“Deixemos no bengaleiro a nossa perpétua inclinação nacional de escutar odes- e entremos só com a tendência humana de resolver problemas” (Eça de Queiroz, 1845-1900).
Sem meias tintas, que o tempo não é de palavras mas de acção, comecemos por encarar a realidade do nosso ensino em que, segundo Carlos Fiolhais, “por força de um atraso ancestral, a necessidade de uma escola qualificada que dê lugar a uma sociedade desenvolvida não está suficientemente clara na mente das pessoas. A escola, a boa escola, não ocupa ainda o lugar a que tem direito”.
Em contra-mão com a vox populi que nos avisa que se a palavra é de prata o silêncio é de ouro, surge o optimismo de uma extensa entrevista, com chamada na primeira página, da Ministra da Educação (“Expresso”, (31/07/2010), intitulada “Isabel Alçada quer acabar com chumbos”, criando, com isso, uma espécie de fait-divers para os inúmeros problemas que afectam o sistema educativo nacional.
Se não fosse trágico, seria interessante o burburinho causado por esta entrevista no que se refere aos chumbos por ser o anúncio do que se iria passar no nosso ensino como se já não fosse o que se passa de há dezenas de anos para cá perante a passividade ou mesmo a água da pia baptismal das diversas tutelas do Ministério da Educação, que fingem nada ver e nada saberdas passagens de ano, escandalosamente facilitadas, no ensino básico com finalidades estatísticas de sucesso escolar.
Este facto coloca-nos a anos-luz da preocupação de Platão (427-347 aC.) com a educação da juventude ateniense. Quando confrontado com a incapacidade de as crianças contarem ou distinguirem os números pares dos números ímpares, manifestou o seu muito desagrado e não menor desalento: “Quanto a mim, parecemo-nos mais com porcos do que com Homens, e sinto-me não só envergonhado de mim, mas de todos os gregos”. Justiça seja feita a Vasco Graça Moura, por idêntica preocupação mais de dois milénios depois: “A escola que temos não exige a muitos jovens qualquer aproveitamento útil ou qualquer respeito ou disciplina. Passa o tempo a pôr-lhes pó de talco e a mudar-lhes as fraldas até aos 17 anos. (…) Vão para a universidade mal sabendo ler e escrever e muitas vezes sem sequer conhecerem as quatro operações” .
Para acabar com os chumbos, em provas de aferição (em 2010) de Matemática do 6.º ano de escolaridade foram feitas perguntas destas: “Qual é a quarta parte de 8? Quantos são 5+2?”. Não ouso, sequer, fazer uma comparação zoológica entre os gregos dessa época e os portugueses de uma geração em que a humanidade já pisou o solo lunar e projecta ir a Marte em naves tripuladas. Estas coisas não se resolvem”a ouvir odes” ou por simples decretos porque se não erradica a doença proibindo que os cidadãos adoeçam e muito menos se melhora o ensino querendo acabar com os chumbos com o ónus pesadíssimo de gerações de analfabetos funcionais lançados para as garras do desemprego.
Mas não são só estes problemas a jusante que nos devem preocupar quando a montante a qualidade da formação académica dos docentes desceu de forma vertiginosa. Sem professores competentes (para já não falar nos programas e compêndios escolares, avaliações em fim de estudos de ciclo, problemas de disciplina dos alunos, fracas possibilidades económicas dos pais, etc.) poderemos aspirar a alunos interessados, trabalhadores, cumpridores do seu dever que é estudar?
Os próprios sindicatos docentes contribuíram para o novo-riquismo na formação de docentes, exigindo um mestrado pelas escolas superiores de educação para a docência do 1.º ciclo do ensino básico. De que credibilidade se reveste esta medida comparativamente aos mestrados exigidos, por exemplo, para o magistério do ensino secundário obtidos “com sangue, suor e lágrimas” em universidades públicas?
Seja como for, repito, estas coisas não se resolvem por simples decretos, portarias ou simples instruções, à luz do dia ou encapotadas, para acabar com as reprovações dos alunos, a exemplo dos países nórdicos que o conseguiram, mas mercê de um desenvolvimento bastante maior a níveis económico, cultural, social. No caso português com o ónus pesadíssimo de uma geração ou mais de analfabetos funcionais portugueses a servirem de cobaias. Alguma vez, uma cópia de um pintor de monos poderá ser tomada por um quadro da Renascença?
Isabel Alçada pertence ao corpo docente de um ensino politécnico na área da educação em que os chumbos se contam pelos dedos de uma mão e os mestrados de alguns dos seus professores iniciais foram feitos em 6 meses, em Boston. Por outro lado, uma árvore com raízes daninhas, que equiparou, para a docência da Matemática do 2.º ciclo do básico, professores licenciados por universidades, unicamente para o ensino desta disciplina, com professores saídos das escolas superiores de educação para a docência simultânea da Matemática e Ciências da Natureza, nunca poderia dar frutos sãos. Isto trouxe como resultado, como escreveu Nuno Crato, haver professores que não sabem somar fracções ou confessam “horror à Matemática”. Com a agravante de poderem transmitir esse horror aos seus alunos.
Mas busquemos o exemplo do ensino do Português:
“Como se avalia este professor, ouvido há tempo numa livraria:
- Bom dia, queria a Aparição do Fernando Pessoa.
- Desculpe do Vergílio Ferreira
– Francamente, quer-me ensinar a mim que dou aulas de português há 15 anos? Há pessoas que não deviam estar em certos lugares.
(Caricato??? Mas verdadeiro. É piada ainda hoje nessa livraria).
Conversa entre mim e uma professora sobre a questão dos A.T.L.
– haaaaa! Conheço-a bem (refere-se a Maria Montessori) ainda o ano passado estive com ela numa acção de formação. (incrível mas verdadeiro)
Conversa entre mim e a colega que dá a cadeira de Português:
– Não li os Contos Exemplares nem vou ler. Eles (alunos) que leiam. Já comprei um estudo de obra para lhes dar aquilo.
– E como vais dar se nunca leste nem analisaste?
- Da mesma forma que dei o "Felizmente há luar", pelos resumos. (Sem comentários) “.
Mas será que ainda estamos a tempo e com a humildade em reconhecer os erros do nosso ensino advertindo a juventude do nosso tempo como o fez Jaime Cortesão na primeira metade do século passado: “Jovem amigo, se tens a vontade frouxa, o ânimo facilmente impulsionável, se és um incoerente ou um desequilibrado, estás a tempo de evitar um destino inglório. Toma conta: se não cultivares a tua personalidade e se te deixares ir na onda de admiração com que se aplaudem as tuas piores extravagâncias, poderás vir a arrastar a vida pelas esquinas ou botequins, vazando na maledicência e na calúnia a tristeza secreta da tua inferioridade”.
Por seu turno, escreveu Pessoa que “ o sentido íntimo das coisas é elas não terem sentido íntimo nenhum”. De modo igual, o sentido das reformas educativas portuguesas destas últimas décadas é não terem sentido nenhum. Ou, se o têm, é prosseguirem, com redobrada energia, no sentido errado!
42 comentários:
Vocês, o pessoal do de rerum, vão partir a cabecinha toda com estas novas medidas! Decididamente, não sois muito bons a aceitar coisas novas.
Quero lá saber o que Platão disse. Quem me garante que ele tinha queda para professor? É que uma coisa é ser um génio numa certa área e outra muito diferente é ser génio em tudo? Eu não acredito nada que o Einstein, ou o Platão, ou sejam quem for, mesmo o Da Vinci, fossem bons em tudo. Ele foi famoso por ser um excelente pedagogo de crianças? Só estou a perguntar, não sei.
Outra coisa. Algum dia a matemática foi uma disciplina em que a maior parte dos alunos passavam nos exames? Mesmo no vosso tempo, no tempo das reguadas e do estudar à bruta? Eu não me lembro disso. O que me lembro é que desde há uns 30 anos para cá a maioria dos alunos chumbavam no exame. E se chumbavam, não seria porque o nível exigido era demasiado elevado para a média da população? E não era traumatizante, quase inibidor, não faria pior aos alunos que desistiriam à partida, sem sequer tentar aprender algo? Se não se consegue pôr a população toda a saber matemática de alto nível, não será melhor baixar o nível, facilitar?
E o mesmo não acontecia nas universidades portuguesas onde havia cursos com altas taxas de reprovação e onde os cursos de 4 anos eram concluídos numa média de 7? E se é impossível que a média dos alunos universitários sejam todos génios da matemática (ou outra), não será melhor facilitar um bocado e não fazer perder tanto tempo na universidade aos alunos? Não se distinguem os bons alunos dos mais fracos através das médias? De que vale sacrificar as pessoas obrigando-as a estudar 7 anos quando podiam perder apenas 4 e ficar a saber o mesmo?
E digo isto porque lá fora, nalguns países é assim. Não na Espanha, por exemplo, onde um curso de arquitectura leva 10 anos, em média a ser concluído. Esses são parecidos connosco.
Mas em Inglaterra, ao contrário de nós, as taxas de reprovação nas universidades são mínimas, e só chumbam os alunos que não fazem mesmo nada.
Eu agora pergunto: quais são as universidades com mais prestígio, as inglesas ou as portuguesas ou as espanholas? E onde se faz melhor investigação de ponta? Claro que é em Inglaterra. Como é que é possível que com tanto facilitismo eles tenham investigadores tão bons e nós andemos a ver navios? Se calhar a resposta é que quem é bom é bom e não precisa de ser massacrado com muitas dificuldades para tirar uma média de 15, como tiram em Portugal, e se calhar até estarão mais motivados se acabarem com média de 19 em Cambridge (eu sei que lá as escalas são diferentes, ou é o first ou o second ou o third, não há tantas tretas). E os que acabam com média de 11, ao fim de 7 anos, também não serão melhores do que os que acabam em Inglaterra ao fim de 4 com um second.
Mas se vocês querem continuar a teimar numa teoria delirante que diz que se o ensino for muito bom, próximo do perfeito, todos os alunos serão craques a matemática e todos os doutores que acabaram um curso universitário não darão erros, vocês estão completamente errados e não sabem nada da vida nem de que como funcionam as pessoas e o que é o mundo real, não passam de uns universitários que vivem desligados do mundo e que por isso sois bastante ignorantes.
E eu não estou a dizer que se deve passar toda a gente, ou se isso for feito não sei como se deve fazer, ou se se deve, eu não sei muito disso. E claro que sou a favor de um ensino de qualidade, mas tenho dúvidas de que este dependa tanto de massacrar os alunos com dificuldades absurdas que são entendidas apenas por uma minoria, tenham eles professores excelentes ou não.
luis
Ah, e desculpem se o meu português não está muito bom ou se dei algum erro. É que eu não dou grande importância a escrever-se perfeitamente porque as regras gramaticais do português são completamente ridículas e exageradamente complicadas para o meu gosto.
E sim, estudei na universidade, mas sou das ciências, por isso acho que estou desculpado!!
E se virem por aí o Graça Moura, mandem-no foder da minha parte. E perguntem-lhe o que é que ele sabe de matemática para se estar a queixar tanto dos erros de português de quem acaba um curso universitário. Eu gostava de o apanhar ao lado para lhe fazer umas perguntas simples da matemática do secundário que era para me rir um bocado, porque apostava que ele não me iria saber responder a grande coisa. É que garganta vejo eu muita, demasiada garganta, mas na hora da verdade... É só tretas.
luis
Como é que o Prof. Carlos Fiolhais explica que alunos de engenharia a terminar o curso não saibam a densidade da água ou uma regra de três simples ?
Que engenheiros/as vão ser estes cidadãos ?
Que Universidade e professores permitem estas aberrações ? O que podemos fazer nós empregadores para vencer a falta de qualidade da mão-de-obra técnica em Portugal ?
Caro Luís:
Saúdo a sua reaparição nos comentários ao meus post’s, pese embora algum azedume que por eles perpassa.
Em tudo o mais, é sempre salutar trocar ideias com pessoas que têm ideias diferentes das nossas: aguça-nos o engenho de pensar. E por isso penso, será que os cursos das universidades de Oxford e Cambridge são o regabofe que diz? Aqui a minha declarada ignorância não podia ser maior. Alguém (com a experiência vivida nesses faróis do conhecimento mundial) que me ajude num combate desigual em que a experiência parece estar do seu lado sobre o que se passa em terras do Reino Unido separadas do resto da Europa pelo canal da Mancha.
Numa coisa estamos de acordo. Dificilmente os luminares de um dado conhecimento podem aspirar em serem completamente ecléticos. Há zonas corticais que distinguem o matemático do literato, o músico do atleta de alta competição. Todavia, deve ser exigido a um literato que saiba uma matemática capaz de realizar determinadas operações e a um matemático que não dê erros de palmatória no português, o exemplo que lhe serve de referência.
Concordo consigo, por exemplo, que a matemática sempre representou um papão para grande franja da juventude portuguesa. Lembro-me, por exemplo, que aquando dos exames do antigo 5.º ano dos liceus era um alívio para certos alunos libertarem-se do seu jugo partindo para os cursos de Letras ou de Direito. Mas países há, como, por exemplo, a China e a Índia em que o horror à matemática foi ultrapassado com inegável êxito.
Para terminar, recordo-lhe o caso de dois grandes vultos das letras oriundos das ciências: Miguel Torga, vindo da medicina, e Jorge Sena, surgido da engenharia.
Que mais lhe posso dizer. Apenas terminar como comecei: Saúdo a sua reaparição nos comentários ao meus posts. Agora me lembro. Só mais uma coisinha: “Existe uma erótica do novo, o antigo é sempre suspeito”, segundo Roland Barthes. De igual modo, tenho sempre medo daqueles que pensam que para melhorar o que está mal há que destruir, não deixando pedra sobre pedra, aquilo que levou gerações a construir:os chamados iconoclastas!
Caro Luis, tenha juizo e tome Fosgluten para o parco cerebrozinho que tem na sua cabeça.
Antonio Silva
Eu, Vasco, estou-me borrifando para essa merda da Matemática. Escrever bem português é que interessa, o resto é para analfabetos que nem as regras de gramática conhecem, dificilmente merecendo o título de humanos. Só se for de humanos neandertais.
V. G. M.
Luís, não estou aqui para defender os autores do De Rerum Natura, mas o seu comentário exige umas pequenas clarificações. Em primeiro lugar, a crítica é fundamental com ou sem recurso aos clássicos. O que Rui Baptista - o Rui que me desculpe a ousadia - pretende defender é a possibilidade de todos terem um ensino de qualidade. A escola deve fazer esse esforço. Essa qualidade passa necessariamente por permitir aos estudantes a aquisição de saberes fundamentais para o exercício da cidadania. Ora, essa cidadania exige que se saiba escrever bem, pensar o melhor possível e saber mais sobre as leis da termodinâmica ou sobre as nossas matrizes culturais. Por isso, uma pessoa oriunda das ciências tem a obrigação de escrever bem como uma pessoa oriunda de letras deve saber as leis de Newton ou de somar duas fracções. Para concluir não queria deixar de dizer-lhe que, de facto, há muita verborreia à volta da educação, mas não me parece que seja característica dos opinadores do De Rerum. Cumprimentos.
Caro Rui Baptista
Eu penso que a Ministra está a gerir as escolas como uma cadeia de hotéis, onde os gerentes, quando um cliente sai, o saúdam com aquela parcimónia que as good manners impõem:
- Foi um prazer servi-lo. Volte sempre. Servi-lo-emos com a mesma atenção. Sabemos avaliar as necessidades dos nossos clientes. Eles merecem.
Transportando o caso para as escolas:
- Foi um prazer tê-lo tido connosco até o 5.º ano.
Como não pode voltar tomamos a ousadia de lhe lembrar que poderá ser melhor servido, em Hotéis de 5 estrelas (Universidade). Quando tiver 23 anos lembre-se dos concursos ad hoc para esses Hotéis, onde usufruirá de todas as regalias e bem estar.
E lembre-se que foi um alívio para si não ter podido continuar até ao 12.º ano, porque estes hotéis de 2 estrelas (escolas), estão muito mal apetrechados em pessoal e estruturas materiais - apesar dos rebuçados Magalhães - e embora o Ministério da Hotelaria Escolar estar cada vez mais apetrechado em pessoal e estruturas, mas a sua grandeza adquiriu tal volume que mais parece um labirinto sem saída, ou um arremedo de um Ensaio sobre a Cegueira.
Portanto, O Ministério sabe em que terrenos vive, e ver-se livre dos alunos o mais depressa possível criando guethos (aglomerados de muitos mais alunos), pode constituir o primeiro passo para motivar os pais a instruir os filhos sobre as vantagens de esperar pelos 23 anos para o concurso ad hoc à Universidade.
Mariano Gago os acolherá complacentemente, sob os auspícios de Bolonha, centro ubíquo do que se deve saber e do que se deve esquecer, do magister dixit.
Em estilo panfletário:
Abaixo a Escola! Viva a Universidade! O futuro do seu filho está na Universidade! Esqueça a escola! É parra que já não dá uva! Viva a vida até aos 23 anos! Bolonha precisa de si!
Meu Caro António:
Muito me honra o seu tratamento por Rui.
Muito me honra, outrossim, a defesa que faz do DRN pelo simples motivo que apenas o respeito democrático pela liberdade de opinião dos seus autores os deve responsabilizar por aquilo que escrevem acerca das opiniões que, bem ou mal, defendem.
Aliás, é neste contexto que eu leio, eivado das melhor das boas vontades, os comentários que me fazem, sob a condição de desresponsabilizarem este blogue (DRN) por aquilo que aqui se publica com o “verdadeiro nome, o respeito, a cordialidade, a seriedade que deve envolver as objecções, correcções factuais, contra-exemplos e discordâncias”.
A polémica não deve ser uma arena em que obriguemos o nosso contraditor a ajoelhar aos nossos pés ou a arrepender-se daquilo que escreveu no calor da refrega. O bom senso, pela certa, regressará com a análise desapaixonada dos factos. E contra factos não há argumentos. Apenas teimosias!
Cumprimentos amigos.
Concordo com o Luís! No que concerne a temas de política educativa,a linha editorial do De Rerum Natura é, ela própria, 'facilitista', dicotómica, maniqueísta, simplista, populista e alicerçada em concepções mitificadas acerca do passado e 'utupismos' intelectuais de académicos que sofrem de óbvia azia matinal.
Será que esta proposta do ministério foi maleficamente gisada em gabinetes de gente com pérfidas intenções de entregar o 'futuro do país' às mãos de hordas de analfabetos e incivilizados? Porque é que, por uma vez, não se dá o beneficio da dúvida a quem nos governa? Porque não tentar compreender as razões das acções políticas em vez de, de forma reactiva, as colocar sistematicamente em causa mesmo ignorando os detalhes e contornos específicos que justificam as mesmas?
Só duas notas:
1- Quanto ao já clássico 'antigamente é que era bom' que prepassa amiúde pelas opiniões emitidas neste espaço, refiro outro caso 'incrível' de uma professora de português que testemunhou num daqueles programas matinais tipo 'Praça Pública'. A certa altura, estando-se a discutír o caso 'Freeport', disse a senhora professora: ''E depois há as encobrições'' (sic)!!! A idade desta professora? Cinquenta e sete (57) anos!!! Não vinte e sete, nem sequer trinta sete, mas (pasme-se)a vetusta e mui respeitável idade de cinquenta e sete anos!!! Ou seja, salvo uma situação altamente anómala, esta senhora teve o sumo privilégio e ser ter sido educada na idade de ouro dos saudosos senhores Salazar, Caetano e companhia (idade de ouro essa que a própria senhora professora evocava como modelar em termos de conduda dos seus dirigentes políticos! Pois claro!!).
2- Sou doutorado em Filosofia e por isso acho que tenho alguma legitimidade científica e conhecimento de causa para testemunhar contra o tipo de 'exigência' que tanto faz carpir muitas luminárias deste país (não só neste blog).
Apenas como testemunho: lembro-me de estar uma vez em amena cavaqueira com Donald Davidson (um dos mais importantes filósofos do século passado). A certa altura menciomei o facto de ter estudaddo a Crítica da Razão Pura de Kant no liceu (12º ano). O homem ía tendo uma coisa má!!! E eu não lhe disse que, no mesmo ano, tínhamos estudado a Crítica da Razão Prática e a Crítica da Faculdade de Julgar!!!!! E mais!!!! Também não lhe disse que, para acrescentar a tão parca ementa, também se 'estudava' Descartes, Hegel e Nietzsche!!!!! Tudo no mesmo ano!!! Os arautos da 'exigência' não poderiam imagianar melhor!! Para ser prefeito para Vasco Graça Moura só faltaria a laitura obrigatória da Odisseia em grego clássico como preâmbulo!!
Claro está que na realidade as coisas não eram lá muito côr-de-rosa. A maior parte de nós (eu incluído) não compreendia o significado de 'Transcendental' nem o que era verdadeiramente a 'Revolução Copernicana' operada por Kant na epistemologia e metafísica. No entanto, lá papagueávamos 'muito bem' que 'a dedução transcendental das categorias constituiu o cerne da Crítica da Razão Pura' e outras bizarrias que não compreendíamos e que tinham o condão de nos criar uma profunda aversão por essa disciplina 'abstrusa e inútil' que era, para nós, a Filosofia. São estes os resultados da 'exigência'!
João
Caro João Boaventura:
O grande problema é a desarticulação entre o ensino superior e o impropriamente poder ser chamado de ensino "inferior" (para haver um superior terá que haver um inferior) em que há dois ministérios – o da Educação e o do Ensino Superior – em que cada um deles defende as suas doutrinas e interesses de costas viradas um para o outro com o sacerdote da religião católica o está para o ministro da igreja anglicana, a partir do século XVI.
Como é possível a entrada na Universidade de quem não têm as bases necessárias, sancionadas pela passagem do ensino básico e secundário? Mas, por outro lado, para que são precisas essas bases se a idade do BI (ou do cartão do cidadão) que ateste os 23 anos ou mais de idade escancaram essas portas, empurrando quase à força para se sentarem nos seus bancos?
De que serve roçar os calções no 1.º ciclo do ensino básico e as calças de ganga pelos 2.º e 3.º ciclos do ensinos básico e ensino secundário durante uma dúzia ou mais de anos se as NOVAS OPORTUNIDADES o fazem em meia dúzia de meses?
A sua feliz metáfora de ter a universidade como um hotel de cinco estrelas, leva-me a pensar em hóspedes sentados à mesma mesa: uns com o à vontade de habilitações adquiridas em 12 anos de escolaridade, outros sem se sentirem bem por estudos feitos em tempo meteórico.
A pergunta que faço é tão simples como esta: porque gastar percentagens elevadas do PIB com escolas tradicionais, pagar aos professores, remodelar escolas, quando seria mais fácil criar um Ministérios de Diplomas Académicos (com secretarias de Estado para o Ensino Básico, Ensino Secundário, Ensino Politécnico e Ensino Universitário) que outorgasse esses diplomas a mero pedido do requerente e com uma propina única tanto maior quanto mais graduado fosse esse diploma? Parte desse dinheiro poderia ser aplicado para mandar os actuais professores para a aposentação, independentemente da sua idade.
Aliás, eu se algum dia tivesse a veleidade a candidatar-me a um elevado cargo político que exigisse uma campanha eleitoral defenderia o slogan: Reforme-se aos 18 anos e comece a trabalhar quando for sexagenário. Eleição certa com a legião de jovens que em mim votariam.
Para não ser acusado de plágio, embora sem a agravante de uma transcrição “ipsis verbis”, esta minha ideia nem sequer tem o carimbo da originalidade. Tempos, mais ou menos recentes, houve em que a palavra de ordem era: forme-se hoje e comece a estudar amanhã!
P.S.: A exemplo de certos genéricos de filmes, qualquer semelhança com o nosso ensino é pura coincidência. Será?
Interessante o epiteto de neandertal que leio algures por aqui...tendo em conta que a caixa craniana do dito era até maior que a do homo sapiens...! acaba por ser um elogio, e não uma tentativa de insulto...
Folgo em ver que há coisas que nunca mudam...
O que me entristece nem é o rumo que os debates em torno do tema "educação" têm, pois as coisas devem ser debatidas e rebatidas. O que me entristece, mesmo, é que não é o tema que acaba por estar a ser debatido, mas sim os atributos de cada um... o que está em causa nem é o tema, mas a antipatia que uns têm pelos outros, que os leva a jamais concordarem uns com os outros. Debates destes nunca são objectivos, nem nunca conduzirão a lado nenhum.
Peço desculpa pela intromissão, mas, como disse anteriormente, há coisas que nunca mudam...
Caros defensores do facilitismo, porque não vão trabalhar para uma escola pública como professores durante um ano?
Afinal o que é que o ensino Português tem que ver com o ensino Nórdico? Alguém me sabe explicar?
Ó Rui, azedume?! Eu?! Então eu sou o comentador que está sempre com piadas, sempre na tanga, e agora estou azedo? Não acho nada, mas pronto, já te vou explicar que não é só o meu azedume que não percebes e em que a tua opinião está errada.
Para os comentadores que não sabem LER e que não conseguem encaixar opiniões diferentes, vou repetir que eu sou a favor de um ensino de qualidade, como escrevi no primeiro comentário: "E claro que sou a favor de um ensino de qualidade..."
Outra vez para o Rui. Escusas de me vir cá com essa ironia fraca do eu ter experiência vivida nesses faróis do conhecimento mundial, ou de que precisas de alguém que te ajude num combate desigual em que a experiência parece estar do seu lado sobre o que se passa em terras do Reino Unido separadas do resto da Europa pelo canal da Mancha. Olha, essa ironia é fracota porque se reparares bem eu nunca puxo de galões nenhuns, não venho para aqui falar da minha vida nem nada, só digo o pouco que sei, e se queres saber nunca pus os pés em Oxford ou em Cambridge, sou um ignorante nessas coisas dessas catedrais. Ontem disse que andei a estudar ciências numa universidade mas nem te disse mais nada,nem te disse se acabei ou o que estudei. E só falei nisso por culpa do Graça Moura, senão nem tinha dito nada porque não interessa.
Mas para não vires cá teimar com o Oxford não ser um regabofe, que eu não acredito que seja, apenas disse que as pessoas perdem menos tempo a fazer um curso do que em Portugal, vou meter-te aqui uns números. Fui a google e não encontrei nada de especial, nem uma comparação do UK com Portugal, embora esses dados devam existir. Mas se tu falas sem apresentar números, eu vou apresentar alguns, toma lá uns de Oxford em que eles dizem:
Progression and completion rates for undergraduates courses are excellent, averaging 96% over the last three years ... there has been a zero failure rate on resit.
Ou seja, 96% dos gajos passam e os que não passam e vão à segunda chamada (resit) acabam por passar todos!!! Se calhar passam todos porque aquilo lá para Oxford é um regabofe... Diz-me lá onde é que em Portugal tens uma taxa de sucesso tão alta, quero ver.
O link:
www.qaa.ac.uk/reviews/reports/subjectLevel/q313_00.pdf
Olha, quando falaste do sucesso da matemática na China e na Índia, deu-me o riso, desculpa lá. Eu não sei nada da educação nesses países mas há coisas que toda a gente sabe, é que eles são pobres e ainda estão a desenvolver-se, e tu já viste a pobreza que vai na ìndia, pelo menos na tv, devias pensar sobre isso. Sabes, tu não estás a falar com um qualquer catedrático de Coimbra, daqueles que parece que andam a leste do que se passa no mundo, estás a falar comigo, e eu não como qualquer coisa que me ponham no prato. Por isso fui ver umas coisas e vou-te pôr aqui algumas:
Despite growing investment in education, 35% of the population is illiterate and only 15% of the students reach high school.
link: http://en.wikipedia.org/wiki/Education_in_India
Ou seja, na Índia há muitos pobres que não estudam. Eu bem me parecia...
O que tu queres é comparar os estudantes da elite indiana com os nosso estudantes médios. Olha, porque não comparas a nossa elite com a elite indiana? Se calhar aí não encontrarias grandes diferenças, ou até nós sejamos melhores!
luis
Sobre a China. Já sabes que eu não sou universitário nem que vivo apenas no mundo dos livros, sou um gajo que gosta de conhecer coisas e falar com todas as pessoas. E quando falei com chineses eles disseram-me que na China há muitas pessoas que não sabem ler ou escrever porque... paga-se para ir à escola. Poisé!
Para confirmar:
The central government still promises a free education for every child for nine years but it provides little money for education. Most funding comes from local government. In poor rural districts in particular schools need to charge fees or come up with money other way to pay for school expenses. Fees vary from district to district. The education system in many rural areas has virtually collapsed.
E
Since 2000 illiteracy rates have risen. Between 2000 and 2005 the number illiterate Chinese increased 33 percent from 87 million to 116 million, wiping out progress that had been made over the previous decades. China accounts for roughly 12 percent of the world’s illiterate population. The increase in illiteracy was blamed on increasing numbers or rural poor dropping out of school to find work in the cities and the high cost of rural education.
Aqui: http://factsanddetails.com/china.php?itemid=339&catid=13&subcatid=82
Se calhar, e da maneira como os chineses são trafulhas, o que também conta para a história, o que me estás a falar é que os chineses das classes altas e médias são melhores do que os nossos estudantes médios. Obrigado!
Só para acabar o comentário, que isto já vai longo: devias reparar que aqueles que se distinguiram tanto nas ciências como nas letras são de ciências, nunca de letras. Sabes, é que para um gajo de ciências escrever bem é muito mais fácil do que um de letras saber de ciências. Ora experimenta apertar com o Graça Moura com perguntas das matemáticas e vais ver como me dás razão. Nem penses que o Saramago se quisesse poderia de repente fazer trabalho de ciência, não lhe adianta nada ser um génio das letras. Nós os de ciências é que temos que vos aturar com essas coisas do português e vamos escrevendo melhor ou pior do que vós, ás vezes melhor.
Obrigado pelo convite a comentar e não leves a mal o que disse nem o tratar-te por tu. Espero que também me trates por tu, já sabes que eu sou pouco dado a pompas e a puxar pelos galões, além de que nem gosto que me tratem por você.
Até à próxima.
luis
Anónimo (1 de Agosto; 18:45):
É natural que estas discussões sobre o ensino de antigamente e o actual ensino sofram de influência política facilmente detectável no seu comentário. Faço prova: (…) “idade de ouro dos saudosos senhores Salazar, Caetano…” Depois, em política das coisas que verifico é a atribuição, apenas, do tratamento “respeitoso” por senhor aos professores catedráticos do Estado Novo.
Mas vamos à discussão propriamente dita, em que me foi apresentado o exemplo de uma professora do antigamente que falou em “encobrições” [referindo-se ao caso Freeport] num programa televisivo. Ocorrência que eu poderia tomar por um “lapsus língua” com a mesma boa vontade com que detectei, e tive como “lapsus calamis”, no seu comentário a ortografia de palavras com, por exemplo, “conduda”, “discutír”, “ía” (ambas grafadas com acento grave), “gisada”. Embora não seja meu costume deter-me na discussão sobre o sexo dos anjos com os turcos à porta de Constantinopla, esta uma possível prova de que no melhor pano caem as nódoas.
Façamos um pequeno balanço com o que se passa na actualidade. Como apresentou um único exemplo da deficiente formação em Português, da professora acima referida, eu satisfaço-me, igualmente, com um único exemplo da actualidade. Entrevistado pelo “Jornal Nacional da TVI” (29/01/2003), um aluno da Faculdade Letras, interrogado sobre o autor de “Os Maias” atribuiu a sua autoria a Egas Moniz. Pelo menos deixou a alternativa: Egas Moniz, fidalgo do século XII, exemplo de honradez à palavra dada, ou Egas Moniz, Prémio Nobel, em 1949?
Mas deixemos para lá estas discussões valorativas do sistema educativo pós-25 e de Abril e desvalorizantes do anterior a esta data, ou vice-versa. Passemos, portanto, ao ensino da Filosofia tão maltratado nos programas actuais do ensino secundário, passando-se de uma exigência descabida, como diz, com a legitimidade de um doutoramento nesta matéria, a um facilitismo que a atira para o limbo das matérias escolares secundarizadas.
Aliás esta questão nem sequer é nova! Segundo Georges Gusdorf, “na primavera de 64, assistiu-se ao facto de os decanos da Faculdade de Medicina e da Faculdade de Ciências da Universidade de Paris, proclamaram que a Medina é doravante uma ciência; ninguém poderá pretender ser iniciado se não for geómetra, se não possuir noções de base como as de função, logaritmo, derivadas. A formação médica pressupõe uma escolaridade secundária que passa pelas classes terminais de ciências e de matemática nos liceus” (“Da História das Ciências à História do Pensamento”, Editores Livreiros, Ldª., Lisboa 1998, p.9).
(CONTINUA)
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E mais adiante, “os distintos decanos preveniam os interessados e as famílias contra a deplorável perda de tempo e de inteligência que representaria um estágio na classe de Filosofia. Um jornalista foi então perguntar a estudantes de Medicina, escolhidos ao acaso, o que pensavam desta declaração. Reponderam-lhe que lhes parecia, pelo menos, impensada. O conhecimento dos logaritmos é talvez útil ao médico, mas o conhecimento do homem e da condição humana é primordial: é deplorável que não entre em linha de conta na aprendizagem médica. Os estudantes tinham cem vezes razão em denunciar esta forma particularmente nociva de obscurantismo contemporâneo que existe entre os potentados universitários como no homem da rua” (“id,” “ibid”).
Quanto na mim, este descabido e insolente ataque à matriz de todas as ciências é tanto mais insólito quando nomes grados da Ciência se distinguirem no frutuoso deambular pelos caminhos de um Conhecimento sem fronteiras. Três exemplos, apenas: Max Plank, Prémio Nobel da Física (1918), preocupado com a relação entre Ciência e Religião; Ernest Krestchemer, médico psiquiatra alemão, “doutor honoris causa” em Filosofia pelas Universidades de Wurzburgo e Católica do Chile; e Bertrand Russel, matemático e sociólogo britânico, Prémio Nobel da Literatura (!950). E isto já para não falar de Albert Einstein, presença obrigatória em manuais de Filosofia!
Sem uma perspectiva maniqueísta que tolda a liberdade de pensamento, no que tange ao estabelecimento das virtudes dos actuais programas de Filosofia e os defeitos dos de antigamente, ou vice-versa, remeto-me, em minha declarada ignorância, ao silêncio, embora isso não me impeça de declarar que no meu antigo sétimo ano liceal de Ciências foi essa a disciplina da minha predilecção.
A partir de agora, para os entendidos na matéria, não enfeudados à elaboração dos actuais programas de Filosofia, será posta nas mãos uma discussão específica e bem melindrosa. Será uma discussão em que terei muito a aprender, sendo uma perda ela não continuar a ser feita pelos benefícios por si trazidos à Cultura e a um amador (aquele que ama) de uma disciplina que se perde nos milénios da civilização. Valeu?
Vani
Não desespere.
Isso que diz, é um país à procura de si mesmo, e os seus habitantes sentem o contágio... procuram-se a si mesmos.
E tem de viver com isso.
Cordialmente
Meu Caro Luís:
Cá estou eu a responder-te aos dois amáveis convites que me fazes: o primeiro a tutear-te; o segundo a responder ao teu comentário com o prazer que isso me dá. Não declarar o meu gosto pela controvérsia de opiniões, seria assumir o papel de gato escondido com o rabo de fora.
Não prometo responder a todas as questões por ti levantadas. Não por temer em responder-lhes (que eu não sou homem de fugir a uma boa discussão), apenas pela prolixidade de que se revestem e pelo grande número que lhes está afecta. Mas vou tentar, sem a preocupação de disciplinar as minhas respostas a uma ordenação exaustiva.
Mas antes do mais, gostaria que me fizesses a justiça de reconhecer de nunca me ter servido dos teus erros de ortografia ou de construção frásica como arma de remesso. Eu se tivesse que escrever esta resposta na língua de Shakespeare cometeria bem maior número de erros e bem mais graves, embora seja um lugar-comum dizer-se que o português é uma das línguas que mais dificuldades oferece.
Desculpa ter julgado antever um certo azedume no teu comentário inicial. Toda a moeda tem verso e anverso, julgo que foi essa a minha falta ao confundi-los. Para já somos ambos a favor de “um ensino de qualidade”, tu o escreveste, eu o escrevi com insistência. Nunca me passou pela cabeça, o juro, dizer que tinhas um conhecimento (profundo ou não) sobre o ensino nas universidades inglesas. Pensei-o, apenas. Eu é que disse desconhecer o que por lá se passa. Endossas-me para links sobre o ensino da Psicologia em Oxford, atirando-me com uma percentagem de 96% de aprovações que seria um valor de me deixar "mudo e quedo que nem penedo" não soubesse eu que o exame de aptidão a essa universidade é de uma grande exigência garantindo à partida uma base sólida sobre a qual se apoiam os conhecimentos futuros dos seus candidatos.
E por cá, caríssimo Luís? Acabou-se com o exame de admissão entrando os alunos nas faculdades mediante apenas a obediência ao “numero clausus”, cada vez mais alargado e sem sentido, quer para os alunos que venham bem ou mal preparados do 12.ºano do ensino secundário em que a exigência varia de escola para escola, sendo as respectivas notas inflacionadas ou deflacionadas sem critério justo, e muito menos mensurável. As faculdades oficiais para beneficiarem de apoios estatais deixam entrar todo o bicho careta quando mesmo os não empurram para dentro dos seus claustros.
Sobre certas universidades particulares, de vão de escada e de papel e lápis, nem é bom falar. Alguns casos recentes de seu fecho compulsivo o atestam. E o que dizer das Novas Oportunidades e das Provas de Acesso para maiores de 23 anos (que veio substituir o sério exame “ad hoc” em que o aluno era avaliado a nível nacional, sendo sujeitos todos os examinando às mesmas provas) em que cada faculdade faz provas de entrada moldadas às sua necessidades económicas?
(Continua)
(Continuação)
No que tange ao ensino na Índia, segundo me disseram anos atrás, os alunos são iniciados na aritmética com uma grande exigência. Quanto às elites indianas são educadas em universidades de grande exigência que lhes permite lançar para o mercado diplomados capazes de transformar esta antiga colónia inglesa numa potência industrial.
Quanto à China, vive ainda os reflexos de uma Revolução Cultural que atirou para os campos ex-professores feitos camponeses que ensinavam “às escondidas” as crianças . Agora, que a China se abriu ao ocidente com os avanços que essa abertura lhe trouxe e com a necessidade de se desenvolver, cada vez mais, sob o ponto de vista científico é natural que se dê um “boom” no seu sistema educativo, não só sob o ponto de vista de qualidade como de massificação devidamente controlada.
Vai longe o tempo em que a China só exportava cópias grosseiras de bugigangas à venda nas lojas chinesas de bairro. Uma coisa é certa: o cuidado posto no ensino da matemática. Mas eu não sou um sinologista.
E cá estou eu, novamente, a pedir a quem domine estes problemas que transcendem os meus conhecimentos do que se passa além-fronteiras portuguesas que me ajude a ampliar os meus conhecimentos sobre o que se passa na Inglaterra, na Índia e no país tido décadas atrás como um tigre de papel e que hoje mostra umas garras bem afiadas para ser uma potência económica e militar de uma pujança muito invejável.
Aliás, esta a grande vantagem dos comentários que eu não me canso de enaltecer. Se dúvidas houver, basta consultar outros posts meus em que digo isto mesmo, para não correr o risco de ser tomado por um qualquer S. Tomás: “Faz o que ele diz, não faças o que ele faz”
Cumprimentos cordiais.
Acabo de ver a entrevista da Senhora Ministra da Educação na SIC. Apenas dois comentários:
1. Se as palavras são de prata o silêncio é de ouro, é esta sabedoria popular que ela não quis seguir ou soube compreender.
2. Como julgo ter dificuldade em compreender o final do meu post que eu repito, transcrevendo-o: "o sentido das reformas educativas portuguesas destas últimas décadas é não terem sentido nenhum. Ou, se o têm, é prosseguirem, com redobrada energia, no sentido errado!" Como diz outro provérbio, "o pior cego é aquele que não quer ver!"
Caro Ilídio Barros:
Bem posta a questão.
Quanto a mim (outras opiniões, porventura, haverá), para que o ensino Português tivesse a ver com o ensino nórdico seria necessário, pelo menos, que esta medida de igualdade não fosse tomada de forma unilateral.
Ou seja, seria condição "sine qua non" que essa igualdade tivesse correspondência com o mesmo nível de vida, por exemplo. Exigir os mesmos deveres a quem passa necessidades de sobrevivência, como sejam, carências alimentares e de habitação, é, no mínimo, pôr a correr na mesma pista um carro da fórmula 1 com um pequeno automóvel de pequena cilindrada e exigir de ambos a mesma "performance".
Tudo o resto, são cantigas de embalar que obrigam as pessoas a retractarem-se, a maior parte das vezes, com desculpas de mau pagador, dizendo que não era aquilo que queriam dizer (ou escreveram mesmo, se tiver sido esse o caso) mas disseram, metendo os pés pelas mão e as mãos pelos pés como uma criança que é apanhada a mentir pelo facto de ter uma imaginação fértil (uma desculpa como qualquer outra)!
Portugal não pode continuar a viver de utopias. A governação não pode ser uma forma que desobrigue os governantes de pensar, com os pés assentes no terreno que pisam, antes de agir ou dizerem, apenas, que vão agir!
O fim das retenções segundo Marcelo Rebelo de Sousa aqui.
Aí está a diferença entre escolas finlandesas e escolas portuguesas, e em como Deus foi generoso para as cabeças nórdicas e padrasto para as cabecinhas portuguesas.
Oh Eça, quando é que se cumpre o teu vaticínio de que Portugal e Grécia vão desaparecer ?
Caro Rui
Em primeiríssimo lugar, deixe-me que lhe diga, desde já e frontalmente, que muito sinceramente dispenso o seu cinismo disfarçado de bonomia (estou a pensar nas suas simpáticas e paternalistas correcções ortográficas ao meu comentário). Mas deixemos este pormenor.
Não caro Rui, a elocução de ‘encobrições’ por parte da senhora professora não se tratou de um mero lapsus linguae. Como sabe, a abordagem caritativa deve ser mobilizada até que adicionais informações colaterais nos obriguem a suspende-la. Como vi o programa, posso partilhar consigo o facto de a senhora não só não conseguir articular e expressar minimamente uma ideia, como também vilipendiar a gramática portuguesa – com vários ‘prontos’ a abrilhantar a sua verve - de uma forma que faria corar Cristiano Ronaldo (de ressaca!!)
Mas se julga que eu apenas tenho um trunfo na manga para levar a jogo engana-se. Em primeiro lugar, o meu alvo é apenas a actual mitificação do passado recente (o ‘pré-25 de Abril’) que parece servir de ucronia suporte a muitos ditames que por aí pululam oriundos da boca e da pena de muito boa gente.
Deixe-me partilhar a seguinte confidência: os piores docentes que tive em toda a minha formação educativa foram professores universitários formados e promovidos academicamente nos ‘bons velhos tempos’. Uma dessas pessoas cedeu aos estudantes um artigo de sua autoria onde, a certa altura, se podia ler “ouro, brasileiro”. Sim, sujeito e predicado intercalados por uma vírgula!! E, caro Rui, isto não acontecia uma nem duas vezes mas amiúde, inviabilizando assim a possibilidade de eventual lapsus calami (que tão generosamente imputou aos meus erros ortográficos). E a coisa não ficava por aqui (e nem estou a mencionar as barbaridades de conteúdo!), posso-lhe assegurar que o respectivo documento submetia a língua portuguesa a verdadeiros tratos de polé. Os erros básicos de construção eram tantos que tornavam a sua eventual contabilidade num verdadeiro trabalho de Hércules! Só tenho pena de não ter preservado tamanha preciosidade!! Quanto ao seu digníssimo autor, esse assumiu vários cargos de grande responsabilidade na gestão de uma reputada universidade pública tendo chegado a assumir o posto de vice-reitor da mesma!!!
(Continua)
(Continuação)
Mas a minha verdadeira preocupação é a falta de honestidade intelectual e a demagogia que sustenta muitos dos discursos irados contra os ‘facilitismos’ actuais e coisas quejandas.
Notemos a sua resposta ao meu comentário como exemplo. Identifico dois erros crassos na sua estrutura argumentativa: uma falácia e uma óbvia inconsistência lógica (esta última acarretando mais grave consequências como terei ocasião de lhe demonstrar). Comecemos pois pela falácia. Ainda a questão da mobilização do princípio caritativo na interpretação que mobilizou com a professora mas já não o fez relativamente ao caso do estudante que afirmou ter sido Egas Moniz o autor dos Maias (teria sido um ‘mental slip’ causado pela personagem de João da Ega? Não sei). Um princípio ou uma regra, como sabe, deve ter uma aplicação ‘cega’: se foi caritativo para com a professora tinha obrigação de o ser também para com o estudante. Não o fazer é cometer uma falácia argumentativa grosseira (a não ser que demonstre porque é que, para si, a professora é passível de ser objecto desse princípio mas não o estudante).
Sigamos agora para a inconsistência lógica. Faço notar: afirma, em primeiro lugar, a respeito do ensino da filosofia que este está hoje remetido, e cito: “a um facilitismo que a atira para o limbo das matérias escolares secundarizadas.”. Muito bem. Só que, pouco depois, remata afirmando: “Sem uma perspectiva maniqueísta que tolda a liberdade de pensamento, no que tange ao estabelecimento das virtudes dos actuais programas de Filosofia e os defeitos dos de antigamente, ou vice-versa, remeto-me, em minha declarada ignorância, ao silêncio”!! Em que ficamos?! Ou bem que tem fundamentos científicos e académicos que o legitimem a ajuizar acerca da qualidade pedagógica de um programa de Filosofia ou bem que não os possui. É que, sabe caro Rui, é precisamente essa atitude de atirar a matar mesmo quando não se consegue descortinar o alvo que traz maus resultados!! Um pouco de honestidade intelectual não fica mal a ninguém. O Rui não a teve no primeiro momento atrás citado mas acabou por emendar a mão no segundo. Suspeito (e é uma mera suspeita) que, não fosse saber de antemão estar a responder a um profissional académico da matéria, e esse acto de contrição ficaria na gaveta.
Sem querer, a sua incoerência acaba por ilustrar aquilo que está subjacente a muitos dos testemunhos contra o suposto facilitismo que por aí grassa: ignorância e desonestidade intelectual. A expressão ‘facilitismo’ ou a sua contraparte menos ‘académica’ de ‘não sabem nada! São todos uma cambada’ são como aquela pasta dentífrica: estão na boca de toda a gente; verdadeiros mantras! Quando isto acontece é o pensamento crítico que fica a perder: para quê pensar a sério nas questões quando temos aqui uma opinião ‘ready made’ à disposição que explica tudo e nos desresponsabiliza? É por estas e por outras que eu caracterizo esta postura como sendo, ela própria, ‘facilitista’. Tremenda ironia!
Por fim um conselho: as falácias e as incoerências não deixam de existir se emolduradas por um discurso rebuscado, floreado, polvilhado com bastas referências bibliográficas e uma profusão de expressões latinas. O Rui diz-se frequentemente, muito preocupado e interessado na argumentação de ideias. Acho um bom princípio, mas deve tentar ser mais consentâneo com ele e começar desde já a distinguir claramente ‘argumentação’ de ‘retórica’.
João
Rui, eu sei que não falaste dos meus erros de português e também não falei nisso, só estava a comentar aquilo que me pareceu ironia. Não te levo nada do que disseste a mal, nem penses. Eu escrevo sempre coisas que são muito a brincar, não é para levar muito a sério.
Sobre o resto também não vou discutir muito.
Mas acho que mesmo que Oxford tenha um exame de entrada muito rigoroso é incrível que todos os alunos passem. Mas se fores ver números para outras universidades vais ver que as taxas de sucesso são muito altas.
Repara que eu não acho que não possa haver ensino de qualidade mas em que os alunos passem de ano mais facilmente, não sei porque não pode ser assim.
Vou-te dizer uma coisa evidente: pode-se fazer um exame super-difícil, por exemplo de matemática, apenas com contas básicas. Estás a ver aqueles puzzles que vêm nos jornais, que são possíveis de resolver com contas simples mas que partem a cabeça às pessoas que tentam encontrar a solução? Eu acho que muitas vezes é isso que acontece nas universidades portuguesas, não tem a ver com o nível de conhecimentos que se ensinam, tem a ver com a dificuldade com que se pode fazer um exame. E muitas vezes, como dizem os alunos, os professores fazem exames muito difíceis porque são sádicos ou gostam de mostrar que são muito exigentes, não tem nada a ver com a qualidade do conhecimento que transmitem.
Por isso, não é fácil dizer quando se está a facilitar e a ensinar pouco e mal, ou quando se está a ensinar pouco e mal mas a exigir um grau tão grande de dificuldade que até parece que quem passa naqueles exames numa faculdade portuguesa deverá saber mais do que aqueles alunos todos que não têm nenhuma dificuldade em passar nos exames de Oxford. Mas será assim? Eu não acredito!
Também não vou falar mais sobre Chinas e Índias, já te disse que o que parece é que os números deles são números em que só entram as pessoas das elites, ou classes médias. Se na Índia só 15% das pessoas vão para as high schools... está tudo dito.
O que eu quis dizer é que devias ter escolhido para exemplo a Finlândia ou o Japão, porque isso de me dizer que a matemática na Índia é um sucesso é uma coisa que a mim não me diz nada. E deves saber que os chineses não são de confiança, por exemplo, eu li a notícia que lá os professores são avaliados pelo número de papers publicados e não pela sua qualidade, e por isso tentam-se todas as trafulhices para publicar o maior número de papers nas revistas mais manhosas e em que as coisas nem são devidamente verificadas.
Pronto, fico por aqui que eu também não sei muito destas coisas, só faço os meus reparos quando acho que posso dizer algo, as pessoas que trabalham em educação é que te poderão ajudar mais, eu só mando o meu bitaite quando acho que posso.
Até à próxima.
luis
Causa-me alguma "espécie" a "fustigação" dos professores formados nas ESE's, obviamente sou fruto de uma delas. Não que não reconheça alguma falta de qualidade de alguns professores que lá leccionavam e leccionam, mas em boa verdade lembro-me facilmente de um mestrado pela Faculdade de Motricidade Humana de Lisboa e dois douturados pela FCDEF-Porto que valha-nos um qualquer santo, ou todos, para quem tiver a sorte de ser crente. Também claramente me recordo de outros,especialmente um ainda mestrando do FMH e hoje doutorado na mesma faculdade que claramente marcou-me e marcou grande parte dos alunos com quem contactou, quer pelo discurso clarividente e objectivo, quer pelos conhecimentos técnico-científicos que muitos de nós ainda não tinhamos a competência de vislumbrar o seu alcance. O mesmo acontece nas diferentes universidades, pois só assim se justifica que não saibam quem escreveu a Aparição, ou leiam resumos de obras que claramente não são abordadas no 2º ciclo.
Quanto aos êxitos da Matemática na Índia, China e especialmente Singapura, em muito se deve a factores culturais e a uma preparação dos professores quanto à Matemática Elementar, algo que as universidades ocidentais parecem já ter esquecido há muito, como relata a autora chinesa, que não me consigo recordar do nome, ao comparar a formação de professores na China e nos EUA.
Para terminar, eu também acho que a retenção/chumbo/repetição não é uma solução para alunos com um desempenho abaixo do esperado, mas temo que mais que professores, alunos e famílias seja mesmo o ministério que não esteja preparado para essa mudança e aceitar que os alunos que não atinjam as metas traçadas necessitem de mais recursos que podem passar por mais aulas, logo mais professores, logo mais dinheiri gasto nas escolas e consequentemente mais défice. Senão vejamos só o exemplo da carga horária dos alunos do 1º ciclo com 6h a Matemática e 6h:30m a Língua Portuguesa, isto repartido por uma semana em que todos os dias as duas disciplinas são leccionadas. Agora vejamos os alunos do 2º ciclo com 4h por semana a Matemática e outras 4h a Língua Portuguesa em que por absurdo até podem estar distribuídas somente por dois dias. Sem comentários. E já que abordei o 1º ciclo, sem querer ser saudosista, que bem que nos fazia, à imagem dos médicos, podermos contar com as professoras primárias já reformadas para darem apoios nas salas de aula e mesmo formação/orientação aos professores mais novos, e só tinham sete anos de escola e o magistério, Como os chinenses salvo erro.
Roberto Lopes
Caro João:
Permita-me que tente fazer um apanhado dos tópicos essenciais do seu comentário, embora sujeito à subjectividade de tudo quanto é pessoal.
Começo o João por argumentar sobre a má qualidade do ensino de antigamente com o exemplo da “encobrição”. Em contraponto, apresentei-lhe não ser essa uma característica apenas desse tempo com o exemplo do aluno de Letras (de Letras, repito) que atribuiu a “paternidade” de “Os Maias” a Egas Moniz. Logo o João acorre em seu auxílio, questionando: “Teria sido um ‘mental slip’ causado pela personagem de João da Ega? Não sei.” Ou seja, para duas situações semelhantes utiliza o João dois pesos e duas medidas diferente.
Aqui me ocorre, como não podia deixar de ser, um conceito de António Vieira sobre a necessidade da imparcialidade que deve presidir aos nossos juízos, quando escreveu: “Quando se olha com simpatia para o rato preto até o rato preto nos parece branco; quando se olha com antipatia para o cisne branco até o cisne branco nos parece preto”. Em ambos os casos de uma ignorância declarada - a da professora e a do aluno – o seu erro pode ter residido em pretender a alvura do cisne para um caso e a negrura do rato para o outro. Ou vice-versa.
Quanto a professores universitários ignorantes, que separam o sujeito do predicado com uma vírgula e que ascendem à cátedra, é pretender demonstrar que aberrações dessas só se passavam antes de 25 de Abril. Trata-se de uma “falácia argumentativa grosseira”, para utilizar palavras suas, que só o deixaria de ser se se desse ocaso de depois de 25/Abril os professores universitários terem a sabedoria de Aristóteles ou conhecimento científico de Einstein. Antes e depois de 25 de Abril, neste particular, más fadas há.
Mas detenhamo-nos sobre o facilitismo do ensino não superior actual (de que excluo, como sempre, o ensino secundário por último baluarte de resistência). Ao entrar em discussões deste teor de que ambos sejamos intérpretes, corremos o risco de nos tornarmos juízes em causa própria. Procuremos, portanto, o testemunho de um antigo e alto dirigente do Partido Socialista. Escreveu ele: “De repente, perante a obstinação dos que teimaram em não acreditar na realidade, o Portugal novo-rico tornou-se no Portugal novo-pobre. Pobre, porque pobre na qualificação das pessoas, Aí estão a comprová-lo os números terríveis do Estudo Nacional de Literacia, recentemente publicados”. Sabe quem o escreveu? António Guterres, 1.º ministro dos XII e XIV Governos Constitucionais.
(Continua)
(Continuação)
Quanto “à minha inconsistência lógica” (como se eu fosse prosélito da “lógica da batata”, como se dizia na gíria académica do meu tempo), como a retrata sem “bonomia”, por eu me ter referido, como transcreve, “a um facilitismo que a atira [à Filosofia]para o limbo das matérias escolares secundarizadas”, há aqui uma mau interpretação por se servir desta frase enquadrando-a na minha confessa ignorância sobre “as virtudes dos actuais programas de Filosofia e os defeitos dos de antigamente”.
Querer fazer crer estar eu a referir-me a uma e mesma coisa é como querer emoldurar um fotografia oval numa moldura quadrada. E explico porquê: o facilitismo que secundariza a Filosofia, referia-se ao facto de ter deixado de haver exames finais de uma disciplina de enorme importância, quer para quem segue estudos científicos quer humanísticos, pelo seu papel de explicação racional das coisas. Quanto aos programas de Filosofia seria estultícia da minha parte estabelecer juízos críticos por entender e defender o aforisma: “Cada macaco no seu galho!”
Finalmente, escreve: “Suspeito que, não fosse saber de antemão estar a responder a um profissional académico da matéria, e esse acto de contrição ficaria na gaveta.” Suspeita o João, mas suspeita mal por a sua suspeita não ter pernas para andar. Sabe porquê? Eu digo-lhe, servindo-me da minha admiração por Eça, e a leitura constante da sua obra (daí, quiçá, o meu desconforto pelo desconhecimento do autor de “Os Maias”), para abrir de par em par a gaveta de que fala transcrevendo a opinião queirosiana sobre aqueles que se julgam resguardados por “um profissionalismo académico”, para mais suportado por um doutoramento. Escreveu ele: “Tomando isto a sério por enquanto, pedirei à crítica veneranda que me não haja por desonesta pedanteria a determinação de sair a terreiro em tão notável conjuntura”.
Meu Caro Roberto:
Se reparar eu não fustigo sadicamente a formação dada nas escolas superiores de educação. Unicamente reprovo a equiparação, como escrevi no meu post e reproduzo aqui, “para a docência da Matemática do 2.º ciclo do básico, de professores licenciados por universidades, unicamente para o ensino desta disciplina, com professores saídos das escolas superiores de educação para a docência simultânea da Matemática e Ciências da Natureza”.
Julgo que aqui não pode haver qualquer dúvida sobre o erro de partir do princípio que a qualidade do ensino está na razão inversa da preparaçãoacadémica dos respectivos professores.
Quanto à qualidade dos professores do ensino universitário e politécnico, em ambos os casos há bons e maus professores. O que não invalida o reconhecer-se que um mestrado obtido, em 6 meses, em Boston para a docência no ensino politécnico, não pode ser comparada, de forma alguma, com um mestrado oficial universitário nacional. Por outro lado, a carreira docente universitária sujeita o alcance da “cátedra” a dificuldades incomparáveis mais exigentes do que para o cargo de professor-coordenador do ensino politécnico.
Caro Luís:
Obrigado pelo teu comentário, e até ao próximo.
Errata: 5.ª linha, 1.º §, substituir "mau" por má.
Caro Rui
Quando diz: "O que não invalida o reconhecer-se que um mestrado obtido, em 6 meses, em Boston para a docência no ensino politécnico, não pode ser comparada, de forma alguma, com um mestrado oficial universitário nacional."
Vem logo à memória o caso passado em 1960, na Escola do Magistério Primário de Lisboa, de uma macaense, acabada de concluir o 5.º ano, em Macau, que quis tirar o curso de professora do ensino primário.
O português da aluna era tão mau que no final do curso, o então director, o Dr. Dordonat, não sabia se passá-la, se chumbá-la, até que teve uma saída:
- Se o português do 5.º ano tirado em Macau, é suficiente para lá, quem sou eu para duvidar.
E passou com o diploma na mão.
Da mesma forma, o diploma de 6 meses em Boston, deverá enfermar do mesmo mal. O director da escola concluir:
- Se a sabedoria desta gente que vem aqui tirar o curso é suficiente em Portugal, quem sou eu para duvidar.
Um abraço
Caro João (do comentário de 3 de Agosto:16:27):
Ou seja, "albarde-se o burro à vontade do dono", como aconselha o anexim. Mas será que o burro fica bem albardado?
A Universidade de Boston, a exemplo do ex-director da antiga Escola do Magistério Primário de Lisboa, ouvido o respectivo Senado (uma suposição minha, apenas) terá sido aconselhado: "Se Portugal acha que este género de mestrados chega para se ser professor adjunto das escolas superiores de educação portuguesas quem somos nós, considerando-nos mais papistas que o Papa, para dizer que não?
Outro abraço.
Rui Batista:
Se calhar alguém acrescentou: "tanto mais que o negócio é rendoso para nós pois pagam proprinas"
Caro Anónimo (3 de Agosto, 19:13):
O dilema é sempre o mesmo: Veneração à deusa Minerva ou submissão ao rei Midas?
Com a crise económica que assola a Europa não me parece atrevimento deduzir que cada vez mais a Universidade se vê obrigada a submeter-se ao dinheiro. Nos versos de João de Deus(1830-1896):
“Que a gente faz em rapaz,
São milhares aos enxames
O que aquele demo faz!
Sem saber nem patavina
de gramática latina,
Quer-se um rapaz d'ali fora?
Vai ele com tais falinhas,
Tais gaifonas ,tais coisinhas....
Tlim!
Ora…”
Caro Rui
Independentemente do que possa responder a este meu comentário esta será a minha última intervenção neste debate. Por uma razão: já não se trata de debate de ideias (alguma vez o foi?). Não hesito, ademais, em identificar o próprio Rui como principal responsável por inviabilizar essa discussão. Onde se impõem reflexão o Rui reage como se tivesse plavloviamente condicionado, reduz tudo a dicotomias, lê obliquamente os comentários que o convidam a sair do quarto de espelhos intelectual em que confortavelmente habita e a única forma de argumento que parece respeitar é o da autoridade (como o atestam as infindáveis referências eruditas que mobiliza para justificar cada vírgula que escreve). Permita-me que o demonstre com a análise de duas passagens da sua última resposta ao meu comentário (e poderiam ser muitas mais).
1º- Afirma o Rui (e perdoe-me a transcrição longa): «Começo o João por argumentar sobre a má qualidade do ensino de antigamente com o exemplo da “encobrição”. Em contraponto, apresentei-lhe não ser essa uma característica apenas desse tempo com o exemplo do aluno de Letras (de Letras, repito) que atribuiu a “paternidade” de “Os Maias” a Egas Moniz. Logo o João acorre em seu auxílio, questionando: “Teria sido um ‘mental slip’ causado pela personagem de João da Ega? Não sei.” Ou seja, para duas situações semelhantes utiliza o João dois pesos e duas medidas diferente.» (fim de citação).
Aqui o Rui está como que a utilizar um escudo espelhado para devolver os reparos à procedência. Note o seguinte: mencionei o episódio da professora num primeiro momento, o Rui respondeu-me (em 1 de Agosto 222: 56) contrapondo que se poderia tratar de um lapsus lingae e, na mesma resposta, mencionou o caso do estudante. Eu, em resposta às suas observações fiz duas coisas: enquadrei o caso da professora no seu contexto, diminuindo muito a hipótese do lapsus linguae, e fiz notar que o Rui (num primeiro momento, ainda sem essa informação de suporte) não era justo na aplicação do ‘princípio da caridade’ – e agora cito-me a mim próprio: « Ainda a questão da mobilização do princípio caritativo na interpretação que mobilizou com a professora mas já não o fez relativamente ao caso do estudante que afirmou ter sido Egas Moniz o autor dos Maias (teria sido um ‘mental slip’ causado pela personagem de João da Ega? Não sei). Um princípio ou uma regra, como sabe, deve ter uma aplicação ‘cega’: se foi caritativo para com a professora tinha obrigação de o ser também para com o estudante. Não o fazer é cometer uma falácia argumentativa grosseira (a não ser que demonstre porque é que, para si, a professora é passível de ser objecto desse princípio mas não o estudante).» (fim de citação). Mas o Rui, faz tábua rasa das informações que lhe forneci (o contexto em que a professora proferiu ‘ecobrições’) , não respondeu ao meu desafio e, num ‘twist’ retórico digno de um Harry Houdini da argumentação, acusa-me do pecadilho que eu próprio lhe tinha detectado no seu raciocínio!!! Eu não utilizei dois pesos e duas medida pela simples razão de que – contrariamente ao Rui! - não estava a comparar situações passíveis de serem comparadas (no caso da Professora eu detinha informação colateral significativa para ajuizar em seu desfavor, algo que está omisso no caso do estudante. Já no caso do Rui as duas situações estavam no mesmo plano e, por essa razão, utilizou – como eu já tinha chamado à atenção num primeiro momento – dois pesos e duas medidas)
(continua)
(continuação)
2º- Num segundo momento afirma o Rui (e cito de novo): «Quanto a professores universitários ignorantes, que separam o sujeito do predicado com uma vírgula e que ascendem à cátedra, é pretender demonstrar que aberrações dessas só se passavam antes de 25 de Abril. Trata-se de uma “falácia argumentativa grosseira”, para utilizar palavras suas, que só o deixaria de ser se se desse ocaso de depois de 25/Abril os professores universitários terem a sabedoria de Aristóteles ou conhecimento científico de Einstein. Antes e depois de 25 de Abril, neste particular, más fadas há.». O que eu lhe gostaria de perguntar (não de forma retórica) é o seguinte: onde, em todas as minhas intervenções, digo eu que o ensino de antes do 25 de Abril era mau, e/ou que «aberrações dessas» só se passavam nessa altura? Eu recordo-lhe o que de facto afirmei no parágrafo que imediatamente precede o exemplo que motivou a sua acusação: «Em primeiro lugar, o meu alvo é apenas a actual mitificação do passado recente (o ‘pré-25 de Abril’) que parece servir de ucronia suporte a muitos ditames que por aí pululam oriundos da boca e da pena de muito boa gente.» (fim de citação). Pena não ter tido mais atenção. Note que, mesmo que eu não tivesse explicitado devidamente qual o meu móbil, seria sempre abusivo da sua parte presumir que a intenção (impícita neste caso) nas minhas palavras consistiria em demonstrar que antes do 25 de Abril era tudo mau e que depois era tudo bom. E o Rui ainda me acusa de ter cometido uma “falácia argumentativa grosseira”!!! A falácia é toda sua, caro Rui, e em dose dupla, uma vez que eu de facto enunciei o que desejava atingir com a mobilização do exemplo do meu professor e essa intenção não corresponde de todo ao que me atribui. Presumir o contrário, como o Rui fez, equivale a acusar alguém de ser nazi baseando-se no facto de esse alguém ter elogiado o Triunfo da Vontade de Leni Riefenstahl
Olhe, não sei que lhe diga! Faço apenas notar que a sua torpe interpretação das minhas palavras apenas reflecte o esquema conceptual que lhe está subjacente e que, de resto, reforça a ideia com que iniciei a minha participação na discussão do seu post, a saber: «No que concerne a temas de política educativa, a linha editorial do De Rerum Natura é, ela própria, 'facilitista', dicotómica, maniqueísta, simplista, populista e alicerçada em concepções mitificadas acerca do passado e 'utupismos' intelectuais de académicos que sofrem de óbvia azia matinal.». É que só uma mente maniqueísta, para quem apenas existe o preto e o branco mas nunca matizes de cinzento é capaz de uma leitura tão abusiva das minhas palavras. O que eu questiono (e sim, agora de modo retórico) é: qual a legitimidade de alguém para vociferar contra o facilitismo quando esse alguém não só não é capaz de seguir os mais elementares princípios de uma argumentação como também padece do síndroma de simplificar e reduzir à caricatura tudo o que é complexo?
Lamento que uma verdadeira discussão de ideias não seja possível neste espaço e, caro Rui, lembre-se que ‘erudição’ não é sinónimo de ‘inteligência’.
João
Caro João:
É este o princípio do seu comentário: “Independentemente do que possa responder a este meu comentário esta será a minha última intervenção neste debate” (os motivos estão no comentário).
E termina o comentário da forma seguinte: “ Lamento que uma verdadeira discussão de ideias não seja possível neste espaço e, caro Rui, lembre-se que ‘erudição’ não é sinónimo de ‘inteligência’”.
Finalmente, estamos ambos de acordo: não tive a “inteligência” para interpretar a sua mensagem. Que quer? Empanei na palavra “ucronia", e, a partir daí, enublou-se-me o cérebro mais do que já é habitual em mim. Apesar de tudo, tentarei ser breve só tratando de coisas que estão escritas e que, portanto, não são imaginação minha.
Transcreve, o caro João, este período de um meu comentário ,extenso como aliás reconhece, mas que me obriga a transcrevê-lo por minha vez:
“1º- Afirma o Rui (e perdoe-me a transcrição longa): «Começo o João por argumentar sobre a má qualidade do ensino de antigamente com o exemplo da “encobrição”. Em contraponto, apresentei-lhe não ser essa uma característica apenas desse tempo com o exemplo do aluno de Letras (de Letras, repito) que atribuiu a “paternidade” de “Os Maias” a Egas Moniz. Logo o João acorre em seu auxílio, questionando: “Teria sido um ‘mental slip’ causado pela personagem de João da Ega? Não sei.” Ou seja, para duas situações semelhantes utiliza o João dois pesos e duas medidas diferente.» (fim de citação)”.
Sem retórica, defeito que me atribui, numa entrevista televisiva dizer “encobrição” (uma professora do antigamente) é grave; um aluno de Letras (depois de 25 de Abril) atribuir a autoria de “Os Maias” a Egas Moniz não o é.
“2º- Num segundo momento afirma o Rui (e cito de novo): «Quanto a professores universitários ignorantes, que separam o sujeito do predicado com uma vírgula e que ascendem à cátedra, é pretender demonstrar que aberrações dessas só se passavam antes de 25 de Abril. Trata-se de uma “falácia argumentativa grosseira”, para utilizar palavras suas, que só o deixaria de ser se se desse ocaso de depois de 25/Abril os professores universitários terem a sabedoria de Aristóteles ou conhecimento científico de Einstein. Antes e depois de 25 de Abril, neste particular, más fadas há.».
O que eu lhe gostaria de perguntar (não de forma retórica) é o seguinte: onde, em todas as minhas intervenções, digo eu que o ensino de antes do 25 de Abril era mau, e/ou que «aberrações dessas» só se passavam nessa altura?”
(Continua)
(Continuação)
Voltemos ao seu comentário (2 Agosto; 21:21):
“Deixe-me partilhar a seguinte confidência: os piores docentes que tive em toda a minha formação educativa foram professores universitários formados e promovidos academicamente nos ‘bons velhos tempos’. Uma dessas pessoas cedeu aos estudantes um artigo de sua autoria onde, a certa altura, se podia ler “ouro, brasileiro”. Sim, sujeito e predicado intercalados por uma vírgula!! E, caro Rui, isto não acontecia uma nem duas vezes mas amiúde, inviabilizando assim a possibilidade de eventual lapsus calami (que tão generosamente imputou aos meus erros ortográficos). E a coisa não ficava por aqui (e nem estou a mencionar as barbaridades de conteúdo!), posso-lhe assegurar que o respectivo documento submetia a língua portuguesa a verdadeiros tratos de polé. Os erros básicos de construção eram tantos que tornavam a sua eventual contabilidade num verdadeiro trabalho de Hércules! Só tenho pena de não ter preservado tamanha preciosidade!! Quanto ao seu digníssimo autor, esse assumiu vários cargos de grande responsabilidade na gestão de uma reputada universidade pública tendo chegado a assumir o posto de vice-reitor da mesma!!!”
Vejamos:” “Deixe-me partilhar a seguinte confidência: os piores docentes que tive em toda a minha formação educativa foram professores universitários formados e promovidos academicamente nos ‘bons velhos tempos’.Quando se refere aos “bons velhos tempos”, reporta-se a tempos da velha senhora, como deduzo e qualquer pessoa o de deduzirá também. Assim se conclui que o desgraçado professor universitário que lhe serviu de bobo de festa não foi uma excepção. E repito-lhe o porquê: “Os piores docentes que tive em toda a minha formação educativa foram professores universitários formados e promovidos academicamente nos ‘bons velhos tempos’, João “dixit”.
Ou seja, foi um azar tremendo o seu em só ter apanhado professores universitários maus formados antes de25 de Abril. Se reparar, eu não sou maniqueísta para dizer que os professores universitários formados antes de 25 de Abril eram maus e os formados depois de 25 de Abril bons.
Lá me obrigo a uma outra transcrição do meu comentário como ónus de prova: “Quanto a professores universitários ignorantes, que separam o sujeito do predicado com uma vírgula e que ascendem à cátedra, é pretender demonstrar que aberrações dessas só se passavam antes de 25 de Abril. Trata-se de uma “falácia argumentativa grosseira”, para utilizar palavras suas, que só o deixaria de ser se se desse ocaso de depois de 25/Abril os professores universitários terem a sabedoria de Aristóteles ou conhecimento científico de Einstein. Antes e depois de 25 de Abril, neste particular, más fadas há”.
Prometi no início ser breve. Não fui tanto quanto desejei pelas transcrições que o caro João, simpaticamente, fez da minha prosa “erudita”, correndo o risco de deslustrar a sua, ao acorrer-me a sua lembrança : “caro Rui, lembre-se que ‘erudição’ não é sinónimo de ‘inteligência’”.
Que diacho! Atirando para trás das costas a”erudição”, pelo menos uma vez, na vida, quero passar por "inteligente"...
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