quarta-feira, 22 de outubro de 2014

Propostas da ANICT portadoras do vírus que está a destruir a Ciência e aniquilar da dignidade dos Investigadores?

Informação recebida do Sindicato nacional do Ensino Superior:
A Associação Nacional de Investigadores em Ciência e Tecnologia (ANICT) tornou público um documento que designou por “Princípios orientadores para a criação do Estatuto do Trabalhador de Investigação Científica e restruturação da Carreira de investigação Científica (Decreto de Lei 124/99)”, para o qual, diz ter solicitado (ou irá solicitar) pareceres à FCT, CRUP, ABIC, SNESup e FENPROF. Mais ainda, tem agendado uma campanha para publicitar o seu documento pelas universidades portuguesas, iniciando a campanha na Universidade do Porto no dia 22 e terminando-a na Universidade do Aveiro a 4 de novembro, passando pelas Universidades de Trás-os-Montes e Alto Douro, Minho, Coimbra, Beira Interior, Lisboa, Évora e Algarve. Estranhamente, as universidades não só cederam uma sala para que a ANICT possa reunir com os seus associados como se associaram à sua iniciativa dando-lhe a honra da presença de uma vice-reitoria e, no caso da reunião em Lisboa, o Governo de Portugal também se faz representar pela senhora Leonor Parreira, Secretária de Estado para a Ciência.
 Mas afinal, o que é que a ANICT advoga e propõe para que as Reitorias da Universidades Portuguesas e o Governo de Portugal lhe estejam a dar tamanha importância?
 Da leitura do documento facilmente se constata que a ANICT pretende:
1.   O fim da exclusividade de todos aqueles que integram ou vierem a integrar o dito Estatuto do Trabalhador de Investigação Científica (o qual propõem substituir o atual Estatuto da Carreira de Investigação Científica), ou seja, a perda 1/3 do atual salário; Grande atropelo à dignidade e à atividade dos cientistas Portugueses; defendem uma discriminação negativa para os investigadores (ou será que têm também outras propostas para estender a perda de exclusividade a todos os funcionários e agentes públicos?).

2.   A perpetuação dos contratos a prazo, os quais poderão durar até VINTE ANOS e na melhor das hipóteses durarão sempre DEZ anos; Uma Violação da legislação Europeia, do Código do Trabalho e a institucionalização da precariedade.

3.    A criação de uma nova categoria para Investigadores Doutorados que designam por Investigador Assistente (com um salário menor do que o de Professor Auxiliar), ao qual não reconhecem competência para desenvolver investigação de um modo autónomo; Defendem que a carreira de investigação deve ter menor dignidade do que a carreira docente; e que os doutoramentos dos investigadores são menos valiosos do que os dos docentes.

4.    Possibilidade dos Investigadores receberem suplementos remuneratórios, para recuperarem até 1/3 do salário perdido com a perda de exclusividade, através da lecionação de aulas (2.º e 3.º ciclos, mas não de 1.º ciclo) ou através de projetos de investigação que sejam investigadores responsáveis. Assim, defendem que a recuperação de 1/3 do atual salário fica dependente das vontades daqueles que ocupam cúpulas do poder da instituição e/ou da capacidade de angariar fundos para a investigação. Assim, subalternam o nobre objetivo da Ciência (a promoção do conhecimento) tornando-o mero acessório dos interesses económicos e/ou pessoais. O importante será apenas obter financiamento…

5.  Que a categoria de Investigador Coordenador seja apenas acessível aos investigadores que estiverem a fazer a gestão científica de um centro de investigação; Apesar de não darem significado ao termo “gestão científica” subentende-se que corresponde à posição dos atuais coordenadores das unidades de investigação do SCTN, os quais, de acordo com os Estatutos da maior parte das unidades de investigação, são eleitos pelos investigadores doutorados integrados em cada uma das unidade de investigação. Portanto, a não ser que a ANICT tenha também um novo diploma para regular o regime jurídico das unidades de investigação, a ascensão a esta categoria terá um caráter temporário e em Portugal não poderá haver mais do que algumas (poucas) centenas de investigadores coordenadores!

6.  O estatuto do bolseiro de investigação seja exclusivamente cingido a estudantes do ensino superior, que usufruem de bolsas de estudo durante os seus estudos de doutoramento e/ou mestrado; Deve salientar-se que se trata da única medida positiva que o documento contém. No entanto, nada tem de original pois tanto os sindicatos (SNESup, FENPROF) como a Associação dos Bolseiros de Investigação (ABIC) há muito que defendem esta posição. Por exemplo, nesta legislatura apresentaram esta proposta aos vários grupos parlamentares, à Comissão Parlamentar de Ciência, Educação e Cultura e à Secretaria de Estado da Ciência. Infelizmente, a atual maioria não só não quis resolver o problema da precariedade dos bolseiros como a expandiu para o setor privado através dos projetos QREN. Não nos devemos esquecer que foi necessário os Sindicatos (SNESup e FENPROF) vincarem na Comissão Parlamentar de Ciência, Educação e Cultura que o desrespeito pelo Bolseiro de Investigação em Portugal atingiu o inimaginável numa democracia, bem explícito no facto da atual maioria parlamentar ter aprovado no Estatuto do Bolseiro de Investigação Científica um artigo que viola direitos fundamentais - “O bolseiro de investigação científica será punido pelas falsas declarações dos seus supervisores”, para que este artigo fosse alterado.

Se ao exposto juntarmos o comunicado público da direção da ANICT branqueando as evidentes e públicas irregularidades/ilegalidades subjacentes aos concursos InvestigadorFCT2013 e para atribuição das bolsas de doutoramento e pós-doutoramento, torna-se evidente que nos últimos tempos esta associação não estará interessada em defender os interesses da ciência nem dos investigadores, não expressando também qualquer sinal de respeito pelas conquistas mais recentes. Parece antes tratar-se de uma organização muito peculiar, uma organização controlada por uma direção cujos membros terão sido infetados pelo vírus que está a destruir a Ciência em Portugal e aniquilar da dignidade dos Investigadores. E uma organização que até ignorará que no Politécnico também se faz investigação e existem investigadores que merecem tanto respeito como os demais.
Uma palavra final para a associação das Reitorias das universidades públicas à “discussão pública” promovida pela ANICT que não deixa de evidenciar uma inversão na forma como o CRUP tem acolhido as diversas movimentações da sociedade civil, mas numa estranha direção face à crítica generalizada sobre a forma como se está a gerir a Ciência em Portugal. Talvez esteja aqui também a justificação para a enorme passividade do CRUP em torno da ação da FCT e em particular da recente avaliação das unidades de I&D.
O SNESup expressa assim o seu completo repúdio pelas propostas da ANICT e apela à mobilização de todos para travar propagação deste vírus. Esta é uma posição que sabemos partilhada também por outras organizações sindicais representantes de docentes do ensino superior e investigadores.
A Direção do SNESup

Em 21 de outubro de 2014

6 comentários:

Anónimo disse...

A ANICT perdeu a sua total credibilidade quando decidiu não apoiar a impugnação do vergonhoso concurso "Investigador FCT 2013". Nem uma palavra a ANICT escreveu ainda sobre o concurso deste ano, que infelizmente está a ir pelo mesmo caminho. Continua "preocupada" com idiotices como esta proposta de carreira de investigação, ou em converter bolsas em contratos, sendo que o investigador pagaria o IRS do seu bolso (!!!). Para dar cobertura a semelhante disparate, realizou um inquérito mal elaborado, onde responderam menos de 400 pessoas. A conclusão foi "Bolseiros de investigação querem contratos de trabalho mesmo que isso implique redução do rendimento líquido.". Conclusão brilhante, tendo em conta que há milhares de bolseiros no país, e só responderam 400... e com um inquérito enviesado aos sórdidos objectivos dos promotores do mesmo. Além disso, o seu site tem um poderoso sistema de censura de comentários, onde se mudam as regras de quem pode ou não comentar ao sabor do vento... por isso a ANICT para mim morreu... nem sei se alguma vez chegou a nascer.

Anónimo disse...

Para mim a ANICT tinha morrido antes, no concurso anterior, em 2012, quando a FCT abriu concurso para 80 investigadores ciência e passou a 160 sem explicar as regras. Claro que os critérios de avaliação são diferentes, consoante o número de vagas..
Na altura perguntei à direcção da ANICT, via mail se ia fazer algo e responderam-me que só quando a FCT tomasse notícia como oficial. Quando a FCT assim o fez, mandei um mail novamente à direcção da ANICT com o comentário: "é oficial; que medida via tomar a ANICT?".

Nunca me responderam...e se já não acreditava muito na ANICT, por tomar posições que não reflectem as preocupações dos ciências e bolseiros, nesse momento então..

Para concluir, fala-se muito que o concurso de 2013 foi vergonhoso, mas mais vergonhoso foi o de 2012...e coloco aqui estas questões: foi feita, por parte da FCT ou outra instituição, alguma avaliação do trabalho desenvolvido pelos ciências 2007/2008, junto dos seus centros de investigação? Contabilizou-se o número de trabalhos e laboratórios que foram abandonados por não se dar continuidade a esses ciência, com as novas regras da FCT?

Nunca obtive respostas oficiais a estas duas questões, mas aquilo que sei não é agradável...a FCT devia ter investido nos anteriores ciência e abrir concurso para integrar novos investigadores que se vão doutorando...a ANICT nunca quis saber destas e outras sugestões.

Anónimo disse...

A ANICT já teve a honra de responder, no seu site, às críticas do SNESup e da FENPROF. Reafirma o seu "compromisso em trabalhar, juntamente com os seus associados, na procura de medidas que tornem o sistema científico em Portugal mais justo e onde o mérito possa ser reconhecido e premiado." Ficam muitas dúvidas:

1 - Se é para reconhecer o mérito, porque razão a ANICT não participou na impugnação dos concursos "Investigador FCT"? Até agora, estes concursos não favoreceram o mérito, bem pelo contrário, tendo em conta as graves irregularidades sobejamente conhecidas. O que significará a inacção da ANICT perante tais irregularidades? Diz a ANICT que "privilegia uma atitude construtiva e de diálogo"... será que não quer destruir as posições Investigador FCT irregularmente atribuídas aos seus associados?

2 - Se é para reconhecer o mérito, onde está o mérito da "avaliação das unidades" em curso, tão bem descrita neste blog? A ANICT não terá uma palavra a dizer? Ou vai, numa atitude construtiva e de diálogo, dizer amén a esta vergonhosa "avaliação"?

3 - Ainda sobre a "avaliação" das unidades, num momento em que a comunidade científica portuguesa se devia unir para combater a destruição da ciência em Portugal, porque razão anda a ANICT a distrair a comunidade com uma discussão inútil e perigosa?

4 - Sim, discussão inútil, perigosa e até ofensiva: pretende-se por exemplo que os actuais bolseiros post-doc, que ganham 1495 euros por mês, passem a ganhar 1527 euros, aos quais será aplicado IRS... ficando a ganhar pouco mais de 1000 euros. Como post-doc, repudio veementemente esta proposta. Acho-a ofensiva da minha dignidade. Prefiro continuar bolseiro a ver diminuídos os meus rendimentos.

5 - Diz também a ANICT: "A existência de comunidades bem distintas dentro do SCTN, uma com emprego para a vida e cheia de direitos adquiridos e outra totalmente precária e que essencialmente só tem deveres é absolutamente inaceitável." Em vez de mandar "bocas foleiras", a ANICT devia explicar, tim tim por tim tim, o que significa esta frase.

Anónimo disse...

A este propósito, é elucidativa a discussão salutar sobre este assunto que está a ser feita no Fórum dos bolseiros:

http://forum.bolseiros.org/viewtopic.php?f=8&t=5954

ao contrário do que acontece no site da ANICT, neste fórum não há censura de comentários.

Anónimo disse...

Sobre a ANICT e o seu presidente, esta notícia basta para percebermos a sua independência: http://www.psdarouca.com/nuno_cerca_mandatario_cavaco_silva

Ruben Silva disse...

A ANICT fez um estudo baseado em 244 bolseiros (deve ser cerca de 1%). Isto não sei se dá vontade de rir ou de chorar. Todos os bolseiros que eu conheço não estou interessados em transitar para este sistema de contrato de trabalho. Espero que a FCT, caso pondere esta situação, tenha uma atitude responsável e coloque esta questão a todos os bolseiros/LAs.

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