quinta-feira, 11 de março de 2010

Porque a Terra Treme (1)


Nova crónica de António Piedade saída no Despertar:

Terramotos ou maremotos nunca vêm a propósito. Mas, perante a impotência humana para fazer face às mais recentes e violentas movimentações das camadas superficiais da crosta do nosso planeta, reacende-se o apelo mais genuíno à habilidade humana em compreender a natureza deste fenómenos devastadores. Apesar da aparente fragilidade dos actuais modelos geológicos em prever, com uma antecedência humanamente útil, as movimentações da crosta terrestre, a acumulação de informação que resulta da observação e registo dessas mesmas movimentações validam o conhecimento e permitem corrigir e ajustar os modelos.

Por exemplo, a observação e análise do grande terramoto que em 1906 flagelou São Francisco (Estados Unidos da América) permitiu ao geofísico norte-americano Harry Fielding Reid propor, faz agora 100 anos, uma teoria para explicar a causa dos terramotos. Segundo o modelo nela incluso, os terramotos resultariam do movimento relativo de uma falha ou fractura na crosta do planeta, contra ou sobre um outra falha. As teorias anteriores invertiam a relação causa – efeito e postulavam, de acordo com o senso comum, que seriam os terramotos que originavam as falhas.

Também nesse mesmo ano de 1910, Frank B. Taylor propôs, por intuição, a movimentação dos continentes na litosfera terrestre (a camada exterior do planeta composta por rochas no estado sólido) e que uma região menos profunda no atlântico (hoje identificada como a dorsal meso-atlântica) seria o resquício da separação dos continentes africano e sul-americano. Esta proposta seria mais tarde incorporada na teoria mais ampla da deriva continental. Esta, proposta pelo meteorologista alemão Alfred Lothar Wegener em 1912, sugeria a partir de dados provenientes de várias disciplinas científicas, que os continentes actuais teriam divergido, quais jangadas, a partir de um continente único e primevo, designado por Pangea (do grego: todas as terras).

A confirmação destas teorias ocorreria décadas depois e, principalmente, devido à instrumentação de observação, detecção e análise derivadas de tecnologia militar desenvolvida para as grandes guerras, de que o sonar é um bom exemplo. Isto permitiu um acumular de conhecimento geológico sem precedentes. Foi assim confirmada não só a deriva continental, assim como identificada a expansão dos fundos oceânicos (por Hess, em 1962). Assim, inúmeras observações da dinâmica da litosfera levaram à incorporação das interpretações sísmicas anteriores na teoria designada por tectónica de placas. A formulação desta teoria, através dos contributos complementares e multidisciplinares de Wilson, (1966), McKenzie e Parker (1967), Morgan (1968) e Le Pichon (1968) durante a década de 60 do século XX, proporcionou uma abordagem interdisciplinar no estudo da Terra, confluindo o conhecimento fornecido por diversas ciências como a sismologia, a paleontologia, a petrografia, a física dos materiais, entre outras.

(Continua)

António Piedade

Legenda da figura:
Actividade sísmica registada durante o sismo de 27/02/2010 no Chile.

8 comentários:

Carlos Faria disse...

Como geólogo é bom ver que as ciências da terra também têm lugar no Rerum Natura, venham mais...

Anónimo disse...

Ninguém da mente me tira
que quando a terra estremece
é por causa da mentira
de quem das leis escarnece!

JCN

Fernando Martins disse...

É pena não terem um geólogo no Blog - estes posts são bons mas falta-lhes continuidade...

Tenho a certeza que na Universidade de Coimbra ou de Lisboa arranjavam um excelente blogger!

Anónimo disse...

A par da geologia
com os seus conhecimentos
dê-se espaço à poesia
que é a voz dos sentimentos!

JCN

Joaquim Duarte disse...

Venho por este meio solicitar autorização para publicar este excelente post no sítio web do Instituto de Odivelas na secção de divulgação científica.

António Piedade disse...

Caro Joaquim Duarte,

Pela parte que me toca, enquanto autor do post, dou-lhe toda a liberdade em o divulgar no sítio web do seu Instituto, desde que ressalvadas as habituais referências, naturalmente. Fica também desde já dada a autorização para o mesmo acontecer, se achar conveniente e merecedor, para futuros post de minha autoria (agradeço só me indique o endereço do sítio para minha consulta). A honra é toda minha e o dever em divulgar ciência fica assim melhor cumprido. Muito Obrigado

Joaquim Duarte disse...

Caro António Piedade,

Para o nosso colégio, a ciência a cultura são essenciais e como tal a divulgação científica é prática habitual. O nosso endereço web é o seguinte: http://institutodivelas.com

Muito lhe agradeço a sua colaboração.

Joaquim Duarte

Anónimo disse...

Começo pedindo desculpa se o meu comentário sair um pouco do âmbito do artigo, mas...
Tenho alguma formação científica e hoje estou particularmente incomodada, porque ontem por volta das 20h30 anunciei à minha família ter sentido um sismo.
Porque senti!
Mas não houve sismo e daí o meu verdadeiro incómodo, tendo em conta a minha certeza da ocorrência. Já confirmei em pessoa junto da fonte mais fidedigna (IM).
Que se passou comigo?
Aceito contribuições para a explicação do que se passou, sem mais pormenores, para que possam vir muitas (explicações).
Desde já grata,
Helena Oliveira

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