, mais bem conhecido e, por isso, mais bem combatido.

Mas será que toda a gente sabe que a SIDA vem de um vírus, pequeníssimo e invisível a olho nú, e que, baseado no conhecimento que advém desse facto, actua em conformidade com o nosso melhor conhecimento sobre a propagação viral nos humanos? Infelizmente não... Este é um dos muitos casos de ignorância científica que pululam no mundo moderno. A sociedade moderna é dominada pela ciência mas parece que a mente humana teima em não reconhecer esse domínio. E o pior é quando a ignorância científica está instalada no governo das nações, ampliando devastadoramente os seus resultados a uma escala colectiva.

É isto, a falta de cultura científica nos cidadãos e nos governos, que mais pode preocupar um físico, a propósito da SIDA. É um facto que a generalidade dos governos tem actuado de acordo com aquilo que é o nosso melhor conhecimento da SIDA, realizando campanhas públicas de prevenção, fornecendo meios de diagnóstico e modernizando os meios de tratamento. Mas um contra-exemplo que vale a pena apontar como “campeão” da ignorância científica é o actual governo da África do Sul, personalizado na pessoa do presidente Thabo Mbeki.

Mbeki, infeliz sucessor do grande Nelson Mandela, diz não acreditar que a SIDA seja causada por vírus. Atribui a doença ao subdesenvolvimento e à má-nutrição, chegando a sugerir que são os próprios meios de tratamento (o AZT e outros) que causam a doença. Morrer-se-ia não da doença mas da cura! O seu pensamento radica numa ideia muito “sui generis” e muito errada de ciência, que faz lembrar a “ciência alemã” do tempo da Segunda Grande Guerra. O que é africano ou sul-africano é bom, o que vier de fora é necessariamente mau. A tal ponto que, quando alguns médicos sul-africanos propuseram um remédio absurdo para a SIDA (o viroderme, que tanta controvérsia deu mas de que já ninguém fala, e que apareceu associado ao nome de uma médica portuguesa), tal solução foi imediatamente apoiada por autoridades sul-africanas em detrimento de outras que, apesar de cientificamente mais sólidas, não eram africanas. Mbeki chegou a patrocinar reuniões sobre a SIDA em que cerca de metade dos convidados eram vozes heterodoxas dos meios médicos e farmacêuticos, que são ultra-minoritários na comunidade científica, procurando auxílio científico às suas teses.

Pode parecer estranho a um leigo que a ciência contenha contradições e contraditores. Pois não é a ciência certa? Não, a ciência não é certa, mas contém em si, no seu método, um caminho para nos livrarmos progressivamente da incerteza. Para nos livrarmos do erro. E o método científico tem o seu juiz no consenso da própria comunidade científica especializada num dado assunto, perante todo o conjunto de provas produzidas. Não é de maneira nenhuma necessária unanimidade para se chegar a um resultado científico mas tão só e simplesmente maioria (quantos disparates se ouvem por aí por não se conhecer a metodologia científica: veja-se o caso português da co-incineração!). Há uns, poucos, cientistas que não acreditam no vírus: um deles é muito conhecido, Peter Duesberg, professor de Biologia Molecular na Universidade de Berkeley, nos Estados Unidos. Não são necessariamente pessoas estúpidas, apesar de também o poderem ser. E têm todo o direito a expandir a sua opinião (fazem-no de resto muito bem na Internet). É bom que a exprimam porque a ciência vive da disputa viva, do choque dos contrários. Mas a esmagadora maioria dos cientistas da SIDA reconhece a descoberta do vírus como a maior e melhor peça de conhecimento sobre a SIDA disponível até hoje, desenvolvendo a sua actividade em conformidade.

Na África do Sul continua-se a morrer estupidamente de SIDA. Actualmente, cerca de 15% dos adultos de sexo masculino estão infectados e tal número tem uma tendência muito perigosa a crescer. Morre-se por ignorância própria (promiscuidade sexual, por exemplo) mas também por ignorância do governo (que dificulta a experimentação de fármacos anti-SIDA). Morre-se até inocentemente como as numerosas crianças que recebem o vírus no ventre ou dos seios de mãe seropositiva, sem que o governo e as autoridades de saúde lhes dêem qualquer atenção e prioridade.

Morre-se – e é uma das piores mortes – de ignorância científica. Saber alguma ciência, reconhecer o valor e o poder da ciência, actuar de acordo com o que a ciência actual diz pode ser uma questão de vida ou de morte. E é isto o que um físico tem a dizer sobre a SIDA.

sábado, 27 de setembro de 2008

DVD-ROM BIBLIOTECA JOANINA

Informação recebida da Universidade de Coimbra:

Apresentação do DVD-ROM Biblioteca Joanina Virtual
30 de Setembro | 17:00 | Biblioteca Joanina

Irá realizar-se na Biblioteca Joanina, no dia 30 de Setembro, pelas 17 horas, a apresentação do DVD-Rom Biblioteca Joanina Virtual. Esta obra digital, com texto em seis línguas, contém uma visita guiada pela história, arquitectura e decoração da Casa da Livraria e, inclui, em texto integral, um conjunto de 21 obras raras e preciosas da biblioteca.

A coordenação científica do projecto, que foi apoiado pelo Programa Operacional da Cultura do Ministério da Cultura, é do Professor Doutor António Filipe Pimentel, especialista em História de Arte, e a concepção, desenvolvimento e produção técnica da empresa MediaPrimer - Tecnologias e Sistemas Multimédia, Lda.

DIAS DO SOM

Informação recebida do Museu de Ciência da Universidade de Coimbra:

O Dia Mundial da Música (1 de de Outubro) vai ser celebrado no Museu da Ciência, com a iniciativa "Dias do Som". para mais informações ver aqui.

CIMÉLIOS RELIGIOSOS


Depois de termos aqui publicado uma descrição de cimélios científicos, eis uma descrição de cimélios religiosos, isto é, relacionados com a Igreja, que se encontram na exposição "Cimélios" patente na Biblioteca Geral da Universidade de Coimbra. A ordem é a cronológica. Entre as obras encontram-se bíblias enigmáticas, o primeiro colectório e o primeiro regimento publicado da Inquisição, o primeiro sermão de auto-de-fé que se publicou em Portugal, uma das primeiras obras europeias impressas na China, algumas das primeiras obras da tipografia conimbricense, e a primeira marca de uma biblioteca pública em Portugal. Os textos são da responsabilidade do bibliotecário e Director Adjunto daquela Biblioteca António Eugénio Maia Amaral.

BÍBLIA
[Bíblia Sacra] [manuscrito]. [11--]. 3 vol. (2 colns., 35-40 l.) : perg., ilum. color. ; 520x360 mm. Texto em latim. Letra carolina. Encadernação em pele gravada a ferros dourados com o super-libros setecentista da Livraria da Universidade, cantos e lombada mutilados.Ms. 3088/3090

A razão para mostrar esta bíblia, além da qualidade evidente da sua iluminura (bem melhor que a caligrafia) é recolher também a opinião dos “connaisseurs” reunidos por ocasião do congresso da Associação Internacional de Bibliófilos. Datável do último terço do século XII, é uma bíblia atlântica, a que falta um volume, e que nos parece distante dos programas decorativos hispânicos que conhecemos. Inclui a carta apócrifa aos Laodicenses, atribuída a S. Paulo, frequente em manuscritos copiados nos scriptoria do centro-sul da Europa, entre os séculos VI e XII. Posteriormente, foi acrescentado ao segundo volume um último fólio, o 189, datável paleogràficamente de inícios ou meados do século XIII, contendo doutrina acerca das Quatro Idades do Mundo. Este conteúdo remete para uso numa ambiência provavelmente monástica, com preocupações de sabor milenarista. Disponível na Internet em: http://bdigital.bg.uc.pt/

BÍBLIA. A.T.
[Bíblia] [manuscrito]. [14--]. [385] f., (3 colns., 32 l.) : perg. ; 278x227 mm. Fls. 310v. a 350v. com texto a 2 colns. Texto em hebraico. Vários apontamentos biográficos de nascimentos e da morte de Samuel Costa e de Sincha, mulher do possuidor, datados de 1557. Encadernação com pastas de madeira, revestidas a pele castanha, gravada a ferros dourados; lombada de 5 nervos; fechos de bronze, incompletos. Cofre 1.

Manuscrito em velino atribuível à escola de calígrafos de Lisboa do século XV. Encadernação da época. Não tem colophon que nos informe da data e do nome do seu autor. Faltam-lhe algumas características decorativas típicas da escola lisboeta (tarjas e iluminuras cor de malva). O manuscrito foi adquirido na Holanda, pelo Doutor Manuel Pedro de Mello, lente da então Faculdade de Matemática, tendo sido confiada, para estudo, a uma comissão de teólogos presidida por Fr. Domingos de Carvalho, lente de Teologia. O códice recolheu à Biblioteca da Universidade, em 1857. Passou a ser conhecida como “Bíblia de Abravanel” depois de Mendes dos Remédios (em estudo já antigo) a ter relacionado com a família Abravanel, de Lisboa e Sevilha, e atribuído “o ano de 1429 como referência”, uma data precoce não contraditada pelo estudo recente do Prof. Saul A. Gomes. Contudo, não podem excluir-se semelhanças com exemplares assinados pelo calígrafo Samuel b. Isaac de Medina, datados entre 1469 e 1490, e que se conservam na Palatina de Parma, em Cincinnati e em Oxford. Disponível na Internet em: http://bdigital.bg.uc.pt/

LOURENÇO JUSTINIANO, Santo, 1381-1455
... Ho liuro que se escreue da regra et perfeyçam da conuersaçam dos monges ... / per ho reuerendo senhor Lourenço Iustiniano primeyro patriarcha de Veneza ... Coimbra, moesteyro de sctã Cruz : per Germã Galharde, 28 Abril 1531. [1], 94, [1] f. : il. ; 2º (30 cm). Pert. : Livraria do Visconde da Trindade. Encadernação em pele gravada a ferros dourados. V.T. 18-10-7

O Livro da regra e perfeiçam da conversaçam dos monges seguido do Livro da vida solitária, é tradução de natureza ascética e mística atribuída à Infanta D. Catarina, revista pelos cónegos e impressa em 28 de Abril de 1531. O tipo é gótico, a duas colunas, com diversas gravuras e letrinas em madeira. Germão Galharde (German Gaillard), impressor de origem francesa estabelecido em Lisboa, foi chamado a Coimbra, em 1530, para montar a tipografia do Mosteiro de Santa Cruz. Em 1532, já se encontrava de novo em Lisboa, onde parece ter permanecido até à sua morte. O seu labor tipográfico foi ininterrupto e quase todas as suas impressões são em caracteres góticos, tipos que terá adquirido aos herdeiros de Valentim Fernandes. Muitas das suas obras vêm ilustradas com gravuras, várias das quais já executadas em Portugal. Disponível na Internet em: http://bdigital.bg.uc.pt/

CÓNEGOS REGREANTES DE SANTO AGOSTINHO
Liuro das constituiçoens e costumes q[ue] se guardã em os moesteyros da cõgregacam de sancta Cruz de Coi[m]bra, dos Canonicos regulares da ordem de nosso Padre sancto Augustinho. - Coimbra : per os Canonicos regulares do moesteyro de sancta Cruz, 1558. LVI f. : il. ; 4º (22 cm) Encadernação em pergaminho reaproveitado.R-12-7

Um dos resultados mais notáveis da reforma do Mosteiro de Santa Cruz, no reinado de D. João III, foi a criação de uma oficina tipográfica dentro do próprio convento. Depois do impulso trazido por Germão Galharde, os cónegos começaram, em 1532, a imprimir pelos seus próprios meios. Os textos regulamentares da vida interna do Mosteiro ocupam em permanência os monges tipógrafos. Este Livro das constituições e costumes foi a principal obra da tipografia de Santa Cruz com edições em 1532, 1534, 1536, 1544, 1548, 1553 e 1558. A obra corporiza a reforma introduzida por Frei Brás de Barros, ordenando a vida do mosteiro sob três princípios: o recolhimento, o silêncio e a clausura. Sob o título, uma gravura com uma cruz sustentada por dois anjos (o emblema do mosteiro) e no verso uma gravura representando a comunidade religiosa em assembleia, escutando o superior que está sentado ao meio, com um livro aberto. A tipografia de S. Cruz foi transferida para S. Vicente de Fora em 1577. Disponível na Internet em: http://bdigital.bg.uc.pt/

IGREJA CATÓLICA. Papa, 1227-1241 (Gregório IX)
Divi Gregorii Papae hvivs nominis primi, cognomento Magni, Omnia qvae extant, opera… Parisiis: [Compagnie du grand navire], 1586. 2 vol.; 2º (41 cm). Encadernação em pastas de madeira revestidas a pele gravada a ferros secos e com o super-libros da Sapiência sentada com a divisa “[florão] Insignia Vniversitatis Conimbricensis” gravada a ferros dourados BJ 2-4-6-1

Em 6 de Setembro de 1603, a Universidade de Coimbra mandou executar a “estampa” (cunho) de um super-libros especialmente para os livros que tinham sido adquiridos no estrangeiro, em 1602, pelo bacharel Pedro de Mariz, “corrector das impressões e guarda da Livraria”. Sabemos que ferros com este desenho foram usados pelos encadernadores Domingos Fernandes, Francisco Álvares e Manuel Álvares. Outro desenho semelhante, porventura estrangeiro, mais perfeito mas graficamente menos eficiente, é orlado pela divisa, retirada dos Provérbios de Salomão (8:15), de acordo com os Estatutos filipinos de 1597. A matriz que serviu para o estampar, executada em latão e ainda assente num cepo muito usado de madeira, conserva-se no Arquivo da Universidade de Coimbra. Qualquer que tenha sido, destas duas marcas, a primeira a ser usada na Livraria da Universidade para corresponder à regra de que a sua Insígnia “se porá em todas as fabricas… e livros dela” (Estatutos de 1591), essa será então a primeira marca de posse usada por uma biblioteca pública em Portugal.

SANDE, Duarte de, 1531-1600
De missione legatorum Iaponesium ad Romanum Curiam … Dialogus
… In Macaensi portu Sinici : in domo Societatis Iesu, 1589. [4], 92 p. ; 4º (22 cm). Encadernação em pele gravada a ferros secos. R-13-17

Seja a autoria deste texto de Duarte de Sande (como aparece nos catálogos das principais bibliotecas) ou de Alexandre Valignano (1539-1606), certo é que este relato da vinda dos emissários japoneses a Roma e à Europa foi o segundo livro impresso em Macau (China) com uma tipografia de tipos móveis. O parque tipográfico que serviu para esta impressão tinha sido enviado de Portugal por Valignano, em 1587, com destino às Missões do Japão, onde veio a servir efectivamente para produzir todas as impressões luso-nipónicas, entre 1590 e 1611. Na falta de “letrinas” suficientes para estas primeiras impressões europeias, foram incorporadas capitais e ornamentos tipográficos executados localmente por artífices chineses. Um casamento tecnológico que confirma a absoluta prevalência da técnica xilográfica tradicional, pois, como escreveu Matteo Ricci sobre os xilógrafos chineses, "… são tão hábeis a gravar estes blocos, que não consomem a fazer um deles mais tempo do que um dos nossos tipógrafos a compor uma página e a fazer as correcções necessárias."

INQUISIÇÃO, Portugal
Collectorio de diuersas letras apostólicas, prouisões reaes e outros papeis em que se contém a Instituyção & primeiro progresso do Sancto Officio em Portugal & vários priuilegios que os Summos Pontífices & reis destes reynos lhe concederão diuidido em sete titolos … Em Lisboa : nas casas da Sancta Inquisição, 1596. [6], 137 f. ; 2º (30 cm). Pert.: Livraria do Visconde da Trindade. Encadernação em pele gravada a ferros secos e com o super-libros do Visconde a ferros dourados em ambas as pastas, lombada gravada a ferros dourados. V.T.-15-10-7

Obra extremamente rara, de que só se conhecem mais dois exemplares, na BNP, em Lisboa, e na biblioteca d’el Rei D. Manuel II, conservada na Fundação da Casa de Bragança, em Vila Viçosa. Trata-se do mais antigo “colectório” ou colecção de Bulas e Breves apostólicos, cartas, alvarás e provisões reais referentes à instituição e ao progresso da Inquisição em Portugal. Foi impressa nas Casas da Santa Inquisição por ordem do Inquisidor Geral D. António de Matos de Noronha, cujas armas de bispo de Elvas ornamentam a página de título. Encadernação moderna, imitando o antigo.

INQUISIÇÃO, Portugal
Regimento do Santo Officio da Inquisiçam dos Reynos de Portugal … Lisboa : Pedro Craesbeeck, 1613. [2], 48, [20] f. ; 2º (32 cm). Pert.: Livraria do Visconde da Trindade; Ex-libris de A. Ramel. Encadernação em pergaminho com duplo filete e o emblema da Companhia de Jesus gravado a ferros dourados ao centro e vestígios de atacas. Obra inserida em caixa de pele ricamente gravada a ferros dourados e com o super-libros do Visconde. V.T. 15-10-4

Trata-se do primeiro Regimento impresso do Tribunal do Santo Ofício, mandado ordenar pelo Inquisidor-Geral D. Pedro de Castilho. Página de título espelhada. Encadernação da época, conservada em caixa moderna assinada “MAN. ELM”, encadernador que ainda não identificámos. Além de exemplares de todos os Regimentos publicados (1613, 1640, 1774 e 1821), a Biblioteca Geral possui uma cópia manuscrita de um Projecto de hum novo Regimento para o Sancto Officio (Ms. 1060), de conteúdo bem mais humanitário e tolerante, onde o redactor Pascoal José de Melo (1738-1798) preconiza, por exemplo, a abolição dos Autos de Fé, tanto os privados (os que se realizavam nas “Casas” da Inquisição) como os públicos.

SANTANA, Estevão de, O.C.,1558-1630
Sermão do acto da fee, que se celebrou na cidade de Coimbra, na segunda dominga da Quaresma. Anno de 1612. Em Lisboa : por Antonio Alvarez, 1618. 23, [1] f. ; 4º (19 cm). Pert.: Livraria do Visconde da Trindade. Encadernação em pele com o super-libros do Visconde gravado a ferros dourados em ambas as pastas. V.T.-15-8-1

Segunda edição, raríssima, do sermão escrito para o primeiro Auto-de-Fé realizado em Coimbra e o primeiro sermão desta espécie que se publicou em Portugal. Este exemplar fez parte da famosa “Judaica” de Elkan Nathan Adler (1861–1946) e, como a maior parte dos outros 67 sermões de Autos-de-Fé da colecção, foi adquirido pelo Dr. Alberto Navarro à Livraria Rosenthal, em 1956. Na preciosa colecção do tema da “Inquisição”, comprada e reunida pelo Visconde da Trindade e agora na Biblioteca Geral, encontram-se sermões proferidos e impressos em Coimbra, em Évora, em Lisboa e em Goa. Serviram de fonte a E. N. Adler para escrever o seu Auto de Fe and jew, publicado em 1908.

RELAÇÃO
Relação e lista verdadeira das pessoas que sairão no auto de fé que se celebrou na praça da cidade de Coimbra em domingo 4 de Maio de 1625 annos. Em Coimbra : na impressam de Diogo Gomez de Loureyro, 1625. [12] f. ; 4º (20 cm). Pert.: Livraria do Visconde da Trindade. Encadernação em pele com super-libros do Visconde gravados a ferros dourados em ambas as pastas e inserida, com outras, em caixa de cartão também com super-libros heráldico gravado a ferros dourados e fechos de metal. V.T.-15-10-1(1)

LISTE DES PERSONNES
Liste des personnes qui ont été condamnées a l’Acte public de Foi, célébré dans le Cloître du Couvent de Saint Dominique à Lisbonne, le 20 Septembre 1761. A Lisbonne : [s.n.], 1761. 28 p. ; 8º (17 cm). Pert.: Livraria do Visconde da Trindade. Encadernação em pele vermelha com filete e super-libros do Visconde gravados a ferros dourados em ambas as pastas e inserida, com outras, em caixa de cartão também com super-libros heráldico gravado a ferros dourados e fechos de metal. V.T. 15-10-3(15)

A colecção do Visconde da Trindade conserva dezenas de listas de Autos de Fé e, no caso deste, de 4 de Maio de 1625, conserva também a publicação do sermão que o jesuíta Padre Manuel Fagundes proferiu na cerimónia. Em três grandes caixas, divididas pelos vários tribunais do território continental (Coimbra, Lisboa e Évora), estas listas impressionam pelos milhares de nomes de vítimas do temido Tribunal que delas constam. Pensa-se que a redacção e publicação de algumas destas listas em francês, foi feita para provocar o maior impacto possível na comunidade estrangeira de Lisboa. Folheto, da maior raridade, a colecção do Visconde da Trindade conserva dois exemplares (sendo um incompleto) desta lista em francês. Dela constam a condenação do padre Gabriel Malagrida (p. 26), que chocou Voltaire e toda a Europa iluminista e a condenação de Francisco Xavier de Oliveira (1702-1783), o Cavaleiro de Oliveira (p. 27), queimado em efígie por se encontrar refugiado em Londres. De lá, terá ele comentado sobre esse dia 20 de Setembro: "Nunca senti tanto frio!"

GRAMÀTICA
Gramatica da língua geral do Brazil, com hum Diccionario dos vocábulos mais uzuaes para a intelligencia da dita língua [manuscrito]. [Belém, 1750]. [4, 1 br., 1] f., 224 p., [2, 4 br.], [86] f., [3 br., 1] f. : papel ; 215x150 mm. Texto em português e em tupi. Encadernação em papel de fantasia. Ms. 69

DICCIONÁRIO
Diccionario da lingua geral do Brasil, que se falla em todas as villas, lugares, e aldeas deste vastissimo Estado [manuscrito]. Pará [i.é Belém], 1771. [5 br., 2], 164, [2 br.] f. ; 220x155 mm. Texto português-tupi. Encadernação em papel de fantasia, muito deteriorada. Ms. 81

Dois documentos da mesma mão, facto evidente pelo ornamento caligráfico, tão pessoal que funciona como uma verdadeira "assinatura" do anónimo autor ou copista. O dicionário incluído no Ms. 69 tem 3604 verbetes, enquanto o do Ms. 81, faltando-lhe embora 6 folhas, deve ter contido mais de 6900. A comparação dos dois códices, separados por 21 anos, permitiu a Cândida Barros perceber a evolução da dicionarização do tupi em ambiente jesuíta. Encontra-se na Biblioteca Geral da Universidade de Coimbra o maior conjunto conservado em bibliotecas públicas, portuguesas ou brasileiras, de dicionários setecentistas da língua indígena do Brasil, na maior parte inéditos. Completam o conjunto o Ms. 94 ("Diccionário da Língua Brazilica...") e o Ms. 148 (miscelânea que inclui "Significados de alguns termos e frases..."), aos quais se poderiam ainda acrescentar o Ms. 1089 com cópia da "Doutrina christan..." do Padre João Filipe Bettendorff. O Ms. 81 já foi publicado com transcrições em CD-ROM, em Junho de 2008, e três destes documentos estão digitalizados na Internet em: http://bdigital.bg.uc.pt/.

MONITA SECRETA
Monita secreta da Comp[anhia] de Jezu [manuscrito]. [séc. 17-18]. [70] f. ; 152x102 mm. Encadernação de cinto em pergaminho. V.T.-19-8-1

A Monita secreta foi atribuída ao Principal Claudio Acquaviva (1543-1615) e muito divulgada durante as controvérsias político-pedagógicas que levaram à expulsão dos jesuítas de Portugal, no século XVIII. Aquela atribuição é reconhecida, hoje, como alegação sem fundamento, devendo antes creditar-se a sua redacção a um tal Jerome Zahorowski, expulso da Companhia de Jesus, em 1611. A “fabricação” deste texto, onde entre outras recomendações sobre como aumentar o poder e a riqueza da Companhia, se davam instruções sobre a melhor forma de cativar os rapazes para noviços e de explorar as viúvas ricas sem filhos, foi ao ponto de se terem produzido cópias como esta, com encadernações “de cinto” que imitavam as do uso dos religiosos e que até simulavam a usura do tempo.

QUEM VAI GANHAR A CASA BRANCA?


O Boletim de Novidades Científicas do American Institute of Physics informa-nos que a corrida à Casa Branca continua renhida, mesmo adoptando critérios de previsão ditos científicos:

INSIDE SCIENCE RESEARCH---PHYSICS NEWS UPDATE
The American Institute of Physics Bulletin of Research News
Number 873 September 25, 2008 www.aip.org/pnu
by Phillip F. Schewe, James Dawson, and Jason S. Bardi

PREDICTING THE PRESIDENTIAL ELECTION, SORT OF

Two mathematicians have devised what they say is a surprisingly effective means to predict the outcome of the U.S. presidential election using median statistics based on voter polling. In a paper in the journal Mathematical and Computer Modeling, Wes Colley, of the University of Alabama, Huntsville, and J. Richard Gott III, at Princeton University, said they have developed a system that uses the margins of victory for each candidate in each of the many polls taken during the past month. Those margins are then ranked from the largest margin to the smallest, and the middle number, or the median, is used as the candidates score for the individual states. Colley is nationally known for his computer modeling system used in determining college football rankings by the NCAA, and his new system has Barack Obama ahead of John McCain. "John McCain needs several swing states to break his way, whereas Obama can afford to lose a couple and still win the election," Colley said.

Before the Obama supporters start breaking out the champagne, however, they should be aware of new research from the Maryland-based Institute for Operations Research and the Management Sciences the world's largest society for operations research professionals. Using a methodology that "applies a mathematical model of state polling data, using a dynamic programming algorithm to forecast electoral results," has McCain ahead by as many as 27 electoral votes (282.8 votes for McCain, 255.2 for Obama).

Then there is University of New Hampshire Survey Center founder and former Gallup Poll managing editor David Moore, who is revealing in a new book that "media polls are not used to uncover the 'will' or thoughts of the public, but rather to manufacture a public 'opinion' that grabs the attention of journalists and can be used to fill media news holes." The methodology used by the major national polls, he says, "give false readings of which candidates voters prefer and what the public wants."

VÍDEO-JOGOS E CIÊNCIA

É lugar comum pensar-se que as crianças e jovens preferem vídeo-jogos à ciência. Mas leia-se aqui (na revista "Wired") uma surpreendente relação entre esses jogos e o método científico.

sexta-feira, 26 de setembro de 2008

HUMOR CIENTÍFICO - O BURACO NEGRO


O "humor científico" de David Marçal no "Inimigo Público" de hoje:

Cientistas continuam a alimentar o buraco negro com hélio líquido até à colocação de banda gástrica

A anunciada paragem do LHC (o acelerador de partículas apocalíptico recentemente inaugurado na fronteira entre a França e a Suiça) não se verificou. Ao fim de menos de uma semana formou-se um mini-buraco negro que engoliu de imediato alguns dos magnetos gigantes mais próximos. À hora de fecho desta edição os cientistas continuavam a alimentar o buraco negro com hélio líquido, uma solução provisória. A ideia é que o buraco passe a alimentar-se do lixo de Nápoles e dos resíduos radioactivos da Europa. No entanto, a situação é pouco sustentável porque o buraco negro vai crescendo e precisando de mais alimento. A solução de médio prazo poderá passar por uma banda gástrica.

David Marçal

QUEM TE VIU JÁ NÃO TE VÊ


Minha crónica de hoje publicada no "Público":

Na passada segunda-feira liguei a televisão na RTP1 para ver o programa da Fátima Campos Ferreira e apareceu-me, em vez dele, um jogo do Paços de Ferreira. O prós era o Paços de Ferreira e o contras era o Benfica. O futebol ameaça tornar-se omnipresente na televisão pública, agora que os direitos da “Liga Sagres” foram adquiridos pela RTP até ao ano de 2010.

Embora não desgoste de ver uma boa partida de futebol, confesso que desliguei a televisão e liguei-me à Internet para “blogar”. Não penso que a transmissão de futebol profissional seja serviço público. Se me tivessem perguntado – infelizmente não perguntaram – teria dito que o dinheiro dos impostos não devia alimentar os nebulosos negócios da bola. Aliás, nos países mais desenvolvidos, esse tipo de jogos passa só em canais pagos e só vê quem estiver disposto a pagar.

Não fui só eu que abandonei a televisão, que, cheia de futebol, novelas e “reality shows”, está imprópria para consumo. Com efeito, um dos fenómenos mais sintomáticos do moderno audiovisual tem sido o êxodo das camadas mais jovens da população da televisão para a Internet. Em Portugal, tal como no resto da Europa, os jovens já passam mais tempo no computador do que diante da TV, já preferem o You Tube aos Morangos com Açúcar. Quem a viu já não a vê!

Bem sei que a televisão continua, entre nós, a ser consumida em demasia. Portugal é dos países europeus com maior dependência da “caixa mágica”. Li algures na Internet que só existem, emtodo o país, 1400 casas sem televisão. Segundo estatísticas do Observatório Europeu do Audiovisual de 2004, somos até, de todos os países europeus, aquele onde há mais casas com pelo menos duas televisões (71 por cento de lares têm dois ou mais aparelhos). Segundo dados da Marktest de 2008, a nossa média de consumo diário de televisão é de três horas e 37 minutos. E as pessoas com mais de 65 anos passam, em cada dia, mais de cinco horas e meia em frente ao televisor. Contudo, o comportamento dos jovens - e não só - indicia que o público começa a estar farto de ter cada vez mais do mesmo, quando ao lado há alternativa...

Os chamados canais generalistas, TVI, RTP e SIC, na ganância de captarem audiências e maximizarem os lucros, escusam de descer mais para mostrar que não há limites para o telelixo. Já o mostraram e demonstraram. Se os jogos são maus, as novelas são piores e – a verdade seja dita, paguem-me ou não - os “reality shows” são péssimos. Já não é só o corpo que se vende, mas a alma. Quanto aos noticiários, chegam a estender-se por mais de uma hora, como não acontece em mais nenhum país civilizado, relatando a rotura de um cano e a fuga de um gato. Uma das medidas mais fáceis em prol do desenvolvimento poderia ser imediata: encolher os noticiários, escolhendo as notícias. Ao argumento useiro e vezeiro de que as audiências só querem a falta e o penalty, traição e ciúme, a verdade e a mentira, o cano e o gato, já respondeu o filósofo Karl Popper em Televisão, um perigo para a democracia (Gradiva, 1995): “Nada no seio da democracia proíbe as pessoas mais instruídas de comunicarem o seu saber às que o são menos. Pelo contrário, a democracia sempre procurou elevar o nível da educação; é essa a sua autêntica aspiração”.

Dizem que foi o governo que mandou comprar os direitos do futebol. Não me admirava nada, pois, para distrair da crise, o povo sempre pode ver uns jogos. Também pouca gente se admirará que haja cuidada e atempada intervenção governamental no concurso do quinto canal generalista, um grande negócio a avaliar pela voracidade das partes interessadas (Portugal Telecom, Zon, Controlinvest e Cofina, curiosamente os dois últimos com ligações ao futebol). Noutro megaconcurso que já decorreu, o da televisão digital terrestre, que vai implicar todos os canais, ninguém se admirou com a concessão à Portugal Telecom, onde o Estado tem uma “golden share”. Vai haver ainda mais televisão, mais falta e penalty, ciúme e traição, verdade e mentira, cano e gato. Mas vamos nós vê-la?

quinta-feira, 25 de setembro de 2008

LIVROS QUE MUDARAM A CIÊNCIA

Eis dez “Livros que mudaram a ciência” sobre os quais o Nuno Crato e eu vamos falar logo na Biblioteca Municipal de Oeiras (ver aqui ):

- Aristóteles (384-322 a.C.), Do céu (c. 300 a.C.)

- Euclides (c. 330 a. C. - 260 a. C.), Elementos (c. 300 a.C.)

- Cláudio Ptolomeu (c. 83 – 161), Almagesto (c. 150)

- Nicolau Copérnico (1473-1543), De revolutionibus orbium coelestium
(Sobre as revoluções das orbes celestes) (1543)

- Pedro Nunes (1502-1578), De crepusculis (Do Crepúsculo) (1542)

- Johannes Kepler (1571-1630), Epitome astronomia Copernicanae
(Compêndio de Astronomia de Copérnico) (1617-1621)

- Galileu Galilei (1564-1642), Sidereus Nuncius (Mensageiro das estrelas)(1610)
e Dialogo di Massimo Sistemi del Mondo (Diálogo sobre os maiores sistemas do mundo) (1632)

- Isaac Newton (163-1727), Philosophiæ Naturalis Principia Mathematica
(Princípios Matemáticos de Filosofia Natural) (1687)

- Charles Darwin (1809-1902), The Origin of Species (A Origem das Espécies)(1859)

- Albert Einstein (1879-1955), Über die spezielle und die allgemeine
Relativitätstheorie, gemeinverständlich (Sobre a relatividade restrita e geral,
ao alcance de todos) (1917)

Contra o acordo ortográfico

Está marcada para as 14h00 de hoje, dia 25 de Setembro de 2008, a Audição Parlamentar da Petição Manifesto em Defesa da Língua Portuguesa Contra o Acordo Ortográfico, na Comissão de Ética, Sociedade e Cultura da Assembleia da República. Àquela Audição irá uma delegação de peticionários composta pelo primeiro subscritor da Petição, Vasco Graça Moura, acompanhado por Maria Alzira Seixo, Jorge Morais Barbosa e António Emiliano.

A Petição Contra o Acordo Ortográfico conta já com mais de 94 000 assinaturas e continua aberta e disponível para assinatura, aguardando-se ainda o agendamento da sua apreciação em Plenário da Assembleia da República, nos termos da Lei.

Assine-a em www.ipetitions.com/petition/manifestolinguaportuguesa.

Blog em Defesa da Língua Portuguesa.

CIMÉLIOS CIENTÍFICOS


Pedimos à Biblioteca Geral da Universidade de Coimbra que nos facultasse alguns dados sobre livros e documentos quje estão patentes na sua exposição "Cimélios", já aqui anunciada. Eis o texto do "catálogo" da parte científica da exposição, da responsabilidade do bibliotecário António Eugénio Maia Amaral, que descreve várias obras preciosas, aqui por ordem cronológica:

TÁBUAS DOS ROTEIROS
[Tábuas dos roteiros] [manuscrito]. [15--]. 1 álbum (63 f.) : todo il. ; 430x290 mm. Encadernação em pele gravada a ferros secos com lombada gravada a ferros dourados, atilhos em fita de seda verde. Cofre 33

É o único manuscrito conhecido que inclui os desenhos que ilustravam ambos os roteiros “de Goa a Diu” (1538-1539) e o “do Mar Roxo” (1540) do 4.º Vice-Rei da Índia, Índia, D. João de Castro (1500-1548). Conhecem-se outras cópias (os originais consideram-se perdidos) em separado: da costa da Índia na Biblioteca Nacional de Portugal e da costa do Mar Vermelho, na British Library. Esta é uma das melhores cópias, de meados do século XVI, com vinte e nove das trinta e uma tábuas previstas. O manuscrito foi facsimilado, com estudo do Professor Luís de Albuquerque, em versões portuguesa, francesa e inglesa, pela INAPA, em 1988 (esgotadas). Disponível na Internet em: http://bdigital.bg.uc.pt/

ARISTÓTELES, 384-322 a.C.
Logica / Aristotelis Stagiritae. - Conimbricae : excudebat Antonius de Maris, 1556. 278 [i.e. 276] f. ; 4º (20 cm) Encadernação em pele gravada a ferros secos e lombada gravada a ferros dourados, encadernação com vestígios de atacas. R-13-14

Nesta edição (e na do De Anima) António de Mariz foi não só o impressor (typis et expensis) como o principal investidor. Estabelecido em Coimbra, de 1556 até 1599, usou sucessivamente os títulos de tipógrafo régio, impressor e livreiro e por vezes também arquitipógrafo da Universidade. Foi o preferido dos jesuítas e possuía uma importante oficina bem provida de material, como vemos pela variedade dos caracteres góticos, gregos e romanos, que empregou. Consta que o impressor-livreiro de Coimbra se fornecia de todas as impressões de Christophe Plantin de Antuérpia por intermédio de Pedro Moreto, joalheiro flamengo estabelecido em Lisboa desde 1570 até 1577. As suas impressões são caracterizadas pelo esmero e perfeição com que estão estampadas. Como marca tipográfica usou em algumas edições uma galinha rodeada de pintos, em moldura oval, com a divisa “Fervens Amor” e as iniciais A. M. do seu nome.

CÓDICE DE BASTIÃO LOPES
[Códice de Bastião Lopes] [manuscrito]. [1568?]. [14 br.], [14], [77 br.] f. : il., color. ; 200x132 mm. Pert.: Ex-libris de Charles R. Boxer; Kraus; Selo de Philip Hofer; ex-libris de Bóies Penrose; Fundação Calouste Gulbenkian; Secção de Coimbra do Agrupamento de Estudos de Cartografia Antiga. Encadernação com pastas de madeira revestidas a pele gravadas a ferros secos em ambas as pastas com fechos de metal, inserida em caixa. Cofre 46

Conhecido pelo nome de “Códice de Bastião Lopes”, a sua autoria pode atribuir-se a qualquer piloto da carreira da Índia, que não a Bastião Lopes, cujo nome aparece apenas nesta nota: Terei lembrança de trazer do Brasil uma arroba de açúcar do melhor para a mulher de Bastião Lopez, com a ajuda de nosso senhor. O códice pertenceu a Charles R. Boxer, que posteriormente o venderia ao livreiro antiquário Kraus, de Nova Iorque. No verso da pasta, um selo com o nome de Philip Hofer e a seguinte nota manuscrita a lápis “given to Bóies Penrose with best regards, March 1959 P H” e também o ex-libris de Bóies Penrose. Em 1971, o manuscrito foi leiloado em Londres e adquirido pela Fundação Calouste Gulbenkian que o ofereceu à Secção de Coimbra do Agrupamento de Estudos de Cartografia Antiga, tendo sido mais tarde oferecido à Biblioteca Geral da Universidade de Coimbra pelo então Director, Professor Luís de Albuquerque. Existem facsimiles com estudo de Luís de Albuquerque, o mais facilmente disponível publicado pela IN-CM (Lisboa, 1987). Disponível na Internet em: http://bdigital.bg.uc.pt/

TORRIANI, Leonardo, 1560-1628
Alla maesta del re catolico discrittione et historia del regno de l’Isole Canarie gia dette le fortunate con il parere delle loro fortificationi [manuscrito]. [ca. 1590-1594]. 114 [i.e. 113] f. : papel ; 232x413 mm. Já se encontrava incompleto, como hoje está, quando foi manuseado e copiado por Frei Francisco de São Tomás, na segunda metade do séc. XVIII. Pert.: Colégio de S. Bento de Coimbra. Encadernação em pele marmoreada com lombada gravada a ferros dourados.
Ms. 314

O resultado (incompleto) de um relatório elaborado pelo arquitecto militar italiano Leonardo Torriani, ao serviço do rei Filipe II de Espanha, é uma peça fundamental para o conhecimento das ilhas atlânticas, mas sobretudo da geografia, do vulcanismo e do povoamento das Canárias. Crê-se que, retirado para o convento de S. Bento de Coimbra, Torriani possa ter solicitado ao Rei a remessa desta sua Discrittione et historia… para ajudar na educação dos dois filhos, que lhe sucederiam no cargo de Engenheiro-Mór do Reino de Portugal. Por morte do filho Frei Juan Torriano (1679), o códice ficou na biblioteca do convento, nunca tendo sido devolvido a Madrid. Daí, com a extinção das ordens, veio a ser incorporado na Secção de Manuscritos da BGUC.
Foi transcrito, traduzido e publicado há poucos anos pelo Professor José Manuel Azevedo Silva, da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra. Disponível na Internet em: http://bdigital.bg.uc.pt/.

BORRI, Cristoforo, S.J., 1583-1632
Arte de navegar … no Colégio de Santo Antão… [seguido de] Nova Astronomia… Arte da memória [manuscrito]. 1628. [1, 2 br., 1], 156, [1] f. : papel, il. gravuras, desenhos geométricos, tabelas ; 198x141 mm. Encadernação em pergaminho com atacas. Ms. 44

BORRI, Cristoforo, S.J., 1583-1632
Collecta astronomica, ex doctrina P. Christophori Borri … De tribus caelis … iussu, et studio … D. Gregorii de Castelbranco. Ulysipone : apud Matthiam Rodrigues, 1631. [8], 44 [i.e. 45], [3], 470, [2] : il., des. e grav. ; 4º (20 cm). Encadernação em pergaminho com vestígios de atacas. RB-34-10

O milanês Cristoforo Borri (ou Cristóvão Bruno, como também foi conhecido em Portugal), fez observações astronómicas com telescópio e leccionou astronomia em 1526-1527 em Coimbra e no ano de 1527-1528 em Lisboa. Um aluno do astrónomo deixou-nos este caderno de apontamentos (ou “sebenta”, como se diz em Coimbra) ilustrado com desenhos à mão e com esquemas impressos. Como o verso dos impressos está em branco, afastando a possibilidade de terem sido recortadas de um livro, só podemos supor que o professor as deve ter usado para leccionar o seu curso. Só três anos mais tarde Borri conseguirá imprimir a Collecta astronomica, onde as mesmas estampas são utilizadas. A ser assim, este manuscrito conterá um dos mais antigos exemplos conservados de “textos de apoio” usados no ensino. Se essa práctica se refere a Coimbra ou à “Aula da Esfera” de Lisboa é questão que julgamos ainda por resolver.

TACQUET, André, 1612-1660
Elementa geometriae planae ac solidae. Editio tertia correctior. Antuerpiae : apud Iacobum Meursium, 1672. [24], 350, [12] p. ; 8º (15 cm). Faltam as f. desdobr. com as estampas. Encadernação em pergaminho com vestígios de atacas. BJ 4 A-14-27-11

A este exemplar do “Manual” de Tacquet faltam todas as gravuras originais. Às vezes, no trabalho bibliográfico também apetece embarcar nalguns voos de imaginação: sabemos que foram as estampas de uma das edições de 1672 os modelos utilizados para a produção (talvez conimbricense) das centenas de azulejos didácticos azul e branco que terão ornamentado a sala do ensino de Matemática (a Sala de Cosmografia?) do Colégio das Artes de Coimbra, a grande escola jesuíta do país. Tudo isto para melhorar o ensino nas escolas da Província portuguesa, seguindo as recomendações do Geral Tirso González na sua Ordinatio, de 1692. Será que as imagens que serviram de modelos àquela empreitada foram arrancadas deste mesmo exemplar que se conserva até hoje no fundo da Biblioteca Joanina?

GUSMÃO, Bartolomeu de, S.J., 1685-1724
Manifesto sumario para os q[ue] ignorão poderse navegar pello elemento do Ar [manuscrito]. [ca. 1709]. f. 234-241 : papel ; 215x153 mm. Cópia da época. Encadernado com cartas e papeis vários. Encadernação em pele. Ms. 342, f. 234-244

GUSMÃO, Bartolomeu de, S.J., 1685-1724
[Petição de Bartolomeu Lourenço para lhe ser concedido o privilégio de só ele poder fabricar instrumentos para voar] [manuscrito]. [inícios de 1709]. [1] f. (f. 431 r, v) : papel ; 330x220 mm. Cópia da época. F. 431, numeração antiga, a tinta, e f. 410, 410 v., a lápis, num. moderna. Com papeis vários, impressos e manuscritos. Encadernação em pergaminho. Ms. 677, f. 410-410v

O primeiro homem a fazer voar um balão aerostático foi o jovem jesuíta brasileiro Bartholomeu Lourenço de Gusmão, em 8 de Agosto de 1709, diante do Rei D. João V, da Rainha, do Núncio Apostólico Cardeal Conti (depois Papa Inocêncio XIII) e de toda a corte, em Lisboa. A ascensão do universitário de Coimbra despertou a maledicência dos lisboetas e a desconfiança da Santa Inquisição, e o “Padre voador” teve de renunciar publicamente às suas ideias. Ideias que se contêm no primeiro destes dois manuscritos: no “Manifesto”, Gusmão faz a eloquente defesa física e filosófica (porém não teológica) da possibilidade da máquina voadora. O desenho da folha 247v. do Ms. 342, reproduzido pela primeira vez em 1868, tem-se mantido estranhamente desconhecido mas é muito mais verosímil do que as gravuras fantasiosas que se divulgaram tardiamente. Por seu lado, a “Petição” (se for autêntica) pode considerar-se o primeiro pedido de patente na área aeronáutica, que lhe terá sido concedido por Alvará, em 19 de Abril de 1709. A Biblioteca Geral possui também uma boa colecção de sátiras feitas ao “Voador”, tanto em prosa como em poesia (Ms. 342, 353, 357, 389, 392, 526, etc.) na sua época e ainda muitas décadas depois.

"Senhor, Diz Bertholameu Lourenço que elle tem descuberto hum instrumento para se andar pello ar, da mesma sorte que pella terra, e pello mar, e com muito mais brevidade, fazendosse muitas vezes duzentas e mais Legoas de caminho por dia, no qual instrumento se poderão levar os avizos de mais importancia aos exercitos e terras muy remotas quasi no mesmo tempo em que se rezolverem: em que interessa Vossa Magestade muito mais que nenhum dos outros Príncipes pella maior distancia do seu domínio, evitandosse desta sorte os desgovernos das conquistas, que procedem em grande parte de chegar muito tarde a noticia delles a Vossa Magestade. Alem do que poderá Vossa Magestade mandar vir todo o precioso dellas muito mais brevemente e mais seguro. Poderão os homens de negocio passar letras de cabedais com a mesma brevidade. Todas as Praças sitiadas poderão ser socorridas tanto de gente como de munições e viveres a todo o tempo, e retirarse dellas as passoas que quizerem sem que o inimigo o possa impedir. Descobrirsehão as Regiões que ficão mais vezinhas aos Polos do Mundo, sendo da Nação Portuguesa a gloria deste descobrimento que tantas vezes têm intentado, inutilmente, os estrangeiros. Sabersehão as verdadeiras longitudes de todo o mundo, que, por estarem erradas nos mappas, cauzão muitos naufrágios, alem das infinitas conveniencias que mostrará o tempo e outras que por si são notorias, que todas merecem a Real attenção de Vossa Magestade. E porque deste invento tão útil se podem seguir muitas desordens e cometendosse com seu uso muitos crimes e facilitandosse muitos mais, na confiança de se poder passar logo a outros Reynos, so se evita estando reduzido o seu uso a huma so pessoa a quem se mande a todo o tempo as ordens que forem convenientes a respeito do dito transporte, e prohibindosse a todos os mais sob graves penas, e he bem se remunere ao suplicante invento de tanta importancia. Pede a Vossa Magestade seja servido conceder ao suplicante o previlegio de que pondo por obra o dito invento, nenhuma pessoa de qualquer qualidade que for possa usar delle em nenhum tempo neste Reyno e suas Conquistas, nem trazello de fora para o dito Reyno ou Conquistas com qualquer pretexto sem licença do suplicante e de seus herdeiros, sob pena de perdimento de todos os seus bens, a metade para o suplicante e a metade para quem os acusar, e sobre as mais penas que a Vossa Magestade parecer pede a importancia deste negocio, as quaes todas terão lugar tanto que constar que alguma pessoa faz o sobredito instrumento, ainda que não tenha usado delle, para que não fiquem frustradas as ditas penas, ausentandosse o que as tiver encorrido. E. R. M. (Espera Real Mercê)."

Anotação do copista: "Desceo a consulta, concedeuse-lhe o Previlegio, e dizem tem comprado para a fabrica de tal instrumento aerio 24 arrobas de arames surtido, isto he, grossos e delgados, e quantidade de papel; com que teremos algum desses chamados Papagayos. Dizem tambem que a primeira jornada que faz he a buscar tantos mil moyos de trigo, que estará aqui brevemente etc."

FIGURAS
[Figuras para o estudo da física] [manuscrito]. [1779?-1781]. 3 vol. : papel ; 485x378 mm; 482x370 mm; 480x376 mm. Encadernação em pele marmoreada com duplo filete gravada a ferros dourados, lombada gravada a ferros dourados. Ms. 3152/3154

Um total de três volumes (de que aqui se mostram apenas dois) desenhados pelo oficial mecânico Joaquim José da Silva Nogueira, “abridor de cunhos” da Imprensa da Universidade, para ilustrar as aulas de Ciências Físico-Matemáticas que o professor José Monteiro da Rocha (1734-1819) regeu na Universidade de Coimbra até 1783. São um bom exemplo do tipo de inovação prática que a Reforma Pombalina pretendia introduzir no ensino, permitindo aos alunos seguir as explicações e demonstrações do Mestre. Os dois volumes de “Mecânica” e de “Hidrologia” estavam concluídos e encadernados em 1780, enquanto o volume da “Óptica”, ainda estava a ser desenhado em Março de 1781. Monteiro da Rocha, notável matemático e astrónomo, foi Director do Observatório Astronómico da Universidade, autor de fórmulas simples e elegantes para o cálculo dos eclipses e inventor (não-creditado, por atraso da publicação) do primeiro método prático de determinação dos parâmetros orbitais de um cometa.

CARVALHO, Joaquim Augusto Simões de, 1821-1902
Curso de Philosophia Chymica, e de galvanismo lido nesta Universidade como prova de habilitação para oppozitor… [manuscrito]. 1849. [1]f., 578 p. ; papel; 305x224 mm. Originalmente brochado em papel azul (295x215 mm); enc. meia inglesa com lombada em pele gravada a ouro, posterior a 1935. Ms.1369

Na 16ª lição desta Tese de 1849, já se ensinavam a fotografia e o daguerriótipo (inventado em 1839). O texto foi publicado no ano seguinte com o título Lições de philosophia chimica pela Typographia da Rua da Mathematica, em Coimbra. Pela mesma época, também o Visconde de Vila Maior, Júlio Máximo de Oliveira Pimentel (1809-1884), que veio a ser Reitor da Universidade, refere a aplicação na fotografia de alguns compostos químicos nas suas Lições de chymica geral e suas principais applicações, em três volumes, publicadas entre 1850 e 1852. E, desde a sua criação, em 1852, a revista conimbricense “O Instituto”, órgão do “Clube dos Lentes”, traz referências diversas à fotografia. Tudo isto evidencia que Coimbra e a sua Universidade tiveram, sem dúvida, um papel determinante na introdução da técnica fotográfica em Portugal.

THOMPSON, Charles Thurston, 1818-1868
Monumentos architectonicos de Coimbra [visual gráfico]. [Londres : ed. do aut.,1866?]. 2 vol. : fotograf. por colódio húmido ; 605x477 mm ; 455x306 mm. Encadernação meio-amador em tela, com rótulo em ferros dourados. R-69-16/16 A

Nesta Mostra expõe-se apenas um dos dois álbuns de fotografias realizados em Setembro de 1866, pelo fotógrafo Charles Thurston Thompson (1816-1868) do Museu de South Kensington (actual Victoria and Albert), em Londres. Num grande empreendimento do imperialismo cultural britânico do século XIX, aquele Museu financiou excursões a Espanha e a Portugal, com o objectivo de fixar pela fotografia os grandes monumentos arquitectónicos da Península. Dessas excursões resultaram dois álbuns que foram oferecidos ao então Reitor da Universidade e que hoje se encontram nos fundos da Biblioteca Geral. A sua autoria só recentemente foi identificada pelo investigador Alexandre Ramires, mas, reconhecida a sua importância, ingressaram de imediato na secção de Reservados da BGUC. Entre as várias fotografias do Paço das Escolas, existe uma particularmente rara do interior da Biblioteca Joanina, tirada numa época em que a fotografia de interiores ainda não estava ao alcance da generalidade dos fotógrafos.

O corpo e a mente

 Por A. Galopim de Carvalho   Eu não quero acreditar que sou velho, mas o espelho, todas as manhãs, diz-me que sim. Quando dou uma aula, ai...