domingo, 25 de março de 2007

Exames: sim, por favor!


Em 2001 foram publicados pela primeira vez os resultados dos exames de acesso à Universidade em função da escola secundária frequentada. São chocantes, em particular no que diz respeito à amplitude da diferença entre as notas de frequência escolar e na prova nacional. Na disciplina de Português essa diferença varia mais de 11 valores em função da escola frequentada; em Matemática varia 10 valores.

Em média, os alunos que frequentaram a escola A obtiveram 13 valores a Português na frequência escolar e 16 valores na prova nacional; os que frequentaram a escola B obtiveram 13 valores na frequência e 5 valores na prova nacional. Em Matemática, os alunos da escola C obtiveram em média 13 valores de frequência e 13 valores na prova nacional, ao passo que os da escola D, com 15 valores de média de frequência, obtiveram 5 valores na prova final. Estes dados são factuais e relativos a escolas com mais de 15 alunos examinados: as escolas A, B, C e D são reais; só por ser totalmente inútil não dou aqui os seus nomes. Os alunos que as frequentaram são seres humanos reais, hoje perto dos 22 anos. Uns licenciados ou quase, outros não.

O que estes dados revelam é que é falsa a ilusão utópica de que o sistema educativo se auto-regula. A prática mostra precisamente o contrário. Entregue a si próprio, sem mecanismos de controlo que permitam monitorizar periodicamente o desempenho dos alunos e, indirectamente, o funcionamento do sistema, este entra em roda livre. Escolas, professores e alunos problemáticos podem passar despercebidos ao longo de todo o percurso escolar por não haver um processo externo de avaliação. Os próprios alunos mais fracos podem nem se aperceber das suas carências até ser demasiado tarde.

Tudo isto além, evidentemente, das enormes injustiças académicas quando está em causa o acesso ao Ensino Superior. Alunos de escolas medíocres, com professores que disfarçam a falta de condições ou de competência com o inflacionamento das notas ultrapassam nas candidaturas os alunos que frequentam escolas mais sérias e com professores mais exigentes. Os alunos que admitimos nas Universidades não são necessariamente os melhores; para ter “sucesso”, mais importante do que uma sólida preparação académica é frequentar uma escola de fraco nível de exigência mas generosa nas notas. Há muitos alunos (conheço dezenas de casos reais) que abandonam as escolas de elevado grau de exigência onde estão no final do 9º ano ingressando em escolas públicas conhecidas por inflacionar as notas para poder aceder ao curso que ambicionam (Medicina, por exemplo) e a que não poderão aceder alguns que optaram por ficar na mesma escola e trabalhar mais duramente.

É esta mensagem de facilitismo e de esperteza saloia que estamos a transmitir aos nossos jovens na escola: mais vale ser espertalhão do que inteligente, mais vale dar o golpe do que trabalhar. Vale fazer batota: os fins justificam os meios. E admiram-se que estes seres humanos, anos mais tarde, quando forem adultos sejam cidadãos que considerem normal a fuga aos impostos? É esta a "cidadania", como dizia o Desidério, que queremos transimitir? Seria uma boa piada, se não fosse acima de tudo tristíssimo.

Este é um dos problema central no nosso ensino. Um dos instrumentos que permite corrigi-lo é aplicado pela maioria dos nossos parceiros europeus: são os exames nacionais, com consequências, no final de cada ciclo de ensino. Mas a intelligentsia da Educação Nacional, até há bem poucos anos, queria acabar com os exames do... 12º ano! Nas palavras de um ex-ministro da Educação, "salvei-os porque disse que me demitia". Espantoso!

13 comentários:

:ΚΑΙΡΩΣ(1988)נפש: disse...

Entrei em Setembro passado no Ensino Superior, e não posso deixar de concordar: notei uma incrível diferença na atitude dos professores do 11.º para o 12.º anos. A existência de um exame final levou os professores a, pela primeira vez, cumprirem a totalidade dos programas - de facto, os exames levam a que os professores também se sintam avaliados.
Por outro lado, apesar de valerem apenas metade da nota de candidatura, os exames são um factor de rigor e equidade na avaliação dos canditados.
Não é possível, de facto, avaliar o trabalho de três anos nas duas horas dum exame; porém, essa avaliação possível é bem mais justa que a avaliação subjectiva e variável entre professores e escolas diferentes: é que avaliar requer critérios, e é necessário que os critérios sejam iguais para que se possam comparar avaliações.

AA disse...

...todos nós, professores ou pais educadores ou até pais também professores,sabemos q esta descriçao é terrivelmente verdadeira e que a mestiçagem do nosso sangue nao justificará todo este "deixa-andar;deixa-fazer,não-chateies!!!"...é preciso muita coragem para ir contra está maré q faz de nós fracos e corruptos.
...Abaixo a ordinarice e o xico-espertismo !

Desidério Murcho disse...

E há outro aspecto ainda de que as pessoas raramente se apercebem: sem exames nacionais os próprios autores de manuais não se sentem na obrigação de cumprir os programas, porque sabem que os professores não ligam muito a esse pormenor sem importância. No caso dos manuais de filosofia, que são os que conheço bem, entrou um novo programa em vigor em 2001. Contudo, os manuais para esse novo programa são muitíssimo mais parecidos aos manuais antigos do que ao novo programa. Claro, se os próprios professores não ligam ao programa, para que raio irão os autores perder tempo a mudar os manuais para cumprir cuidadosamente o programa? Escrever um manual dá muito trabalho.

Sem exames nacionais um professor pode leccionar apenas o que lhe apetece, e portanto não sente qualquer pressão para escolher manuais que cumpram o programa. Na maior parte dos casos, o professor nem sequer conhece o programa, precisamente porque toda a avaliação é interna. Pode passar o ano a falar de colmeias neo-zelandesas e depois avalia os estudantes como lhe apetecer. E o problema é que os professores e as escolas verdadeiramente bons, que são exigentes e cumprem os programas, não têm qualquer estímulo para o fazer — e até tendem a perder alunos.

João Pinto e Castro disse...

Não posso deixar de fazer notar a evidente sugestão racista quando "aa", num comentário acima, remete a responsabilidade, pelo menos em parte, para a "mestiçagem do nosso sangue".

Arrebenta disse...

Meu caro Jorge Buescu, embora leitor da sua obra publicada, vou discordar radicalmente de si. Durante todo o meu percurso académico sempre DETESTEI exames, que só me empobreceram, e nunca permitiram revelar o que eu tinha de importante. O exame é skinneriano, e tende para enformar, normativamente, as várias cabeças que possamos ainda ter, suficientemente livres, para não estarem destruídas pelo ambiente soturno em que se afundou a nossa contemporaneidade cultural.
Pessoalmente, conheço alguns dos responsáveis por esses "exames": são pessoas que os utilizam, pelo perfeccionismo da "forma" para ocultarem o fracasso que foi a sua experiência pedagógica, e aumentarem a sua vaidade e auto-estima.
Um bom professor não se retira de campo, para se dedicar a redigir exames para os alunos... dos outros.

Para si, especialmete, Jorge Buescu -- e desculpe dirigir-me com o heterónimo de "Arrebenta", mas já fui, etc., etc., etc., adiante --- para, si, especialmente... como não ignora, vivemos num país a duas, se não a três velocidades: no primeiro nível, campeia a excelência, na qual o incluo; no segundo, o duvidoso, no qual se inclui uma vastíssima mancha de possíveis "avaliadores externos", que, suponho, devessem provir de níveis de ensino superiores ao do Secundário. Acima do Secundario, só reconheço o Superior, onde o regime da "Cooptação", do "Convite", ou, mais descaradamente do "Compadrio", em todas as suas manifestações, desde as Sociedades Secretas, aos "Lobbies" Políticos e Sociológicos, ou ao mero "Nepotismo de Cama", se constituíram Quadros.
Finalmente, como as coisas más nunca vêm sós, ainda há um terceiro nível, o dos "licenciados" que "compraram" as suas licenciaturas, e podem, hoje, ocupar os mais importantes cargos decisórios.

No outro dia, discorrendo com um amigo do "Secundário", a própósito de ser o Secundário considerado como o "Caixote de Lixo das Licenciaturas", ele retorquiu-me com a seguinte frase: "e o Superior, é o caixote de lixo do quê?... Nós, aqui, podemos ser lixo, mas ainda entrámos por concursos nacionais. Por que portas invisíveis se acede ao Superior"?..."

Posso dar-lhe um exemplo?
Considera a "Catedrática" Clara Pinto Correia, Vice-Reitora (!) da Universidade Lusófona capaz de alguma avaliação externa do que quer que seja?...
Suponho que saiba em que nível estou a pôr a discussão, e mais lhe digo, no dia em que se constituírem essas avaliações externas, eu, que sou COMPLETAMENTE externo ao processo, até lhe poderia já avançar com uma lista de nomes, com sérias hipóteses de não falhar.
Eu, por exemplo, gostaria de ser avaliado pelo Rui Zink, sobretudo no que respeita ao meu papel de intelectual.
Boa sorte, e não se admire se for excluído das "Comissões Externas. de Avaliação"...
Acontece :-)

Carolina Almeida disse...

Sou aluna do Ensino Superior e concordo absolutamente com a existência de exames. O que se passa é que amiúde são lançados exames com perguntas altamente polémicas, cuja resolução ultrapassa o rigor científico e insere-se no plano filosófico, inadmissível para disciplinas como Química, Matemática e Biologia.
Sou da opinião que o Ensino navega em tão desregrada falta de rigor que o desaparecimento destas provas seria trágico para quem se pauta por padrões de excelência. Mas, infelizmente, parece que em Portugal vigora mais a esperteza do que a inteligência.

Anónimo disse...

Caros Buescu e Arrebenta,

Como não podia deixar de ser, ambos têm razão... e não têm.

Se parece óbvio que um aluno não deve ver todo o seu trabalho escolar depender de cerca de duas horas que dura um exame (basta uma eventual dor de cabeça para invalidar o resultado de um, ou mais, anos completos), também é bem sabido que as notas de frequência se 'compram' escolhendo adequadamente a escola a frequentar (muitas vezes, na mesma escola, basta ver o que se passa em turmas com professores diferentes). O peso dos exames, neste caso, pode não ser suficiente para colmatar as diferentes maneiras de 'avaliar' os alunos durante a frequência lectiva.

Há duas coisas que convinha separar: a avaliação da aprendizagem, que essencialmente deve ser feita ao longo de todo o ano lectivo, e o ingresso no Ensino Superior, ou noutro qualquer sistema, que exija determinada habilitação académica (o 12º ano, no caso do Ensino Superior).

A fim de evitar uma parte da polémica que o ingresso no Ensino Superior levanta, parece que este não deveria revestir a forma actual, mas depender de um teste ad hoc feito para o efeito, em que de facto se eliminassem, por exemplo, as 'habilidades' resultantes da particular escola que se frequentou. Para isso, e também para evitar as naturais disparidades dos correctores de provas, bastaria que se fizesse um teste de entrada o mais simplificado (mas capaz de reconhecer a (in)formação dos candidatos) possível, por exemplo com respostas dadas por 'cruzes'. Quanto a outras instituições, que não as de Ensino Superior, algumas (cientes da falibilidade do método de classificação académica vigente) já usam processos de selecção em que o diploma de estudos secundários é fundamentalmente condição de admissão ao concurso, que não factor decisivo.

Enfim, se não é justo que um aluno com 20 valores de frequência numa disciplina reprove porque no dia do exame estava indisposto e teve 8 valores (estou a caricaturar, mas há nisto um fundo de verdade), também não é desejável que um estudante, só porque teve 'sorte' com as questões de um determinado exame, possa ser globalmente melhor classificado do que outro que sempre provou ter sido melhor, sem subterfúgios, com efeito decisivo em quaisquer candidaturas subsequentes, nomeadamente de ingresso no Ensino Superior.

Enfim, deveriam separar-se claramente duas coisas: um diploma de estudos secundários e um teste de candidatura ao Ensino Superior.

PS - Não acrescenta nada à discussão, mas pessoalmente fiz exame escrito e oral a TODAS as disciplinas de licenciatura no Ensino Superior (estatal) e exames nacionais em TODAS as disciplinas do Ensino Secundário (estatal).

PSbis - Enquanto docente do Ensino Superior (estatal, como vós), normalmente não exijo exames orais porque o modo como conduzo o ensino os torna dispensáveis (aliás, mesmo os exames escritos constituem apenas um instrumento de aferição para a classificação final do aluno - tenho sorte, porque o número de alunos me permite adoptar esta atitude, o que se não passa com muitos outros colegas que têm a seu cargo a avaliação de muitos alunos, centenas, por vezes).

Anónimo disse...

Um dos argumentos mais usados pelos opositores dos exames é que estes não permitem avaliar aspectos que apenas a avaliação interna consegue revelar. Uma versão ligeiramente diferente deste argumento é que numa prova de 2 horas os estudantes não conseguem mostrar realmente o que valem, até porque podem estar num dia não.
Mas estes argumentos baseiam-se numa concepção distorcida dos exames e do seu papel, pois assentam na seguinte falácia: ou a avaliação dos estudantes é exclusivamente interna ou é exclusivamente externa. Ora, isto é um falso dilema.
Assim, ainda que haja conhecimentos e competências importantes que não possam ser avaliadas num exame de duas horas, isso não permite concluir que os exames não deviam existir. Se assim fosse, e com exactamente os mesmos argumentos acima expostos, também teríamos de banir os testes escritos que os professores utilizam para avaliar os estudantes ao longo do ano. Também aí o estudante pode estar num dia não e também aí se está a utilizar um expediente skinneriano, como diz um dos comentadores anteriores. Já agora, não será também o que acontece quando alguém se candidata a um emprego?
É claro que uma prova de exame não consegue avaliar tudo o que é importante, tal como nenhum outro instrumento de avaliação consegue, por si só, avaliar todo o que é importante. Por isso é que a nota final dos estudantes inclui (com um peso bastante superior, aliás) a avaliação interna feita pelos professores. A questão é que, sem avaliação externa, há aspectos importantes (não os únicos) que nunca seriam publicamente avaliados. E isto, embora não seja condição suficiente, é condição necessária para a qualidade do que se ensina. Por isso, devíamos antes estar a discutir em Portugal qual o peso relativo da avaliação externa e não a sua existência.
Sou professor há mais de 20 anos e já vi muitos estudantes fazerem exame e já assisti ao fim dos exames na disciplina que lecciono. E é claro como a água, que há uma relação causal entre o fim dos exames e a degradação do ensino. E a experiência diz-me também que essa ideia de que os bons estudantes podem ser prejudicados no exame por estarem num dia não é uma grande treta. Nunca vi disso, embora admita que possa haver casos excepcionais.
Só para terminar, acrescento que se eu, professor de filosofia, quiser passar as aulas todas do ano sem falar uma única vez de filosofia e sem cumprir o programa, garanto-vos que o consigo fazer com a maior das calmas, sem que ninguém me venha pedir contas. No final do mês, a maçaroca lá aparece na conta sem problemas. Como é maravilhosa a escola sem exames.

Anónimo disse...

Fui estudante no tempo em que havia exames nacionais no 2º, 5º e 7º anos dos liceus.
Tive a sorte de dispensar dos exames dos 2º e 5º anos e das provas orais dos do 7º ano.

À época, a questão da existência, ou não, dos exames praticamente não se punha. Nem tão pouco o problema das matérias para os exames. Fosse a disciplina da área das Ciências Exactas, fosse Filosofia, os programas estavam clara e razoavelmente estabelecidos. Por exemplo, em Matemática toda a gente sabia o que estudar (e era muito, mas muito mais, do que o que hoje constitui os programas dos diversos anos de escolaridade), mas o mesmo acontecia com a Filosofia que não era deixada ao livre arbítrio dos professores, pois havia compêndios bem estruturados por onde estudar, em vez do que ocorre hoje: textos desgarrados de alguns filósofos e de muitos pseudo-filósofos, geralmente sem qualquer 'cimento' que os una.

É certo que na altura havia uma selecção natural dos alunos, por razões sócio-económicas, entre outras, e que os professores do liceu, salvo raras excepções, estavam melhor preparados dos que os de hoje, porventura porque ainda não contaminados pelas ditas 'ciências da educação'.

Mas o sistema diferia do actual num aspecto em que reside o cerne da questão dos exames: não havia o chamado 'paralelismo pedagógico' que hoje serve para dar guarida a toda uma manóplia de negociatas do ensino privado.

Toda a gente fazia exames (excepto os alunos do ensino oficial que tivessem classificações de frequência que os dispensassem) e o que se passava era que genericamente os alunos da maior partes dos colégios privados (com uma ou outra excepção) reprovavam e com notas baixíssimas (muitos zeros, com frequência).

Como não parece viável o regresso à universalidade de exames com o 'esquecimento' do histórico escolar dos alunos, ao menos que os exames não sirvam para cobrir as falcatruas da grande maioria das instituições de ensino provado, que fundamentalmente VENDEM BOAS NOTAS aos seus clientes, sob pena de eles lhes fugirem.

Assim, o problema poderá ter uma solução parcial: não utilizar as classificações de frequência lectiva para quaisquer candidaturas, sejam elas de que tipo forem.
Em cada caso devem realizar-se testes adequados que ponham à partida todos os candidatos em condições iguais: 'sem passado académico' em termos das classificações obtidas na parte lectiva (claro que mesmo assim voltará a surgir o factor sócio-económico a favorecer alguns, mas parece muito difícil eliminar esta circunstância).

Desidério Murcho disse...

Eu acho o argumento do aluno muito bom que lhe corre muito mal o teste uma ilusão. Nunca vi tal coisa acontecer ao longo dos anos -- mas vi muitos alunos que se julgam melhores do que são terem más notas e depois desculparem-se com a dor de cabeça e os nervos e a diarreia. Mas -- não será isto óbvio? -- isto tanto acontece na avaliação interna como na externa. E se não acontece mais na interna é porque, sem a externa, a avaliação interna só faz perguntas do género "olhe, diga lá mais ou menos o que lhe ocorre agora, se faz favor" (ou seja, sem exigência cognitiva).

Por outro lado, é contraditório declarar que queremos que a escola "prepare para a vida" (havia de preparar para a morte?), e ao mesmo tempo eliminar os exames porque os estudantes podem ter diarreia nesse dia. Mas isto é o que nos acontece na vida: vamos a uma entrevista importante de emprego e o bebé pode ter passado a noite a chorar, vamos a uma defesa do doutoramento e na véspera passámos o dia com febre alta, vamos operar alguém de urgência depois de um acidente e ainda ontem apanhámos o marido na cama com a vizinha do terceiro esquerdo. Mesmo em termos de preparação para a vida não é uma boa ideia os estudantes desde pequenos se habituarem à ideia de que na vida há etapas fundamentais e que nos preparamos para elas e depois fazemos o melhor que podemos e sabemos, controlando na medida do possível os nervos? Claro que sim.

Isto faz-me sempre lembrar a história das condições: os preguiçosos e incompetentes desculpam-se sempre com a falta de condições. Mas que condições tinha Beethoven para, meio envenenado e com uma vida pessoal complicada, fazer o que fez? Desculpa de mau pagador, é o que é. Ou estarei a ver mal?

Anónimo disse...

Caro D. Murcho,
Os exames são alguma coisa, mas estão longe, muito longe, de ser tudo, ou mesmo o principal, no processo de formação de alguém. Os resultados do estudo e da investigação podem ser altamente mascarados pelos exames tradicionais.


Só a título de exemplo ilustrativo, para evidenciar a contingência dos exames, narro algo de que tive notícia.
Havia um aluno brilhante que chegou ao fim do 7º ano do liceu, oficial, com média de 19 valores. Aconteceu que na semana anterior aos exames foi atropelado, o que o deixou em más condições físicas para realizar o exame (por acaso, já uma arreliadora gripe o havia obrigado a deixar os exames para a 2ª chamada). Resultado: por incapacidade física (não considerada legal para lhe permitir requerer exames noutra altura) e, consequentemente, algum desânimo psicológico, os resultados obtidos foram péssimos, do seu ponto de vista.
No ano seguinte repetiu tudo e as coisas correram normalmente.

Concluíu a licenciatura com média de 19 valores (antes dos bons tempos - inflacionistas - de agora).

Hoje, é professor catedrático jubilado, ainda activo cientificamente, com produção científica mundial altamente qualificada.

Esqueci-me de dizer que enquanto aluno (salvo aquando daquele incidente do 7º ano) lhe foram sempre atribuídos os mais elevados prémios escolares (Camões, incluído).

Quanto aos doutoramentos e, já agora, também à agregação, em Portugal, são provas (exames) sobre as quais muito já se disse e há ainda para dizer.
Em vários países elas não passam de um mero acto simbólico (e bem), pois a verdadeira avaliação já antes foi feita por conceituados especialistas, por vezes de países os mais diversos, e não é o resultado do exame de duas a três horas prescritas por cá, com júris ad hoc, e, no caso das últimas, ainda recorrendo ao cobarde método da votação secreta!!!

A terminar, uma palavra sobre Bolonha, que não é mais do que o culminar de um processo de nivelamento por baixo de todo o ensino superior europeu e, escândalo dos escândalos, até da pós-graduação, em sentido lato (mestrados e doutoramentos).
Talvez com boa performance em exames(!) tudo fique muito arranjadinho!

Só que nalguns países europeus cada vez mais o que conta para a vida profissional (académica ou não) não são os resultados dos exames universitários. Há outras escolas mais credíveis e as empresas encarregam-se, elas próprias, de avaliar os candidatos por outros métodos que não os exames.

Quanto à quase sacralização dos exames que parece defender, se houve Beethoven (não consta que fosse submetido a exames para que a sua excelsa obra possa ser por nós hoje fruída), também houve Galois, Einstein,... que por via dos louvados(!) exames foram impedidos de entrar em escolas a que se candidataram, que os creditaram como produtos de qualidade inferior, em resultado dos tais exames!

Desidério Murcho disse...

Caro anónimo: Não defendo a sacralização dos exames, nem em lado algum está afirmado que são uma solução mágica, nem a única solução.

Mas o mesmo se pode dizer de tudo o resto. Ter boas bibliotecas, por exemplo. De que serve tal coisa se ninguém estudar os livros que lá estão?

E de que serve a avaliação interna se uma pessoa ficar com cancro e deixar de poder ir às aulas durante 3 meses por causa dos tratamentos?

Não se pode argumentar contra os exames como se quem os defende achasse que é a solução única. E não se pode apontar deficiências aos exames como se as outras formas de avaliação não tivessem deficiências.

Além disso, não se estava a falar, no artigo original do Jorge, nem nos comentários, em exames nas universidades mas sim no ensino secundário.

Repito: os exames não são uma condição suficiente para haver bom ensino; mas são uma condição necessária.

Anónimo disse...

gracas a voces fui apanhado obrigado :(







andre dores

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