quarta-feira, 24 de março de 2010

93 anos





Nova crónica de António Piedade, saída antes nor jornal "Despertar", que acaba de fazer 93 anos:

Ser cinquentenário em 1917 era considerado um extraordinário feito de longevidade! Ou seja, alguém que tivesse nascido a 2 de Março de 1917 (dia em que O Despertar saiu pela primeira vez) teria a esperança média de viver até cerca de meados do século XX, no caso de não ser afligido por algum problema de saúde redutor desse horizonte. E, nessa segunda década do século passado, muitas eram as doenças para as quais nem se suspeitava a causa quanto mais o tratamento ou cura.

Volvidos 93 anos, a esperança média de vida à nascença é hoje, em Portugal, 75 anos para uma criança do sexo masculino e de 81 anos para uma do sexo feminino. Esta quase duplicação da esperança de vida, não só em quantidade, mas sobretudo em qualidade é, talvez, a principal conquista da ciência e das tecnologias a jusante desenvolvidas pelo fluir do engenho humano.

Mas que avanços no conhecimento, descobertas e invenções despertadas nas últimas nove décadas contribuíram para uma maior longevidade com melhor saúde? Antes de mais, refira-se que não só as ciências da saúde foram responsáveis por isso. Aliás, avanços ocorridos nas ciências da vida e da saúde resultaram de descobertas fundamentais em outras disciplinas tais como a Física, a Química, a Biologia e a Matemática, alicerces de inúmeras Engenharias concretas.

Hoje, um nonagenário relembrará uma infância sem iluminação eléctrica. Recordará relações sociais em que a notícia chegava pelo jornal, pela voz do viajante, à velocidade do mais rápido vapor e sempre retardada por ser mais densa do que o ar. Contará sem hesitar que muitos dos seus morreram pela falta de higiene constante, pela ausência de uma vacina ou de um comprimido, pela infecção que matava depois da mais simples cirurgia. Relembrará a vida a levedar com a descoberta da penicilina (primeiro antibiótico) em 1928. Dirá que muitos corações continuaram a bater depois do primeiro transplante bem sucedido em 1952.

Um nonagenário relatará, ainda com espanto, a resolução da estrutura tridimensional do ácido desoxirribonucleico (ADN) em 1953, seguida, em 1961, pela descoberta do código genético em tríades universais de informação bioquímica inscrita na argamassa genética helicoidal. Lembrar-se-á da notícia, em 1978, do primeiro bebé-proveta, e passeará a sua ainda boa acuidade visual pelo mapa do genoma humano delineado em 2001.

Contemplando os dedos meninos de um bisneto, sobre um ecrã táctil de brincadeiras móveis, um nonagenário dir-lhe-á num conto pausado e longo: era uma vez uma época em que não havia telefonia nem visão à distância, quanto mais explorações para além do nosso sistema solar! Contemplar a Lua um sonho até 1969 chegar; o transístor, que deu asas às telefonias em 1947, é hoje diminuta parte desse computador mais que portátil. E a energia, que hoje se quer renovável, sempre foi e é constante em tudo o que há no Universo: desde o efeito de túnel quântico num microscópico electrónico, até à supernova mais matutina e distante.

E sobre o fundo dessa radiação cósmica que sussurra o testemunho de uma história improvável que se verificou, há sempre lugar para um endereço electrónico onde se aloja um sempre jovem Despertar: http://www.odespertar.com/jornal/.

Parabéns!

Legendas:

Figura 1 – Imagem gerada por computador de um Feto com 35 semanas de gestação. Créditos Miguel Castro, Take The Wind 2010

Figura 2 - Em 1917, quando Albert Einstein apresentava ao universo a sua constante cósmica (talvez o seu maior pecado), nascia em Coimbra o jornal “O Despertar”.

Figura 3 – Nuvens de Magalhães. Imagem obtida pelo telescópio Hubble. Créditos NASA, ESA.

9 comentários:

Anónimo disse...

ODE AO PASSADO

A António Piedade

Noventa anos no tempo recuando,
quando eu nasci, aproximadamente,
quantas recordações me vêm à mente
de como a vida se ia processando!

Tudo corria calmo e devagar,
à luz da vela e do petróleo às vezes,
poucos ainda sendo os portugueses
que tinham luz eléctrica no lar.

Como as coisas mudaram! como tudo
vertiginosamente se processa
nos dias de hoje em pertinaz estudo!

Pois é, mas mesmo sem televisão,
o mundo pondo em comunicação,
também se era feliz: essa é que é essa!

JOÃO DE CASTRO NUNES

Anónimo disse...

Infelizmente não sei a referência exacta, mas existe um estudo recente que mostra que o aumento da esperança de vida deve-se, sobretudo, à diminuição da mortalidade infantil. Ou seja, para aqueles que não morriam nos primeiros anos, a sua esperança média de vida era semelhante (menos dois anos) à actual.

Anónimo disse...

Gostaria de saber se me poderá enumerar que avanços matemáticos ocorreram nos útlimos 100 anos que já não tenham sido resolvidos pelos clássicos Gregos e Árabes e Indianos?
Obrigado

António Piedade disse...

Caro Anónimo das 15:34

Tem razão. A esperança de vida que indiquei é em rigor referente à esperança média de vida à nascença, tendo em conta as guerras, catástrofes e pandemias. De facto, os cuidados peri, neo-natais e na primeira infância foram e são decisivos no estabelecimento da esperança média de vida.

António Piedade disse...

Caro João de Castro Nunes

Muito obrigado pelo seu soneto.

Abraço. António Piedade

António Piedade disse...

Caro Anónimo das 18:20

Sugiro que passe os olhos no seguinte artigo para um primeira abordagem à avanço da matemática no séc XX.
http://www.apm.pt/apm/revista/educ60/paraestenumero.pdf

Como verá, o avanço no conhecimento matemático foi decisivo, como sempre, para a evolução do conhecimento e das tecnologias: desde a espacial à das chaves electrónicas, desde os computadores à compreensão de inúmeros casos clínicos.
Os clássicos fundaram a matemática, a geometria, mas nem só de gregos e árabes se fez e vive a matemática.

Serafina disse...

Parabéns, António Piedade. O meu avô nasceu em 1903 e tenho muitas saudades deles. E viveu ainda mais anos do que os 93.

Anónimo disse...

Não tem de quê: são coisas que ofereço a muita gente, mesmo que não goste de poesia. JCN

António Piedade disse...

Obrigado Laura.

Cumprimentos,

António Piedade

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