quarta-feira, 7 de julho de 2010
NOVAS OPORTUNIDADES OU NOVOS OPORTUNISMOS?
Artigo de opinião de Rui Baptista publicado hoje no "Público":
No ano de 2006, foram divulgados os resultados do PISA (Programme for International Student Assessment) que colocaram Portugal em 54.º lugar, apenas à frente da Grécia, da Turquia e do México. Uma vez mais e sem ser por boas razões, o sistema educativo português passou para as páginas da comunicação social dos 57 países da OCDE que participam nestas provas avaliativas do rendimento escolar no âmbito da Matemática, das Ciências e da Leitura.
Era este, portanto, o desolador panorama do nosso país em que "até dá pena ver o esforço das autoridades portuguesas para desvalorizar o PISA e, quando não o desvalorizam, o esforço para desculpabilizar um sistema que assim se vê tão cruamente retratado e, claro, abalado", dizia Carlos Fiolhais.
E se, no sistema educativo regular dos jovens portugueses com a idade de 15 anos, pois é neste escalão etário que incide o PISA, houve maus resultados impossíveis de esconder, no Programa Novas Oportunidades, destinado a indivíduos maiores de 18 anos que deixaram de frequentar a escola por reprovações sucessivas, os resultados transformam-se em êxitos estatísticos oficiais de uma desastrada política educativa.
A réstia de esperança que pudesse haver sobre a bondade de uma segunda oportunidade, para quem desperdiçou uma primeira, foi abalada em seus frágeis alicerces pela leitura de uma extensa reportagem, sobre os Cursos de Educação e Formação, publicada no Expresso (8/12/2007). Por ela se ficou a saber que estes badalados cursos para aumentar as percentagens estatísticas de portugueses que terminam os 6.º, o 9.º e 12.º anos de escolaridade, não espelham uma situação minimamente verdadeira, credível ou séria.
Não querendo generalizar a todos estes cursos efeitos perversos, tenho razões para pensar que em sua grande maioria sirvam apenas de recreio buliçoso para passar o tempo de quem procura um diploma avalizado pelo Estado. A título de mero exemplo, extraio ainda do Expresso este elucidativo pedaço de prosa da autoria do professor que denunciou ao Presidente da República o verdadeiro escândalo que se acoberta por detrás destas actividades curriculares: "Estes frequentadores da escola aparecem nas aulas sem trazer uma esferográfica ou uma folha de papel. Trazem o boné, o telemóvel, os headphones e uma vontade incrível de não aprender e não deixar aprender."
Nas sábias palavras de Stephen Covery, "se continuarmos fazendo o que estamos fazendo, continuaremos conseguindo o que estamos conseguindo". Ou seja, continuando a consentir "que se estejam a fabricar ignorantes às pazadas" (Medina Carreira), a educação portuguesa corre o risco de ruir ao peso das Novas Oportunidades.
Rui Baptista
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7 comentários:
Velhos oportunismos...
Caro Rui Baptista,
Continua a haver imensa gente com enormes responsabilidades a assobiar para o lado como se nada fosse! E se alguém lhes pede uma opinião, tentam atirar com as responsabilidades para quem se limita a cumprir ordens, ou seja os professores... normalmente esta gente diz-se de esquerda...! Chegam mesmo a apelidar quem discorda do facilitismo, laxismo, preguiça e indisciplina impostos na escola de... reaccionários, do tempo da outra senhora, salazarentos, bolorentos, neoliberais, conservadores, (como se fosse possível ser tudo isto em simultâneo) entre outros...
A esquerda defende o analfabetismo forçado de uma boa parte da população?
A esquerda defende a pobreza forçada de uma boa parte da população?
A esquerda defende a exclusão social forçada de uma boa parte da população?
A esquerda defende uma sociedade dividida em castas?
Se a esquerda defende este sistema de "ensino", então defende tudo o que acabei de referir.
Duas rectificações:
1. Na 3.ª linha, 1.º§, onde escrevi "colocam Portugal em 54.º lugar, apenas à frente da Grécia, da Turquia e do México", emendar para "colocam Portugal apenas à frente da Grécia, da Turquia e do México."
2. Na 6.ª linha, 1.º §, onde escrevi "comunicação social dos 57 países da OCDE que participam", emendar para "comunicação social dos 57 países da OCDE e seus companheiros que participaram".
Peço imensa desculpa pela intromissão. Gostaria apenas de clarificar que o o Programa Novas Oportunidades não é "destinado a indivíduos maiores de 18 anos que deixaram de frequentar a escola por reprovações sucessivas". Sei, de fonte segura, se sítios onde a maioria das pessoas que recorre às Novas Oportunidades são pessoas com vidas organizadas, que, na grande maioria das vezes, não puderam estudar por dificuldades económicas ou por imposições de outras ordens, como ser mulher e por isso não valer a pena gastar dinheiro nos seus estudos. Tenho visto este processo como uma forma de RECONHECER competências que as pessoas foram adquirindo ao longo da vida, muitas delas mais importantes do que as competências altamente teóricas e desligadas da realidade, que a escola ainda gosta tanto de transmitir (e que eu ainda acho serem as principais causas do abandono escolar no nosso país, juntamente com as próprias características da população). Tenho tido conhecimento deste processo como sendo uma forma de estimular as pessoas de procurar aprender ao longo da vida, de resgatar pessoas que já se tinham esquecido da importância da escola, e tantas delas com más recordações desta. Só gostaria de deixar aqui a nota que este processo pode contribuir para melhorar a ideia que as pessoas fazem acerca da escola e da aprendizagem. Sei de muitas pessoas que frequentam as Novas Oportunidades não porque necessitem do 9ºano ou qualquer outro nível, mas porque querem aprender um pouco mais e se querem valorizar e, por vezes, nos meios onde se encontram têm acesso a poucos recursos. Não estou a defender as Novas Oportunidades, estou apenas a chamar a atenção para o facto de este processo, como tudo, poder ser aproveitado de forma positiva. Este processo não se destina, definitivamente, maioritariamente a jovens, mas a pessoas que não têm facilidade em regressar à escola num processo mais formal, porque trabalham, têm famílias, filhos e outras responsabilidades, e que entretanto foram adquirindo outras competências, também importantes, e que necessitam reconhecimento. Sim, porque a escola da vida também é uma escola.
Espero não ferir qualquer susceptibilidade, consigo compreender o ponto de vista patente neste post, acho que sim, que é uma maneira à pressa e em cima do joelho de conseguir números, mas a verdade é que as coisas não são simplesmente, independentemente de quem as faz; acho que em qualquer contexto, se quem estiver encarregue souber dar dignidade ao processo, certamente farão um bom trabalho.
Mais feio é ver "professores" (que não podem ser verdadeiros professores) discriminar outros professores, porque estes dão o máximo de si num Processo de Novas Oportunidades.
Obrigada.
Susana Pires
Prezado Fartinho da Silva:
Obrigado pelo seu comentário. É sempre consolador saber que há quem lute para que o ensino em Portugal não caia mais fundo num poço de descarado facilitismo que serve, até, para angariar votos de gente boçal e ignorante. Os seus responsáveis tudo fazem para tentar convencer as novas gerações que antes de 25 de Abril o ensino se destinava apenas a uma pequena elite. Só é verdade, em parte.
Vejamos o ensino superior dos nossos dias em que os alunos são obrigados a estudarem longe dos seus lares, a pagarem elevadas propinas…e a terem de desistir, muitas vezes, a meio dos cursos por carência económica do seu agregado familiar. Abriram-se cursos em universidades privadas de vão de escada ou em instalações faraónicas para satisfazer o ego das classes possidentes e assim poderem anteceder o seu nome com o título profissional de engenheiro ou académico de dr.
Antigamente o ensino era cumprido à custa de “sangue, suor e lágrimas”, desde o primário ao fim dos liceus. Hoje, tirando o ensino secundário oficial e o ensino particular de qualidade tudo é feito com intenções estatísticas.
Se é essa a finalidade, porque não fazer o mesmo que para a obtenção do cartão do cidadão? Abriam-se Lojas do Cidadão que passavam a atribuir diplomas de 12.º ano a quem preenchesse um questionário que incidisse sobre a história de vida dos respectivos peticionários. Parafraseando o comediante Wood Allen, “acredito que há qualquer coisa a olhar por nós. Infelizmente, é o Governo”, também eu acredito que há qualquer coisa a olhar pelo nosso ensino. Infelizmente, são os ministérios das respectivas tutelas, do básico ao universitário.
Como escreve, e bem, no seu comentário, chega-se mesmo “a apelidar quem discorda do facilitismo, laxismo, preguiça e indisciplina impostos na escola de... reaccionários, do tempo da outra senhora, salazarentos, bolorentos”. Mas pior do que isso é julgarem-nos estúpidos a ponto de não sermos capazes de estabelecer comparações com um ensino exigente de antes de 25 de Abril que só atribuía o diploma da instrução primária a quem soubesse ler, escrever e contar. Hoje há “letrados” com “diplomas superiores” que mal sabem ler, escrevem com erros e fazem simples contas de somar com máquinas de calcular compradas nas lojas chinesas.
Sinal dos tempos…de tempos de laxismo de deixar passar os ignorante que, suceda o que suceder, são admitido no ensino superior…desde que tenham 23 ou mais anos de idade. Pouco me espanta que entrem no ensino superior, mais me espanta como saem com o canudo nas mãos.
Prezada Susana Pires:
Não tem nada que pedir desculpa "pela sua intromissão" que li com muita atenção. Atenção que me leva a estar a redigir um post a clarificar uma situação que eu sabia de antemão ser polémica.
Quando o ler verá que não sou daqueles fundamentalistas que não aceitam ou fogem mesmo a discutir os assuntos que possam ser incómodos, Aliás, como consta do prefácio de um dos meus livros, escrito por Augusto Cabral, que conheceu o prelo em 72: “Não é de estranhar, pois, que tenha defendido, desde que o conheço a sua posição, em particular, e da sua classe, em geral. Defesa essa em que tem sido intransigente, mesmo quando fica sozinho e luta até ao último alento: mesmo quando lhe falta o apoio daqueles que sobre estes assuntos se deviam pronunciar e o não fazem, limitando-se a colher os benefícios, quando os há, da luta que ele tem travado.”
Hoje, uns tantos lutam contra uma educação que não educa e de um ensino que não ensina. Outros não querem fazer ondas, outros mais, acomodam-se em benefício próprio ou ao serviço dos poderosos. Como dizia o outro, "c'est la vie"...
Caro Jaime Piedade Valente:
No nosso tempo, cada vez têm mais actualidade as sábias palavras de Salomão:"Nil novi sub sole". Oportunistas sempre houve e sempre haverá!
Mas o que é mais grave é que eles brotam como cogumelos no terreno húmido da actual política nacional.
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