segunda-feira, 17 de outubro de 2011

ONDE SE VOLTA A FALAR DOS "PROFESSORES DE GINÁSTICA"


“Há sempre um modo diferente de ver os problemas – depende ‘del cristal com que se mira’” (Professor Fernando Pádua, presidente do Instituto Nacional de Cardiologia Preventiva).

Num comentário ao meu post anterior, aqui publicado com o título “Quando uma ‘boutade’ se torna numa piada de mau gosto” (15/10/2011), o leitor Daniel Marques chamou a minha atenção para o facto desta “piada de mau gosto" não merecer os direitos de autor por parte da Prof.ª Doutora Maria de Lurdes Rodrigues.

Sempre disponível a corrigir os meus erros, prestei-me a “rebobinar” a intervenção do Dr. Artur Santos Silva. Na verdade, como muito bem escreve este leitor/comentador, o Dr. Artur Santos Silva foi o orador que antecedeu a Prof.ª Doutora Maria de Lurdes Rodrigues, que, pelos vistos, embalada pelo rasgado elogio que este lhe teceu, reproduziu o que então ouvira da sua boca. Mas, pelos vistos, achou-lhe tanta graça que até o bisou para que não houvesse o risco de passar despercebido. Daí eu não me obrigar a retractar perante a Prof.ª Doutora Maria de Lurdes Rodrigues porque o que escrevi, sem ser de "pena ao vento", como diria Eça, está escrito sem necessidade de eu lhe retirar uma vírgula sequer.

Portanto, “nestas circunstâncias que são simultâneamente humilhantes de suportar, humilhantes de considerar e humilhantes de descrever” (Charles Dickens), o que escrevi antes sobre essa graça de mau gosto encaixa, de igual modo, sobre o seu autor inicial por dois motivos:

1. Sendo, desde de 2009, o licenciado em Direito Artur Santos Silva Presidente do Conselho Geral da Universidade de Coimbra devia saber (sabe-o com certeza!) que a oitava e última Faculdade dessa Universidade tem o nome de Faculdade de Ciências do Desporto e Educação Física e não o de Faculdade de Ciências do Desporto e “Ginástica”.

2. Por outro lado, se alguma vez tivesse tido a necessidade de ir às consultas do Hospital da Universidade de Coimbra saberia que os médicos não doutorados são aí tratados por doutores e os doutorados por Professores.

Passando adiante, detenho-me sobre a aceitação que a criação desta faculdade mereceu por parte de figuras gradas da Universidade de Coimbra (UC), pondo em justo destaque (embora correndo o risco de omissão involuntária de outros nomes) a acção conjunta e importante que tiveram os Professores Rui de Alarcão (catedrático de Direito e Reitor da UC), António Poiares Baptista (catedrático de Medicina), António Pinho Brojo (catedrático de Farmácia) e, last but not least, Manuel Viegas de Abreu (catedrático de Psicologia e Ciências de Educação).

Sei do que falo, por ter sido docente convidado, aquando da respectiva criação (por aprovação unânime do respectivo Senado Universitário), e ter sido, anteriormente, docente por concurso no arranque do Instituto Superior de Educação Física da Universidade do Porto (1975). Criada na década de 60, havia, até então, no Porto apenas, uma escola média de formação de instrutores de Educação Física, profissionais que a Portaria n.º 20.786/64/ de 4 de Setembro, subordinava à orientação dos professores de Educação Física.

Mas, seja como for, isto dos tratamentos (ainda que só como mera forma de cortesia) tem muito que se lhe diga, embora Camilo nos tenha legado que “se pode asnear nos tratamentos”. Por outro lado, não me parece ser esta uma questão de lana caprina. Não o é, certamente, como se verifica pela atenção que lhe dedicou o Professor Rodrigo de Sá Nogueira (1892-1974), licenciado pela Universidade Clássica de Lisboa e doutorado pela Universidade de Coimbra, tido como o mais competente foneticista português, ao debruçar-se sobre esta temática quando escreveu: ”Nos cursos superiores há coisas curiosas. Os formados pelas Faculdades de Letras, Ciências e Direito são licenciados; os médicos e os veterinários são doutores. Em presença disto que fazem os licenciados? Para não desmentir o espírito nacional, fingem que não conhecem a lei e, como quem não quer a coisa, deixam-se chamar doutores, quando se não intitulam a si próprios”.

Todavia, como é da profissão dos professores de Educação Física que estamos a falar, temo que alguma confusão criada a este respeito se fique a dever ao facto de a promiscuidade que se verifica neste exercício profissional que mereceu, na década de 50, de um antigo professor do Instituto Nacional de Educação Física, Quintino da Costa, a seguinte, e contundente, crítica: “Enquanto os médicos, em tempos idos, só tiveram como competidores os barbeiros, o professor de Educação Física vê ainda o seu campo invadido por contorcionistas da lei que às claras ou na penumbra, logram alcançar um papelzinho com o ‘imprimatur’ do Estado”.

Curiosamente, acontece que os cirurgiões, membros do muito prestigiado e exigente Royal College of Surgeons of England, usam o tratamento de Mr, em vez de doctor, não enjeitando o seu passado de herdeiros de uma prática secular de barbeiros. Agora o que eu duvido é que gostassem de ser tratados por barbeiros, ainda que mesmo, numa sessão pública portuguesa com a projecção mediática dos Grandes Debates do Regime, promovidos pela Câmara Municipal da sempre leal e mui nobre Cidade Invicta.

9 comentários:

José Mesquita disse...

Mas é António Santos Silva ou Artur Santos Silva?
E como nisto de tratamentos convém não asnear, basta dizer cidade do Porto, ou querendo usar o título, fazê-lo como deve ser "ANTIGA, MUI NOBRE SEMPRE LEAL E INVICTA CIDADE DO PORTO".
Dura e merecidamente conquistado e, como tal, não deve ser apoucado.

paulocosta disse...

O 'professor' já é uma praxe, uma gíria quando aplicada ao licenciado em Educação Física. Quanto à 'Ginástica' tem razões históricas, claro, mas não enobrecemos esta 'área de estudos' por nos chamarmos agora de outra forma, mas sim por outras lutas, como o estatuto cientifico ou o corpo de conhecimentos. Foi uma graça, Rui Baptista. Por outro lado, como dou aulas no 2º ciclo, costumo perguntar aos alunos quem são os 'professores de física' deles. E acha que estou a ofender os meus colegas, ou o Newton?

Paulo Costa

Rui Baptista disse...

Caro José Mesquita: Grato pela correcção do nome de baptismo do Dr. António Santos Silva. Resta-me pedir ao visado desculpa pelo erro involuntário de que me penitencio publicamente, e que irei corrigir no próprio texto.

Quanto à referência final que faço à cidade do Porto, por não estar entre aspas, não se tratou de uma incorrecção de transcrição. Seja como for, registo a lição na convicção que tanto não chega para "chumbar" o meu extenso "post". Tão-só para me regozijar pela leitura que lhe mereceu, passando-o a pente fino, o meu texto de mais de quatro mil caracteres para denunciar o erro cometido em 5 caracteres, tantos são os do nome de Artur.

Mas nunca, por nunca, me serviria da desculpa esfarrapada do professor que é apanhado em falta pelo aluno e argumenta que cometeu um determinado erro para ver se ele estava com atenção. Aliás, os próprios factos não mo consentiriam. E, como é uso dizer-se, contra factos não há argumentos.

Cordialmente,
Rui Baptista

Rui Baptista disse...

Não vá o diabo tecê-las, e um simples "lapsus calami" passar por um erro a merecer” o pelourinho do escárnio público”, como diria Camilo, apresso-me a uma correcção ao meu comentário anterior. Assim, onde escrevi “passando-o a pente fino, o meu texto” deverá ler-se “passando a pente fino o meu texto”.

Rui Baptista disse...

Caro Paulo Costa: Obrigado pelo seu comentário. Apenas breves reparos. Se quisermos levar mais longe este assunto poderemos objectar que a questão sobre os títulos profissionais, perante o estado calamitoso das finanças públicas nacionais, se trata de uma simples gota de água (mas não tão simples como isso!) no “mare magnum” das actuais preocupações dos portugueses retratadas, em idos séculos, por Eça, quando se interrogava:”No meio de tudo isto o que fazer? Que esperar? Portugal tem atravessado crises igualmente más:- mas nelas nunca nos faltaram nem homens de valor e carácter, nem dinheiro ou crédito. Hoje crédito não temos, dinheiro também não – pelo menos o Estado não tem: - e homens não os há, ou os raros que há são postos na penumbra pela Política. De sorte que esta crise me parece a pior – e sem cura”.

Seja como for, interpretando a sua pergunta aos alunos (esclarecer-me-á se assim é ou não) sobre os seus “professores de física”, referindo-se aos professores de Educação Física da sua escola, está a amputá-los da sua condição de educadores.

Aliás, vai sendo uso da sociedade portuguesa a adulteração dos títulos profissionais. Por exemplo, os licenciados pelas escolas superiores de educação que ministram a disciplina de Educação Física nas escolas são professores do ensino básico na variante de Educação Física. Parafraseando Rodrigo de Sá Nogueira,”para não desmentir o espírito nacional, fingem que não conhecem a lei e, como quem não quer a coisa, deixam-se chamar professores de Educação Física, quando não se intitulam a si próprios”. Com esta atitude, não prestigiam o próprio diploma como o não prestigiavam os ex-instrutores de Educação Física que deixavam (ou promoviam mesmo) que se estabelecesse idêntica confusão relativamente aos professores de Educação Física.

Em nome de uma tradição ancestral, sinceramente, não estou a ver um farmacêutico actual ser tratado por boticário ou um médico por físico (em usurpação ao título dos actuais Físicos)e, com isso, assistir passivamente a estes tratamentos. Ou os cirurgiões a serem tratados por barbeiros. Esta a questão!

Cordialmente,
Rui Baptista

Rui Baptista disse...

Caro José Mesquita: Grande maldade a sua em lançar a confusão sobre o nome próprio do Dr. Santos Silva obrigando-me, com isso, a ir à fonte fazer a devida consulta. O nome, próprio é, na verdade, Artur.

E cá estou eu, novamente, a retractar-me perante o Dr. Artur Santos Silva perante um erro para que fui induzido por uma pergunta sua – “Mas é António Santos Silva ou Artur Santos Silva?” - que julgo não ter tido a atenção maldosa de me baralhar. Mas lá que me baralhou, baralhou!. E, novamente, como quem cumpre uma mesma penitência, a fazer a correcção de uma “correcção” no post que lhe deu azo. Triste e penosa sina para quem acusa o peso dos oitenta anos que lhe não pesam no corpo mas lhe atormentam uma memória sem o verdor da juventude ou mesmo de alguns anos atrás.

Anónimo disse...

Caro Rui Baptista

Peço desculpa pelo termo que utilizei. De qualquer forma agradeço por ter esclarecido a situação.

Com estima

Daniel Marques

Rui Baptista disse...

Caro Daniel Marques: Agradeço-lhe e retribuo a estima. É sempre um prazer saber que as divergências entre pessoas honestas nem sempre geram um clima em que a razão é maltratada em nome do orgulho.

Cordialmente,
Rui Baptista

joão boaventura disse...

A este propósito não resisto a partilhar este vídeo que nos permite ver o que é possível fazer do, e com o nosso corpo

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