segunda-feira, 5 de setembro de 2022

Austrália e Portugal: o mesmo problema, respostas distintas

Por Cátia Delgado

António Duarte, num dos últimos textos que publicou no seu blog – Escola Portuguesa – recuperou  um artigo saído no The Guardian‘I can’t stay. It’s not enough’: why are teachers leaving Australian schools? – que reproduz testemunhos de professores australianos, em tudo semelhantes aos de professores portugueses.

Destacam a desvalorização da profissão como razão de grande relevo para os mais novos optarem por outras carreiras e para os mais experientes a abandonarem, assim como condições de trabalho adversas, com desmérito e secundarização do ensino em prol de funções de natureza burocrática. Deixo alguns exemplos: 

“Está sempre implícito que levantar os resultados dos alunos seria fácil, se os professores apenas ‘fossem melhores’. As nossas competências não são respeitadas ou valorizadas.”

“Os meus dias são preenchidos com gestão de comportamentos, bombardeamento de emails, redigir planificações, marcar trabalhos, dar feedback, informar os pais, definir objetivos aos alunos, fazer adaptações curriculares, reuniões e formações. Sem esquecer a introdução de dados no sistema dentro dos prazos. Se eu pudesse simplesmente ensinar!”

“[Os políticos] esperam que façamos determinadas coisas… confiam-nos a responsabilidade de as fazer, mas na realidade não têm confiança em nós. Sabemos disso porque as decisões em Educação nunca são tomadas com base no que os professores necessitam ou no que aconselham.”

“As turmas são demasiado grandes para poder ser dado a todos os alunos o apoio de que necessitam. Estamos exaustos. Tantos professores espantosos estão a bater num muro, e isto está a ser ignorado pelo governo uma e outra vez.”

Estes problemas, que fazem parte do problema maior aqui em destaque, estão presentes em múltiplos sistemas educativos, os quais podem dar respostas diferentes. Na Austrália a resposta afigura-se diferente da de Portugal.

No caso português, estando a falta de professores – sobretudo devida a aposentações – calculada pelo menos desde 2016 e confirmada em 2021 (vg. Flores, 2016; Nunes et al., 2021), é encarada, agora, como se de um dado novo se tratasse e, logo, governada como tal.

No caso da Austrália, antevê-se a falta de cerca de 4.000 professores para os próximos 4 anos – em Portugal serão precisos cerca de 30.000 até 2030 – o que levou à elaboração de um "plano nacional para combater a escassez” destes profissionais. As causas foram identificadas: degradação do estatuto profissional, desgaste provocado pela pandemia e diminuição de candidatos à formação de professores, bem como reduzidas oportunidades de carreira. Segundo a Ministra da Educação Sarah Mitchel é preciso: 

“garantir que os nossos melhores professores não sintam que precisam de sair da sala de aula para obter um salário mais alto ou para obter uma progressão na carreira”. 

O assunto será tratado a três níveis:

- melhores condições para o ensino;
- novas estruturas de remuneração;
- uma carga de trabalho reduzida. 

Não sabemos qual o grau de comprometimento político com estas intenções, contudo, ele parece distante do português. Este apela ao remedeio a curto prazo e por vias que descredibilizam ainda mais a docência, nomeadamente através do abaixamento da qualificação que dá acesso à profissão. 

Fica, pois, a nota de que, na nossa realidade, ao nível político, seria possível – ou pelo menos, seria desejável – fazer um esforço para considerar medidas instigadoras do recrutamento de candidatos com formação e perfil adequados à docência e da retenção dos professores que ainda persistem em ensinar com consciência de que têm nas suas mãos a responsabilidade pelas novas gerações.

2 comentários:

Anónimo disse...

Para procurar resolver o problema da falta de professores, esperamos todos que autoridades portuguesas, da área da educação, deem três passos firmes em frente:
1 - Melhorar as condições para o ensino das matérias, a começar por garantir a professores e alunos, em contexto de sala de aula, o ambiente de disciplina indispensável ao ensino e à aprendizagem;
2 - Melhorar os salários e a progressão na carreira dos professores;
3 - Reduzir a carga de trabalho dos professores, não os obrigando a executar milhentas tarefas miudinhas e burocráticas que transformam o ato de ensinar e aprender numa farsa.
A esperança é a última a morrer.

Cátia Delgado disse...

Caro Leitor,
apesar de ver exatamente o caminho inverso às soluções que aponta a ser trilhado pelos nossos governantes na área da educação, o que muito me pesa e inquieta, também gosto de manter um resquício de esperança na inversão das atuais políticas! Cumprimentos, Cátia Delgado

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