terça-feira, 25 de outubro de 2011

EUGÉNIO LISBOA: VÁRIO, INTRÉPIDO E FECUNDO

A convite do Reitor da Universidade de Aveiro, Prof. Doutor Manuel António Assunção – gentileza que só a minha grande admiração pela figura de Eugénio Lisboa pode ter justificado ou consentido - , tive a honra de assistir à homenagem que lhe foi prestada, na tarde do passado dia 22 deste mês, aquando do lançamento do livro de que “roubei” o título para este post e de do qual retratei a capa que aqui figura.

Conheci Eugénio Lisboa, no início da década de 50, quando ambos frequentámos, ainda que enquadrados em pelotões diferentes, o Curso de Oficiais Milicianos de Infantaria, em Mafra, vindo a reencontrá-lo na sempre saudosa ”Cidade das Acácias”, como era conhecida a então Lourenço Marques, onde eu e minha mulher tivemos o privilégio da sua amizade e de “Maria Antonieta, inseparável companheira de Eugénio”, e a oportunidade de um contacto mais estreito com a sua enorme cultura e profundo humanismo que o convívio da caserna não permitia, preocupados que estávamos em limpar com o escovilhão as estrias dos canos das espingardas “Mauser”, o que era o salvo conduto para um merecido fim-de-semana longe das paredes de uma espécie de clausura de leigos no Convento de Mafra.

O livro de que aqui falo, nas suas mais de 400 riquíssimas páginas, contém os testemunhos calorosos de várias e ilustres personalidades da vida cultural portuguesa em feitura, organização e “Introdução Supérflua” (assim justamente adjectivada pelos seus autores dada a figura de Eugénio Lisboa) conjuntas dos Professores Otília Pires Martins (Universidade de Aveiro) e Onésimo Teotónio Almeida (Brown University), em que a páginas tantas escrevem em dados biográficos:

“Por razões de praxe, neste tipo de publicação, é todavia imperativo começarmos com os mais elementares dados biográficos do nosso homenageado, para benefício dos menos familiarizados com a figura aqui celebrada: Eugénio Lisboa nasceu, a 25 de Maio de 1930, em Lourenço Marques, então viveiro de um notável conjunto de figuras da cultura portuguesa. Com dezassete anos rumou a Lisboa, à época um dos poucos sítios do tardio império onde era possível frequentar estudos universitários. Em 1955 licenciou-se em Engenharia Electrotécnica pelo Instituto Superior Técnico. Entre 1958 e 1976, foi profissional na indústria petrolífera, se bem que de 19744 a 1976 tivesse conciliado essa actividade com a docência nas Universidades de Lourenço Marques e Pretória (1974-1975). Em 1976 esteve em França como adjunto do director mundial de exploração na Compagnie Française des Pétroles. Em 1977 partiu para Estocolmo onde regeu cursos de Literatura Portuguesa e coordenou, em toda a Suécia, o ensino da língua portuguesa. Em 1978 iniciou as suas funções de Conselheiro Cultural na Embaixada de Portugal em Londres, posto em que permaneceu durante dezassete anos. Ainda no Reino Unido em 1998, recebeu um Doutoramento “Honoris Causa” em Letras na Universidade de Nottingham. Entre 1995 e 1998 foi Presidente da Comissão Nacional da UNESCO. A Universidade de Aveiro teve, entretanto, a clarividência de aproveitar um espírito demasiado jovem para se ver sujeito a limites de idade e convidou-o para Professor, conservando-o no seu seio durante seis magníficos anos (1996-2002) e beneficiando professores e alunos do seu saber e experiência de “sage””.

Este valioso currículo de vida científico/cultural de Eugénio Lisboa (desnecessária me parece esta divisão como tenho a dicotomia que Descartes estabeleceu entre a res extensa e a res cogitans) é posto em evidência pelo Reitor da Universidade de Aveiro quando, no seu testemunho sobre esta “figura singular”, escreve: “Destaco ainda, porque me diz muito a mim, a atracção igual que sentiu pelas chamadas “duas culturas”: fez muito bem em não ter escolhido, em ter rejeitado a disjuntiva “ou…ou”, em ter percebido logo o que agora sabemos bem, que a cultura é só uma” (“Eugénio Lisboa: um percurso exemplar”). A Universidade de Aveiro viria a atribuir-lhe, também, o Doutoramento “Honoris Causa”, que a minha memória de octogenário desculpa a falta de datação mas não a “preguiça” da sua pesquisa. E para o ter nos seus exaltados muros de instituição universitária de prestígio internacional mantém-no “prisioneiro” como Membro do Conselho Geral da Fundação dessa Universidade. Ou seja, “noblesse oblige!

É pois deste Eugénio Lisboa (como foi dito em Aveiro, numa sala repleta de notáveis académicos, há pessoas que dispensam títulos académicos) que o “De Rerum Natura” tem tido a honra de publicar textos e continuará a publicar sempre que a sua disponibilidade e prestimoso serviço à causa da cultura permitam.

3 comentários:

Anónimo disse...

"Quando morre um velho arde uma biblioteca" (Octávio Paz)

Possam os seus amigos apreciá-lo tanto quanto por si são apreciados.

HR

Rui Baptista disse...

Caro HR: Só lamento este meu post não estar à altura do brilhantismo da cerimónia promovida pela Universidade de Aveiro, de que aqui deixei uma pálida sombra, e, outrossim, do real merecimento do homenageado.

Com a benevolência que o caracteriza, Eugénio Lisboa, pela certa, me perdoará a falta de engenho.

Cordialmente,
Rui Baptista

Cláudia S. Tomazi disse...

Com toda licença prevista pelo direito de comentar e que perdoe-me o bom Deus ao tanto que o tenha, Octávio Paz.

Dia desses houve um incêndio em um bairro de uma cidade inglesa, pois ardera tudo em volta de uma livraria, e milagrosamente os livros venceram as chamas, que em nada de metáforas compara tal descrita do evento.

E que vivam os velhos como a serenidade das bibliotecas!



A propósito Sr. Rui Baptista, um arroubo justificado. Bela matéria.

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