Um despacho da agência Lusa, transcrito do sítio do Porto Canal:
Lisboa, 25 jul (Lusa) -- O reitor da Universidade de Lisboa considerou o processo de avaliação das unidades de investigação "um enormíssimo erro da política pública", que está "enviesado desde o início" apelando ao Governo para que se "preocupe seriamente" com as "consequências desastrosas".
Em entrevista à Lusa, a propósito do primeiro ano de vida da nova Universidade de Lisboa, após a fusão da Clássica com a Técnica, António Cruz Serra diz que ficou claro desde o fim-de-semana passado que o processo de avaliação a cargo da Fundação para a Ciência e Tecnologia (FCT) -- que é também a instituição que atribui o financiamento público destas instituições científicas -- definia à partida que apenas metade das instituições obteria classificação suficientemente alta para passar à 2.ª fase da avaliação.
Ficar pela 1.ª fase significa não receber qualquer financiamento público ou, caso a avaliação dos centros de investigação seja de 'Bom', receber um financiamento no patamar mínimo, que varia entre os cinco mil e os 40 mil euros.
"Toda a informação que entretanto se foi reunindo leva-nos a concluir que aquilo que aconteceu com o processo de avaliação das unidades de investigação é um enormíssimo erro de política pública, é um processo que foi mal montado, uma avaliação que foi feita de forma amadora, por gente pouco qualificada, em muitos casos, para realizar a avaliação e que o processo estava enviesado desde o momento inicial. O erro político fundamental é que tal como o processo foi lançado nós vamos liquidar metade do sistema científico por via administrativa", declarou o reitor.
Cruz Serra disse que a avaliação foi entregue a entidades estrangeiras que desconhecem por completo a ciência em Portugal, e que os painéis de avaliação criados têm avaliadores sem "capacidade científica para avaliar as unidades na sua área científica", são de qualidade "altamente questionável" e que "não conseguem ganhar em Portugal, nas nossas melhores faculdades, um concurso de professor auxiliar".
O reitor declarou que "neste momento já se percebe como foi feita a avaliação", explicando que as unidades foram previamente avaliadas por especialistas da área científica em que se enquadram com notas bastante altas (iguais ou superiores a 17 numa escala que vai até 20), sendo depois avaliadas pelo avaliador do painel, que "normalmente não é da área, [percebendo-se] até pelo conjunto de disparates que estão escritos nessas avaliações, e que dá uma nota muito baixa".
"Aquilo que foi a avaliação final foi a avaliação desse avaliador. Porquê? Porque é ele que está no painel, ele é que foi encarregue de elaborar o relatório final", disse, acrescentando que a consequência foi a exclusão da próxima fase da avaliação de centros de "qualidade inquestionável" em todo o país, considerando que "tudo isto que está a acontecer é lamentável".
"Era como se o professor Nuno Crato tivesse pedido a um professor de Biologia para ir corrigir os exames nacionais de Matemática. Aquilo que aconteceu é algo que precisa de ser infletido, é um processo para o qual eu chamo a atenção do nosso ministro, do senhor primeiro-ministro, porque tem consequências políticas e consequências para o país desastrosas", disse.
António Cruz Serra entende que na fase em que o processo está ou a FCT assume que cometeu um erro, e que é preciso começar tudo de novo, ou não resta alternativa senão "repescar para a 2.ª fase da avaliação" centros excluídos e que não o deveriam ter sido, indo ao encontro da proposta entregue pelo conselho de reitores ao Governo, que defende que não se deve negar financiamento suplementar a unidades de investigação que já foram anteriormente avaliadas com notas muito altas ou a nota máxima.
"Acontece que muitas dessas unidades são unidades onde se faz um trabalho excelente, onde temos um investimento do país de duas dezenas de anos ou mais com equipamento e capacidade instalada de dezenas de milhares de euros e que de repente vai ser deitado fora e isto é algo absolutamente incompreensível", declarou Cruz Serra.
"Tenho a certeza absoluta que se a avaliação terminasse agora, nestas condições, haveria unidades de investigação de grande dimensão e de grande relevância que acabavam no dia a seguir", acrescentou.
Sobre a Universidade de Lisboa, o reitor garantiu que a instituição "não tem qualquer capacidade, com a dotação do Orçamento do Estado que recebe, de substituir o financiamento da FCT".
"Isso está completamente fora de questão. Estamos a trabalhar no limite do que é possível", declarou.
Das 322 unidades avaliadas, 163 (52%) passaram à segunda fase e outras 26% obtiveram a classificação de Bom, tendo assegurado um financiamento base, avançou a Fundação para a Ciência e Tecnologia.
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