quinta-feira, 19 de março de 2020

A PANDEMIA E O PANDEMÓNIO ACTUAIS

Nunca tive por hábito consultar bolas de cristal que me dessem respostas para o futuro. Com os pés bem assentes no chão sem estarem grudados, como tal, ao saudosismo do passado, atenho-me em consultar umas tantas minhas reflexões atestadas por documentos que escrevi, sobre o mundo que me rodeava e dos quais extraio conclusões que o futuro se encarregaria de validar ou não.    

Decorria a década de 70 (1973), baseado em leituras projectadas no futuro, numa conferência que então proferi na Sociedade de Estudos de Moçambique – intitulada “Educação Física, Ciência ao Serviço da Saúde Pública” -, publicada por essa Sociedade num pequeno opúsculo, escrevi, em transcrição integral (p. 22): 
«Pode afirmar-se que a mais dominante preocupação de qualquer governo deve ser o bem-estar físico das suas populações. Disso nos dá conta o médico e escritor espanhol (862-1931) Francos Rodrigues, ao afirmar: “A verdade, a bondade e a beleza que assinalam o caminho do imortal têm de ir na companhia imprescindível da saúde que é como o cimento das obras perduráveis que constituem o orgulho da condição humana. Por isso quando se afirma acerca de um povo que é insalubre e que não emprega remédios para pôr cobro a semelhante estado de coisas tem de se lhe chamar bárbaro. É barbárie não respeitar o direito, não respeitar as crenças, não respeitar os sentimentos, converter a força em único e supremo governo das colectividades, e também é barbárie não perseguir nem aniquilar os milhões de germes que se agitam na água, no ar, nos alimentos para provocarem a morte nos organismos superiores. Estas legiões de invisíveis inimigos produzem mais mortalidade do que as legiões dos ferozes combatentes nos campos de batalha”». 
Em alguns filmes de antigamente era passado o seguinte aviso: “Qualquer parecença com a realidade é pura coincidência”. Infelizmente, neste caso, qual parecença com a realidade não é simples coincidência, é a dura realidade de um país de barbárie deste extremo mais ocidental de uma Europa fragilizada, ou mesmo em decadência, incapaz de fazer frente à actual e devastadora pandemia cavalgando em tropel ensurdecedor devastando vidas inocentes sem conta. Ainda se fosse para depurar a maldade humana!

Nunca tive tanto a certeza de que em pântanos podem nascer e crescer nenúfares. Eles aí estão: médicos, enfermeiros e outros profissionais de saúde que arriscam a vida em prol do seu semelhante nas águas paradas de uma política retardada, apática e sem garra para um combate estrénuo que se deseja não vir a ser apocalíptico. Haja esperança, aquela esperança da vox populi: "A esperança é a última a morrer"!

6 comentários:

Carlos Ricardo Soares disse...

Rui Baptista é um bom exemplo do combatente bem sucedido, infatigável e lúcido.
Nas últimas semanas desta guerra de trincheiras, que muitos dariam por ultrapassada, sobretudo depois do sucesso do poder aéreo, o inimigo é mais insidioso e diabólico do que nunca.
Faz parar os aviões e guardar os mísseis e todos os arsenais de torpedeiros e manda as pessoas para os abrigos, mesmo sem bombardeamentos, submissas e abatidas. Em vez de activar a economia, para-a, afunda-a. Em vez de obrigar a mobilizar tropa rija e violenta, obriga a cuidados paliativos e, tragédia das tragédias para quem é senhor da guerra, é um inimigo que escolhe o campo de batalha e as armas e move-se à vontade, ataca em qualquer lugar, a qualquer hora, invisível aos radares e sem estrondo, inexpugnável e impune. Um inimigo cobarde. Um terrorista da pior espécie. Desconhecido. Destituído de intenções. Um facto e não actos. Ao contrário de uma guerra. Guerra é o que vamos ter de lhe mover. Guerra é coisa de humanos.

Impressões disse...

Acredita em coincidências, Edward? Universos paralelos...

Bater de asas da borboleta (anúncio):
“Os gafanhotos invadiram o Corno de África, que sofreu fortes chuvas em dezembro de 2019, depois de provocarem graves problemas no Paquistão (onde foi declarada emergência nacional), Iémen e Omã, antes da aterragem no continente africano pelo Mar Vermelho.”
JN

Tufão (acontecimento anunciado):
Covid 19 – Dezembro de 2019

Conclusão: aposto que o kit foi, há muito, pensado e concebido - vírus, tratamento e vacina, mas “Deuch” adia... Os recursos naturais estão a escassear e os velhos são muitos... Talvez, por isso, o coronavírus seja n ovo...

Ou talvez não.

Rui Baptista disse...

Dr. Carlos Ricardo Soares: Julgo ser formado em Direito um curso que só por teimosia de um filho para com a Mãe que o aconselhava a seguir Letras (no meu tempo, antes das alíneas do 5.º ano dos liceus, o sexto ano desdobrava-se apenas em Letras e Ciências). Assim segui Ciências escolhendo um curso que de tão depreciado, por ser tido como uma fábrica de hercúleos mentecaptos, me fiz combatente na sua defesa
sem galões, que os viria a obter como oficial miliciano de Infantaria, onde colegas meus se tinham destacado com estrelas de generalato, v.g., José Esteves. Assim, agradeço-lhe a referência que me faz, com grande dose de generosidade, de ser um "bom exemplo do combatente bem sucedido, infatigável e lúcido". Generosidade que me incita a não desistir das minhas lutas pondo sempre a honestidade como razão primeira tentando seguir o caminho que tem percorrido na sua argumentação com uma certa agressividade, nunca como um inimigo a abater sordidamente. Obrigado!

Rui Baptista disse...

Das coisas que mais me impressionam é o futuro estar a reproduzir a ficção científica, como tal, com pouca ou nenhuma imaginação desde os tempos de Julio Verne, "alma pater" neste domínio. Temos, portanto, que nos precaver atempadamente contra esse futuro. Sem entrar na teoria da conspiração, por vezes, dou por mim a pensar se esta virose não será a guarda avançada para destruir a vida terráquea e os seus selvagens para se apoderarem da Terra como um planeta a habitar por destruição do seu planeta em vias de extinção. A palavra é livre e os disparates que possamos pensar e/ou exprimir, germinam-os!

Rui Baptista disse...

A 2.ª linha do meu comentário anterior está incompleta. Assim, acrescento "a seguir Letras, não segui.

Carlos Ricardo Soares disse...

Rui Baptista, também lhe agradeço a bondade do comentário e que esteja à vontade para me dirigir a palavra, do mesmo modo que eu escrevo melhor quando penso que as pessoas merecem essa consideração.
Sou formado em Direito, como diz, e o meu percurso foi das ciências para as letras, não por teimosia para com a minha mãe, que queria que eu fosse trabalhar, porque considerava vadiagem andar na escola, mas por muita rebeldia e espírito de contradição e sentido de independência.
Também fui militar, mas os meus combates, felizmente, não são mais do que uma espécie de delírios quixotescos à procura de pelejas intelectuais com uma pena na mão a assombrar o coronavírus.

"A escola pública está em apuros"

Por Isaltina Martins e Maria Helena Damião   Cristiana Gaspar, Professora de História no sistema de ensino público e doutoranda em educação,...