Texto meu saído na imprensa regional:
Vale
a pena, neste Ano Internacional da Luz, voltar a esta questão muito antiga. Ao
longo da história, foram-lhe sendo dadas diferentes respostas. Para os
atomistas gregos, a luz era, como aliás tudo
o resto, constituída por partículas. No início do século XVIII, o físico inglês
Isaac Newton recuperou esta teoria, uma vez que ela permitia explicar, entre
outros fenómenos ópticos, a propagação rectilínea da luz, a reflexão (embate da
luz na superfície de um espelho) e refracção (desvio da luz ao passar de um
meio para outro).
Contudo, um outro físico, o holandês seu
contemporâneo Christian Huyghens, conseguia explicar os mesmos fenómenos usando
ondas. Apesar do enorme prestígio de Newton, foi a teoria ondulatória que
acabou por prevalecer no século XIX: logo no início desse século, uma famosa
realizada pelo inglês Thomas Young, exibindo a interferência de luz que passa
por duas fendas, só podia ser compreendida com a ajuda de ondas. Uma partícula
nunca pode anular outra partícula, mas uma onda já pode anular outra onda. Assistiu-se
então ao triunfo da teoria ondulatória, para a qual muito contribuiu uma
memória de 1815 do francês Augustin-Jean Fresnel, sobre a difracção da luz
(espalhamento quando sai de um pequeno orifício).
Se a luz é uma onda, o que é que está a vibrar? Há 150 anos, o escocês James Clerk
Maxwell, ao juntar, na mesma descrição matemática, a electricidade e o magnetismo,
foi o primeiro a propor que a luz era uma onda que resultava da vibração do
campo electromagnético. O que é esse campo? Para explicar a força eléctrica e a
magnética à distância tinha-se introduzido a noção de campo. Existe um campo
magnético associado ao campo eléctrico e a luz mais não é do que a propagação
de uma perturbação periódica desses dois campos, conjunto a que chamamos campo
electromagnético. A velocidade da luz foi calculada a partir de propriedades
eléctricas e magnéticas. Apesar de essa velocidade ser constante, podiam
existir ondas com comprimentos de onda
muito diferentes. A luz visível corresponde a uma pequena “janela” no conjunto dos
comprimentos de onda. Luz invisível, como a ultravioleta e a infravermelha, é
tão luz como a luz visível, só diferindo desta por o comprimento de onda ser
menor ou maior. Com a detecção instrumental de luz invisível, a onda parecia
ter ganho à partícula!
Mas a
luz reservava-nos surpresas. Em 1905 as partículas de luz voltaram quando o físico
suíço Albert Einstein se viu obrigado a introduzir a noção de “pacote” de luz
(fotão) para descrever o arranque de electrões de um metal por luz
ultravioleta. Graças a Einstein Newton estava vingado… A energia do fotão
dependia do comprimento de onda: havia fotões ultravioletas, infravermelhos, e,
com uma energia intermédia, fotões azuis, verdes e vermelhos. Como conciliar a
descrição ondulatória, que funciona bem em certas circunstâncias, e a descrição
corpuscular, que funciona bem noutras? Uma estranha teoria – a teoria quântica
– conseguiu fazê-lo, impondo-se como a moderna teoria da luz. A luz propaga-se
no espaço como uma onda, mas pode ser produzida ou apanhada como partícula. Hoje
em dia conseguimos emitir luz fotão a fotão, evidenciando o seu carácter
corpuscular, mas, se colocarmos um obstáculo com duas fendas à frente dessa luz,
verificaremos que ela passa pelas duas, como seria de esperar de uma onda. A
experiência desafia o nosso senso comum. Quem diz que o mundo tem de estar
de acordo com o nosso senso comum?
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