Entrevista que dei ao jornalista Paulo Carvalho e que saiu no último "As Artes entre as Letras", a propósito do painel sobre educação em que participei na companhia de Artur Santos Silva e Maria de Lurdes Rodrigues, moderado por Rui Rio.
P- Como vê o estado a educação em Portugal?
R- O sistema educativo português cresceu bastante em quantidade nos últimos tempos, mas, apesar de alguns bons indicadores sectoriais, não cresceu em qualidade de forma que nos possa satisfazer. É facto que havia um grande atraso estrutural visível nos baixos níveis de qualificação da população activa e essa situação, por mais esforços que se façam, demora a colmatar. Mas basta olhar para comparações internacionais para vermos que estamos longe dos níveis alcançados por países europeus aos quais devíamos aspirar e longe das metas fixadas pelo "clube de países" a que pertencemos. Em Abril de 2011 foi publicado um Relatório da União Europeia sobre educação, que analisava os progressos obtidos pelos países europeus numa série de indicadores para os quais se tinham estabelecido metas, a atingir em 2010 e 2020. No que se refere ao nosso país as notícias são boas e más, nalguns casos muito boas e noutros muito más. São boas no que respeita ao aumento da frequência do ensino pré-escolar, bastante boas no que respeita à diminuição do número de alunos com 15 anos com fraco desempenho em leitura, matemática e ciências, e muito boas quanto ao aumento do número de licenciados nas áreas de ciência e tecnologia, em resultado do investimento na ciência. Mas, apesar dos visíveis progressos, são muito más quanto ao abandono escolar precoce (um verdadeiro flagelo nacional!), quanto ao nível de educação atingido pela população jovem e quanto ao número de pessoas que termina o ensino superior, e más ainda quanto à aprendizagem ao longo da vida. Esta deficiência de resultados tem lugar apesar de o investimento público em educação em 2007 (5,3% do PIB) ter sido acima da média da União Europeia (5,0%). Portanto, o nosso investimento na área educativa está longe de ser eficaz. O nosso desafio agora, numa altura em que os recursos financeiros escasseiam, é fazer mais com menos, o que, convenhamos, não é fácil.
P- Assente neste modelo educativo, que futuro vê para o país?
R- A Europa, com a colaboração do FMI, é que nos está neste momento a ajudar para ultrapassarmos a crise económico-financeira. Acredito que o nosso futuro está na Europa, na sociedade do conhecimento que a Europa quer ou devia querer construir em conjunto construir. Para esse futuro na "casa europeia comum", terá de haver convergência não só a nível económico-financeiro, mas também ao nível educativo. As duas áreas estão aliás ligadas intimamente: Quanto melhor for a nossa qualificação, melhor será o nosso desempenho económico. Quanto mais soubermos, mais seremos capazes de fazer. Basta olhar para os países mais ricos, que são aqueles que têm sistemas educativos mais eficientes. Sem ser irrealista, quero ser optimista. Poderá demorar o seu tempo, porque em educação não há ilusionismos nem magias (não se aprende instantantaneamente!), mas estou convencido de que não somos inferiores aos outros povos europeus. Temos, porém, de assegurar que a escola fornece uma boa preparação. E temos todos que nos empenhar na escola. É uma questão de melhoria da organização, mas é sobretudo uma questão de mudança de mentalidades. Queremos trabalhar mais e melhor na escola para amanhã sermos mais ricos?
P- O que considera urgente mudar?
R- Em Junho passado houve uma mudança de governo e está a haver, na educação, um "choque" governativo. Unir a Educação com a Ciência e Tecnologia poderá ser bom para todos, até porque na ciência os nossos progressos tem sido visíveis e pode haver um efeito de "contaminação" na educação. Havia algumas mudanças na educação que se impunham e estão a ser feitas e outras que ainda se impõem. Estou a pensar da diminuição e desburocratização do pesadíssimo ministério, na maior autonomia das escolas, na paz com os professores (base do sistema educativo, mas que foram incompreensívelmente hostilizados), na auditoria a fundações opacas como a responsável pelo E-Escolas e a empresas altamente endividadas como a Parque Escolar, na revisão do programa Novas Oportunidades (cujo grau de exigência deixa muito a desejar), na revisão dos programas (com orientações pedagógicas cheias de expressões por vezes ocas como o "aprender a aprender"), na revisão do sistema de acesso ao ensino superior, cheio de injustiças, na reorganização do sistema de ensino superior onde proliferam instituições e cursos, na melhor formação inicial e contínua dos professores, etc. Numa altura em que o país está a ser sacudido por uma crise, a ocasião é óptima para efectuar, na área crucial da educação, mudanças profundas. Acima de tudo não devemos ter medo de mudar o que for preciso mudar.
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1 comentário:
Parabéns, Prof. C. Fiolhais.
Melhor é impossível.
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