sábado, 7 de julho de 2012

Ó (R)ELVAS, Ó (R)ELVAS, BOLONHA À VISTA!


“Devido à irresponsabilidade dos governos, ao populismo dos parlamentares e à cobardia dos docentes a universidade degradou-se para além do razoável” (Maria Filomena Mónica, Público, 8/12/2003).


O meu post aqui publicado,“Ainda a Prova de Acesso à Carreira Docente e um Comentário de um(a) Leitor(a)” (1/06/2012), mereceu de um anónimo o seguinte comentário: “Estará Miguel Relvas em condições de exercer cargos públicos com a licenciatura de Bolonha que possui tirada num ano? Ou terá que sujeitar-se a alguma prova de acesso?”

Este comentário mereceu-me a seguinte resposta, que transcrevo textualmente:

“ Tempos houve em que esse acesso era feito através de um exame de aptidão ao ensino superior ou de uma elevada classificação do exame liceal que o dispensava. De cá para lá, esse acesso passou a fazer-se através do facilitismo das Novas Oportunidades ou de um caricato “Exame de Acesso ao Ensino Superior para maiores de 23 anos”. Sem mais comentários, por desnecessários, muito me causa confusão o facto de governantes e deputados, etc., eles próprios, acharem menos dignos os cargos que desempenham a ponto de os desejarem ornados de licenciaturas de três ao pataco numa altura em que o ensino superior se tornou numa espécie de mercearia que vende títulos académicos ao quilo ou mesmo ao grama.

Mas nada disto nos devia espantar “num país onde a inteligência é um capital inútil e onde o único capital deveras produtivo é a falta de vergonha e a falta de escrúpulos” (Manuel Laranjeira, “O Norte”, 1908). O que nos devia espantar, isso sim, a ser verdade a licenciatura em causa, aliás como muitas outras quejandas, é não serem tomadas medidas para as anular de imediato. Talvez por isso, quando se defendem ordens profissionais que atestam os cursos superiores de actividades profissionais de direito público ouve-se a vozearia de semi-analfabetos a bramar contra a “heresia”. Entretanto, diplomados com cursos superiores de créditos firmados e acima de qualquer mácula têm que se contentar com empregos de caixas de supermercados, levando a concluir ser este um trabalho mais exigente sob o ponto de vista deformação académica do que cargos políticos ao mais elevado nível”.


Ainda não se sabia (e, consequentemente, eu não sabia, outro tanto, por me faltarem dotes de adivinhação só ao alcance de cartomantes ou bruxos) que a procissão ia no adro de outras situações idênticas em que se houvesse ordens profissionais a sancionar a qualidade dos diplomas universitários dos respectivos associados nada disto teria acontecido para descrédito, cada vez maior, de um ensino superior em que se pode ter acesso, através de ”Provas de Acesso ao Ensino Superior para maiores de 23 anos", e em que, o que é mais estranho, de lá sair, num ai, com um diploma que diploma a ignorância. Agora compreendo, finalmente, e já não era sem tempo, a obstrução actual para que as ordens profissionais deixem de dar a garantia da qualidade dos actos prestados por profissões de interesse público em assumpção da responsabilidade inerente.

Nada, portanto, como encaixar as peças de um mesmo puzzle do facilitismo em que se transformou o próprio ensino superior num país, como escreveu o falecido António José Saraiva - no artigo “Para que serve a Universidade Portuguesa”, “Diário de Notícias” (28/09/1979) -, uma referência de destaque no panorama cultural, em que "a Universidade tem umgrande, um indispensável papel na nossa vida nacional: passar diplomas. É ela quefabrica os bacharéis e os doutores. Não ensina, não investiga, mas como podiaexistir o País sem ela? É indispensável para desenvolver o verbalismo, oformalismo, a incapacidade de ‘fazer’ e de tomar iniciativas que caracteriza onosso pessoal dirigente. Quem, se não ela, produziria o conselheiro Acácio,‘bacharel como toda a gente’”?

Durante tempos, pensei que esta mordaz crítica não passava de um exagero utilizado e ampliado para criticar usos e costumes duvidosos, mas não tão duvidosos quanto isso! Mas com a adopção do “Processo de Bolonha”, neste tradicional cantinho europeu, a língua de Shakespeare – veículo de entendimento entre países dos cinco continentes – seria abastardada pela adopção megalómana do grau de licenciado para o 1.º ciclo de estudos superiores como que a modos da força da tradução para português da palavra inglesa “bachelor”. E isto, depois de inúmeras hesitações e consultas a meio mundo que se manifestaram a favor da nomenclatura de bacharel, como foi o caso de nove ordens profissionais que participaram no Seminário “Reflexos da Declaração de Bolonha”, realizado em Coimbra (12-13 /Novembro/2004). Fiquei agora a saber, em Portugal tudo acontece e nada acontece por acaso!

7 comentários:

João de Castro Nunes disse...

A solução que se impunha
era darem-lhe o capelo
de doutor "honoris cunha"
embora sem merecê-lo!

JCN

Anonymus disse...

Afinal, há mais Relvas do que imaginamos.

Da crónica de Santana Castilho, Público, 4/7/12:

«2. A história é rápida de contar mas já demorou demasiado a resolver. A 16 de Julho de 2011, verificou-se a eleição do actual director do Agrupamento de Escolas de Dr. João Araújo Correia, de Peso da Régua. O acto viria a ser impugnado junto do Tribunal Administrativo e Fiscal de Mirandela, por outro candidato, que alegou ter o eleito prestado falsas declarações, designadamente dizendo possuir uma licenciatura que nunca possuiu. Do mesmo passo, a Inspecção-Geral da Educação e Ciência abriu um inquérito. Passou quase um ano e não há decisão sobre uma coisa que não precisaria de qualquer inquérito. Com efeito, é exigível que os serviços administrativos certifiquem, na hora, se um professor é licenciado ou não, sendo certo que há anos lhe paga como tal e até o nomeou Professor Titular, quando a categoria existia e exigia o grau de licenciado. A universidade onde o director estudou certificou que ele não tinha concluído a licenciatura. Essa certidão é do conhecimento dos intervenientes.
Entretanto, houve decisão judicial, que anulou o acto de admissão a concurso do actual director, considerou que ele prestou falsas declarações no que toca à licenciatura e mandou repetir o processo, com a sua exclusão. Desta decisão podia recorrer o director, que recorreu, e a Direção-regional de Educação do Norte que, ao não recorrer, aceitou a decisão do tribunal. Exige-se, agora, rápida prova de vida do secretário de Estado do Ensino e Administração Educativa, que também está ao corrente desta saga, ou do director-regional de educação do Norte ou da inspectora-geral da Educação e Ciência. Ou deles todos, de mãozinhas dadas, por causa dos papões autárquicos. É que o processo judicial é uma coisa e o disciplinar outra. Conhecida a falta, correm prazos e há prescrições. O costume.
»

Francisco Domingues disse...

Eu, como académico universitário que estudei 5 anos para me licenciar e "queimei as pestanas" para ser um dos melhores do curso (1968 - Faculdade de Letras de Lisboa), já com um percurso de seminário de c. 11 anos que me deu forte componente cultural e crítica, apesar do arregimento religioso com o qual nunca pactuei, sinto-me envergonhado como português que tal governação e legislação tem! Mas, para não ficarmos na eterna indignação e crítica - que nada adiantam! - proponho a propagação de um movimento anti-voto, para que possamos realmente escolher os melhores que ponham ordem na casa e acabarmos de uma vez por todas com as propostas partidárias de incompetentes nos quais nos convidam a votar. Eis o texto:
«NAS PRÓXIMAS ELEIÇÕES LEGISLATIVAS VAMOS TODOS votar em branco ou não votar (abstenção geral!) - SERÁ A MANEIRA PRÁTICA E LEGAL DE CORRERMOS COM OS ACTUAIS POLÍTICOS CORRUPTOS. Passemos palavra para sermos a maioria!
SE VOTAREM EM BRANCO, e se esta for a maioria da votação, a CNE é obrigada a anular as eleições e marcar novas, mas com outras pessoas diferentes nas listas. A legislação eleitoral tem esta opção para correr com quem não nos agrada. (Mesmo assim, irão dar aos partidos eleitos, 3,60€ por cada voto e durante a legislatura, ou seja, durante 4 anos, o que perfaz 14,40€, o mesmo acontecendo com os votos nulos ou riscados.)
SE SE ABSTIVEREM, protestam e não vão dar dinheiro nenhum aos partidos!»
Esta, uma acção que poderá dar frutos. Vamos então actuar!

Rui Baptista disse...

Prezado Doutor João de Castro Nunes: Escrevi no ‘Diário de Coimbra’, em 26 de Julho de 2001:

"No estertor da monarquia, o fascínio pelos títulos de nobreza concedidos a granel (a que o festejado Camilo não foi capaz de se subtrair, só descansando quando o fizeram visconde, logo ele que tanto criticara esses títulos) deu azo ao dito jocoso: ‘Foge cão, que te fazem barão! / Para onde, se me fazem visconde?’ Em nossos dias, com idêntica razão, desajustado me não parece parafrasear: ‘Foge gato, que te dão o bacharelato! / Para que lado, se me fazem licenciado?’ Mas, em tempo algum, as licenciaturas tiveram como destino trágico servirem o ego da legião de desempregados…ou a exercerem profissões para que a seriedade do diploma da antiga 4:ª classe capacitava. E bem!”

Em post neste blogue, quase sete anos depois (06/04/2008), perante o facilitismo que, qual erva daninha, se alapardava à exigência da atribuição de graus académicos mais elevados, atrevi-me a fazer novo verso, pedindo indulto perante os poetas por me ter atrevido a ser um remendão do género lírico (mas como diz o ditado, “de médico poeta e louco todos temos um pouco”). Escrevi então: “Abre as asas canário / não se trata de imaginário /Para além da dádiva do mestrado / Com pouco mais sairás doutorado!”

Ao arrepio dos versos camonianos, mudam-se os tempos, mas não se mudam as vontades ! E quando mudam é, por vezes, e em mau fado nacional, para pior. Muito pior!

João de Castro Nunes disse...

Na presente situação
estamos feitos ao bife,
não tendo mais solução
que encomendar o esquife!

JCN

Anónimo disse...

Debaixo do pé esquerdo escreva o nome dele. repita 3 x: Debaixo do meu pé esquerdo eu te prendo (aeag), eu te amarro (aeag), eu te mantenho (aeag), pelo poder das 13 almas santas e benditas e por São Cipriano, vc vai ficar apaixonado por mim e me fará muito feliz. Que vc (aeag) só tenha pensamentos, olhos, coração, amor, desejos, tesão, admiração, respeito, carinho, paz e realização sexual comigo. Que vc (aeag) seja uma amante, namorada, amiga, companheiroa, noivoa e esposa, dedicada e fiel e completamente apaixonada por mim. Assim eu quero, assim será feito. Amém. Publicar 7 x essa oração (forte para amarrar alguém) simpatia infalível, porém não se pode voltar atrás.

João de Castro Nunes disse...

Por decisão do reitor,
que tem poder para tal,
o Relvas saiu doutor:
essa é que é essa, afinal!

JCN

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