quinta-feira, 11 de agosto de 2011

O que é que eu preciso de saber sobre Ciência


A revista "Visão" perguntou-me o que era preciso saber sobre ciência em cerca de 3000 caracteres. Escrevi este mini-texto, que saiu hoje, na nova secção "Radar":

O QUE É A CIÊNCIA? A ciência é a descoberta que o ser humano faz do mundo, mundo onde ele naturalmente está incluído. A ciência procura responder a questões tais como: O que aconteceu no início do mundo? De que são feitas as coisas? É possível uma teoria unificada das forças fundamentais? O mundo vai acabar? O que é a vida? De onde veio a vida? Há vida noutros planetas? Que parte do nosso comportamento depende dos genes? O que faz com que nos apaixonemos? Como funciona o cérebro? O que é a consciência? O que é a inteligência? Para responder a estas e outras questões os cientistas colocam hipóteses e tentam, através da observação e da experiência, verificá-las. E a realidade é que manda. Como disse o físico Richard Feynman: “A hipótese que é contrariada pela experiência está errada. Nesta simples frase está a chave da ciência. Não interessa quão elegante possa ser a nossa hipótese. Não interessa a nossa esperteza ou quem avançou a hipótese, o nome que tem – se contrariar a experiência está errada”. Portanto, o cientista tem de estar sempre, com cuidado e atenção, a procurar e a detectar erros. Vejamos algumas outras marcas maiores da ciência.

NA CIÊNCIA HÁ PROGRESSO. Por outras palavras, o conhecimento científico é cumulativo. Quer isto dizer que cada vez se sabe mais. Na Física, Einstein sabia mais do que Newton e Newton sabia mais do que Galileu. Isto em nada diminui nem Newton nem Galileu, bem pelo contrário: sem ter subido aos “ombros desses gigantes”, Einstein nunca poderia ter visto o que viu. Ao propor uma nova visão do cosmos, ele teve o cuidado de manter o essencial do que os seus antecessores tinham descoberto. Um cientista tem de ter imaginação para descobrir, mas a sua imaginação tem de estar delimitada por aquilo que já se sabe. Ele poderá mudar um bocadinho do que se sabe, quiçá um bocado, mas nunca poderá mudar tudo.

A CIÊNCIA PERMITE-NOS VIVER MELHOR. A ciência é feita, em grande medida, para satisfazer a curiosidade humana, mas tem aplicações práticas, resulta em tecnologia útil. É natural que, conhecendo melhor o mundo, possamos viver melhor nele e é isso, de facto, o que acontece. Podemos prevenir perigos e tratar doenças. O progresso da ciência vê-se, por exemplo, no aumento da longevidade humana. Em Portugal, a esperança média de vida das mulheres subiu no último meio século de 66 para 82 anos (24 por cento!), o que se deveu ao enorme avanço dos conhecimentos sobre nutrição e saúde.

A CIÊNCIA É DE TODOS. A ciência pode ser feita pelos investigadores das mais diversas áreas – matemáticos, físicos, químicos, geólogos, biólogos, psicólogos, sociólogos, engenheiros, médicos, etc. – mas fornece conhecimentos e atitudes que podem e devem pertencer a todos. De posse de rudimentos ainda que básicos da ciência e de posse de elementos do método científico ficamos mais ricos tanto individual como colectivamente. Em particular, vemos melhor os erros, deixamo-nos enganar menos facilmente.

A CIÊNCIA TEM UM GRANDE FUTURO. Há um curioso paradoxo na ciência: à medida que sabemos mais, damo-nos conta de que nos falta saber muito mais, isto é, cresce a consciência da nossa ignorância. Não é uma afirmação científica, mas os cientistas julgam que nunca se saberá tudo, que haverá sempre coisas para descobrir. Como disse o astrofísico Carl Sagan, “o nosso destino é o conhecimento”.


BIBLIOGRAFIA

COSMOS, Carl Sagan (Gradiva)
HISTÓRIA DA CIÊNCIA, John Gribbin (Publicações Europa-América)
GRANDES QUESTÕES CIENTÍFICAS Harriet Swain (Org.)(Gradiva)
A CIÊNCIA EM PORTUGAL, Carlos Fiolhais (Fundação Francisco Manuel dos Santos)

3 comentários:

Cláudia S. Tomazi disse...

Apenas que a humanidade estava preparada para o conhecimento de Newton e não está para Eistein, então uns poucos sabem por diferencial o que a Ciência pode oferecer, afinal o padrão continua como no canto de Camões que Tétis mostras a Gama a grande máquina do mundo.
E o conhecimento continua como um sentimento que poucos compreendem sua dimensão pois
é muito confortável conhecer bem aquilo que se ama, mas, também devemos amar com a mesma intensidade o que desconhecemos, não significa que o que nos assombra seja menos dígno de conhecimento. Continuo a pensar que a ciência é um sentimento, um caminho, uma circustância, um apelo, e quem poderá dizer que sou ou não sou um cientista?

Simplismente fascinante!

Anónimo disse...

Se a ciência fosse mais divulgada e ensinada desde cedo nas escolas, muito teria a sociedade e cada indivíduo a ganhar. Tantas vezes nos perdemos em conflitos inúteis com origem em crenças e motivações emocionais, passando completamente ao lado da realidade. Faz falta a honestidade intelectual e o realismo da ciência, todos os dias.

Cláudia disse...

Pela Honestidade Intelectual!

Richard Feynman (Prémio Nobel da Física) escreveu um dia:

«Para aqueles que insistem em que a única coisa importante é a concordância da teoria com a experiência, gostaria de imaginar uma discussão entre um astrónomo maia e um seu discípulo. Os Maias eram capazes de calcular com grande precisão as efemérides, por exemplo, os eclipses, a posição da Lua no céu, a posição de Vénus, etc. Faziam tudo com o auxílio da aritmética. Contavam um dado número, subtraíam outros números, etc. Não discutiam o que era a Lua, não questionavam o que se passava. Só calculavam a ocorrência de um eclipse ou da fase de lua cheia, etc. Suponhamos que um jovem ia ao astrónomo e lhe dizia: "Tenho uma ideia. Talvez esses objectos andem à roda, talvez existam lá em cima bolas feitas de algo semelhante a pedra e possamos calcular os respectivos movimentos de um modo completamente diferente do da previsão simples do seu aparecimento no céu." "Sim", diz o astrónomo, "e com que precisão consegue prever os eclipses?". Resposta do jovem: "Ainda não desenvolvi a coisa a esse ponto." Então replica o astrónomo: "Bem, consigo calcular eclipses com muito maior exactidão do que o seu modelo, pelo que a sua ideia não é muito relevante. O esquema matemático é certamente melhor." Quando alguém nos surge com uma ideia e diz "suponhamos que o mundo é desta maneira", existe uma tendência muito grande para lhe respondermos: "Qual é a resposta para este e para aquele problema?". Ele diz: "Ainda não desenvolvi a coisa a esse ponto." E os outros:"Pois bem, nós obtemos respostas muito precisas." O problema consiste, portanto, em saber se devemos preocupar-nos ou não com filosofias por detrás das ideias.»

in FEYNMAN, R., The Caracter of Physical Law, 1967.

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