Moeda da cidade fenícia de Tiro datada de 200 a.C. que representa a lenda que atribui ao cão de Melkarth - o deus protector da cidade que alguns consideram o antecessor de Hércules - a descoberta da púrpura.
Embora os tecidos têxteis tingidos mais antigos de que há registo datem de há cerca de 8 000 anos, estudos arqueológicos permitiram descobrir sementes de plantas tintureiras em cavernas do Neolítico. Os corantes eram extraídos de flores, sementes, frutos, cascas e raízes de plantas ou de insectos e moluscos através de processos complexos, muitas vezes envoltos em segredos que fizeram perder no tempo as técnicas utilizadas.
Durante a Idade Média, a indústria tintureira, assente em corantes na sua maioria conhecidos desde a Antiguidade, tornou-se num dos principais motores da economia europeia.
A púrpura designa os mais importantes e mais caros corantes da História, utilizados pelas elites até à queda de Constantinopla em meados do século XV. A púrpura era obtida a partir da secreção mucosa produzida pela glândula hipocondrial situada junto do tracto respiratório de moluscos do género Purpura, por exemplo purpura haemostoma, e do género Murex. Encontram-se enormes pilhas de cascas destes moluscos em alguns sítios históricos na costa grega já que se estima que eram necessários cerca de 10 000 destes elusivos moluscos para produzir 1 grama de corante, cujos diferentes tons dependem do tipo de molusco e extracção utilizados. Não é por isso de espantar que o seu preço fosse muitas vezes mais elevado que o ouro e que apenas pessoas muito abastadas se pudessem dar ao luxo de usar roupa tingida com estes corantes, normalmente associados à realeza e ao clero.
Durante o Império Romano, apenas o imperador Romano podia aparecer em público com um manto tingido de púrpura imperial, enquanto que aos senadores imperiais estaria reservado apenas o uso de uma barra púrpura na toga branca. No século I, Nero fez mesmo publicar um decreto que dava ao imperador o direito exclusivo da cor púrpura. Carlos Magno e restantes imperadores do Sacro Império Romano continuaram a usar o púrpura imperial enquanto os restantes reis europeus preferiam uma tonalidade mais azul, denominada púrpura real.
A associação destes corantes com a realeza e o alto clero é muito antiga, e já os textos bíblicos referem o púrpura, argaman, que deveria tingir as cortinas do tabernáculo e as vestes sacerdotais, e o tekhelet, um corante azul obtido de uma criatura marinha que a Torah refere como chilazon, que deveria ser usado para tingir os talit (xailes) com que os judeus se cobrem durante as orações. Hoje em dia pensa-se que o chilazon seria um destes moluscos, mas a maioria dos talit exibe apenas tzitzit (franjas) brancas.
Codex Brixianus (Brescia, Biblioteca Queriniana) uma bíblia do século VI que como a sua congénere Argenteus em Uppsala foi escrita com tinta de ouro ou prata em velino tingido com púrpura.
Nas vilas romanas de Casais Velhos, perto do Guincho, e Cerro da Vila, em Quarteira, a grande quantidade de conchas murex e tanques encontrados levanta a hipótese de terem sido centros de produção de púrpura.
Não há quaisquer dúvidas sobre a importância para a economia nacional de outro corante púrpura, a que Teofrasto, o filósofo que sucedeu a Aristóteles, se refere como dando origem a uma cor mais bela do que a púrpura, extraído do líquen Roccela tinctoria. A urzela, orcina, ou ervinha, introduzida nos Açores no século XV, foi uma importante fonte de rendimento do arquipélago. A partir da urzela preparava-se uma tintura de um vermelho violáceo exportada para a Flandres. Esta tintura era conhecida em França como «púrpura francesa».
Um azul bem menos intenso que o azul/púrpura real era uma cor mais acessível na Idade Média- e contrariamente ao «sangue», uma cor mais do povo. Obtida da Isatis tinctoria, a fonte europeia de anil ou indigo conhecida cá no burgo por pastel ou pastel-dos-tintureiros, a sua importância económica no Portugal medieval traduz-se no facto de que ainda hoje em muitas expressões idiomáticas «pastel» é sinónimo de dinheiro.
Mas como indica o nome (de indicum, «da Índia»), a fonte mais importante daquele que alguns historiadores consideram o corante mais antigo utilizado era a Indigofera tinctoria, uma planta nativa na Ásia. Vasco da Gama abriu o caminho à importação para a Europa do indigo indiano, de muito melhor qualidade e cerca de 30 vezes mais concentrado que o pastel. Na Alemanha, ou antes, em alguns estados da confederação que continuava a ser conhecida como Sacro Império Romano, a utilização do indigo indiano foi proibido por lei, sob pena de morte, para proteger os camponeses locais da competição estrangeira. O indigo foi declarado a «cor do demónio» em 1654 e apenas foi legalizado em 1737.
Permanecem algumas expressões idiomáticas que reflectem a importância do indigo na Alemanha, como Blauer Montag (segunda-feira azul, que significa não trabalhar à segunda-feira) e Blau werden (ficar azul, isto é, bêbedo). A origem destas expressões tem a ver com o facto de o indigo ser um corante de tina, isto é, não é solúvel em água na sua forma corada sendo necessário aplicá-la numa forma dita leuco, incolor, que depois é oxidada à forma corada por exposição ao ar. A forma incolor do indigo era extraída com urina e urina de quem consumira grandes quantidades de álcool surtia melhor efeito. Os tintureiros usavam muitas vezes a própria urina na processo de fermentação do pastel e mergulhavam os tecidos nas tinas, normalmente ao domingo, por pelo menos 12 horas. Quando os tecidos eram pendurados em varais para secar e corar (de facto), à segunda-feira, os tintureiros, descansavam e curtiam a ressaca ao lado dos varais.
Como nota de curiosidade, entre os pigmentos mais antigos encontra-se o quermes ou grã, um corante vermelho escarlate extraído das fêmeas grávidas do pulgão, Kermes illici (antes designado por Kermococcus illici ou Coccus illici), que vive na orla mediterrânica sobre carvalhos ou plantas espinhosas como o azevinho. Em 1467, uns anos após a queda de Constantinopla, o papa Paulo II decretou que a indumentária dos cardeais passasse a ser tingida com uma mistura de quermes e indigo em vez da púrpura de murex que os agraciava até à data. Ainda hoje os cardeais são referidos como purpurados embora as suas vestes sejam escarlate.
domingo, 8 de julho de 2007
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6 comentários:
Nunca tinha percebido donde vem a expressão «tens pastel». Ainda pensei que fosse alguma coisa dos pastéis de Belém...
Será que carmin e crimson vêm de quermes?
Olá Joana:
O que dá a cor vermelha ao quermes é o ácido quermésico, uma antraquinona. Crimson vem do espanhol antigo cremesin (de quermes) que por sua vez deriva do latim medieval cremesinus para kermesinus ou carmesinus. Penso que vermelho tenha também origem neste corante que vem de um verme...
Do Novo Mundo veio outro pulgão, cochinilha ou cochonilha-do-carmim, (Dactylopius coccus, antigamente conhecido por Coccus cacti) que produzia um corante, carmine, que substituiu o quermes, do qual o ácido carmínico, outra antraquinona, é o principal componente.
Embora os vermelhos de síntese tenham substituido estes corantes naturais na indústria têxtil, o carmim da cochonilha ainda é usado na indústria cosmética e alimentar (por exemplo é o vermelho dos smarties).
É preciso entender que este blogue está numa cruzada anti-religiosa, atacando a sagrada Bíblia e a fé num Criador de tudo para atacar, de uma penada, todas as religiões que se baseiam nesse livro.
Em quase todos os posts impõem o seu dogma materialista, a apresentação da natureza como criadora de tudo, insultando todos aqueles que vivem em Cristo e vivem segundo os mandamentos deixados à humanidade no livro que Deus escreveu e chamamos Bíblia.
Só assim se pode entender que em todos os artigos apresentem como verdade absoluta idades de milhares ou milhões de anos para muitas coisas.
São especulações materialistas e ateístas dizer que as pinturas rupestres têm 40 000 anos e que os tecidos têm 8 000 anos, inventadas e coladas com cuspo só para contrariar os ensinamentos divinos. A ciencia baseada em entendimentos bíblicos não anda a especular sobre possíveis factos históricos, só quando se faz ciência tendo em mente a pessoa de Jesus Cristo, estamos a caminhar para a verdade.
Esta historia dos corantes é excelente.Bem escrita, objetiva, clara. O mundo está ficando melhor porque as pessoas querem ensinar, com clareza, o que sabem. Pena que muitas religiões ainda obscureçam algumas mentes. Arte e ciência devem operar no sentido de melhorar a condição humana,tão precária às vezes.
Muito útil informação que com os devidos créditos e autorização , copiei para o Site
http://azeitaoanossaterra.ning.com
Fico agradecido a esta autorização e desejo que tenham muito sucesso
Joaquim Oliveira
Azeitão Portugal
Olá sou Atom Seven, artista plástico e gostaria de lhes fazer uma pergunta sobre a Roccella tinctoria. Gostaria de saber se este liquen era usado para fazer a cor purpura para tingir roupa ou/e se era também usado pelos pintores flamengos nas suas pinturas a óleo para obterem a cor purpura ou violeta? Obrigado , o meu email é: atomseven@gmail.com
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