quinta-feira, 12 de julho de 2012

Recordando Francis Crick, co-descobridor da dupla hélice do ADN


Novo post de António Mota Aguiar:

No dia 28 deste mês de Julho passarão oito anos do falecimento, aos 88 anos de idade, de Francis Crick, um dos mais brilhantes e influentes cientistas de todos os tempos, homem de uma curiosidade insaciável acerca da vida, possuidor de uma mente criativa verdadeiramente invulgar.

Crick nasceu em 1916 em Northhampton, no Reino Unido. Formou-se em Física no University College de Londres e, durante a Segunda Guerra Mundial, trabalhou em detectores de minas, para a Royal Navy. Mas em 1947 passou-se para biologia.

Nos anos cinquenta associou-se com o biólogo norte-americano James Watson (Chicago, n. 1928) nos Laboratórios Cavendish, em Cambridge, no Reino Unido. Da colaboração entre os dois cientistas surgiu, em 1953, a descoberta da dupla hélice da estrutura do ADN, a molécula da vida, pela qual os dois homens, juntamente com o neozelandês, Maurice Wilkins (1916-2004), receberam, em 1962, o Prémio Nobel da Medicina. A descoberta da estrutura do ADN é considerada pela comunidade científica internacional como a maior descoberta em biologia do século XX, estando na base da revolução biotecnológica e biomédica actual.

A partir de 1962 Crick colaborou com Sydney Brenner procurando saber como se traduzia o código genético nas proteínas do organismo. Graças à sua contribuição, a partir da década de 1960, já se conheciam bem as bases da biologia molecular.

Em 1976, passou-se para o Salk Institut, na Califórnia, tornando-se neurocientista e dedicando-se ao estudo do cérebro. Num artigo que publicou em 1979, na revista Scientific American, escreveu que tinha chegado o momento da ciência abordar o proibido tema da consciência.

Em 1994, publicou: A Hipótese Espantosa: Busca Científica da Alma (Instituto Piaget, Lisboa), no qual escreveu:

“A Hipótese Espantosa é a de que “Você”, as suas alegrias e as suas tristezas, as suas memórias e as suas ambições, o seu sentido de identidade pessoal e livre arbítrio, não sejam de facto mais que o comportamento de um vasto conjunto de células nervosas e das suas moléculas associadas”. (…) “A linguagem do cérebro é baseada em neurónios. Para compreender o cérebro devemos compreender os neurónios e, especialmente, como é que grande número deles actuam conjuntamente em paralelo” , e, citando outro autor, acrescenta: “Você não passa de um embrulho de neurónios”.

Interrogando-se se a nossa “Vontade é livre”, acrescentou:

“E não poderá acontecer que a nossa vontade apenas aparente ser livre”?

Interrogando-se sobre o funcionamento do cérebro, escreveu:

“Como é que esta extraordinária máquina neurónica surgiu? Para compreender o cérebro, é importante compreender que se trata do produto final de um longo processo de evolução por selecção natural. Não foi projectado por um engenheiro, se bem que, como veremos, execute um trabalho fantástico num pequeno espaço e use relativamente pouca energia para o fazer.”
(…) “Assim, o cérebro amadurecido é o produto simultâneo da Natureza e da Educação.”

Todavia, como não fazia da ciência um dogma, Francis Crick afirmava:

“As especulações discutidas neste livro não são um conjunto de ideias completamente trabalhadas e coerentes. Representam antes um trabalho em progresso. Acredito que o modo correcto de conceptualizar a consciência ainda não foi descoberto e que estamos meramente a tactear o nosso caminho nessa direcção. Esta é uma das razões pela qual a evidência experimental se torna importante. Novos resultados poderão sugerir novas ideias e alertar-nos simultaneamente para erros nas concepções anteriores."

Nos seus trabalhos, Crick privilegiou a abordagem empírica centrada no estudo da consciência, inspirando a investigação do jovem neurocientista americano Christof Koch (Kansas City, 1956). Crick e Koch pensavam que a consciência é uma propriedade global do cérebro, e que só uns tantos neurónios são responsáveis em cada momento pela consciência no ser humano e afirmava que, dos cerca de 50.000 milhões de neurónios que há no cérebro, talvez só algumas dezenas de milhares dessem lugar ao sentimento de percepção consciente, um fenómeno local segundo ele.
Depois de ter descoberto um dos mistérios básicos da vida, a dupla hélice, o ADN, que conduziu à genética molecular, que originou inúmeras aplicações, o descobrimento da consciência, dizia Crick poderia levar a resultados igualmente surpreendentes:

“Os aspectos misteriosos da consciência podiam desaparecer, exactamente como os aspectos misteriosos da embriologia desapareceram em grande parte, agora que conhecemos as capacidades do ADN, ARN e proteínas”.

Paralelamente aos seus estudos, Francis Crick queria eliminar a ideia de que existe vida depois da morte. Por isso não estava de acordo com os filósofos que, quando abordam a problemática da mente e da matéria, são de opinião que a consciência está fora do âmbito da ciência material. Recusava estas opiniões, dizendo que “o mecanismo é que importa, o resto não são mais que jogos de palavras”. E acrescentava: “uma dedução mais aprofundada do conhecimento de como funciona a consciência, conduzirá à morte da «alma»”. Dentro de algumas centenas de anos, “os instruídos acreditarão que não há alma independente do corpo e, por conseguinte, que não há vida depois da morte.”

Estas palavras do parágrafo anterior foram ditas por Crick para uma entrevista que lhe foi feita cerca de um ano antes de morrer, a 28 de Julho de 2004, no Thornton Hospital de São Diego, onde esteve submetido a um tratamento de quimioterapia, depois de uma longa luta contra um cancro no cólon.

Crick será recordado como um dos mais brilhantes e influentes científicos de todos os tempos”, disse Richard A. Murphy, presidente do Instituto Salk de São Diego, onde Crick trabalhava desde 1976. O presidente da Royal Society britânica da altura, Robert May, salientou que Francis Crick dera uma “descomunal contribuição à ciência, seus descobrimentos permitiram-nos entrar na idade de ouro da biologia molecular”.

António Mota de Aguiar

2 comentários:

José Batista da Ascenção disse...

Há pessoas a quem os comuns mortais muito devem.
Francis Harry Compton Crick foi uma dessas pessoas.
Um dos melhores.

Cláudia da Silva Tomazi disse...

Respeito a bem dizer o brilhantismo em cientistas, estudiosos e deveras por construir conceito, mas cada qual: com cada seu! em relação a Crick, o bando de andorinhas ao vôo ou então as nobres sardinhas a manta em comum ballet.

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