Meu artigo saído na última revista Rua Larga (lembro que já há um plano para entregar boa parte do espaço da Penitenciária da Lisboa à Universidade Nova de Lisboa):
A Biblioteca Joanina foi concluída em 1728,
após 11 anos de obras. O anexo ao antigo Paço Real, ao serviço da Universidade
de Coimbra, foi erguido sobre uma prisão medieval, então em ruínas. O piso
inferior foi adaptado para Prisão Académica. Pensando que a construção de uma
biblioteca sobre uma cadeia poderia ser reeditada, propus em 2005, como Director
da Biblioteca Geral da Universidade de Coimbra (BGUC), a transformação da velhíssima
Penitenciária de Coimbra (abriu em 1901, após 25 anos de obras, tendo hoje
condições indignas), numa nova biblioteca da Universidade, da cidade e do país,
a que chamei «Casa do Conhecimento». A proposta foi acarinhada pelo Reitor Fernando
Seabra Santos (que logo pensou em juntar a Biblioteca e Arquivo universitários na
nova «Casa»), e pelo Presidente da Câmara Carlos Encarnação, que não só afirmou
aos jornais que a ideia era «excelente», como fez um acordo com o Ministério da
Justiça para a cedência de terrenos no Botão, de forma a construir uma nova
penitenciária, dispondo-se a ajudar no financiamento. Os serviços da Câmara fizeram
um desenho do lote da antiga penitenciária, que incluía um sector destinado a
urbanização, preservando, obviamente no centro, a memória histórica do lugar.
A ideia não teve, até hoje, seguimento. Os
reitores e edis mudaram e os seguintes deixaram de ter a mesma sensibilidade
para as questões da cultura em geral e das bibliotecas em particular. No
entanto, havia — e há! — razões de monta para dar a Coimbra um novo equipamento
cultural. A BGUC estava — e está — a rebentar pelas costuras, graças a doações
e às contínuas incorporações de depósito legal. O edifício da BGUC foi inaugurado
em 1956, após um processo de planeamento e construção que durou 20 anos. O
número de monografias e periódicos em Portugal sofreu, desde então, um aumento brutal,
embora ligeiramente mitigado nos últimos
anos no suporte de papel. O número de utentes também cresceu
extraordinariamente, assim como as respectivas necessidades. Muitos serviços
das bibliotecas modernas não têm qualquer viabilidade no edifício actual. A
transferência da BGUC para um sítio mesmo ao lado do Pólo I (na prática, o
alargamento deste Pólo) resolveria o problema, podendo o antigo espaço servir
para Biblioteca da Faculdade de Letras. Por outro lado, a Biblioteca Municipal
de Coimbra, com um espólio muito rico, está desde há décadas na hoje muito
degradada Casa da Cultura. Não teria de «andar» muito para brilhar com uma nova
funcionalidade. Em muitas cidades estrangeiras, há bons exemplos de bibliotecas
da Universidade e da cidade. A BGUC e a Biblioteca Municipal, bem articuladas,
poderiam formar uma segunda Biblioteca Nacional, tal como em Itália (Florença)
e em França (Lyon).
Um concurso arquitectónico internacional permitiria
criar em Coimbra um novo equipamento que fosse uma grande âncora cultural e
urbana para o século XXI (muito além de 2027), com uso das mais recentes
tecnologias. Faria «univers(c)idade» e criaria uma faixa verde de Santa Cruz
até ao rio. O Porto tem Serralves e a Casa da Música. Não quererá Coimbra ter
alguma ambição?
Carlos Fiolhais
Departamento de Física da Faculdade de
Ciências
e Tecnologia da Universidade de Coimbra
Este texto foi escrito ao abrigo do
antigo Acordo Ortográfico, por vontade do autor.
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