sexta-feira, 3 de dezembro de 2010

PORTUGAL SUBTERRÂNEO



Minha crónica no "Sol" de hoje (na imagem, o troglóbio "Proteus Anguinus", que existe em grutas da Eslovénia):

“Portugal Subterrâneo” foi o título de um livro, publicado em 1925 pelo geólogo suíço Ernest Fleury, que de certo modo inaugura a espeleologia portuguesa, isto é, a exploração e estudo científico das grutas nacionais. Uma parte importante da espeleleologia é a bioespeleologia, a ciência que estuda a flora e a fauna subterrâneas. Se a flora no interior das cavidades naturais é bastante escassa – por não haver a luz que permite a fotossíntese – já a fauna nesses locais da Terra é numerosa e variada, chegando por vezes a ser surpreendente.

De facto, foi uma boa surpresa o anúncio recente da descoberta em Portugal de duas novas espécies animais adaptadas completamente à vida subterrânea: um novo género e nova espécie de pseudoescorpião, de nome científico Titanobochica magna, e uma nova espécie de escaravelho, Trechus tatai. Esses novos animais – que estavam bem escondidos dentro de grutas respectivamente das serras algarvias e da serra de Montejunto - são ambos troglóbios, isto é, animais do interior das cavernas ou das águas subterrâneas que vivem na maior escuridão e que, por isso, se apresentam despigmentados e desprovidos ou quase desprovidos de órgãos de visão, possuindo em contrapartida órgãos tácteis mais desenvolvidos que lhes permitem, tal como a bengala de um cego, encontrar o seu caminho. Distinguem-se de outros animais cavernícolas, como os morcegos, que só passam no interior das grutas uma parte do seu tempo.

Um dos troglóbios mais conhecidos do mundo é considerado o símbolo da Eslovénia, um país cujo solo mais parece um “queijo suíço”. Dá pelo nome de Proteus anguinus e trata-se de um anfíbio despigmentado (a sua cor semelhante à da pele humana faz com que os locais lhe chamem o “peixe humano”) com olhos muito rudimentares, que nada com facilidade por águas subterrâneas.

Sofia Reboleira, a investigadora da Universidade de Aveiro com o nome associado às duas descobertas em solo português, que acabam de ser publicadas na revista de sistemática zoológica Zootaxa, declarou a propósito do novo género: "O novo pseudoescorpião é um dos maiores do mundo. Um predador de aparência espectacular, de grandes dimensões e com adaptações extremas à vida nas grutas. Pertence à família Bochicidae, cujos representantes são quase todos cavernícolas. É considerado uma relíquia, sendo o segundo representante desta família na Europa. A sua descoberta enfatiza a relevância da Península Ibérica como refúgio de uma fauna antiga de artrópodes."

As Nações Unidas estabeleceram que 2010 é o Ano Internacional da Biodiversidade. Com estas novas espécies dadas à ciência, que se acrescentam a várias outras exclusivas do nosso país, esse ano termina entre nós da melhor maneira.

1 comentário:

Anónimo disse...

Como diria Rafael Bordalo Pinheiro, não é só em microcefalia que ninguém nos bate, mas também, segundo acaba de se constatar, em animalejos cavernículas. JCN

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