quinta-feira, 19 de março de 2020

ENTREVISTA A CARLOS FIOLHAIS, DIRECTOR DA COLECÇÃO CIÊNCIA ABERTA DA GRADIVA, A INÊS NAVALHAS


Dei recentemente uma entrevista a uma aluna de doutoramento que está a estudar a colecção Ciência Aberta, da Gradiva. Porque pode interessar aos leitores, habituais ou novos, dessa colecção, publico aqui uma pequena parte:

IN- Coloco agora questões relacionadas com a sua condição de editor da colecção Ciência Aberta desde 2012. Desde que é editor da colecção, alterou alguma política?

CF- A partir do número 200, quando tomei conta da colecção, aumentou bastante o número de autores portugueses: procurei não só aumentar a variedade de temas disciplinares, mas também a variedade da origem dos autores, incluindo embora de inicio de uma forma muito tímida, os portugueses. Estão até agora editados 234, o último é O Homem de Neanderthal, de Svante Pääbo, portanto 34 livros. Destes 14 (41%) são de autores portugueses. Para comparação, nos 200 primeiros títulos houve 36 títulos de autores portugueses (13%), isto é, a percentagem de autores nacionais passou em relativamente pouco tempo para o triplo. Mantendo autores tradicionais (dos estrangeiros, destaco Hubert Reeves, Stephen Hawking, Richard Feynman e Richard Dawkins – neste caso em reedição numa subcolecção chamada Grandes Clássicos, – Martins Rees e Peter Atkins e Neil Tyson, e, dos portugueses, Manuel Paiva, Jorge Buescu e Jorge Dias de Deus), procurei lançar novos autores, tanto estrangeiros como nacionais: destaco nos primeiros David Deutsch, Sean Carroll, Lawrence Krauss e Svante Pääbo  e, nos segundos,  José Tito de Mendonça, Alexandre Aibéo e João Paulo André. 

Tentei também lançar alguns livros “fora da caixa” como Os Marcianos Somos Nós, sobre ficção científica do jornalista Nuno Galopim, ou Tecnologia versus Humanidade, sobre a moderna sociedade dominada pelas tecnologias do futurólogo Gerd Leonardt. 

Há também algumas abordagens originais, como Zombies e Cálculo, do matemático Colin Adams, uma abordagem zombie à matemática que estava inicialmente prevista para a colecção O Prazer da Matemática, e O Cálculo da Felicidade – Como uma abordagem matemática da vida, da saúde, dinheiro e amor, que pelo título mais parece um livro de autoajuda mas que tem, ao contrário destes, muito de ciência matemática. Estes dois últimos títulos e também um título dos Grandes Clássicos -  Simetria de Hermann Weyl – mostram que não receamos a matemática (no caso de Weyl a matemática é mais difícil, admito). 

Outra inovação, para além da criação da subsérie Grandes Clássicos, houve um acordo com a Fundação Francisco Manuel dos Santos, que tem permitido trazer alguns autores a Portugal para proferir conferências e lançar os seus livros: Foi o caso do psicólogo social Philip Tetlock, um autor da área das ciências sociais e humanas que não tem sido muito contemplada na colecção, Martin Rees, Peter Atkins e Svante Pääbo, todos eles grandes nomes das suas áreas, respectivamente a astronomia, a química e a paleogenética.

Um sinal dos tempos foi termos publicado A Paixão da Física  do professor de Física  americano Walter Lewin (sendo coautor Warren Goodstein): é uma espécie de guião das aulas muito populares que ele deu no MIT e que estão acessíveis no YouTube. No Cosmos  de Sagan o meio era a televisão, agora o meio é também a Internet.

IN- Como são seleccionados os livros que publicam na Ciência Aberta? Existirá alguma área científica preferencial para publicar, atendendo ao mercado?

CF- Procuramos escolher bons autores e bons livros, estando atentos á actualidade da ciência e do mundo. Não há critérios absolutamente objectivos, pois há sempre alguma subjectividade. Dependemos da oferta que vem de fora e de dentro, havendo que seleccionar, no que vem de fora, entre uma grande quantidade de autores e de títulos. Por vezes, há restrições próprias do comércio livreiro: direitos demasiado caros, ou comprados por outros.

Quanto a temas, há temas que têm sempre procura como o da astronomia, astrofísica e astronáutica. Conto 12 títulos (35%) na Ciência Aberta desde o n.º 200. A biologia e a medicina tiveram 5 títulos. A matemática, até por ter terminado a colecção O Prazer da Matemática, que foi dirigida pelo Jorge Buescu, tem 5 livros. A física, sem a astrofísica, tem 4 títulos (destaco Uma Biografia da Luz, publicada no quadro do 2015 - Ano Internacional da Luz, que teve edição no Brasil). A química tem 2. Saliento, a propósito da química, a atenção que temos dado ao tema das “duas culturas” de C. P. Snow, isto é, a cultura científico-tecnológica e a cultura humanística: destaco o livro do químico Sérgio Rodrigues sobre a relação da química com a literatura Jardins de Cristais – Química e Cultura e o livro de um outro químico, o João Paulo André, Poções e Paixões –  Química e Ópera

Se me é permitida uma autocitação, tenho com o David Marçal um título sobre um tema muito actual, que é o dos ataques à ciência, A Ciência e os seus Inimigos, que tem vendido bem. Teve impacto nos media e suscitou algum debate.

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